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Valores Socio-culturais E A Desistencia Escolar Da Rapariga Na Maganja Da Costa

Desistencia escolar da rapariga no distrito da Maganja da Costa-Zambezia

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CAPITULO I: Introdução No âmbito do trabalho de fim de curso de Licenciatura em Ensino de História, na Universidade Católica de Moçambique, delegação de Quelimane, e na qualidade de professora do Ensino Básico, constatou-se porém, que de entre vários problemas de educação, a “Desistência Escolar da Rapariga” merece uma atenção particular, primeiro porque constituí uma preocupação constante do Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano, dos pais e ou encarregados de educação e da própria sociedade civil. Segundo, porque trata-se de um fenómeno que causa prejuízos no campo educativo, uma vez que as crianças não concluem a escolaridade mínima, vão engrossar a lista de analfabetismo e vão diminuir a lista dos que concluem a escolaridade mínima. No campo social podemos verificar que as crianças que abandonam as escolas, muitas delas não são acolhidas em outras instituições, o que faz com que elas enveredam por outros caminhos que de nada as dignificam, quais sejam a droga, prostituição e alcoolismo. Do ponto de vista económico, estas crianças vão engrossar a taxa de desemprego e, ou então, são candidatos a mão-de-obra não qualificada, auferindo baixos rendimentos, dificultando desta forma o seu bemestar familiar. A educação é um direito humano básico. O seu papel fundamental na redução da pobreza é universalmente reconhecido. Ela contribui directamente para o desenvolvimento humano através da melhoria das capacidades e oportunidades dos pobres (materialmente), promovendo uma maior equidade social, regional e de género, dai que o conhecimento é sem dúvida um meio indispensável para a melhoria das condições de vida. Por isso, a educação é essencial para o rápido crescimento e desenvolvimento do indivíduo e da sociedade. Na Zambézia, em particular no distrito da Maganja da Costa, os níveis de escolaridade ainda continuam baixos, sobretudo entre mulheres e populações rurais. Não é uma fatalidade, embora as condições socioeconómicas influenciarem esse facto, mas o pensamento cultural daquelas populações os destina. Importa referir que esta pesquisa partiu de um problema consciencializado e vivido desde a infância, sempre ouvi alguns pais dizendo às suas filhas “agora és crescida, arranja a tua vida, a escola não te garante o futuro, a escola não se come”. E, muitas famílias, dizem que as meninas 11 que vão à escola estão a fugir do trabalho das machambas. Outras famílias riem-se das raparigas de 18 anos a frequentar a escola porque acham que elas já deviam ter criado uma família. O distrito da Maganja da Costa, a ambiguidade da educação ainda faz-se sentir. Apesar das expectativas sobre a educação claramente indicarem que podiam materializar-se em oportunidades de emprego ou avanço da família. Em termos culturais, o envio das raparigas para a escola significa que os pais tomam uma decisão de “investir” os escassos recursos para algo que é considerado como resultado incerto. Dada a gravidade da situação, senti a necessidade de desenvolver uma pesquisa com vista a dar um contributo para a superação do problema com que as escolas daquele ponto da província da Zambézia se defrontam no dia-a-dia. A presente monografia pretende-se fazer um estudo em pormenores sobre os Valores socioculturais e suas implicações na desistência escolar da rapariga e os problemas que poderá trazer no seio da comunidade Nharinga. Este trabalho está composto por quatro capítulos: o primeiro capítulo: introdução que dará uma abordagem sumária de todo o trabalho destacando tema, a delimitação do tema, justificativa, formulação do problema, objectivos da pesquisa, formulação das hipóteses, metodologia da pesquisa, tipo de pesquisa, métodos e técnicas de colecta de dados, população alvo e amostra da pesquisa. No segundo capítulo, apresento referencial teórico, como forma de sustentar o trabalho em estudo, buscando as ideias dos diferentes autores. No terceiro capítulo, apresento a análise e interpretação dos dados recolhidos no campo, do qual discuto e comprovo as hipóteses desta pesquisa. E no quarto capítulo, faz-se a apresentação da conclusão, sugestões e a respectiva bibliografia. 12 1.1.Tema O presente trabalho tem como tema: “Valores Socioculturais e suas Implicações na Desistência Escolar da Rapariga. 1.2. Delimitação do tema Como nos refere LAKATOS (1992:102), “para que o tema seja passível de uma investigação deve passar por especificação possível, dotado de um sujeito e de um objecto”. Portanto, o trabalho que tem como objecto “Implicações na Desistência Escolar da Rapariga”, goza da seguinte delimitação espácio-temporal:  “Valores Socioculturais e suas Implicações na Desistência Escolar da Rapariga”: Caso da Escola Primária e Completa de Inroga – Maganja da Costa, 2012-2015. 1.2.1. Breve caracterização do local de estudo Neste ponto, de um modo geral vai-se proceder a apresentação do local de estudo, bem como a caracterização de alguns aspectos históricos da escola em causa. 1.2.2. Localização geográfica do distrito da Maganja da Costa De acordo com PEDD (2006), o distrito da Maganja da Costa situa-se no extremo Este da Província da Zambézia e ocupa uma superfície de 7.597 Km2. O seu território estende-se entre os paralelos 16º42’13” e 17º31’44” na Latitude Sul e entre os meridianos 37º04’38” e 38º00’12” na Longitude Este. Com uma superfície de 7.466 km2, o distrito da Maganja da Costa, conta com uma população de 450.944 habitantes e tem uma densidade populacional de 50.3 habitantes por quilómetros quadrados. Segundo com PDM (2009), o distrito da Maganja da Costa, é composta na sua maioria por população jovem que ocupa cerca de 47%, abaixo dos 15 anos de idade maioritariamente feminina. É um distrito que apresenta um clima do tipo tropical chuvoso de savana, com duas estações distinta, a estação chuvosa e a seca. A maior queda pluviométrica ocorre sobre tudo nos meses de 13 Dezembro de um ano a Abril do ano seguinte, variando significativamente na quantidade e distribuição, quer durante o ano, quer de ano para ano, e a temperatura média está na ordem dos 25.7⁰C 1.2.3. Situação geográfica da Escola Primária e Completa de Inroga A Escola Primária e Completa de Inroga localiza-se no distrito da Maganja da Costa, província da Zambézia. A escola está dentro da localidade Bala a 7 km da vila em direcção a praia de Cabuir. Ela localiza-se ao sul da vila, no extremo oeste. 1.2.4. Breve historial da Escola Primária e Completa de Inroga A Escola Primária de Inroga foi construída pelos missionários capuchinhos Jesuítas em reconhecimento de hospedagem que foram-lhes concedidos pelo régulo Inroga em 1979. Inicialmente a escola tinha dois (2) blocos e leccionava 1ª e 2ª classe. Actualmente a escola é constituída por cinco (5) blocos sendo quatro (4) de material de construção convencional e restante dos blocos com material precário. Os blocos estão constituídos por 14 salas de aula, sendo duas salas funcionam como sector pedagógico e uma sala como gabinete do director da escola e a outra funciona como secretaria. Ela carece de biblioteca e do material didáctico específico para várias disciplinas. E, caracterizase pela apresentação de edifícios pequenos. 1.3. Justificativa O principal motivo de escrever um trabalho deste género reside no facto de se ter constatado que a desistência escolar da rapariga é um fenómeno que se verifica em muitas escolas do País, em particular na Escola Primária e Completa de Inroga. Este fenómeno está assumindo proporções e aspectos de muita gravidade no domínio da educação e, envolve a vida social, o aumento das diferenças sexuais, até económicas. A cada dia que passa aumenta a desistência escolar da rapariga, verifica-se muitas vezes em várias instituições de ensino, raparigas que não têm chegado ao fim do ano lectivo, indo ajudar os seus pais nos trabalhos de casa. Embora, a desistência se verifique em alguns rapazes, o objecto desta pesquisa é da rapariga em particular. 14 Por volta dos 8/12 anos, as raparigas assumem mais e mais responsabilidades domésticas em comparação aos rapazes da mesma idade. O montante de trabalho que a rapariga executa dentro e fora da família, constitui uma grande limitação para o seu desenvolvimento. Na Zambézia, nas zonas rurais, a rapariga enfrenta exigências de tarefas e responsabilidades familiares em excesso, em relação ao seu tempo disponível. Para as famílias pobres, a mera necessidade de sobrevivência torna-se um obstáculo para a educação da rapariga, porque tem de desistir de ir à escola no sentido de prestar o seu contributo nas actividades domésticas incluindo a responsabilidade de preparar as refeições, cartar água e, também, tem de participar na produção familiar. Além da rapariga assumir a responsabilidade da família precocemente, ela quando atinge os seus dez anos é submetida a ritos de iniciação que contribui fundamentalmente na desistência da rapariga à escola. Nesta região quando uma rapariga é submetida aos ritos iniciação é considerada como já estando pronta para assumir o casamento. Este factor leva com que naquele estabelecimento de ensino primário haja maior desistência da rapariga, uma vez que maior parte dos alunos que frequentam naquela escola tem a idade que permite entrar nos ritos de iniciação. Na zona rural de Maganja da Costa, é normal que uma rapariga se case logo depois da puberdade, ou até mais jovem, enquanto os rapazes só se casam muito depois da sua juventude ou na adolescência final. 1.4 Objectivos da pesquisa A definição dos objectivos determina o que o pesquisador quer atingir com a realização do trabalho. O objectivo num projecto de pesquisa é sinónimo de meta, fim. Neste sentido, tendo em conta a amplitude real da problemática da desistência escolar da rapariga, a presente pesquisa visa despertar maior atenção as autoridades moçambicanas sobre desistência da rapariga em massa e para que possa contribuir na superação desta problemática. 1.4.1 Objectivo geral 15  Analisar o impacto dos valores sócio-culturais na desistência escolar da rapariga. 1.4.2Objectivos específico  Explicar a relação entre os valores sócio-culturais e a rapariga na escola.  Identificar as causas que motivam a desistência escolar da rapariga.  Explicar as implicações que a desistência escolar da rapariga poderá trazer no seio da população da Maganja da Costa em particular.  Sugerir mecanismos que concorram para a retenção da rapariga na escola. 1.5 Problematização A desistência escolar da rapariga é um problema que vem se arrastando desde a muito tempo no nosso País. É um assunto que actualmente tem levantado constantes debates nas instituições de ensino, na televisão, na rádio e a comunidade em geral. Foi assim que se tomou conhecimento a cerca deste problema. Nesta perspectiva, a desistência escolar da rapariga é um fenómeno que se apresenta em diversas vertentes. O fraco acesso da rapariga à escola, desistência propriamente dita e a redução significativa do número de raparigas à medida que cresce cronologicamente tanto como a escolaridade. A desistência escolar da rapariga é um problema que afecta todo Moçambique e que nos leva a pensar e a reflectir, procurando as suas causas. Trato a questão concretamente na Escola Primária Completa de Inroga. Os dados fornecidos pelo Sector Pedagógico daquela instituição são reveladores quanto a situação que priva a sociedade e estabelece um desequilíbrio no direito de desenvolvimento de rapazes e raparigas. Assim, em 2012, dos 1450 alunos matriculados da 1ª à 7ª classe, 685 eram raparigas e destas desistiram 84 alunas. No ano seguinte, isto é, em 2013, matricularam naquele estabelecimento de ensino da 1ª à 7ª classe, um total de 973 alunos. Deste número 385 eram raparigas e desistiram 87 alunas. 16 No ano de 2014, a Escola Primária e Completa do Inroga, matriculou nas mesmas classes 1105 alunos, dos quais 446 eram raparigas, destas desistiram 64 alunas. E, finalmente, em 2015, dos 1120 alunos matriculados da 1ª e 7ª classe, 478 eram raparigas e desistiram 54 raparigas. Gráfico 1: Número de raparigas que desistira a escola por ano Número de alunas que desistiram a escola entre 2012 á 2015 87 84 Fonte: autora 2012 2013 64 54 2014 2015 Desta forma, a inquietação que me motivou na realização do presente trabalho, relaciona-se basicamente com a seguinte questão:  Qual é a causa que influência na desistência escolar da rapariga no distrito da Maganja da Costa? 1.6 Hipóteses Num trabalho científico é inquestionável a presença de hipóteses, porque se trata de uma suposição ou possível resposta previamente antecipada. Trata-se de uma afirmação préformulada pelo autor do que ele pensa a respeito do problema colocado em consonância com os objectivos definidos. 1.6.1. Hipótese primária  Pensamento sociocultural que muitos pais têm em relação a rapariga e do seu papel na sua vida futura influência na desistência escolar da rapariga. 1.6.2. Hipóteses secundárias 17  Certos ensinamentos incorporados nos ritos de iniciação feminina, na educação da rapariga têm influenciado negativamente na desistência escolar da rapariga ao nível do distrito da Maganja da Costa.  As mestras da prática de ritos de iniciação feminina na educação da rapariga no distrito da Maganja da Costa evidenciam acções que dominam a rapariga de um elemento passivo e menos importante na escola o que contribui a sua desistência. A redução dos dados estatísticos do efectivo feminino escolar nos últimos três (3) anos (20122015) na EPC de Inroga, resulta a influência negativa de certos ensinamentos transmitidos nos ritos de iniciação feminina, bem como a falta de condições financeiras para sustentar os estudos. 1.7 Metodologia de investigação A metodologia é a explicação minuciosa, detalhada, rigorosa e exacta de toda acção desenvolvida no método do trabalho de pesquisa. Ela é a explicação do tipo de pesquisa, do instrumento que se vai usar e tratamento dos dados, enfim, de tudo aquilo que se vai utilizar na pesquisa. Trujillo (1974) apud Richardson (1999:21), define o método como sendo “a forma de proceder ao longo de um caminho ou percurso para o alcance de um objectivo”. Concordando com a ideia do autor acima citado, a presente pesquisa adoptou ainda diferentes métodos de abordagem como: dedutivo e indutivo. 1.7.1 Tipos de pesquisa Para a problemática da desistência da rapariga na escola, recorri a pesquisa qualitativa, para além da revisão bibliográfica. Segundo Chizzotti (2000:78), “a abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objecto, um vínculo indissociável entre o mundo objectivo e a subjectividade do sujeito”. Na pesquisa qualitativa, é necessário que o sujeito que faça parte integrante da observação dos fenómenos de modo que lhe possa atribuir um significado de acordo com o observado no local da investigação. 18 1.7.2 Instrumentos de colecta de dados A pesquisa teve como instrumento questionário e entrevista contendo perguntas devidamente elaboradas pela autora e análise documental. Segundo BELL (2002:100) “o questionário constitui uma forma rápida e relativamente barata de recolher um determinado de informações, partindo do princípio de que os inquiridos são suficientemente disciplinados, abandonam questões supérfluas e avançam para tarefa principal”. Richardson (1999:158) afirma que “no caso de questionário ser anónimo, as pessoas podem sentir-se com maior liberdade para expressar suas opiniões. O facto de ter tempo suficiente, o questionário pode proporcionar respostas reflectidas que as obtidas em uma primeira aproximação com o tema pesquisado”. A aplicação do questionário como técnica principal na colecta de dados, explica-se também pelo facto deste permitir informações de grande número de pessoas simultaneamente em um tempo relativamente curto. A análise documental serviu para completar as informações obtidas por outros métodos e, constituiu na discussão de obras que abordam a desistência da rapariga. 1.7.3 População alvo Segundo Richardson (1999:157), define população alvo como sendo “conjunto de elementos que possuem determinadas características”.(...) Pode ser o conjunto de indivíduos que trabalham em um mesmo lugar. Neste sentido, a pesquisa tem como população alvo: Director da escola, Director Adjunto Pedagógico, chefe do núcleo da promoção da rapariga, 6 professores, 24 alunos, 8 pais e encarregados com alunas naquela escola. Assim, o total de pessoas entrevistas pode ser mostrado conforme a tabela abaixo. 19 Tabela 1: O pessoal envolvido na pesquisa e respectiva técnica e instrumento de recolha de dados. Alvo da pesquisa Quantidade Técnica e instrumentos da recolha de dados Director da escola 1 Entrevista semi-estruturada Director adjunto Pedagógico 1 Entrevista semi-estruturada Chefe da secretaria 1 Entrevista semi-estruturada Chefe do núcleo da promoção da 1 Entrevista semi-estruturada rapariga Professores 8 Questionário Alunas que estudam 20 Questionário Alunas que não estudam 4 Entrevista semi-estruturada Pais e encarregados de educação 4 Entrevista semi-estruturada Total 42 Fonte: Autora 20 Capítulo II: Fundamentação Teórica O presente capítulo aborda questões da visão do ponto de vista dos autores que tratam assuntos ligados ao tema em alusão. A desistência escolar da rapariga constitui uma das preocupações constantes dos sucessivos governos, tendo em conta o seu nível de crescimento e os prejuízos advenientes nos domínios educativo, social, económico e familiar. Neste contexto, esforços, acordos e parcerias vêm sendo feitos entre os vários responsáveis e representantes da Educação com vista a pôr fim a essa praga, que tanto tem contribuído para o insucesso escolar e pelos baixos rendimentos escolares. 2.1. Conceito de desistência escolar Para uma melhor compreensão do fenómeno desistência escolar, torna-se necessário conhecer o seu conceito. Contudo, não é fácil encontrar uma definição que seja consensual. Para Benavente e tal., (1994:78), a desistência escolar corresponde ao “abandono das actividades escolares sem que o aluno tenha completado o percurso obrigatório e/ou atingindo a idade legal para o fazer”. Na perspectiva de Tavares (1990:109), “a desistência escolar consiste em alunos que matricularam nos estabelecimentos de ensino e que não frequentaram a escola durante o ano lectivo em curso. Segundo Mongella (2001:248) entende que “as cerimónias de iniciação, assumem ainda hoje uma grande importância na maioria das culturas, contribuem para a desistência precoce das raparigas”. (...) As raparigas são obrigadas pela cultura a submeter-se aos ritos tradicionais de iniciação, logo após a primeira menstruação. A programação de tais ritos coincide as vezes com o calendário escolar, dando origem ao absentismo das raparigas na escola. Segundo Mongella (2001:248), “as famílias mantém as filhas fora da escola durante um (1) mês após a menstruação, de modo a participar nos ritos de iniciação”.(...) Isto tudo indica que alguns pais estão dispostos a cobrir os custos destes ritos do que a escolaridade formal. As iniciações dão origem a diversos dilemas para as raparigas, afectando a sua frequência e o desempenho académico”. 21 Durante a iniciação, a rapariga é preparada para todas as funções femininas incluindo a preparação para a vida sexual. Segundo Casas (1998:9) “muitos dos ensinamentos relativo à sexualidade e comportamento social são transmitidos aquando da realização dos ritos de iniciação masculinos e femininos”.(...) A prática de relações sexuais, tanto para rapazes como para raparigas, tem início muito cedo (10 e 13 anos) e, os casamentos sobretudo nas zonas rurais, verificam-se igualmente cedo, entre os 14 e 16 anos para as raparigas, ocorrendo mais tarde nas zonas urbanas. Segundo a autora acima citada (Ibid), “os ritos de iniciação contribuem para que as características sexuais se convertem num destino que se apresenta como inalterável, especialmente para as mulheres”. Por esta razão, os papéis perpetuados pela educação tradicional podem entrar em conflito com a educação formal, que, pelo menos nos seus princípios, promove o desenvolvimento integral do indivíduo entre homem e mulher, em função da sociedade. A iniciação feminina é considerada como um rito de maturidade e é realizado para uma ruptura dramática entre as fases de infância e da vida adulta. Em sentido oposto, os ritos de iniciação da puberdade arrastam mais raparigas, do que a escola consegue reter no sistema educacional. A permanência da rapariga na escola, torna-se mais difícil devido as condições socioeconómicas dos pais ou encarregados de educação. Segundo Mongella (2001:245), “as pressões económicas obrigam as crianças a ter que ajudar nas actividades económicas”. Assim, quando se trata de tomar decisões a fazer escolhas, devido as limitações financeiras, é mais provável que as raparigas, e não os rapazes, sejam retiradas da escola. Segundo a autora acima citado (2001:203), “a pobreza está na origem da exclusão das raparigas da escola aos milhões e para as que se encontram na escola, é a pobreza que as impede de alcançar sucesso no campo educacional”. Para as famílias camponesas que têm pouco dinheiro, os gastos aos livros escolares representam um custo considerável para todos eles especialmente quando têm muitos filhos. Tudo isto mostra que um aumento do preço dos livros escolares e da matrícula conduzem a um aumento paralelo de desistências nas áreas rurais. Isto afecta em particular as raparigas, já que as famílias camponesas optam por enviar, em primeiro lugar, os rapazes à escola. 22 Neste contexto, enviar as raparigas para a escola envolve ou significa ter rendimento financeiro o que as famílias, particularmente nas zonas rurais, não têm. Os crescentes custos elevados de ensino são identificados como a razão principal para os pais retirarem as suas filhas. Segundo Mongella (2001:202), “os custos de ensino são considerados fora do alcance e da capacidade de muitas famílias das zonas rurais”.(...) Os estudos mostram que os custos associados com o ensino são mais elevados para as raparigas do que para os rapazes. Na mesma linha do pensamento e de acordo com Osório (1997) citado por (CASAS, 1998:119). “a situação de extrema pobreza das famílias, acrescida da falta de perspectiva para os filhos, levam grande número de famílias a utilizar as meninas como recurso, casando-as prematuramente” Nas áreas rurais, para a rapariga, o casamento e a maternidade perfilam como o único futuro aceitável. As raparigas têm maior probabilidade do que os rapazes de desistirem devido ao casamento prematuro. De acordo com Ivala e Bonnet (1999:38), a ideia que existe é que: “a rapariga foi concebida para cuidar do lar, e como tal ela deve, logo que atinja a idade adequada, depois de submetida aos ritos de iniciação, casar-se para ajudar a sua família de proveniência, a suprir carências de ordem económica, através de proventos do marido. Não se inculca na rapariga, desde cedo, as vantagens que podem resultar da sua escolarização para a obtenção do emprego, a fim de ajudar melhor a família”. Na sociedade nharinga, principalmente nas áreas rurais do distrito da Maganja da Costa, o sonho de muitas famílias é ver suas filhas casadas crescidas ou pequenas, em vez serem engravidadas. Segundo Casas (1998:119), “Se encontrarem um rapaz trabalhador, muitos pais preferem casar a sua filha quase criança, porque pensam que é melhor isso do que esperar que engravide e seja mais uma carga nas suas costas, sem apoio do marido”. Os ensinamentos dos ritos de iniciação promovem a sexualidade precoce. Segundo Casas (1998:118), “a sociedade aceita como “normal” que as raparigas tenham “um destino” mais ou menos fixo, o que inculca nelas um sentido de baixa auto-estima, de valor próprio relacionado apenas com a sexualidade, com a sua capacidade reprodutora e a capacidade de trabalhar para a família”.(...) Não há muitas razões, especialmente para uma rapariga nas zonas rurais, que a levem a acreditar que o futuro lhe oferece outras alternativas. Desde os seus primeiros anos dentro da família, ela identifica-se com o papel desempenhado pela sua mãe. 23 2.2. A Educação Formal da Rapariga na Zona Rural Um obstáculo significativo que o governo de Moçambique enfrenta são as disparidades que persistem entre as zonas urbanas e as zonas rurais onde mais de metade da população moçambicana reside. De facto, os desafios em termos de educação permanecem sem dúvida mais elevados nas zonas, a nível global. Segundo Nérice (1989:41) considera a educação como maior arma de que uma sociedade pode dispor. Uma arma de maior alcance e eficiência. Esta ideia também foi abordada na Declaração de Beijing (1995) na qual se afirma que a educação é um direito humano inalienável e uma ferramenta essencial para atingir os objectivos da igualdade, (MONGELLA, 2001:43). As taxas elevadas de desistência escolar nas escolas das zonas rurais significam que a maioria das raparigas abandona o sistema de educação sem adquirir competências básicas de alfabetização. Os dados desagregados por género sobre os resultados escolares indicam ainda que as raparigas nas zonas rurais têm menor possibilidade de permanecerem na escola do que os rapazes, bem como do que as raparigas nas zonas urbanas. Aquelas enfrentam obstáculos específicos à permanência no sistema de educação, relacionados com a carga de trabalho doméstico que desempenham e o seu papel como cuidadoras. Algumas pesquisas mostram que as raparigas trabalham em actividades domésticas do que os rapazes. Mongella (2001:196) afirma que, “espera-se que as raparigas limpem a casa, lavem a loiça , preparem refeições e lavem a roupa enquanto que os rapazes geralmente têm uma carga de trabalho mais ligeiro. É norma que as raparigas jovens ajudem as suas mães no mercado, na busca de água, recolha de lenha e no zelo pelos membros da família mais novos, pois estas são actividades que se esperam das raparigas”. A identidade feminina constrói-se na base da noção de “ser para os outros”, assim, entende-se que uma rapariga “é para” ajudar a sua mãe em casa, “é para” servir o seu marido. Casas (1998:118) salienta que, “a sociedade aceita como “normal” que as raparigas tenham “um destino” mais ou menos fixo, o que inculca nelas um sentido de baixa auto-estima, de valor próprio relacionado apenas com a sexualidade, com a sua capacidade reprodutora e a capacidade de trabalhar para a família”.(...) Não há muitas razões, especialmente para uma rapariga nas zonas rurais, que a levem a acreditar que o futuro lhe oferece outras alternativas. 24 Desde os seus primeiros anos dentro da família, ela identifica-se com o papel desempenhado pela sua mãe. Perante a problemática da educação das raparigas a sociedade exibe uma atitude de silêncio, mais frequentemente, de cumplicidade, não censurando, de forma clara e aberta, o abuso sexual das raparigas, nem os casamentos prematuros. Assim, para Casas (1998:118),“há professores que vêem em cada rapariga que chega a puberdade uma possível conquista, ou consideram o seu status lhes outorga o “direito” sobre ela”.(...) Se encontrarem um rapaz trabalhador, muitos pais preferem casar a sua filha quase criança, porque pensam que é melhor isso do que esperar que engravide e seja mais uma carga nas suas costas, sem apoio do marido. 2.3. O Exercício da Educação Tradicional da Rapariga Culturalmente, o preconceito de que a mulher é feita só para o casamento pode influir na educação, toda virada para a sua preparação enquanto elemento fiel e submisso ao futuro esposo. A mulher está para o serviço da casa, para cuidar das crianças, para estar ao serviço dos outros, no que se pode chamar de identidade doméstica. A educação tradicional pode contribuir para esta ideia, ao insistir na sua capacidade reprodutora da mulher, o que origina deste muito cedo, casamentos prematuros e o consequente abandono. O problema em estudo da desistência escolar da rapariga, a educação tradicional ocupa um lugar de destaque porque é o principal meio de socialização entre a maioria da população do país. Que segundo Bonnet (1996:25) define a educação tradicional como sendo, “Conjunto de ideias, sentimentos, crenças, hábitos, habilidades, toda a informação cultural que, ao longo da historia, são transmitidos de geração em geração, quer através da linguagem oral, gestual e, ou escrita, quer através dos actos que possam identificar, de modo particular, os membros de uma sociedade, ou de uma etnia”. Na óptica de Mira at. all (1997:39), dizem que a educação tradicional é aquisição de conhecimentos referentes a cultura local. Começa antes da iniciação à puberdade, isto é, na família. Assim, a educação tradicional é realizada em dois momentos cruciais: na família e nos ritos de iniciação. O principal objectivo da iniciação é aumentar a inserção do indivíduo na 25 sociedade através de múltiplas manifestações e, em particular, prepará-lo para assumir outras responsabilidades sociais. De acordo com a ideia dos autores acima citados, pode-se entender que a educação tradicional é uma herança cultural, em que o sistema de conhecimentos e valores é transmitido aos membros da sociedade, de acordo com o seu estágio de desenvolvimento e, comporta dois (2) momentos cruciais: na família e nos ritos de iniciação. Nesta perspectiva, a educação tradicional é um processo de socialização, segundo aquilo que cada povo no seu modo de existir, considera ideal em termos de valor. Para questão da alta desistência escolar das raparigas das zonas rurais, Palme (1992) citado por Ivala e Bonnet (1999:24) diz que não pode ser entendida como um efeito de hábitos ou formas ultrapassadas”. Para isso encontra a explicação na lógica da reprodução social na sociedade rural enquanto o mesmo fenómeno nas áreas suburbanas tem a ver com estratégias de sobrevivência das famílias pobres. Na zona rural no distrito da Maganja da Costa, os ensinamentos tradicionais desempenham um papel importante para a população. Segundo a obra de Claude Boucher Mafr at all (1996) citado por Ivala e Bonnet (1999:27), faz uma abordagem acerca da juventude moçambicana e dos ritos de iniciação numa perspectiva da religião crista:  “A obra refere-se a importância da educação e do seu significado para a vida das populações, principalmente para os povos do centro e do norte de Moçambique;  Revela que esta educação serve para a formação dos rapazes e das raparigas quando atingem uma determinada idade. Tem um grande valor para o povo, porque através da iniciação, a pessoa fica formada e preparada a tornar-se adulta, deixa de ser criança 2.4. Causas da Desistência da Rapariga na escola Estudos realizados no país situam a maior taxa de desistência das raparigas nas regiões Norte e centro do país, nomeadamente Niassa, Cabo Delgado, Nampula e Zambézia. Várias são as causas que limitam a participação da rapariga na educação formal. 26 2.4.1. Os Ritos de Iniciação das Raparigas Na sociedade moçambicana, os ritos de iniciação constituem uma etapa de formalização na educação iniciada na família. Enquanto, o rapaz é ensinado a conquistar a obediência da mulher, a rapariga aprende a obediência como norma. Entenda-se norma como uma regra de conduta obrigatória por imperativo de convivência social. Que, de acordo com Maia (2002:266), as normas são instituídas pela força normativa das vivências socialmente aceites e instituídas. Nesta perspectiva, a vida em sociedade determina uma certa ordem ou ordenamento, certas regras. Para PNUD (2001:43) refere que, nos ritos de iniciação, a jovem mulher aprende onde se situar na hierarquia da família e a distinguir as boas e más condutas em função do modelo cultural. Assim, a identidade feminina é constituída por mecanismos de socialização e fundamentos normativos que a excluem das funções de controle. Os ensinamentos proporcionados à mulher adolescente visam iniciá-la a vida adulta, isto é, prepará-la para a sua integração no mundo dos adultos com todas as exigências do seu papel. Dos vários conteúdos, a jovem mulher aprende a cuidar do seu próprio corpo, cuidar da casa, do seu marido e das crianças. O principal objectivo é, de acordo com Cipire (1996:43), prepará-la para ser mulher com qualidades de uma excelente “mãe” e “esposa”, contrariamente ao homem que, na mesma fase, é ensinado a tomar dianteira da família e participar activamente na vida social, política e económica da sua comunidade. A iniciação representa uma instituição de capital importância para a instrução e educação do indivíduo. Golias (1993:15) salienta que, “os ritos de iniciação têm lugar por volta dos 12 anos e são marcados por acções educativas mais conscientes. É nessa altura que a educação dos jovens é confiada a alguns membros designados colectividade. Ela compreende os fundamentos da vida social, nomeadamente os valores culturais, costumes e tradições”. 27 Assim, o adolescente forjado na iniciação é um homem completo: ele tem da sua vida e da sua sociedade uma ideia clara e coerente, sabe o que os outros esperam e o que é que ele deles pode esperar. Os ritos de iniciação envolvem cerimónias que marcam a passagem da infância para a adolescência. Eles constituem um momento simbólico durante os quais são transmitidos bastantes elementos da educação tradicional. Estes ritos são particularmente mantidos nas zonas rurais, mas também em cidades das regiões centro e norte do país principalmente. Os ritos de iniciação afectam mais raparigas do que os rapazes. As raparigas são normalmente iniciadas durante a sua primeira menstruação. De acordo com Mongella (2001:248) entende que “as cerimónias de iniciação, assumem ainda hoje uma grande importância na maioria das culturas embora, contribuírem para desistência precoce das raparigas”.(...) As raparigas são obrigadas pela cultura a submeter-se aos ritos tradicionais de iniciação, logo após a primeira menstruação. Na sociedade rural, a programação de tais ritos coincide, as vezes, com o calendário escolar dando origem ao absentismo das raparigas na escola. Normalmente têm lugar após as colheitas, quando há abundância de tempo da comunidade e comida para a realização das cerimónias. Segundo Mongella (2001:248), “as famílias mantém as filhas fora da escola durante um (1) mês após a menstruação, de modo a participar nos ritos de iniciação”.(...) Isto tudo indica que alguns pais estão dispostos a cobrir os custos destes ritos do que a escolaridade formal. As iniciações dão origem a diversos dilemas para as raparigas, afectando a sua frequência e o desempenho académico. Ainda existem pessoas que pensam que a menina não precisa estudar, bastando apenas aprender o mais cedo possível a cuidar os trabalhos domésticos, para ser uma excelente dona de casa. As normas culturais valorizam mais a educação dos rapazes, tidos como futuros ganha-pão, influenciam também a maioria das famílias a considerar os homens como chefes de família, e as mulheres como esposas e mães. Espera-se que as mulheres se casem cedo e se tornem dependentes dos seus chamados ganha-pão. 28 Para Nekmwene, José Maria A. (1996) citado por Ivala e Bonnet (1999:30), “o papel preponderante do homem na família, posição que será transmitidas aos filhos, relega para o plano secundário as filhas levando o que a educação formal não seja prioridade para estas”. Depois dos ritos um grande número de raparigas desiste, porque são prontas para serem casadas. Nas áreas rurais os pais arranjam maridos e casamentos. Porque, de acordo com os pais os ritos são importantes, uma vez que as crianças aprendem coisas diferentes da escola, por exemplo aprendem a sexualidade e recebem ensinamentos sobre como se tornarem boas esposas e mães. Segundo Casas (1998:9) “muitos dos ensinamentos relativo à sexualidade e comportamento social são transmitidos aquando da realização dos ritos de iniciação masculinos e femininos”.(...) A prática de relações sexuais, tanto para rapazes como para raparigas, tem início muito cedo (11 e 13 anos) e os casamentos, sobretudo nas zonas rurais, verificam-se igualmente cedo, entre os 13 e 15 anos para as raparigas, ocorrendo mais tarde nas zonas urbanas. Os ritos de iniciação podem ser verdadeiro espaço de formação de personalidades, se os seus responsáveis promovem uma relação de equidade entre rapazes e raparigas e estimularem neles e nelas uma visão do futuro que fortaleça o crescimento pessoal, como condição necessária para uma contribuição na família e nas comunidades, (CASAS, 1998:119). De acordo com o pensamento da autora, nem todos os aspectos da educação tradicional favorecem a desistência da rapariga as aulas. Também fazem parte da educação tradicional os aspectos que visam formar os jovens para a vida. Deste modo, nota-se a importância dos ritos de iniciação como forma de preparar a rapariga para a integração na sociedade. 2.4.2. Casamentos Prematuros Nas áreas rurais, a rapariga, o casamento e a maternidade perfilam como o único futuro. As raparigas têm maior probabilidade do que os rapazes de desistirem devido ao casamento prematuro. Segundo Maia (2002:47), no sentido mais imediato, a noção de casamento comporta duas significações. Por um lado, indica uma convenção ou decisão de viver junto e, por conseguinte, constitui um fundamento da família, embora esta possa existir sem aquele, como acontece 29 frequentemente nos nossos dias, por outro, manifesta o estado e o género de vida que daí decorrem. Para as raparigas, a principal causa para o abandono escolar é o casamento. O casamento precoce é comum em Moçambique. A estrutura social e as relações de género nas áreas rurais, bem como a ausência de outras estratégias de vida viáveis para as mulheres num contexto de pobreza profunda fazem com que as raparigas e as suas famílias procurem muitas vezes um casamento prematuro como estratégia de sobrevivência. O facto de uma rapariga ser mais educada do que o seu futuro marido não ser socialmente aceitável, influencia a decisão dos pais de retirarem as raparigas da escola. De acordo com Ivala e Bonnet (1999:38) a ideia que existe é que, “a rapariga foi concebida para cuidar do lar, e como tal ela deve, logo que atinja a idade adequada, depois de submetida dos ritos de iniciação, casar-se para ajudar a sua família de proveniência, a suprir carências de ordem económica, através de proventos do marido. Não se inculca na rapariga, desde cedo, as vantagens que podem resultar da sua escolarização para a obtenção do emprego, a fim de ajudar melhor a família”. Na adolescência, os casamentos prematuros continuam a ser prevalecentes onde devido as dificuldades económicas e as atitudes culturais, é mais comum casar raparigas jovens em vez de investir através da sua educação. As raparigas entram para o primeiro casamento relativamente mais jovens do que os rapazes. Este aspecto encontra a sustentabilidade na Província da Zambézia, a idade mínima das primeiras relações sexuais está entre os 10-13 anos. Importa referir que na sociedade nharinga, após a primeira menstruação a rapariga é considerada adulta e apta para o casamento. Para Palme (1992:49), “tanto na sociedade rural como nos subúrbios as raparigas preparam-se, mentalmente e através de actividades concretas, para um futuro como mulheres casadas ou pelo menos como mulheres crescidas”. Isto significa que, as actividades domésticas tornam-se uma parte cada vez mais importante da educação das raparigas à medida que crescem. Os efeitos físicos, emocionais e sociais do casamento precoce são vários, mas um dos mais frequentes é o abandono escolar, por parte das raparigas, (LEWIS, 2003:2). Quando as alunas abandonam a escola para se casar, dá-se um efeito de choque na comunidade como um todo, com implicações das gerações futuras. As raparigas que casam cedo, têm, inevitavelmente, filhos cedo e têm muitos filhos, uma vez que os seus conhecimentos sobre os métodos anticonceptivos é limitado e o seu poder de negociação para os utilizar é fraco. 30 2.4.3. Causas sócio-economicas O baixo rendimento das famílias, faz com que a rapariga desista da escola. Neste sentido, a permanência da rapariga torna-se difícil devido a condições socioeconómicas. Segundo Mongella (2001:245), “as pressões económicas obrigam as crianças a ter que ajudar nas actividades económicas”. Neste contexto, enviar as raparigas para a escola envolve ou significa ter rendimento financeiro o que as famílias, particularmente nas zonas rurais, não têm. Os crescentes custos elevados de ensino são identificados como a razão principal para os pais retirarem as suas filhas. Esta situação é agravada pela pobreza, que fecha ainda mais as portas da escola às raparigas comparativamente aos rapazes. Como resultado, as raparigas não se inscrevem ou abandonam a escola por razões económicas, procurando realizações no casamento ou maternidade, perdendo muitas vezes a auto-estima e representando-se como dependente do poder masculino. De acordo com Ivala e Bonnet (1999:37), salientam que, “A pobreza na família é dita como uma das causas principais do impedimento da rapariga no que respeita à progressão escolar. Quando uma família de camponeses - que é a maioria em Moçambique - existe algum dinheiro, a preferência é apoiar o rapaz em detrimento da rapariga, pois na compreensão das pessoas “o rapaz é que leva muito tempo para crescer”, ao passo que a “rapariga logo que atinja a puberdade pode (ou deve) casar-se” para aliviar os pais da responsabilidade de sustentá-la além de vigiala para que não seja engravidada por “desconhecidos” (indivíduos não aceites como genros na família)”. 2.5. Outras Causas Específicas da Desistência escolar da Rapariga 2.5.1. Gravidez Precoce e o Assédio Sexual O problema da gravidez precoce existe ao nível Nacional. Neste contexto, a gravidez precoce pode derivar da prostituição ou das relações que a rapariga experimenta na fase de adolescência. Assim, depois da rapariga engravidar abandona a escola com medo de ser ridicularizada perante os colegas. A educação tradicional, tem como uma das principais fases os ritos de iniciação, em que um dos seus conteúdos é a prática precoce da actividade sexual. As meninas movidas pela curiosidade do aprendido, experimentam as relações sexuais muito cedo. Isto leva ao aumento da taxa de desistência entre as meninas. Nesta perspectiva, a gravidez prematura acontece pela prática de “relações sexuais precoce”, desprotegidas. As relações sexuais precoces são aquelas que normalmente ocorrem antes do 31 amadurecimento, antes de a rapariga atingir 18 anos, antes de a rapariga estar preparada para a vida adulta, isto é, sem a capacidade de assumir os seus actos. A gravidez precoce durante o período de escolarização afecta grandemente a rapariga. Ela, acontece por falta de orientação. É um período de transição da infância para a vida adulta. Nesta fase, o adolescente passa por vários conflitos como sentimentos de agitação e inquietação, vergonha das mudanças físicas que ocorrem, atracção pelo sexo oposto, o espírito de aventura com necessidade de experimentar novas coisas e conhecer o mundo. De acordo com Fenhane e Capece (2003:29) a adolescência é uma fase de desenvolvimento do ser humano que engloba uma série de modificações físicas, psicológicas e sociais. As modificações físicas são as mais facilmente observáveis. Esta é fase de afirmação em relação aos que nos rodeiam, o que muitas vezes leva a rapariga a assumir algumas práticas que podem ser risco ou perigosas como a gravidez prematura. Conforme Bastos (2000:133), o problema da gravidez é a mentalidade na adolescência que acontece em elevados índices está “aliada a falta de informação/formação”. Nesta ordem de ideias, pode-se dizer que, a falta de informação leva a rapariga a ficar na dúvida se praticar o sexo antes da idade é bom ou não. A gravidez precoce é nalgumas vezes provocada pelos professores que se envolvem com as suas alunas. Existe também o envolvimento de alunos, além de casos frequentes de indivíduos vindos de fora. De acordo com PNUD (2000:60), “o assédio sexual dos professores e colegas também age como factor que desencoraja, muitas vezes, a permanência das raparigas na escola e tem um impacto negativo sobre o seu aproveitamento escolar”. O envolvimento de professores com suas alunas quebrou a confiança dos pais, ao ponto destes não aceitarem de ânimo leve que suas filhas sejam internadas em escolas que possuem lares de estudantes, mesmo em zonas em que grandes distâncias separam as escolas das áreas de residência, (IVALA E BONNET, 1999:39). 32 2.5.2. Custo da Oportunidade da Educação da Rapariga As elevadas taxas de desistências nas áreas rurais é devido ao elevado custo de oportunidade da educação. Este custo tem contornos específicos de acordo com o género e representa maior obstáculo à expansão da educação para as pessoas rurais. As raparigas nas zonas rurais têm menor probabilidade de trabalhar do que as raparigas nas zonas urbanas. De acordo com Ivala e Bonnet (1999:39), sustentam que, “alguns pais não dão muito valor a escola principalmente nas zonas rurais porque sabem que muitas raparigas com escolarização mínima não têm emprego, e mesmo as que trabalham não ocupam lugares de destaque na hierarquia da empresa. Além disso o seu “saber fazer” é posto em causa pelos homens, devido exactamente a educação que elas recebem desde o berço, na sua relação com a mulher, sempre secundarizada na tomada de decisões, em todas as esferas sociais”. A natureza do trabalho empreendido pelas raparigas nas zonas rurais, muitas na altura da colheita, também faz com que muitas vezes estas não possam ir à escola durante um período de tempo prolongados, uma vez que constituem uma fonte essencial de mão-de-obra para o agregado familiar a que pertence. Ao ficarem atrás no trabalho da escola, as raparigas nas zonas rurais, acabam muitas vezes por desistir. 2.5.3. Relevância da Educação Associado ao custo de oportunidade da educação nas zonas rurais encontra-se a percepção da relevância daquilo que é ensinado nas escolas, por parte dos agregados familiares nas zonas rurais. A relação entre educação e um melhor acesso ao mercado de trabalho é menos visível nas zonas rurais do que nas urbanas. Enquanto os benefícios da alfabetização básica não são postos em causa, completar a educação secundária nem sempre é visto como aumento das possibilidades de um melhor rendimento, num contexto em que existem poucas oportunidades para além do sector agrícola. Palme (1992:41), argumenta que, “se a escola formal pode ser de interesse duvidoso aos olhos dos pais ou famílias, é o mais ainda para as próprias crianças. Ser capaz de ler e escrever, o objectivo mais básico na educação formal, não é um valor obvio nas sociedades rurais onde as crianças não só podem sobreviver sem essa competência mas também pouco ou nenhum uso fazem dela”. Para as famílias camponesas, a educação formal da rapariga é uma alternativa. Neste contexto, deixar a escola não é assunto dramático. Porque o seu futuro é bem preparado e a sua 33 participação em actividades importantes é muito necessitada. Neste sentido, na óptica de Palme (1992: 42), permanecer na escola significa de certa forma prolongar o estado de infância e adiar a entrada na vida adulta e respeitada, incluindo coisas como contribuir mais completamente para a sobrevivência da família através de trabalho, arranjar a sua própria machamba ou casar-se. 2.5.4. Carga de Trabalho da Rapariga Tradicionalmente, as raparigas realizam trabalho doméstico. Nas zonas rurais, o trabalho doméstico é considerado como uma educação e introdução na vida real. A carga de trabalho tem impacto negativo sobre o tempo e energia gasta com trabalhos doméstico. Na opinião de Maia (2002:391) por trabalho doméstico “entende-se o trabalho relativo às tarefas domésticas”. As raparigas completam as actividades escolares com tarefas domésticas para além da sua função na produção agrícola. Ivala e Bonnet (1999:37) argumentam que, “A incompatibilidade entre o tempo das tarefas domésticas e o ensino formal. As raparigas, desde tenra idade, é habituada a cumprir uma série de actividades domésticas reproduzidas ao longo dos anos pela diferenciação sexual por actividades. A rapariga deve varrer, cozinhar, carretar água, cuidar dos irmãos. Ela substitui a mãe, em caso de impedimento (doenças, falecimento), na gestão do lar o que impede dedicar-se de igual modo nas actividades escolares como o seu irmão, por estar mais folgado apresenta-se com maior probabilidade de progressão na escola”. Tradicionalmente, cabe a mulher ocupar-se ao trabalho doméstico e da educação dos filhos, enquanto compete ao homem garantir os meios financeiros da família. Nesta perspectiva, as raparigas desistem em maior número que os rapazes. A rapariga que trabalha na machamba não pode estudar, se ela falta muito tempo, perde a moral e não irá estudar mais. 2.5.5. Impacto Social da Educação da Rapariga A partir do nascimento, o indivíduo é um ser social que através das relações com os seus semelhantes, assimila e integra o modo peculiar como o seu grupo e sua sociedade organiza e produzem as relações sociais. A socialização realiza-se tendo em vista a adequação dos indivíduos às normas e exigências sociais. Para Rocher (1989:126), entende que a socialização é um processo pelo qual ao longo da vida a pessoa humana aprende e interioriza os elementos socioculturais do seu meio, os íntegra na sua 34 personalidade sob a influência de experiências sociais significativa e se adapta assim ao ambiente social em que se deve viver. As raparigas são criadas sob normas culturais que condicionam o seu destino. Desde a sua infância, a rapariga é tratada como um ser inferior e socializada de modo a colocar-se em último plano, subestimando desta forma o seu amor-próprio. As raparigas são apenas tidas como importantes porque constituem uma fonte de rendimento para as famílias, conforme expresso por um provérbio comum na região: “só é pobre quem não tem filhas”. Isto é porque as raparigas estão associadas a vinda de riquezas para a família. Em algumas vezes, as raparigas nas zonas rurais, são comprometidas para o casamento quando ainda pequenas e mais tarde são forçadas a realizar casamentos. As raparigas enfrentam um padrão de socialização que dita as suas vidas até à adulta. As raparigas são socializadas a aceitar certos papéis que são discriminatórios, isto é, o início de um cenário de uma vida de privação e exclusão da corrente social. O comportamento verbal e nãoverbal de ambos os papeis perpetua os estereótipos do género. Mongella (2001:197), sustenta que, “os pais servem de exemplo para os seus filhos e é a nível de família que as atitudes e as crenças são formadas. As crianças observam os distintos papeis desempenhados pelas suas mães tais como cozinhar, limpar a casa, lavar a roupa, enquanto os pais se engajam em actividades recreativas e chamadas de masculinas como tomar conta do cão e matar animais para providenciar carne para a família. Estas observações influenciam as atitudes, crenças e aspirações das crianças sobre os futuros papeis na sociedade. Daí a diferenciação de papeis com base no género é cultivada a nível familiar”. A maior parte das raparigas rurais não usufrui o direito de uso e aproveitamento da educação, apesar de consagrar direitos e oportunidades iguais para rapazes e raparigas e ela ser a principal fonte produtora de alimentos na família. Nas áreas rurais, mais de metade de raparigas com idade igual ou inferior a 14 anos constituem famílias. As raparigas são socializadas a encarar o casamento como sendo o seu objectivo principal na vida e são exigidas a despender a maior do seu tempo em tarefas domésticas e outras actividades produtivas que as preparam para ser boas esposas e mães. Isto reduz o tempo e a energia que as raparigas despendem na escola, afectando a sua participação, desempenho e realização. 35 Segundo um estudo das Nações Unidas, The World’s Women (as mulheres do mundo), indicou que cerca de 40% das mulheres dão à luz antes de atingirem os 18 anos de idade, enquanto em países desenvolvidos, os valores são de aproximadamente 10%, (MONGELLA, 2001:199). 2.6. Estratégias Visando a Promoção da Educação escolar da Rapariga  Em colaboração com os parceiros, incentivar a educação de raparigas aos níveis primários até secundários através de bolsas de estudo para as alunas com melhor desempenho;  Incentivar os professores e escolas a tomar atitudes mais proactivas em relação ao acompanhamento e retenção das raparigas, por exemplo através da menção onerosa para aqueles que conseguem os melhores resultados;  Fortalecer o funcionamento dos conselhos de escola e apoiar a sua participação no estabelecimento de um ambiente encorajador e seguro para a educação das raparigas;  Investigar e analisar de forma sistemática as causas que levam à maior disparidade de género em certos Distritos e comparar esta experiência com a dos Distritos com melhores resultados em relação à igualdade de género;  Formar docentes e membros dos conselhos de escola e da comunidade em geral em direitos humanos e das mulheres, encorajando a identificação de denuncia de casos de assédio ou abuso sexual;  Sensibilizar a sociedade contra certas práticas culturais que impedem à promoção social da mulher. Segundo a Política Nacional de Educação (1995:22), as estratégias que visam a promoção da educação da rapariga são:  “A sensibilização da sociedade para a redução da carga de trabalho doméstico das raparigas;  Promoção de sistemas alternativos de atendimento à educação da rapariga, como seja a organização de programas de educação informal;  Estabelecimento de acordos com Organizações não-governamentais, confissões religiosas e outros parceiros, para envolvimento destas na execução do programa de educação da rapariga; 36  Aumento do no de professoras, recrutando-as nas respectivas comunidades;  Concessão de apoio financeiro para a compra de material escolar”. 37 CAPITULO III: Apresentação, análise e interpretação dos resultados da pesquisa O presente capítulo apresenta a síntese dos dados recolhidos a partir de inquérito e entrevista aos pais e encarregados de educação, professores, corpo directivo, alunos e chefe da repartição do ensino primário na Direcção Distrital da Educação Juventude e Tecnologia da Maganja da Costa. Os dados são a resposta destes às perguntas que lhes foram dirigidas durante a pesquisa de campo. À medida que são apresentados os resultados, seguem-se comentários para analisar os discursos dos participantes. Em cada entrevista fez-se a respectiva apresentação, análise e interpretação dos resultados. 3.1. Dados da Entrevista ao chefe de repartição de ensino primário na DDEJTM Com objectivo de saber qual é o impacto da desistência escolar da rapariga no distrito da Maganja da Costa, foi entrevistado nesta instituição o chefe da repartição do ensino primário, onde as questões dirigidas estavam formuladas de seguinte modo: Pergunta 1: Tem havido desistência da rapariga nas escolas? Face a essa questão o nosso entrevistado respondeu afirmativamente que “sim tem havido desistência da rapariga nas escolas. Pergunta 2: Quais as causas que fazem com que a rapariga não permaneça na escola? O entrevistado avançou várias causas que contribuem a não permanência da rapariga nas escolas. Dentre as causas apontou a pobreza, casamentos prematuros, reprovações e trabalhos domésticos. Sobre a pobreza o chefe da repartição do ensino primário referiu que na sua maioria verifica-se nas famílias de proveniência das raparigas. Vendo-se incapazes de custearem os estudos das filhas, os pais, muitas, vezes aconselham-nas abandonar a escola. Mas não é só da iniciativa dos pais ou encarregados de educação que vem a proposta de abandonar a escola. Algumas vezes e por iniciativa delas próprias. No que respeita aos casamentos prematuros, é na opinião do inquirido que estes contribuem para o abandono escolar da rapariga, uma vez que, devido a imposição familiar muitas raparigas são 38 obrigadas a casar-se. Isto acontece principalmente quando a menina entra para 6ª a 7ª classe, que coincide com o período em que deve ir para os ritos de iniciação. É através dos ritos de iniciação que a rapariga recebe ensinamentos de ser uma boa dona de casa. No que tange sobre trabalhos domésticos aquele chefe disse que “não é observado o respeito pela rapariga no que diz respeito as preparações de lições”. Assim, depois de ir a escola, muitas raparigas são chamadas a colaborarem nos trabalhos da casa dos pais e da machamba o que lhes impedem de prepararem as lições. O reflexo disso verifica-se nas reprovações em massa das raparigas. Assim, desesperadas de passarem de classe, as raparigas optam por abandonar o ensino e irem ajudar os trabalhos dos pais, por vezes são os pais que assim o exigem. No que se refere a preconceitos em relação a rapariga olha-se para aquilo que é a consideração que muitos pais, devido ao analfabetismo, causa e consequência do subdesenvolvimento, dão a rapariga em relação ao rapaz. A rapariga é mais dependente deles enquanto não se casar ao passo que o rapaz goza de certa independência na tomada de decisão sobre o seu próprio futuro. Aqui, o futuro da rapariga é muitas vezes determinado pelos pais ou outras conselheiras que estão mais conscientes de que tal como elas, a rapariga também pode viver sem precisar ir mais longe com os estudos, uma vez que os objectivos do ensino formal na visão popular são ler, calcular (contar) e escrever e calcula-se que tenham sido atingidos. Fazendo uma análise das respostas dadas, pelo chefe de repartição do ensino primário, conclui-se que os casamentos e as condições socioeconómicas são as causas principais para esta problemática da desistência escolar da rapariga. Pergunta 3: Em que período do ano que se verifica maior índice de desistência escolar da rapariga? O entrevistado disse que verifica-se maior índice de desistência escolar da rapariga nos períodos do 2º e 3º trimestre. Neste período a rapariga consegue prever o fim do ano pelos resultados, fracos ou fortes. Por outro lado este período coincide com as cerimónias dos ritos de iniciação e da colheita o que cria confusão na rapariga. 39 O chefe de repartição do ensino primário referiu que, maior parte dos professores estão conscientes que quando as raparigas vão aos ritos de iniciação a probabilidade de voltar a escola é menor porque elas são educadas para dominar os trabalhos domésticos e como instrumento doméstico do homem. E minha opinião que as raparigas abandonam a escola por falta de acompanhamento e apoio moral dos pais, professores e a sociedade em geral. Pergunta 4: Na sua opinião os padrões culturais influenciam o abandono escolar da rapariga? Como? O entrevistado respondeu que os padrões culturais influenciam em algum modo a desistência escolar da rapariga na medida em que elas são levadas para os ritos de iniciação num período inadequado. Assim, podemos dizer que os padrões culturais influenciam para o abandono escolar da rapariga. Pergunta 5: Na sua opinião, a família/comunidade contribui para a desistência da rapariga na escola? Como? Sobre esta questão o entrevistado que disse que em algum momento a família/comunidade contribui na desistência escolar da rapariga na medida que os pais obrigam a rapariga a se casar muito cedo para poderem ter dividendo do casamento desta. Portanto, tudo tem raiz na pobreza de muitas famílias. 3.2.Dados da entrevista ao corpo directivo da escola Para intender as reais causas da desistência escolar da rapariga no distrito da Maganja da Costa, concretamente na Escola Primária e Completa de Inroga, procuramos saber com a direcção daquele estabelecimento de ensino, destacando-se quatro elementos conforme a tabela 1 abaixo. Tabela 2: Número de corpo directivo da EPC – Inroga entrevistados Indicadores Entrevistados Director da escola 1 Director adjunto pedagógico 1 Chefe da secretaria 1 40 Chefe de núcleo da rapariga 1 Total 4 Fonte: autora Pergunta 1: Tem havido desistência da rapariga nesta escola? Em relação a esta primeira questão que se pretendia saber se tem havido desistência da rapariga na escola, dos quatro (4) funcionários que compõem o corpo directivo responderam afirmativamente haver desistência da rapariga. Esta pergunta tinha objectivo de fazer apreciação do informante em relação ao tema. Pergunta 3: Em que período do ano que se verifica maior índice de desistência escolar da rapariga? Em relação a esta questão os nossos entrevistados tiveram respostas divergentes uma da outra. Três (3) pessoas (o director da escola, director adjunto pedagógico e o chefe da secretaria), apontaram o segundo trimestre como o período que mais regista desistência escolar. E a chefe do núcleo de género daquele estabelecimento de ensino apontou o segundo e terceiro trimestre como os períodos que as raparigas desistem a escola, como ilustra o gráfico 1 abaixo. Pergunta 4 Com que idade a rapariga abandona a escola e porque? As idades afectadas são entre 10 a 16 anos. De facto, nesta faixa etária acontecem muitas mudanças na rapariga. É normalmente neste tempo que ela ganha o estatuto de independência, é submetida aos ritos de iniciação e é procurada pelos rapazes para o casamento. Portanto encontra uma série de coisas que influenciam sobremaneira na sua vida afectiva e emocional recebendo pressão de todos os lados. Pergunta 5: Na sua opinião, os padrões culturais aqui na zona influenciam para o abandono da rapariga na escola? Como? Objectivando analisar como é que a comunidade e a família contribuem na desistência escolar da rapariga concluímos que tanto uma quanto outra parte tem influência negativa sobre a 41 rapariga. A comunidade exerce influência à medida que pressiona a rapariga a casar-se através de ironias e outros métodos de exclusão. Se ela não se submeter ao que a comunidade quer é excluída nas várias tarefas comunitárias como o caso de ser conselheira para novas meninas que atingem a fase de maturidade. Os pais também exercem influência quando tomam postura de ver a filha casada. Esta tomada de postura pode ser directa ou indirecta e a menina vê-se num obstáculo para a vida familiar pelo que prefere casar-se. Pergunta 6: Como membros da direcção o que tem feito para reter a rapariga na escola? Em relação ao que deve ser feito para reter a rapariga na escola os inquiridos acham que se devem promover palestras e reuniões de sensibilização da rapariga. Esta apreciação não leva em conta ao poder dos pais e da comunidade na desistência da rapariga. Apressadamente podemos concluir que as palestras dirigidas a rapariga poderá resultar em fracasso se não se der atenção a influência dos pais e da comunidade em todo este processo. Síntese geral da opinião do corpo directivo Do que foi dito podemos generalizar que há vários factores que concorrem para o problema da desistência da rapariga do ensino formal como a pobreza, os casamentos, as gravidezes associadas as tradições. Assim, os casamentos prematuros ou as gravidezes são apenas causas imediatas porque o problema começa muito longe. Este tem origem na pobreza dos pais ou encarregados os quais buscam aliviarem dos encargos entregando a beneficiária a outrem: ao casamento. Neste caso casamento é o desejo comum dos pais, um alívio, pois por um lado, diminui o número de quem pudesse beneficiar-se do apoio deles na esperança de, por outro lado, receber do marido desta algum apoio material. A rapariga torna-se vítima selecionada. Mas acontece um contra-desejo. A própria rapariga tem a consciência da situação por que passam os encarregados: a pobreza; sente que eles querem que se case ainda que não lhe digam directamente e que ela deve aliviá-los daquela situação. Na escola encontra um amigo que lhe 42 vai ajudando, ajuda esta que culmina muitas vezes, não em casamento como é o desejo dos pais, mas em gravidez, que tem sido causa imediata da sua desistência. 3.3.Dados do Questionário aos Alunos Pergunta 1: A que se deve a desistência da rapariga na escola? Sobre esta questão, num total de 24 alunos questionados, 10 alunos equivalentes 42% responderam que a desistência da rapariga a escola deve-se aos casamentos que elas contraem muito cedo, 5 alunos (21%) responderam que nesta região as meninas apanham gravidas indesejadas e 9 alunos (37%) responderam que a falta de dinheiro na família obriga a menina a sair da escola. Veja o gráfico 1 abaixo. Gráfico 2: Número de alunos questionados sobre a desistência da rapariga Alunos questionados sobre a desistencia escolar da rapariga Falta de dinheiro 37% Fonte: Autora Casament os prematuro s 42% Gravidez indesejada 21% Devido ao número elevado de respostas, pode-se dizer que a desistência escolar da rapariga deve-se aos casamentos prematuros, porque quando certos pais se apercebem que as suas filhas já atingiram a puberdade, preferem retirar as suas filhas da escola do que ficarem grávidas, as vezes sem assumirem as suas filhas. 43 Pergunta 2: Achas que os ritos de iniciação influenciam na desistência escolar da rapariga? Porque? Em relação a esta pergunta, num total de 24 (100%) alunos responderam que os ritos de iniciação influenciam sim na desistência escolar da rapariga. Questionado os porquês eles referiram que os conselhos que são dados pelas matronas é para casar depois de regressarem a casa. Pergunta 3: Acha que as escolas influenciam para a desistência escolar da rapariga. Porque? Sobre a questão em alusão os 24 alunos questionados responderam que a escola não influencia a desistência escolar da rapariga. Avançaram como motivos que fazem com que os alunos permaneçam na escola as palestras que as direcções das escolas têm levado acabo no sentido de reter as raparigas na escola. Pergunta 4: A família/comunidade influência para a desistência escolar da rapariga? Em relação a esta pergunta 18 (75%) alunos responderam sim e os restantes 6 (25%) responderam que não. Veja o gráfico 2 abaixo. Gráfico 3: Resposta do questionário sobre se a família/comunidade influencia a desistência escolar da rapariga Questionario sobre se afamilia/comunidade influencia a desistencia escolar da rapariga 30 25 Total dos alunos 20 15 Alunos com resposta negativa 10 5 0 Fonte: Autora Alunos com Alunos com Total dos resposta resposta alunos positiva negativa Alunos com resposta Positiva 44 Procurando saber os porquês, os 18 alunos que corresponde a (75%), responderam que quando não tem dinheiro para custear os estudos, prefere retirar a menina da escola para se casar ou participar nos trabalhos domésticos da casa enquanto 6 alunos que corresponde a (25%), responderam que a família é que incentiva para os estudos da rapariga. No entanto, pode-se concluir que numa situação de pobreza profunda, onde não consegue custear os estudos dos filhos, como por exemplo, compra de material escolar, como forma de resolver o problema os pais retiram as suas filhas da escola. Pergunta 5: A escola na zona rural tem elevado custo de oportunidade? Num total de 24 alunos questionados que corresponde a (100%) responderam que sim, justificando-se que as meninas que estudam nunca arranjam emprego, se não em fazer trabalhos domésticos. A partir dessas respostas dadas pelos alunos, levam-nos a crer que os efeitos da educação não são reconhecidos nas famílias rurais, na medida em que a rapariga pode estudar até concluir o ensino secundário geral, o lugar dela é em casa cuidando dos trabalhos domésticos e dos filhos. 3.4.Dados do Questionário aos Professores Tabela 3: Número de professores entrevistados Indicadores Entrevistados Professores 5 Professoras 3 Total 8 Fonte: Autora Pergunta 1: Porque a rapariga não atinge níveis altos de escolaridade? Sobre esta pergunta dos 6 professores questionados, 4 que corresponde a 67% responderam que durante as cerimónias dos ritos de iniciação as raparigas são ditas que são grandes, criarem suas famílias, enquanto 2 professores que corresponde a (33%) responderam que aqui no campo as meninas apanham gravidas indesejada muito cedo de homens mais velhos, na tentativa de procurar dinheiro para se sustentar. 45 Pergunta 2: Em que época do ano a rapariga desiste de ir a escola? Sobre esta pergunta, os 6 professores que correspondem a 100% dos inqueridos responderam que a época do ano que as raparigas desistem da escola é o 3º trimestre. Procurando saber os porquês, responderam que esta é a época que há abundancia de comida e é o tempo próprio para realizar os ritos de iniciação. Pergunta 3: Na sua opinião os padrões culturais aqui na zona influenciam para a desistência escolar da rapariga? Sobre a questão em alusão, 3 professores que corresponde a (50%), responderam que sim, enquanto os outros 3 professores também correspondente a (50%), responderam que não. Procurando saber porque os padrões culturais influenciam para a desistência escolar da rapariga na zona, os professores responderam que a maior parte da população que vive na zona acreditase tanto nas crenças da culturais e, quando vêm que a menina esta mais ou menos crescida, pensam que é para se casar e cuidar do lar. Enquanto os outros 3 professores referiram que os padrões culturais complementam o conhecimento da escola. Devido o número de respostas elevadas, pode-se interpretar que na sociedade moçambicana, principalmente nhariga os padrões culturais constituem grande obstáculo à educação da rapariga. Pergunta 4: Qual é a faixa etária mais predominante em desistir a escola? Em relação a esta pergunta, os professores responderam que a faixa etária que mais predomina na desistência escolar da rapariga é a partir dos 10 – 14 anos. Procurando saber os porquês os 6 professores que corresponde a 100% dos inqueridos, responderam que nesta idade as meninas já passaram pelos ritos de iniciação e, querem experimentar o que aprenderam durante os ritos. Pergunta 5: quem importância a comunidade atribui a educação formal da rapariga? Nesta pergunta um total de 4 professores que corresponde a 75%, responderam que a comunidade atribui à educação formal da rapariga como perda de tempo, enquanto os restantes 2 que perfaz 25% responderam que a comunidade atribui à educação formal da rapariga como liberdade, desenvolvimento da rapariga e a sociedade em geral. 46 Pergunta 6: O que tem feito para reter a rapariga na escola? Em relação a esta questão os 6 professores questionados responderam que convocam as raparigas e ensinam como devem se cuidar quando chegam a essa idade. Por outro lado referiram que tem realizado palestras e teatro com mensagens educativas que incentiva a rapariga a progredir com os estudos. 3.5. Dados do Questionário aos Pais/Encarregados de Educação Tabela 4: Número de pais/encarregados de educação Indicadores Questionados Homens 6 Mulheres 4 Total 10 Fonte: Autora Opinião dos Encarregados de Educação Alguns pais e encarregos de educação referem que têm dificuldades em manter as filhas na escola devido a compra de uniformes, cadernos e pagamentos de algumas taxas que são cobradas na escola, sem falar do lanche ou matabicho o que faz com que as raparigas procurem um rapaz para ajudar nessas necessidades. Isso culmina com grávidas para as raparigas as quais ficam em casa quando o rapaz continua a estudar o que é injusto. Um outro factor tem a ver com o futuro; arranjar trabalho não é fácil mesmo para quem estudou, e o namoro com os respectivos professores é um factor adicional. As meninas incapazes de namorarem com respectivos professores acabam por abandonar a escola. Como se pode ver, concorrem para o fracasso da participação da rapariga no ensino formal os factores pobreza e grávidas prematuras nas opiniões dos encarregados. A pobreza é, na visão dos pais e encarregados de educação, a causa e factor principal. Os pais sabem muito bem que a escola necessita de meios materiais para a sua distinção com outras instituições como: uniformes, livros, cadernos e o dinheiro que vêm das matrículas. No grau de ignorância em que se encontram muitos pais vê a escola como um lugar onde as suas filhas 47 possam perder-se rapidamente através das más companhias, porque a escola formal não difere da escola tradicional. Na verdade, quanto mais uma rapariga cresce, com ela crescem também as necessidades pessoais dada a sua constituição biológica e, mais crescente vai se tornando a falta de diálogo, isto é, na educação tradicional, é difícil que uma rapariga peça algo do seu pai (por exemplo, pedir dinheiro para a compra de roupa interior e lanche) e sabe que mamã não tem dinheiro. Como tal, para satisfazer essas necessidades que se tornam cada vez mais prioritárias, ela procura um amigo que a possa socorrer. Aliás, muitas vezes o amigo serve para comprar coisas que os pais não possam notar. Outra razão, relacionada com a desistência prende-se com as vantagens de estudar ou seja a falta de modelo-padrão que motive a rapariga. A luta dos pais, primeiro, para conseguir lugar na escola já superlotada e, segundo para conseguir que ela transite de classe além de ter livros e uniforme e por fim conseguir um trabalho é deveras pesado para as famílias moçambicanas. A outra questão colocada aos pais e encarregados de educação foi procurar saber porque as raparigas desistem a escola. Sobre a questão os pais e encarregados de educação responderam que as raparigas desistem a escola não é porque querem, outras é por falta de dinheiro para compra de comida, material escolar, então ela tem de sair da escola para ajudar os pais arranjar dinheiro e outras desistem porque estão gravidas e na zona “gravida” é doença por isso deve ficar em casa. Pelo número elevado de respostas, leva a interpretar que a falta de dinheiro leva muitos pais e encarregados de educação a retirar as suas filhas da escola. Numa outra abordagem procuramos saber dos pais e encarregados de educação, quais são as consequências que trazem os ritos de iniciação na educação formal da rapariga. Nesta questão responderam que as consequências que trazem os ritos de iniciação na educação formal da rapariga é deixar a escola. Depois de passar pelos ritos de iniciação, a rapariga já é crescida o único caminho que lhe resta é casar. Analisando a questão e as respostas dadas pelos pais e encarregados de educação, tudo isto indica que os ritos de iniciação promovem a sexualidade infantil das raparigas. 48 3.6. Discussão da Hipóteses As Raparigas que estudam Depois de se ter apresentado os questionários tal como foram feitas segue-se, agora, o estabelecimento das relações existentes (semelhanças e diferenças) entre cada quatro elementos que correspondem a cada grupo de raparigas. Assim, dados das respostas dadas são ilustrados no quadro abaixo. Para o efeito, codificamos as fontes de informação em Pdal-1 para significar pergunta dirigida a aluna 1, Pdal-2, pergunta dirigida a aluna 2, Pdal-3, pergunta dirigida a aluna 3, e Pdal-4, pergunta dirigida a aluna 4. Tabela 5: Questionário de alunas a estudar Pergunta 1. Qual é a tua maior dificuldade em continuar com os estudos? Pdal-1 Pobreza Pdal-2 Pressão pais Pdal-3 Falta de apoio moral e material dos pais Pdal-4 Falta de acompanhamento dos encarregados 2. Além dos teus encarregados quem te ajuda na escola Amigos Minha Irma Amigas Outros familiares 2. Com quem vives Pais Tios Pais Irmã 3. Quais são as actividades diárias? Limpeza, cozinhar. Lavar pratos, cozinhar, limpeza, venda de produtos. Lavar pratos, cozinhar, limpeza. Trabalhos domésticos dos Fonte: autora A tabela 5 apresenta o grupo das raparigas que estão a estudar. Na sua generalidade a falta de condições (pobreza) é invocada como razão de fundo. Ao que parece a invocada falta de 49 condições tem origem nos vários factores: a morte dos pais (Pdal-2 e Pdal-4). As raparigas sabem o que precisam para estudar e também sabem que os seus pais ou as pessoas mais próximas não tem condições. Por isso procuram outras alternativas de conseguirem satisfazer certas necessidades recorrendo aos amigos (Pdal-1 e Pdal-3) ou aos familiares de seus encarregados (Pdal-4). Olhando para os trabalhos por elas realizados há revelação de terem uma educação para “dona de casa” o que implica ter um marido. Sobre as razões de desistência escolar da rapariga do ensino formal a pobreza “condições” aparece como o factor da causa. Contudo, há um peso sobre elas porque, por outro lado vão cumprindo com os deveres da casa como limpeza, lavar pratos, dar banho aos pequeninos, enquanto, por outro lado, tem de estudar. Em nossa opinião, os encargos da rapariga na casa onde vive aos quais se conforma é um factor para o seu fraco aproveitamento pedagógico por não ter tempo suficiente de estudar, pois não basta estudar, tem que haver transições. Raparigas que não estudam Identificar as “causas” individuais da desistência escolar da rapariga do ensino formal sem situála dentro do seu contexto é insuficiente e reduz a complexidade da realidade abrangida o que leva à uma interpretação errada. A desistência está em todos os níveis seja Primário, Secundário ou Superior. As raparigas que deixaram de estudar apontam várias razões que as obrigam como gravidez, casamentos prematuros, e pobreza. Nesta teia, quando ela está grávida, por vezes cai no casamento caso o rapaz aceite. Tudo indica que elas, depois de desistirem continuam vivendo na casa dos parentes mais próximos fazendo as habituais actividades domésticas, as mesmas que são feitas por aquelas que estudam. Mas a gravidez aparece porque ela, em troca dos bens dados pelo rapaz ofereceu-se em demasiado. Por isso, a pobreza é a causa da gravidez. 50 A gravidez é o factor destacado para a desistência. O casamento prematuro raramente ocorre, pois ela quando sai da escola grávida vai a casa dos pais ou dos tios. A rapariga se encontra numa situação de tal forma que não sabe a quem obedecer: ao pai que lhe gerou ou ao namorado que lhe dá dinheiro para lanche. Apresentação Geral Ao longo do trabalho aparecem partes que mostra que uma hipótese anteriormente formulada foi rejeitada no terreno. A seguir, apresentam-se as razões que ditaram esta refutação na visão da autora, baseando-se nos dados das entrevistas em análise. A pobreza e o peso da tradição sobre a rapariga, de uma forma directa ou indirecta são aceites como sendo factores que contribuem para a desistência escolar da rapariga. Tais aceitações não respondem ao problema a 100% pois existem outros factores pelo que o problema não pode ser respondido apenas com pedaços de factores. Sobre os preconceitos pode dizer-se que não se separam da Educação Tradicional que, para Golias (1993) visa a tripla integração do indivíduo na sociedade; para Ivala e Bonnet (1999) há que ter em conta os raros exemplos dos que estudam que acabam se perdendo de uma vez por todas para a vida da família; para Mikael Palme (1992), o trabalho, a educação familiar, as cerimónias religiosas, a iniciação e outros rituais que preparam a rapariga para o futuro impedem que esta reconheça a Educação Formal como algo de diferente da Educação Tradicional. Observando o sentimento dos encarregados de educação julgam haver uma injustiça quando o rapaz que engravida à rapariga continua a estudar e esta é expulsa ou mandada ao curso nocturno. Acham que ele também deve ser expulso. Ao dizerem isso, estão a pedir que o rapaz seja pressionado a assumir as responsabilidades. Daqui se diga que o que surge são gravidezes não desejadas e que em última instância pode conduzir ao casamento. Só depois de o rapaz assumir as suas responsabilidades é que estaríamos diante de um casamento prematuro – como resposta à gravidez. Tendo sido feita a análise geral dos dados obtidos eis que aparecem factores novos da desistência escolar da rapariga, que reforçam as hipóteses da autora. 51 No campo surgiu como factor novo ou “nova hipótese” a pobreza cuja análise começa da consideração que se dá a gravidez. As grávidas surgem dentro do quadro da pobreza. As raparigas procuram um amigo às escondidas para lhes dar algum dinheiro para a compra de pequenas coisas e como consequência de brincadeiras por eles praticadas, por vezes contra a vontade das raparigas, surgem grávidas, obstáculo para que elas continuem a estudar. 52 Capitulo IV: Conclusões e sugestões 4.1. Conclusão Duma forma geral, a pesquisa verificou que, de facto, a desistência escolar da rapariga é uma realidade na Província da Zambézia e, em particular no Distrito de Maganja da Costa, na Escola Primária e Completa de Inroga. Apesar de vários esforços empreendidos pelo Governo com vista a retenção da rapariga na escola, este problema continua a prevalecer nas nossas instituições de ensino. As raparigas desistem da escola porque há problemas cuja solução não dependem delas, como por exemplo, a excessiva ocupação em trabalhos domésticos, porque elas não têm, efectivamente, o tempo suficiente para a revisão da matéria escolar, falta de apoio moral, material e financeiro na família e na escola para além da influência de algumas normas sociais, como é o caso dos ritos de iniciação. Os ritos de iniciação, embora revelem um espaço privilegiado para a transmissão de hábitos e costumes implicados na cultura da sociedade nhariga, contribuem negativamente para a desistência escolar da rapariga. Porque durante os ritos de iniciação são ditas que já são crescidas e que a partir daquele momento a tarefa principal é de se dedicar em tarefas domésticas e outras actividades produtivas que as preparam para ser boa esposa e mãe. Estes ritos de iniciação promovem a sexualidade infantil da rapariga, porque ela é estimulada a ideia de que pode usar a sexualidade para melhorar a qualidade da sua vida e através dela pode segurar o homem. Uma outra causa não menos importante são os casamentos realiza-se por razões de ordem económica, social e cultural em Moçambique, especialmente nas comunidades pobres como a do Distrito de Maganja da Costa. Normalmente são as raparigas que se casam cedo para sustentarem as suas famílias de proveniência. Salienta-se, ainda, que dos dados recolhidos na Escola Primária e Completa de Inroga, apontaram que, em 2012, das 685 raparigas que matricularam da 1ª à 7ª classe, 84 alunas deixaram de estudar por vários motivos. 53 O mesmo cenário veio a repetir-se no ano seguinte, isto é, em 2013, foram matriculadas 385 raparigas e desistiram 87. E no ano de 2014, foram inscritos naquela escola 446 raparigas e desistiram 64. E, finalmente em 2015, das 478 raparigas inscritos 54 não chegaram ao fim do ano. Entretanto, a desistência escolar da rapariga na Escola Primária e Completa de Inroga, teve maior número de desistidos no ano de 2013, onde das 385 alunas matriculadas abandonaram 87 raparigas. Este cenário contribui negativamente para o aproveitamento pedagógico daquele estabelecimento de ensino. 54 4.2. Recomendações Tendo em consideração os estudos feitos e as conclusões apuradas propõem-se as seguintes sugestões com vista a minimizar a problemática da desistência escolar da rapariga:  Sugere-se a revisão dos conteúdos ministrados nos ritos de iniciação, eliminando os preconceitos que deixam a rapariga num estado de vulnerabilidade, partindo de que as diferenças entre rapazes e raparigas não implicam superioridade de um e inferioridade da outra, mas uma complementaridade necessária.  Sugere-se que se sensibilização dos pais ou encarregados de educação mesmo em situação de pobreza profunda mantenha as suas filhas na escola, pois estas podem possuir habilidades e capacidades elevadas.  Constatou-se também que os casamentos prematuros fazem com que a rapariga saia da escola. De modo a superar esta situação, sugere-se a Direcção Pedagógica que intensifique as estratégias de informação, desenvolvendo reuniões de turmas, o que permitirá que as raparigas se apercebam e atribuam um valor necessário a sua própria escolarização.  Durante o estudo constatou-se as gravidezes precoces como sendo um outro factor que obriga a rapariga a desistir da escola. Desta forma, sugere-se que a escola contrate orientadores escolares que expliquem as raparigas que as relações sexuais precoces podem trazer graves consequências na vida delas.  A direcçao da escola deve tomar atenção à sociedade para a problemática da desistência escolar da rapariga, através do desenvolvimento duma campanha de sensibilização para o retorno a escola das raparigas que desistiram a escola. 55 Referência bibliográfica BARROS, Aidil de Jesus Paes de; LEHFELD, Neide Aparecida de Souza. Projecto Pesquisa: Propostas Metodológicas. 9ª edição. Petrópolis, Editora vozes, 1999. BASTOS, Ana Paula. 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