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Revista-ato-odontologia-pacientes-necessidades-2005 (1)

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ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 410 ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS – PERCEPÇÕES, SENTIMENTOS E MANIFESTAÇÕES DE ALUNOS E FAMILIARES DE PACIENTES * “DENTISTRY FOR PATIENTS WITH SPECIAL NEEDS - FEELINGS, PERCEPTIONS AND REACTIONS OF STUDENTS AND HANDICAPPED PATIENTS” CLAUDIA MARCELA HERNÁNDEZ CANCINO** FLÁVIO AUGUSTO MARSIAJ OLIVEIRA*** MARIA EMÍLIA ENGERS**** JOÃO BATISTA BLESSMANN WEBER***** MARÍLIA GERHARDT DE OLIVEIRA****** ________________________________________________ * Tese de Doutorado apresentada como parte dos requisitos para a obtenção do título de Doutor em Odontologia, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Faculdade de Odontologia, área de concentração em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. ** Mestre e Doutora pela PUC-RS - Autora da Tese de Doutorado na PUC-RS. *** Orientador do Trabalho e Professor da PUC-RS. **** Co-Orientadora da Pesquisa e Professora da PUC-RS. ***** Consultor da Pesquisa e Professor da PUC-RS ****** Consultora e Coordenadora do Curso e Professora titular da PUC-RS. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 411 RESUMO Esta pesquisa, realizada na Faculdade de Odontologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (FO-PUCRS), tem por objetivo, junto aos alunos do quinto ano do curso de Graduação e aos familiares de pacientes com deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor, conhecer as percepções, os sentimentos e, as manifestações em relação à Odontologia para pessoas com necessidades especiais, contribuindo, assim, para a formação dos futuros cirurgiõesdentistas e o aprimoramento da Odontologia nessa área. Para tanto, o estudo foi concebido dentro do paradigma naturalístico ou qualitativo. Aplicou-se a entrevista semi-estruturada como instrumento para a coleta de dados, avaliando-se as informações obtidas por intermédio da análise de conteúdo proposta por ENGERS (1987). Os resultados evidenciaram a carência de serviços odontológicos para pessoas com necessidades especiais e a falta de conhecimento tanto prático quanto teórico por parte dos futuros profissionais a esse respeito. Salienta-se a necessidade do conhecimento técnico adequado e da valorização do paciente para que, no futuro, o aluno possa assumir sua profissão com responsabilidade e suprir com qualidade e competência as necessidades odontológicas de seus pacientes. ABSTRACT The aim of this study is to learn more about the feelings, perceptions and reactions of patients with special needs concerning dental care. This research took place at “Faculdade de Odontologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul” (FO-PUCRS) and involved students attending the last year of graduation and relatives of handicapped patients. This study also aims at improving and developing knowledge in this area of Dentistry. The interviews for collection of data were done on a semi-estructured basis and the obtained information was evaluated according to the analysis of contents proposed by ENGERS (1987). The results showed that there is a lack of dental care services for patients with special needs as well as a lack of practical and theoretical knowledge as far as future dentist are concerned. It is of utmost importance to take the patients into high consideration and to reach a reasonable and adequate technical level of knowledge so that, in the future, the present students become highly responsible professionals and are able to competently fulfill the needs of their patients. Unitermos: Deficiências do desenvolvimento. Assistência odontológica para pessoas portadoras de necessidades especiais. Relação profissional-paciente. Uniterms: Developmental disabilities. Dental care for disabled. Professional-patient relationship. INTRODUÇÃO As pessoas com necessidades especiais constituem uma população heterogênea que inclui uma grande variedade de deficiências físicas, mentais, neurológicas ou sociais. Devido à sua dependência e à sua vulnerabilidade, estas pessoas apresentam maior suscetibilidade a distúrbios bucais e a outras comorbidades passíveis de comprometer a sua qualidade de vida, necessitando, ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 412 portanto, da assistência temporária ou permanente de vários especialistas na área da saúde e, em alguns casos, de adaptações especiais em seu ambiente escolar e social (SCULLY; KUMAR, 2003; NEEDLMAN, 1997). Embora o tratamento odontológico das pessoas com necessidades especiais não seja diferente daquele das saudáveis, ainda assim elas apresentam problemas bucais de grande importância e, enfrentam inúmeras dificuldades para encontrar os serviços apropriados às suas demandas, destacando-se, entre outras, barreiras arquitetônicas, limitações financeiras, medo, ignorância ou negligência em relação à saúde bucal e, principalmente, carência de profissionais qualificados e interessados em tratar tais pacientes (MOURADIAN; CORBIN, 2003; NUNN; MURRAY, 1988; WALDMAN; PERLMAN, 1997). O reduzido número de profissionais dispostos a atender pacientes com necessidades especiais deve-se, provavelmente, à falta, no curso de Graduação, de bases teóricas suficientes e de experiências clínicas motivadoras que proporcionem conhecimento, destreza, autoconfiança e compreensão da complexidade humana. A qualificação assim concebida resulta em profissionais pouco preparados, portanto desinteressados e indiferentes quanto ao manejo desses pacientes (CRESPI, FERGUSON, 1987). Os profissionais amparados na falta de conhecimento teórico, na carência de habilidades clínicas e, portanto, sentindo-se inseguros e intimidados, assumem atitudes negativas ou não prestam atendimento às pessoas com necessidades especiais. Conseqüentemente, esses pacientes são encaminhados de um profissional para outro e, por fim, não recebem o tratamento de que necessitam, aumentando, com isso, os riscos de comprometer sua saúde bucal e sua qualidade de vida (ALBUM, 1990; NUNN; MURRAY, 1988; SOAR FILHO, 1998; STIEFEL; TRUELOVE; JOLLY, 1987). Embora freqüente este não possa ser o comportamento de um profissional da área da saúde, pois ele precisa estar preparado para detectar dificuldades, resolver problemas, responder às necessidades do paciente, atuar com responsabilidade e utilizar a empatia e a comunicação como instrumentos básicos para a interação paciente-profissional. Para tanto, é fundamental que, enquanto aluno, o futuro profissional receba informações que lhe permitam conhecer a si mesmo, evitar preconceitos e enfrentar dificuldades pessoais (BLINKHORN; KAY, 1999; OSÓRIO; SOAR FILHO, 2003; TÄHKÄ, 1988). A percepção desta realidade e o fato de que, no Brasil, há aproximadamente 24,5 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, justifica a necessidade de revisarem-se os conceitos educacionais com relação à Odontologia para pacientes com necessidades especiais, objetivando a capacitação adequada, o reconhecimento do paciente em sua integridade física, psíquica e social, aliando-se ao conhecimento técnico do acadêmico, a percepção de si mesmo como profissional e do paciente como pessoa. O conhecimento técnico associado à compreensão dos fatores relacionados à pessoa contribui para um melhor exercício profissional. Partindo-se da idéia de que os cirurgiões-dentistas não estão preparados para atender pessoas com necessidades especiais, as quais enfrentam severas dificuldades para encontrar serviços odontológicos apropriados, acredita-se que conhecer os sentimentos, as percepções e as manifestações dos futuros profissionais e dos familiares desses pacientes, em relação ao atendimento odontológico, provavelmente auxiliará aqueles que tomam as decisões concernentes ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 413 ao ensino, a fundamentar as reformas curriculares possíveis com o objetivo de beneficiar a qualificação profissional, a saúde pública e as pessoas envolvidas. Considerando os aspectos aqui mencionados, levantou-se o seguinte questionamento: Quais são as percepções, os sentimentos e as manifestações de alunos da Faculdade de Odontologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (FO-PUCRS) e de familiares de pacientes com deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor do Instituto do Excepcional (Convênio com a FO-PUCRS) em relação à Odontologia para pacientes com necessidades especiais? REFERENCIAL TEÓRICO Para melhor compreensão e facilidade de leitura, é essencial apresentar, na revista de literatura, algumas considerações do âmbito da psicologia a respeito do comportamento humano e da relação paciente-profissional, permitindo, assim, o conhecimento das relações, das condutas e dos sentimentos das pessoas. Este capítulo finaliza com a apresentação de conceitos sobre pessoas com necessidades especiais e, por último, tratam-se as percepções em relação à Odontologia para esse grupo de pacientes. CONSIDERAÇÕES PSICOLÓGICAS SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO Histórico A Psicologia tem por objetivo estudar, intervir e formular teorias para a compreensão da totalidade do comportamento humano (condutas, percepções, sentimentos, emoções, significações, ideais e desejos) (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999; DAVIDOFF, 2001). Historicamente, a Psicologia surgiu como ciência em meados do século XIX, após percorrer um longo caminho na Filosofia e pela aplicação do método científico, antes utilizado na Física e na Biologia. Os assuntos da Psicologia, até então estudados exclusivamente por filósofos, passaram a chamar a atenção de fisiologistas e neurologistas. Esses estudos conduziram à formulação de teorias sobre o sistema nervoso central, associando a este as percepções, os pensamentos e os sentimentos humanos (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999). Em 1879, na tentativa de demonstrar que procedimentos experimentais e modelos matemáticos poderiam explicar os processos da mente humana (fenômenos mentais correspondem a fenômenos orgânicos), WILHELM WUNDT (1832-1920) fundou o primeiro laboratório experimental na Universidade de Leipzig, na Alemanha, tornando a Psicologia uma ciência independente de suas raízes filosóficas (DAVIDOFF, 2001; MORGAN, 1978). Rapidamente, a Psicologia científica foi adotada e difundida na Europa, no Canadá e, principalmente, nos Estados Unidos, onde surgiram três escolas precursoras da Psicologia atual, com teorias diferentes quanto ao que deveria ser essa ciência: o Funcionalismo, de WILLIAM JAMES (1842-1910), o Estruturalismo, de EDWARD TITCHENER (1867-1927) e, o Associacionismo, de EDUARD THORNDIKE (1847-1949). A seguir apresentam-se algumas descrições sobre essas primeiras escolas surgidas nos Estados Unidos, que ofereceram subsídios ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 414 para o estabelecimento das atuais (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999; DAVIDOFF, 2001; SCHULTZ; SCHULTZ, 1992). O Funcionalismo tinha por objetivo o entendimento da mente e seu funcionamento (propósitos do comportamento), enfatizando o uso da consciência e de outros processos mentais na adaptação do organismo ao ambiente, isto é, como a mente registra, fixa, organiza e avalia as experiências e, como é utilizada na orientação da conduta. O Estruturalismo, por sua vez, fundamentava-se na introspecção analítica ou no estudo da experiência consciente. Sujeitos eram cuidadosamente treinados para descreverem, o mais objetivamente possível, experiências perceptivas frente a determinados estímulos sensoriais. TITCHENER (1867-1927) definiu a consciência como a soma de experiências em um dado momento e a mente como o acúmulo total dessas experiências ao longo da vida. O objetivo do estruturalismo era o estudo e a compreensão generalizada da mente humana. O Associacionismo enfatizava o desenvolvimento de associações ou conexões entre estímulos e respostas, incluindo os efeitos do reforço e a punição sobre essas conexões. As teorias sobre a aprendizagem humana concentravam-se em tais associações (situações/respostas) e afirmavam que o comportamento depende de elementos subjetivos, como satisfação, contrariedade e desconforto (EDUARD THORNDIKE, 1847-1949). Mais tarde, essas teorias deram origem a novas escolas, destacando-se o Behaviorismo, a Gestalt e a Psicanálise (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999; DAVIDOFF, 2001; SCHULTZ; SCHULTZ, 1992). JOHN WATSON (1878-1958), fundador do Behaviorismo, também, conhecido como comportamentalismo, baseava sua teoria em três princípios fundamentais: (1) estudar os ambientes (estímulos) e os comportamentos (respostas); (2) aprender pela experiência (emissão de uma resposta e sua conseqüência) e (3) aplicar os objetivos científicos: descrição, explicação, predição e controle. WATSON (1878-1958) preconizava o estudo do comportamento por meio de atos passíveis de descrição objetiva; assim, todo comportamento humano poderia ser descrito, previsto e controlado, se reduzido ao nível de estímulo e resposta. A Psicologia de Gestalt, desenvolvida na Alemanha, determinou que entre o estímulo e a resposta do indivíduo encontra-se a percepção. O comportamento (forma individual de interpretar uma situação) depende da maneira como o estímulo é percebido. Postulou a necessidade de compreender as ações e os processos humanos como uma unidade que é, ao mesmo tempo, dependente das características da personalidade do indivíduo, das emoções e das experiências passadas. O termo Gestalt é um substantivo alemão de difícil tradução, portanto mantida a sua grafia original; o termo mais próximo em português é “forma” ou “configuração” (MAX WERTHEIMER, 1880-1943; WOLFGAND KÖHLER, 1887-1967). A Psicanálise originou-se a partir dos estudos de SIGMUND FREUD (1856-1939), responsável pelo desenvolvimento de um novo procedimento para estudar o comportamento humano, a livre-associação, que consiste em trazer o inconsciente para o consciente para conhecer o funcionamento da vida psíquica. A teoria psicanalítica surgiu da observação sistemática de pacientes e da interpretação dos dados oferecidos pelos mesmos durante as sessões. A psicanálise evoluiu como sistema teórico, buscando a compreensão de toda motivação e personalidade humanas, e não apenas como um método de tratamento. Como sistema teórico, ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 415 caracteriza-se pela interpretação, isto é, busca o significado oculto daquilo que é manifesto por ações, palavras, representações, sonhos, delírios e atos falhos. Enfatizou o entendimento dos impulsos instintivos para compreender o outro, assim como o estudo da aprendizagem social que, muitas vezes, pode reprimir os impulsos instintivos (fazer desaparecer da consciência uma representação insuportável e/ou dolorosa), que irá resultar em frustração e conflitos íntimos. A mente foi dividida em três instâncias com características especificas - o id, o ego e o superego. O id representa as percepções internas (pensamentos, sentimentos), as sensações (prazer-desprazer) e os instintos latentes de sobrevivência e destruição. O ego controla os instintos, representa a razão e o senso comum; procedem do ego as percepções externas (percepções sensoriais: luz, cor, movimento), planejamentos e decisões. O superego por sua vez, encerra a moralidade, as forças restritivas e proibitivas dos instintos básicos, representando as exigências sociais e culturais (FREUD, 1856-1939). Percepção A percepção foi definida como um processo psíquico, ativo e dinâmico, que permite a elaboração, a interpretação e a significação das informações provenientes de estímulos externos (DEMBER; WARM, 1990). Ao perceber, infere-se instantânea e inconscientemente a natureza dos estímulos, produzindo uma resposta ou conduta que depende da experiência anterior de quem percebe, sendo influenciada pela motivação e pela emoção. Segundo os autores, a motivação compreende impulsos fisiológicos primários (fome, sede e dor), impulsos adquiridos ou sociais (necessidade de alcançar metas e prestígio social) e impulsos derivados do medo e da ansiedade (defesa). A motivação permite extrair a informação suficiente para classificar um estímulo como relevante ou irrelevante, gratificante ou ameaçador. A emoção possibilita a valoração positiva ou negativa de uma situação, determina as ações, isto é, participa da percepção de situações vividas e do planejamento das reações ao meio. A emoção caracteriza-se por súbitas rupturas do equilíbrio afetivo, produz reações fisiológicas e psicológicas de curta duração que influenciam na percepção, na aprendizagem e no desempenho, estando ligada aos instintos e à sobrevivência, permitindo a expressão de afetos básicos de amor e ódio (DEMBER; WARM, 1990). JUNG (1991) diferenciou a percepção ativa da passiva. A primeira é vista como um processo pelo qual a pessoa aprende conscientemente por si mesma e por motivação própria um conteúdo e o assimila a outros já disponíveis. A segunda é um processo pelo qual um novo conteúdo impõe-se de fora (pelos sentidos) ou de dentro (a partir do inconsciente) à consciência, forçando a atenção e a apreensão. Para o autor, a sensação é uma percepção consciente e a intuição uma percepção inconsciente. A sensação e a intuição são consideradas funções fundamentais que se compensam mutuamente, como o pensamento e o sentimento. O pensamento, o sentimento, a sensação e a intuição são funções psicológicas fundamentais que existem em todas as pessoas, com o predomínio de uma delas, constituí-se um tipo psicológico determinado. O pensamento permite a compreensão da natureza do mundo e de si mesmo; está ligado a critérios lógicos e objetivos. O sentimento, por seu turno, é um estado afetivo intimamente relacionado com a emoção, contudo mais duradouro e atenuado; valoriza as coisas para cada ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 416 pessoa, no sentido de aceitá-las ou não. O sentimento concede a experiência de prazer ou dor, alegria ou tristeza, raiva, medo ou amor. A sensação transmite os estímulos físicos percebidos do mundo objetivo ou subjetivo, produzindo fatos concretos ou representações. A intuição transmite as percepções por intermédio do inconsciente, em termos de experiência passada, objetivos futuros e processos inconscientes, além dos fatos, sentimentos e idéias. Assim, o pensamento e o sentimento são funções sociais, pois usam a razão e a generalização, enquanto a sensação e a intuição são funções inconscientes, uma vez que se baseiam na percepção do concreto, do particular e do acidental (JUNG, 1991). A percepção resulta da elaboração introspectiva de experiências conscientes relacionadas com sensações, imagens e sentimentos (AURELL, 1994). O modelo perceptual proposto pelo autor distingue entre o estímulo externo, que produz sensações objetivas na consciência sensorial, e a memória, que permite a elaboração de imagens subjetivas na consciência cognitiva. Juntos, pensamento sensorial e cognitivo formam a percepção. Existem três tipos de pensamento, o sensorial, o emocional e o cognitivo que se manifestam na consciência como sensação, sentimento e imagem, respectivamente (AURELL, 1994). Os estímulos externos transformam-se em sensações, as quais, independentemente da vontade, são registradas na memória, constituindo, então, as representações ou imagens. Essas imagens ou representações permitem a interpretação dos objetos: (1) identificação, (2) classificação, (3) categorização e (4) significação. Compreender o próprio mundo pessoal é indispensável para a compreensão do outro. A percepção científica permite analisar as causas e os condicionamentos das condutas, pondo-se no lugar do outro, levando ao realismo, à compreensão, à união, à identidade e à autenticidade. Toda percepção deve se libertar de preconceitos, tabus, afetividades e paixões, para estabelecer um contato profundo de pessoa para pessoa na intimidade e na autenticidade do ser (CHIAPPIN, 1998). O estudo da percepção permite compreender o homem em todas as suas expressões, as visíveis (comportamento), as invisíveis (sentimentos), as singulares (porque somos o que somos) e as genéricas (por que somos assim). A percepção é a síntese singular e individual que cada pessoa vai constituindo conforme seu próprio desenvolvimento. É o mundo das idéias, significados e emoções, construído internamente pelo sujeito a partir de suas relações sociais, de suas vivências e de sua constituição biológica (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999). O processo da percepção vai desde a recepção do estímulo pelos órgãos dos sentidos até a atribuição de significado a esse estímulo (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999). A partir da percepção do outro, organizam-se informações relacionadas com os afetos (positivos ou negativos) e desenvolvem-se ações (favoráveis ou desfavoráveis) em relação às pessoas e aos objetos percebidos. Tais ações são denominadas atitudes ou comportamentos e possibilitam a relação com o ambiente. A percepção de um acontecimento do mundo externo ou do interno pode ser constrangedora, dolorosa ou desorganizadora. Para evitá-las, a pessoa deixa de registrar tais eventos e afasta determinados conteúdos psíquicos, utilizando mecanismos de defesa elaborados de maneira inconsciente e independente da vontade. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 417 Esses mecanismos podem ser explicados como uma forma de proteção do ego contra conteúdos indesejáveis que suprimem ou dissimulam a percepção do perigo interno, em função de perigos reais ou imaginários (FREUD, 1988). Tais mecanismos são utilizados constantemente na vida cotidiana, permitindo a proteção e a defesa. O uso desses mecanismos não é patológico, mas distorce a realidade; somente a sua conscientização permite ver a realidade como ela é. Os principais mecanismos de defesa são o recalque ou a repressão, que é a supressão de uma parte da realidade; o ego impede que desejos, sentimentos e impulsos insuportáveis atinjam a consciência; a formação reativa, isto é, uma atitude inaceitável impedida de se tornar consciente pela adoção de um comportamento oposto; por exemplo, a superproteção (esconde um desejo agressivo intenso) (DALLY; HARRINGTON, 1978; FREUD, 1986). A regressão, que consiste em retornar às etapas anteriores no desenvolvimento; a projeção, que é a atribuição no outro, de sentimentos e desejos próprios; o indivíduo projeta algo de si no mundo externo e não percebe o que foi projetado como algo seu que é indesejável; a racionalização, que é a formulação de um argumento intelectualmente convincente e aceitável que justifica um mecanismo de defesa (DALLY; HARRINGTON, 1978; FREUD, 1986). A percepção é um processo psicológico indispensável ao conhecimento que permite à pessoa receber, assimilar e processar informações da realidade objetiva e subjetiva por meio de imagens mentais que as representam (MIRANDA-SÁ Jr., 2001). Fazem parte da percepção as sensações, as motivações e as qualidades afetivas, volitivas e intelectivas da personalidade, portanto, a capacidade perceptiva depende da integridade do organismo, das circunstâncias e do estado psicológico. A afetividade é uma estrutura psicológica que elabora e manifesta a emoção, agradável ou desagradável, das experiências pessoais relacionadas com a satisfação ou a insatisfação das necessidades. Por sua vez, as necessidades são consideradas a tendência natural que estimula a pessoa a praticar um ato ou a buscar uma determinada categoria de objetos, podendo ser naturais e sociais, diferenciadas, respectivamente, da seguinte maneira: concretas (necessidade de abrigo, utensílios, ferramentas) e abstratas (afirmação, amor, dignidade, justiça e estética) (MIRANDA-SÁ JR., 2001). A teoria psicofisiológica, considera a percepção como o resultado do processamento central de informações externas (HICK, 1999). Os objetos percebidos pelos órgãos dos sentidos produzem dados que são processados por estruturas neuronais. As informações resultantes vinculam-se à consciência, interpretando assim, a realidade. A imagem perceptiva, também conhecida como representação, é o reflexo na consciência da síntese das características de um objeto real. O mundo dos objetos percebidos não é único nem verdadeiro para todas as pessoas, é diferente para cada uma e, depende da experiência anterior, das necessidades, das emoções e dos sentimentos (HICK, 1999). Essa realidade perceptual permite a comunicação entre as pessoas e o entendimento mútuo ou proporciona espaços para diferenças. O autor ressaltou que diferentes realidades constituem diferentes formas de percepção e de escolha, não são intelectualmente rígidas, tendem ao enriquecimento mútuo e dispõem-se à comunicação. Ao concluir, assegura que a experiência e o conhecimento estão estruturados na percepção, sendo, abertos a modificações e distantes da objetividade absoluta. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 418 Relação Paciente-Aluno-Profissional A relação paciente-profissional foi descrita como uma interação entre duas pessoas,sendo que uma delas, enfrentando situações de sofrimento e perda e, a outra, supõe-se, qualificada e disposta a detectar esses problemas e outros, encobertos por mecanismos de defesa (LERNER; PEIXOTO; Von EYE, 1983). Para os autores, no primeiro encontro do profissional com o paciente tem início o vínculo terapêutico, ocasião em que se espera que o paciente encontre no profissional uma pessoa receptiva, disposta a escutá-lo e a ajudá-lo a buscar a solução aos seus problemas. Para que exista essa receptividade, é preciso que o profissional mostre solidariedade com o problema do paciente. Embora esta atitude nem sempre seja inerente ao profissional, é indispensável que se conscientize de tal situação e treine essa atitude. Se não entender adequadamente o paciente e não perceber, em si mesmo, sentimentos negativos ou mecanismos de defesa, automaticamente a terapêutica não surtirá o efeito esperado. Portanto, para que o vínculo seja efetivo, é fundamental que o profissional, além de identificar e tratar os problemas físicos saiba escutar, respeitar, compreender, perceber e interpretar a linguagem não-verbal do paciente (sentimentos, gestos e comportamentos), e dessa maneira, elucidar o verdadeiro significado do que lhe é transmitido. No contexto da relação paciente-profissional, indicou-se que a palavra “profissional” abranja os integrantes de várias equipes de saúde que estabelecem uma ação de reciprocidade com o paciente, o qual, por sua vez, é co-construtor do encontro terapêutico (SOAR Fi, 1998). Esse encontro ressaltou o autor não é apenas um processo isolado entre duas pessoas, mas uma interação entre profissional da saúde, paciente, família e instituição. Nessa relação, o profissional deve progressivamente, compreender o significado que a doença adquire tanto para o paciente quanto para sua família, visando estabelecer uma relação de confiança e cooperação entre as partes que permita a superação das vicissitudes do tratamento com base na motivação e na disposição consciente. Tal interação, mediada por reações emocionais, pressupõe o estabelecimento de limites e determina as funções a serem exercidas pelos membros da relação. Entre as reações emocionais que influem na interação entre o paciente e o profissional, foram destacadas a regressão e manifestou que, diante da doença, do desconhecido, de situações estressantes, de tensão emocional e, principalmente, frente à dor e às deficiências, é normal que as pessoas reajam com algum grau de regressão, isto é, retornem a modos de sentir, de pensar e de agir próprios às fases infantis do desenvolvimento (SOAR Fi, 1998). Nesse sentido, a pessoa doente e seus familiares têm necessidade de quietude e apoio. Entretanto, por falta de preparo ou de amadurecimento pessoal, é freqüente que o profissional assuma uma atitude repreensiva e autoritária, por meio da qual busca, por sua vez, lidar com seus próprios sentimentos de ansiedade frente ao sofrimento e aos riscos de fracasso. Para esse autor, nos processos de adoecimento e de tratamento não há padrões rígidos de conduta, apenas a possibilidade de que o profissional mantenha-se disposto e treine um conjunto de atitudes que possam contribuir para o estabelecimento de uma boa interação entre as partes. A relação paciente-profissional é um instrumento terapêutico utilizado para fazer com que o primeiro coopere tanto quanto possível com o tratamento (TÄHKÄ, 1988). A capacidade de utilizar o potencial terapêutico desse relacionamento como parte do tratamento foi considerada por muito tempo um dom ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 419 especial; hoje, essa habilidade é amplamente analisada e entendida como um requisito que conduz à eficácia da terapia. Portanto, recomendou o autor, o aluno deverá aprender, desde a Graduação, a se conhecer para evitar, até onde for possível, que seus preconceitos perturbem essa relação; procurará saber abordar os assuntos para conseguir informações suficientes em tempo razoável e precisará do conhecimento e da motivação suficientes para criar um relacionamento pacienteprofissional favorável com crianças, idosos, pacientes crônicos, terminais ou problemáticos. Em relação às qualidades indispensáveis ou desejáveis para o bom exercício da profissão, foram destacadas (TÄHKÄ, 1988): (1) adquirir e manter atualizados tanto os conhecimentos quanto as habilidades técnicas; (2) priorizar o conforto do paciente relacionando-se com ele com empatia e respeito; (3) desenvolver a capacidade de escutar e observar tudo o que concerne ao paciente; (4) perceber e aceitar as próprias limitações como profissional da saúde e como pessoa e (5) evitar que os conflitos pessoais sejam utilizados para fortalecer a própria autoestima ou satisfazer necessidades alheias à profissão. Foram propostos quatro modelos para a interação pacienteprofissional (VEATCH, 1972). No modelo sacerdotal, o profissional assume uma postura paternalista, a tomada de decisão é baseada em uma relação de dominação e submissão. No modelo engenheiral, o profissional proporciona todas as informações ao paciente, transferindo-lhe todo o poder de decisão. Caracteriza-se por uma atitude de acomodação do profissional e de dominação do paciente. No modelo colegial, o poder é compartilhado igualitariamente entre o paciente e o profissional. No modelo contratualista, o profissional é responsável pela tomada de decisões, mas o paciente participa desse processo, exercendo seu poder, conforme seus valores e preferências. Levando em conta os valores e a autonomia do paciente, foram descritos quatro modelos da relação paciente-profissional (EMANUEL; EMANUEL, 1992). No modelo paternalista, o paciente recebe a melhor terapêutica para o seu bem-estar e a sua saúde. Considera-se que a autonomia do paciente consiste em dar seu consentimento para as determinações do profissional. No modelo informativo, o profissional fornece ao paciente todas as informações relevantes em relação à doença, à terapêutica, aos riscos e benefícios, para que possa selecionar, conforme seus valores, a intervenção a ser executada. Entende-se por autonomia do paciente o controle que exerce na tomada de decisões. No modelo interpretativo, o profissional atua como um consultor, esclarecendo e interpretando as informações, bem como instituindo a intervenção médica escolhida pelo paciente. No modelo deliberativo, o profissional atua como um professor ou um amigo, respeitando os valores do paciente, sugerindo e discutindo com ele todos os assuntos relacionados com a terapia. A autonomia do paciente consiste na evolução moral por intermédio do diálogo. Apesar de indicar este último modelo como ideal, os autores consideraram justificável a utilização dos outros modelos em determinadas circunstâncias clínicas. As percepções e os sentimentos dos pacientes, mostram aos profissionais aspectos da assistência que devem ser revistos e corrigidos (DELBANCO, 1992). Em seu trabalho descreveu algumas estratégias que, segundo os pacientes, se instituídas desde a primeira avaliação, podem contribuir para o fortalecimento da interação paciente-profissional e, conseqüentemente, melhorar a qualidade do cuidado. São elas: (1) respeito pelos valores, preferências e necessidades do paciente; (2) comunicação e educação; (3) cuidado multidisciplinar; ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 420 (4) conforto físico; (5) suporte emocional e alívio do medo e da ansiedade; (6) envolvimento da família e (7) continuidade do vínculo preestabelecido. Para o estabelecimento dessas estratégias é conveniente que, desde os primeiros anos de formação, o aluno aprenda a fazer perguntas, a convidar os pacientes para o diálogo, a ensinar o paciente e a estabelecer uma interação construtiva com ele. Dessa maneira, concluiu o autor, o profissional aproxima-se do paciente, fortalece sua imagem, melhora a qualidade do cuidado e adiciona satisfação à sua atuação profissional. Muito embora os profissionais da saúde trabalhem diariamente com as dimensões da pessoa, tais como sentimentos, crenças, valores, aspirações e objetivos, a compreensão que têm de si mesmos e dos outros é, em geral, inconsciente e intuitiva (REMEN, 1992),. Com relação aos aspectos psicológicos dos profissionais, o autor destacou que os mesmos também experimentam dúvida quanto à própria competência e questionam-se quanto à sua segurança. Qualquer ameaça a essa segurança tende a provocar irritação e frustração, emoções que são geralmente negadas ou minimizadas, dificultando suas resoluções e inibindo seu crescimento como pessoa e como profissional. O respeito, a sinceridade e a empatia são considerados qualidades essenciais para o exercício profissional (ROBERTO et al., 1996). A empatia é entendida como a capacidade de escutar e compreender o paciente, facilitando a expressão das sensações e de seus sentimentos. O comportamento empático do profissional tem relação direta com a plena satisfação do paciente, satisfação essa que o influencia a ter uma atitude saudável. Determinar as características ideais de um bom cirurgião-dentista e saber como ele concebe a relação paciente-profissional foi o objetivo do estudo em questão (KULICH; RYDÉN; BENGTSSON, 1998), quando entrevistaram 64 cirurgiões-dentistas suecos com idade entre 30 e 70 anos e exercício profissional, variando de dois e 44 anos. Em relação às características do profissional, o questionário incluía as seguintes categorias e subcategorias, respectivamente: (1) relações pessoais (atitudes frente aos pacientes e aos colegas; empatia; capacidade de comunicação); (2) habilidades clínicas (capacidade de diagnosticar; aliar a melhor terapêutica aos recursos do paciente; conhecimento teórico; experiência; destreza; precisão e rapidez) e (3) outras habilidades (confiança em si próprio; capacidade de tolerar altos níveis de estresse; conhecimento administrativo). As respostas obtidas dos questionários foram classificadas em uma escala de três pontos, sendo: (1) muito importante; (2) relativamente importante e (3) pouco importante. Em seguida, os pesquisadores quantificaram e analisaram os dados estatisticamente. Conforme os resultados, os profissionais consideraram a empatia, a autoconfiança, as habilidades clínicas e a capacidade de comunicação como características desejáveis e muito importantes, enquanto as demais categorias foram classificadas pelos entrevistados como relativamente importantes. Na mesma pesquisa, foi identificada a autoconfiança e a tolerância como características essenciais para exercer a profissão, e salientaram que o sucesso do tratamento depende da satisfação do paciente, sob os pontos de vista médico, psicológico e financeiro (KULICH; RYDÉN; BENGTSSON, 1998). Contudo, referiram que tais resultados não conseguiram revelar as manifestações próprias dos entrevistados quanto às características ideais de um bom cirurgião-dentista. Os autores ressaltaram a importância de fortalecer essas características no aluno, visto ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 421 que atualmente tem aumentado o interesse de alguns profissionais em atender pacientes que requerem maior atenção e cuidado. Em relação ao tratamento odontológico, foi indicado que vem a possibilitar o estabelecimento de uma relação de dependência entre o paciente e o profissional, determinada pelo desempenho deste último (MORAES; ONGARO, 1998). Ver o paciente exclusivamente como um problema de saúde bucal ou como um conjunto de dentes intensificará a ansiedade do paciente e sua não-adesão ao tratamento. Assim, apontaram como principal característica do relacionamento profissional a valorização do paciente no desenvolvimento do tratamento, que tem por objetivo o bem-estar das pessoas, não se resumindo tão-só a um procedimento técnico. Em todo momento surgem conflitos originários de uma atitude não bem compreendida ou, até mesmo, inesperada. Portanto, o profissional da saúde deve saber lidar com pessoas e estar preparado para decodificar, decifrar e perceber o significado da mensagem que o paciente envia e, depois, estabelecer um plano de tratamento adequado e coerente com as necessidades daquele indivíduo (SILVA, 1998). O autor observou que a maior parte das questões realmente importantes e íntimas das pessoas não é verbalizada, devendo, pois, o profissional perceber e saber interpretar o comportamento daquele que está sob seus cuidados. Todo processo diagnóstico ou terapêutico, depende da confiança, da colaboração, do reconhecimento do sofrimento do paciente e da responsabilidade pela promoção da sua saúde, considerando-o não apenas sob o ponto de vista biológico, mas em sua integridade física, psíquica e social (CAPRARA; FRANCO, 1999). Além do suporte técnico e do diagnóstico, é necessário conhecer a realidade do paciente e ouvir-lhe as queixas, estabelecendo com ele uma relação empática e participativa. A comunicação é um dos aspectos mais relevantes na relação paciente-profissional e, é pela comunicação, que o profissional encoraja as pessoas a manifestarem seus problemas, obtém informações relevantes e, ao mesmo tempo, o paciente sente-se confiante em relação ao cuidado que lhe está sendo dispensado (BLINKHORN; KAY, 1999). Para o êxito na comunicação, os autores apontaram como indispensável desenvolver a capacidade de escuta ativa, isto é, verificar o entendimento entre as partes, identificar as idéias do outro, pensar no que está sendo dito e, no que isso significa controlar as emoções e nunca interromper o interlocutor ou mostrar-se pretensioso. Para uma adequada relação paciente-profissional, convém que o aluno conheça a Ética do cuidado que se fundamenta não apenas em promover o pensamento e o comportamento éticos, mas em desenvolver sensibilidade moral (capacidade de reconhecer um problema ético), motivação moral (determinar prioridades), e caráter moral (coragem, persistência e destreza). Segundo Branch (2000), a Ética do cuidado compreende e exigem características essenciais ao comportamento profissional, como atenção, honestidade, paciência, respeito, lealdade e sensibilidade. Desta maneira, a Ética do cuidado permite ao aluno conhecer-se a si mesmo, assim mesmo, direciona suas ações, facilitando a aplicação de outros princípios, tais como a beneficência, a autonomia e a justiça no cuidado do paciente. Para favorecer a relação paciente-profissional e, conseqüentemente, o exercício da profissão, é importante que os anos de formação acadêmica proporcionem ao aluno a possibilidade de prosseguir em seu amadurecimento ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 422 pessoal, fomentando tanto o desenvolvimento cognitivo (leitura e pensamento crítico) quanto à capacidade de defrontar-se com incertezas, resolver problemas e avaliar evidências. Deve incentivar o desenvolvimento de mecanismos de ajuda para que o estudante possa enfrentar as dificuldades pessoais, bem como propiciar a existência de bons modelos de identificação profissional (professores) que o auxiliem a aperfeiçoar as qualidades necessárias à identidade profissional (OSÓRIO; SOAR FILHO, 2003). As qualidades que devem ser inculcadas no aluno incluem aspectos profissionais e da personalidade, imprescindíveis ao desenvolvimento de atitudes desejáveis para o desempenho da atividade profissional: (1) empatia: capacidade de compreender o outro, seu sofrimento, suas angústias, sem se confundir com ele; (2) continência: capacidade de tolerar, dentro de si, todos os pensamentos e sentimentos que o paciente possa expressar durante o atendimento (choro, raiva, dúvidas, fantasias, etc.), sem retaliações; identificar a origem desses sentimentos e ajudar o paciente a elaborá-los; (3) escuta e curiosidade: questionamento permanente dos próprios valores e crenças, bem como das próprias hipóteses diagnósticas; a escuta demonstra o interesse do profissional para com o paciente; (4) humildade: reconhecer as limitações humanas e profissionais, bem como respeitar as diferenças, verdades e crenças dos outros e (5) comunicação: estabelecer nexos comunicativos verbais com o paciente, perceber e compreender a comunicação corporal do mesmo, interagindo com ele, nesse nível (OSÓRIO; SOAR FILHO, 2003). A relação paciente-profissional é única e singular, depende de fatores individuais, como o perfil emocional tanto de um quanto de outro, do vínculo estabelecido entre ambos, do tipo e do grau da patologia do paciente, dos aspectos socioeconômicos e culturais, entre outros. Portanto, é importante promover, durante a Graduação, o conhecimento desses fatores e a reflexão sobre a atuação do profissional de saúde, desenvolvendo empatia, continência, comunicação, respeito e consideração, sensibilidade, amor à verdade e solidariedade (ZIMERMAN, 2003). Pessoas com necessidades especiais Definições Com o objetivo de estabelecer critérios que visem à descrição de estados funcionais associados à saúde, e permitam sua utilização, em todos os níveis do conhecimento, a Organização Mundial da Saúde (OMS) desenvolveu, em 2001, a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) e definiu os conceitos de deficiência, incapacidade e limitação como seguem: a) deficiência: qualquer perda ou anormalidade, transitória ou definitiva, da função e da estrutura corporal, incluindo a ocorrência de uma anomalia, defeito ou perda de um órgão, de um tecido ou de qualquer estrutura corporal, inclusive das funções mentais; b) incapacidade: toda restrição ou perda (causada por uma deficiência) da habilidade para realizar uma atividade considerada normal para uma pessoa, entendendo a incapacidade como uma dificuldade no desempenho pessoal; c) limitação é a conseqüência de uma deficiência que impede a participação em atividades sociais e/ou culturais, bem como em atividades próprias da faixa etária ou do gênero. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 423 A OMS também definiu os termos: funções corporais, como funções fisiológicas dos sistemas corporais, inclusive psicológicas; estruturas corporais referem-se às partes anatômicas - órgãos, extremidades e seus componentes -; atividade, como a execução de uma tarefa ou ação; participação, diz respeito ao envolvimento em situações da vida diária. Determinou que a palavra “deficiência” deve ser considerada apenas como uma expressão de um estado de saúde, pois não necessariamente indica que a doença esteja presente ou que o portador deva ser considerado doente (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2001). No mesmo ano, a instituição admitiu o uso dos termos incapacidade, deficiência, pessoas com incapacidade ou pessoas com deficiências para se referir àquelas que enfrentam alguma limitação ou restrição funcional permanente ou definitiva, ressaltando, ainda, que essa denominação não pretende rotular, mas descrever as características de saúde dessas pessoas e a relação das mesmas com o ambiente. Foi destacado que a incapacidade existe independentemente dos termos utilizados para defini-la, não se constituindo, pois, um problema, sua denominação, mas as atitudes das demais pessoas e da sociedade em relação à deficiência. O Decreto 3.298, de 20 de dezembro de 1999, que dispõe sobre a política nacional para a integração da pessoa portadora de deficiência, no artigo 4.º I do capítulo I; determina que, uma pessoa é portadora de deficiência, quando se enquadra nas seguintes categorias (BRASIL, 1999): - deficiência física: alteração completa ou parcial de uma ou mais partes do corpo, comprometendo a função física, excluindo desta categoria as deformidades estéticas e as que não produzem dificuldades para o desempenho de funções; - deficiência auditiva: perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras; - deficiência visual: perda parcial ou total da acuidade visual; - deficiência mental: funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos 18 anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: comunicação, cuidado pessoal, habilidades sociais; - deficiência múltipla: associação de duas ou mais deficiências. A deficiência pode ser conceituada como uma limitação funcional causada por distúrbios físicos, mentais ou sensoriais, que além de afetar a vida das pessoas, pode resultar em co-morbidades e morte (WALDMAN; PERLMAN, 1997). Definiram ainda a incapacidade como a perda ou a privação de oportunidades para fazer parte da vida normal de uma sociedade em condições de igualdade devido a barreiras físicas e sociais. Os pacientes com necessidades especiais são pessoas com deficiências físicas, mentais, neurológicas ou sociais, de caráter transitório ou permanente (SCULLY; KUMAR, 2003). Em decorrência dessas condições, os pacientes apresentam maior suscetibilidade a distúrbios odontológicos passíveis de provocar alterações sistêmicas e, conseqüentemente, comprometer ainda mais a sua qualidade de vida. As crianças com necessidades especiais constituem uma população heterogênea que inclui uma grande variedade de deficiências do desenvolvimento e doenças crônicas que podem se apresentar isoladas ou simultaneamente. Enquanto a maioria das crianças recebe a maior parte da assistência médica de um único provedor e é educada em ambientes escolares regulares que não exigem ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 424 modificações, aquelas com necessidades especiais requerem cuidados de vários especialistas de assistência médica que interagem com outros profissionais (terapeutas, nutricionistas, psicólogos, etc.) e precisam de adaptações especiais em seu ambiente escolar e social. Portanto, a detecção precoce de doenças crônicas e das conseqüências funcionais de incapacidades específicas, bem como a prevenção de deficiências psicossociais secundárias são fundamentais para a assistência das crianças portadoras de necessidades especiais (NEEDLMAN, 1997). Os pacientes com necessidades especiais, portadores de deficiências ou pacientes de alto risco são aqueles que, devido a condições crônicas, distúrbios comportamentais, emocionais ou do desenvolvimento, requerem maior assistência do que a população em geral (McPHERSON et al., 1998). Explicaram o risco como biológico e ambiental. O primeiro relacionado com a presença de patologias ou deficiências fisiológicas que podem aumentar a probabilidade de desenvolver uma condição crônica no futuro, e o segundo, concernente a aspectos sociais e econômicos (pobreza absoluta, falta de assistência social, crianças abusadas e negligenciadas), os quais, igualmente, aumentam a probabilidade de desenvolver distúrbios físicos, comportamentais, emocionais e do desenvolvimento. Os autores reconheceram esta definição ampla, mas também inclusiva, pois demonstra a complexa relação existente entre doença, deficiência e ambiente. Na opinião deles, entender essa complexidade exige a identificação das populações de risco e a tomada de medidas que minimizem tais riscos. Classificações Os portadores de necessidades especiais de acordo com as áreas comprometidas pela patologia, podem ser classificados em (MUGAYAR, 2000): a. desvios da inteligência: retardo mental; b. defeitos físicos: - sistema nervoso central: paralisia cerebral; acidente vascular cerebral; doença de Parkinson; - sistema neuromuscular: distrofia muscular progressiva; miastenia grave; - sistema musculoesquelético: artrite; escoliose; osteogênese imperfeita; - malformações congênitas: mielomeningocele ou espinha bífida; c. defeitos congênitos: distúrbios decorrentes de anormalidades cromossômicas; mutações genéticas; d. desvios comportamentais: disfunção cerebral; medo; ansiedade; birra; timidez; agressividade; autismo; e. desvios psíquicos: neuroses; psicoses; esquizofrenia; f. deficiências sensoriais e de audiocomunicação: visuais e da audiocomunicação; g. doenças sistêmicas crônicas: hemopatias; cardiopatias; nefropatias; pneumopatias; transtornos convulsivos; neoplasias; AIDS; h. doenças endócrino-metabólicas: distúrbios no funcionamento das glândulas hipófise; tireóide; paratireóide; supra-renal; hipofunção do pâncreas (diabetes mellitus); i. desvios sociais: favelados; alcoólatras; toxicômanos; asilados; j. estados fisiológicos especiais: gestantes e pacientes geriátricos. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 425 Os pacientes com necessidades especiais de acordo com a origem da limitação, suas características e necessidades podem ser classificados (WEBER; OLIVEIRA; HELLWIG, 2004): a. distúrbios comportamentais: - conduta: birra, agressividade; - distúrbios psiquiátricos: neuroses; psicoses; dependência química; b. deficiências físicas: - traumáticas: paraplegia, politrauma, pacientes queimados, maltratados; - sensoriais: visuais, auditivas, fonéticas; - congênitas: uso de talidomida; rubéola; - deficiências causadas por síndromes e distúrbios genéticos; - síndrome de Down; síndrome de Turner; disostose cleidocraniana; c. deficiências sistêmicas: endócrinas e metabólicas: diabetes mellitus; hipo/hiperparatiroidismo; - cardiocirculatórias: arritmias, endocardite bacteriana, infarto agudo do miocárdio, distúrbios da condução; - renais: síndrome neufrótica, insuficiência renal crônica, glomerulonefrite; - musculoesqueléticas: distrofia muscular; raquitismo; - neurológicas: paralisia cerebral; epilepsia; acidente vascular cerebral; - neoplásicas: linfomas; carcinomas; sarcomas; - imunológicas: deficiências imunológicas: AIDS; - dermatológicas: herpes; psoríase; - gastrintestinais: esofagite; refluxo; - reumatológicas: artrite reumatóide; lúpus eritematoso; - infectocontagiosas: varicela, sarampo; sífilis; tuberculose; d. deficiências poligênicas: fissura labial e palatina; e. outras, incluindo senilidade, gravidez e rádio/quimioterapia. Deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor As condições cognitivas, emocionais ou fisicamente incapacitantes que aparecem na primeira ou na segunda infância e, estão diretamente relacionadas com o desenvolvimento, a maturação, a função sensorial ou motora anormal e que resultam em atrasos no desenvolvimento normal da infância são conhecidas como deficiências do desenvolvimento (MOURADIAN; CORBIN, 2003). As condições crônicas presentes no nascimento que se manifestam antes dos 18 anos de idade, limitando tanto a saúde física e mental quanto a capacidade de aprender, de comunicar-se e de se cuidar, são denominadas deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor. A maioria das pessoas portadoras dessas deficiências precisa de cuidado e suporte assistencial durante toda a vida (CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2004). Fazem parte das deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor o retardo mental, a paralisia cerebral, o autismo e outros distúrbios neurológicos, entre ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 426 eles distúrbios da percepção visual, auditiva e da comunicação, condições que se manifestam antes dos 18 anos de idade e persistem indefinidamente, constituindo uma limitação substancial no desempenho (CRESPI; FERGUSON, 1987). Dentre as deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor, foram destacados o retardo mental, a paralisia cerebral e o autismo, a seguir descritos (CAMP; KOZLESKI, 1997; DALTON; FORMAN, 1997; FENICHEL, 1995; SHONKOFF, 1997). O retardo mental caracteriza-se por limitações no desempenho que comprometem significativamente a inteligência e o comportamento adaptativo, conferindo uma condição social que resulta ainda mais incapacitante que o próprio retardo mental. A origem neurobiológica do retardo mental encontra-se em fatores tais como malformações estruturais do cérebro (anomalias genéticas), anormalidades metabólicas e deficiências do sistema nervoso central associadas a infecções (citomegalovírus, toxoplasmose, vírus de imunodeficiência humana), desnutrição, distúrbios cromossômicos (trissomias) ou lesão hipoxicoisquêmica. A psicopatologia dos pais, a pobreza e a desorganização familiar extrema, a disfunção do relacionamento criança-responsável e o abuso de substâncias psicotrópicas pelos pais também têm sido identificados como fatores contributivos à patogenia do retardo mental, que afeta aproximadamente 6% da população. Nos indivíduos afetados, o desempenho intelectual apresenta-se significativamente abaixo da média (quociente de inteligência - QI < 70), podendo ser leve, moderado e profundo. Crianças com retardo mental profundo podem apresentar comprometimento acentuado de suas habilidades psicomotoras. No retardo moderado, o desenvolvimento motor pode ser normal, mas é possível o comprometimento da fala. Já quando o retardo for leve, pode não ser percebido antes da admissão escolar. O diagnóstico exige confirmação da função intelectual abaixo da média e deficiências em duas ou mais áreas de habilidade adaptativa: comunicação, autocuidado, vida social, saúde e segurança, desempenho acadêmico, lazer e trabalho. O tratamento é multidisciplinar e individualizado. Os pais da criança devem ser informados sobre o que se conhece da natureza e as possíveis causas da incapacidade; o profissional deve identificar áreas de relativa competência e comportamentos adaptativos, fornecer apoio emocional e trabalhar juntamente com a família na formulação de estratégias para tratamento adicional e prevenção de distúrbios associados, sejam leves ou severos, como convulsões, deficiência neurossensorial progressiva e distúrbios nutricionais, entre outros. Embora a maioria dos mecanismos patogênicos do retardo mental seja desconhecida, certos distúrbios podem ser detectados por meio de estudos diagnósticos pré-natais, ultra-sonografia ou amniocentese, permitindo, assim, a tomada de decisões sobre as opções de intervenção pré-natal. Entretanto, o principal esforço para evitar o retardo mental deve ser direcionado à promoção do desenvolvimento cerebral sadio, proporcionando um ambiente favorável ao crescimento. Paralisia cerebral é o termo clínico utilizado para descrever qualquer condição crônica caracterizada por alterações no funcionamento motor e na postura, secundárias a lesões não-progressivas no cérebro em desenvolvimento; pode estar associada a retardo mental e a distúrbios sensoriais e da fala (DARWIS; MESSER, 2001). De acordo com a deficiência motora predominante, a paralisia cerebral pode ser: ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 427 a. espástica: caracteriza-se por restrição nos movimentos devido à hipertonicidade muscular; b. hipotônica ou atávica: representa qualquer distúrbio na coordenação da marcha, podendo ser pura ou associada com espasticidade; c. atetóide: caracterizada por movimentos lentos e involuntários dos membros, podendo ocorrer isoladamente ou associada à coréia (movimentos rápidos, repetitivos e migratórios). Segundo a distribuição, pode ocorrer: a. tetraplegia: paralisia nos membros superiores e inferiores, associada a profundo retardo mental; b. diplegia: maior comprometimento nos membros inferiores do que nos superiores; c. hemiplegia: um lado, direito ou esquerdo, envolvido; d. paraplegia: somente os membros inferiores comprometidos; e. triplegia: três membros afetados. A etiologia da paralisia cerebral é multifatorial, destacando-se, entre as possíveis causas: hipoxia intra-uterina, sangramento intra-uterino, infecções, malformações congênitas, complicações obstétricas, infecções neonatais, hipoglicemia neonatal, trauma e algumas síndromes genéticas. O desempenho intelectual entre os afetados pela paralisia cerebral pode ser normal. Estimulando o desenvolvimento emocional, pessoal e social é possível que essas pessoas consigam ser independentes. Autismo é um distúrbio do desenvolvimento associado a anomalias na função e na estrutura cerebral que se desenvolve antes dos 30 meses de idade, caracterizado pelo comprometimento da comunicação verbal e não-verbal, da atividade imaginativa e das interações sociais recíprocas. Movimentos corporais estereotipados, acentuada necessidade de uniformidade, interesses específicos e preocupação com partes do corpo e acessos de fúria, quando há quebras de rotina, também são freqüentes. A criança que desenvolve este distúrbio psicológico é retraída, apresenta um comportamento ritualístico, refletindo a necessidade de manter constantemente um ambiente previsível. O contato ocular é mínimo ou ausente. Devido aos distúrbios de linguagem e socialização é difícil obter uma estimativa precisa do potencial intelectual dos autistas (KLEIN; NOWAK, 1998). Apesar de não estar totalmente esclarecida a etiologia do autismo, entre as causas foi sugerido que disfunções no sistema nervoso central e anormalidades cromossômicas aumentam a incidência de autismo em populações afetadas por problemas perinatais; também foi associado à lesão cerebral e a fatores psicogênicos. Em relação ao tratamento, diferentes abordagens terapêuticas têm sido empregadas com resultados limitados, destacando-se entre elas, a terapia comportamental (reforço positivo), visando controlar o comportamento destrutivo, a auto-agressão e o retraimento social. Os afetados, principalmente aqueles capazes de falar, podem ter comportamentos limítrofes e serem auto-suficientes, porém isolados da comunidade. O melhor prognóstico está associado à maior inteligência. Os sintomas freqüentemente se modificam com a idade; as convulsões e o comportamento autodestrutivo tornam-se mais freqüentes com o tempo (SURABIAN, 2001). Os resultados do Censo Demográfico de 2000 indicaram que, no Brasil, aproximadamente 24,5 milhões de pessoas (14,5% do total da população) apresentam algum tipo de deficiência. Nesses resultados são considerados ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 428 portadores de deficiência, as pessoas que têm alguma dificuldade permanente para ouvir, ver ou locomover-se ou com alguma deficiência física ou mental, assim sendo distribuídos: deficiência visual, 48,1%; deficiência motora, 22,9%; deficiência auditiva, 16,7%; deficiência mental, 8,3% e deficiência física, 4,1% (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2000). O investimento em suporte à saúde dessas pessoas é muito alto. De acordo com o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) (2004), somente em 2003 os Estados Unidos investiram US$ 11,2 bilhões, exclusivamente no suporte à saúde de pessoas com paralisia cerebral, o que justifica a necessidade de se instituirem medidas preventivas que diminuam o desenvolvimento das deficiências e dos distúrbios secundários ou as co-morbidades. Abordagem para o tratamento odontológico A maioria dos pacientes com necessidades especiais tem condições de receber atendimento em ambiente ambulatorial, sendo necessários conhecimentos científicos e técnicos suficientes para o manejo dos problemas que afetam esses pacientes (TOLEDO; BEZERRA, 1989). Na primeira visita, além da anamnese cuidadosa, é importante estabelecer uma relação de confiança entre as partes, conhecer a história médica, identificar o tipo de deficiência, observar o comportamento do paciente, da família e o relacionamento entre ambos. No final da primeira visita os familiares devem ser informados a respeito do estado da saúde do paciente e da conduta a ser instituída, ressaltando-se que a cooperação familiar e dos demais profissionais que cuidam do paciente é indispensável para o sucesso do tratamento odontológico. Os pacientes com necessidades especiais podem ser atendidos sob os mesmos padrões estabelecidos para o tratamento odontológico dos demais pacientes. No entanto, fatores individuais, tais como a capacidade de cooperação e de aprendizagem, o comprometimento sistêmico e as necessidades odontológicas devem ser levados em consideração. Apesar das limitações físicas, sensoriais ou mentais, a maioria dos pacientes apresenta-se cooperativa com o tratamento e com o profissional; todavia, alguns deles podem resistir e manifestar seu medo com diferentes reações (fuga, choro, gritos). Nesses casos é importante que o profissional mantenha o equilíbrio emocional (autocontrole e autoconfiança) e saiba aplicar técnicas específicas para controlar o comportamento, garantindo, assim, o manejo adequado do paciente e o sucesso do tratamento odontológico (GUEDES-PINTO, 1997; TOLEDO; BEZERRA, 1989). Segundo, As técnicas psicológicas utilizadas em Odontopediatria para o controle do comportamento podem ser aplicadas em pacientes com deficiências (PINKLAM, 1996). Os objetivos dessas técnicas são diminuir o medo e a ansiedade, orientar verbalmente o paciente para manter, modificar ou suprimir um comportamento e estabelecer uma relação de confiança entre o profissional, o paciente e seus familiares, promovendo uma atitude positiva em relação à saúde bucal. A American Academy of Pediatric Dentistry (2003a) assim se posicionou com relação às principais técnicas que podem ser empregadas para controlar o comportamento em pacientes resistentes e combativos: a. modular o tom da voz: utilizar comandos curtos e claros, compreender as expressões faciais e facilitar o contato físico são técnicas que ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 429 permitem captar a atenção do paciente, obter sua cooperação, evitar comportamentos negativos e estabelecer uma comunicação efetiva; b. “dizer-mostrar-fazer”: familiariza o paciente com o consultório e a equipe odontológica, incluindo explicações prévias a determinados procedimentos, demonstrações e execução daquilo que foi explicado, empregando, para aplicar esta técnica, uma linguagem clara que possa ser facilmente entendida pelo paciente; c. reforço positivo: é utilizado para aumentar a freqüência de um comportamento, com reforço verbal ou social; o comportamento do paciente é recompensado por meio de elogios, manifestações de afeto (abraços) ou prêmios simbólicos no final do atendimento. Essas técnicas não têm contra-indicações, mas sua aplicação depende do desenvolvimento físico e psicológico do paciente e, principalmente, da experiência, da capacitação e da personalidade do profissional que as aplica. Em determinados casos, outros métodos, como a contenção física ou química, podem ser utilizados para controlar o comportamento do paciente (GUEDES-PINTO, 1997; MUGAYAR, 2000). Na contenção física utilizam-se faixas, lençóis, ataduras e outros dispositivos para envolver o paciente, restringindo a movimentação dos seus membros. Este método é aplicado principalmente em pacientes pediátricos cujos movimentos involuntários ou retardo mental profundo impedem o posicionamento na cadeira odontológica. A técnica é bem aceita pelos pacientes. Em geral aqueles sem movimentos involuntários, que no início recebiam a contenção, passam a se posicionar na cadeira a partir da terceira ou quarta sessão, colaborando efetivamente com o profissional. Antes da aplicação deste método, informações detalhadas devem ser oferecidas à família do paciente, ressaltando que a contenção física não é uma medida disciplinar ou uma conveniência para a equipe odontológica, mas uma técnica auxiliar que favorece a execução do tratamento. A contenção química é a administração de medicamentos para alterar e controlar o nível de consciência, a coordenação motora, o grau de ansiedade e os parâmetros psicológicos; inclui a sedação e a anestesia geral. A sedação consciente produz um estado de depressão ou de consciência mínima (CREEDON, 1995). O paciente conserva a via aérea pérvia e a ventilação adequada sem necessidade de equipamentos específicos, respondendo a estímulos físicos ou comandos verbais. Para a aplicação deste método, o profissional deve conhecer o agente a ser utilizado, dominar a técnica de administração, estar treinado nas técnicas de ressuscitação e dispor de serviços móveis de emergência médica. Conforme a American Society of Anesthesiologists (ASA) (2004), somente os pacientes que, após a avaliação física sejam considerados saudáveis (ASA I) ou que apresentem uma alteração sistêmica leve, causada pela condição a ser tratada ou por outros processos fisiopatológicos (ASA II), podem ser submetidos à sedação consciente na prática geral. Todavia, em pacientes com retardo mental profundo, comprometimento sistêmico significativo ou transtornos psiquiátricos severos, tal método é contra-indicado. Esses pacientes devem ser atendidos em ambiente hospitalar e sob anestesia geral. Nos casos de insucesso no manejo e no controle do paciente por meio de métodos convencionais ou frente à necessidade de um tratamento complexo em um período de tempo menor, reduzindo o número de visitas, deve ser considerada a possibilidade de realizar o tratamento odontológico sob anestesia geral em ambiente hospitalar. O método consiste em induzir, por meio de medicamentos (anestésicos, analgésicos e relaxantes musculares), a perda da sensação dolorosa e da consciência ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 430 pela depressão do sistema nervoso central. O uso de anestesia geral está indicado para pacientes com retardo mental profundo, transtornos psiquiátricos severos e necessidades de tratamento odontológico acumuladas em pacientes com doenças sistêmicas graves (AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRIC DENTISTRY, 2003b; CREEDON, 1995). A decisão, quanto ao uso da sedação consciente ou da anestesia geral baseia-se na avaliação prévia do comportamento do paciente, na capacidade de modificar um determinado comportamento, na extensão do tratamento, na responsabilidade da família, na viabilidade econômica de soluções alternativas e principalmente, na comparação risco/benefício em relação ao estado fisiológico do paciente, este último determinado pela história médica cuidadosa e pelo exame físico recente (CREEDON, 1995; GUEDES-PINTO, 1997). Qualquer que seja o método escolhido para controlar o comportamento do paciente e, antes de sua aplicação, tanto o paciente quanto seus familiares ou responsáveis devem ser informados em relação ao uso desses métodos. Do paciente, quando possível, ou de seus familiares, deve-se obter, por escrito, o consentimento para a utilização dos mesmos. É indispensável informar a família em termos claros e concisos, a respeito dos riscos e benefícios de cada técnica, os motivos para sua aplicação e os métodos alternativos disponíveis. Todas as informações devem ser registradas meticulosamente na ficha do paciente, incluindo história médica pregressa, avaliação física pré e pós-operatória, procedimentos, orientações, prescrição de medicamentos, bem como a existência do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRIC DENTISTRY, 2003a; CREEDON, 1995; GUEDES-PINTO, 1997; SURABIAN, 2001). Percepções em relação á Odontologia para pacientes com necessidades especiais Um estudo quantitativo, por meio de questionários, para determinar se os cirurgiões-dentistas estão dispostos e preparados para tratar pessoas com deficiências (STIEFEL; SHAFFER; BIGELOW, 1981). Participaram desse trabalho 573 profissionais vinculados à Associação Odontológica de Washington (Estados Unidos), incluindo 442 generalistas, 27 cirurgiões bucomaxilofaciais, 42 odontopediatras e 62 profissionais com outras especialidades. Entre os participantes, os cirurgiões bucomaxilofaciais (100%) e os odontopediatras (97%) asseguraram ter disposição e experiência suficiente no manejo desses pacientes; a prática hospitalar e o curso de Pós-Graduação, respectivamente, proporcionaram-lhes a oportunidade de tratar pacientes portadores de diversas condições, incluindo comprometimento sistêmico e psiquiátrico. Quanto aos generalistas, somente 20% manifestaram-se dispostos a tratar desses pacientes, demonstrando que a disponibilidade e o interesse dos profissionais dependem da experiência prévia e do tipo de deficiência do paciente. Assim, os autores observaram que o contato com esses grupos populacionais desde a Graduação é indispensável para o exercício futuro da profissão, pois daquela experiência depende a disposição, a capacidade e o interesse dos cirurgiões-dentistas para tratar populações vulneráveis. Determinar se a prática clínica influi na confiança, nas percepções e nas atitudes de alunos em relação aos pacientes com deficiências foram os objetivos desse estudo (ÚDIN; KUSTER, 1986) com 42 alunos do último ano da Faculdade ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 431 de Odontologia de Nebraska (Estados Unidos), os quais assistiram a 16 horas de aulas teóricas sobre deficiências do desenvolvimento. Na primeira parte do estudo, os pesquisadores utilizaram um questionário com oito itens aos quais os alunos responderam “sim” ou “não”. As respostas foram avaliadas conforme a escala de Likert modificada, designando números (5 e 1) para as respostas afirmativas e para as negativas, respectivamente; os resultados, analisados estatisticamente, mostraram que os alunos sentem-se inseguros e pouco motivados em relação a tais pacientes. Para a segunda parte dessa pesquisa os mesmos 42 alunos participaram de uma experiência clínica que incluía o atendimento a crianças e adolescentes com retardo mental, deficiências físicas e transtornos psiquiátricos (ÚDIN; KUSTER, 1986). No terceiro dia da experiência, os alunos foram novamente entrevistados. Os pesquisadores, então, compararam as respostas obtidas e concluíram que, após a experiência clínica, os acadêmicos mostraram-se mais confiantes. Todavia, ressaltaram que o instrumento utilizado nesse estudo avaliou as atitudes, mas não foi apropriado para determinar as percepções dos pesquisados. Os autores afirmaram que a insegurança dos alunos está associada à inexperiência. Recomendaram, então, a inclusão de práticas clínicas durante a Graduação para melhorar tanto o exercício profissional quanto o paciente e sugeriram a realização de outros estudos, incluindo instrumentos que permitam conhecer as percepções dos entrevistados. Em uma pesquisa, foi avaliado se o preparo (qualificação e motivação) de cirurgiões-dentistas vinculados a instituições governamentais é adequado para atender às necessidades odontológicas de pessoas com deficiências e se a experiência prática influencia na capacidade do profissional para suprir essas necessidades (STIEFEL; TRUELO5VE; JOLLY, 1987). Participaram dessa pesquisa 300 cirurgiões-dentistas de Washington (Estados Unidos) que responderam a um questionário com questões relacionadas ao nível de conhecimento, à experiência no manejo de deficiências específicas, ao interesse e à motivação para atender esses pacientes. Nas respostas, agrupadas por categorias (alta experiência, baixa experiência ou nenhuma experiência), consideraram cirurgiões-dentistas com alta experiência aqueles que asseguraram atender mais de 20 pacientes com deficiências por ano. Dentre os participantes, 80% sentiram-se pouco capacitados e desinteressados em tratar essas pessoas; desses, 9% admitiram não ter nenhuma preparação e 90% manifestaram interesse em adquirir maior conhecimento para atender de forma adequada às necessidades dos pacientes. Os autores concluíram que, o conhecimento e o contato com esses pacientes, deve começar na Graduação, para sensibilizar e conscientizar o aluno; assim, no futuro, será capaz de responder às necessidades dessas pessoas, o que favoreceria tanto a relação paciente-profissional como a saúde pública. As dificuldades enfrentadas por pessoas com deficiências do desenvolvimento e suas famílias para a obtenção de cuidados odontológicos adequados, devem-se, principalmente, a insuficiências na educação odontológica, que resultam em profissionais pouco capacitados para manejar e tratar esses pacientes (CRESPI; FERGUSON, 1987). Foram apontados, igualmente, como obstáculos na consecução de serviços odontológicos, as dificuldades de transporte, as barreiras físicas, o medo, a pouca motivação, a falta de informação ou a negligência em relação à saúde bucal por parte da família ou das instituições que os acolhem. No intuito de conhecer as opiniões e as condutas de cirurgiõesdentistas em relação aos serviços odontológicos para crianças portadoras de ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 432 deficiências, um estudo foi realizado por meio de questionários enviados a 114 generalistas da cidade de Newcastle (Inglaterra) (NUNN; MURRAY, 1988). Dos respondentes, 47,9% atendiam um, no máximo dois pacientes por mês, os demais participantes encaminhavam os pacientes para outros colegas. Dentre os profissionais que receberam aulas práticas na área (37,5%), 19% foram a favor de cursos de Pós-Graduação para os colegas sem experiência clínica; esses, por sua vez, informaram que preferem encaminhar os pacientes para instituições especializadas ou realizar o tratamento sob anestesia geral. Além disso, 29% dos entrevistados ressaltaram falhas por parte das instituições governamentais para prover e incentivar nos profissionais o cuidado odontológico dessas crianças. No mesmo trabalho, afirmaram os autores que os profissionais que constituem uma equipe atendem mais crianças com deficiências do que aqueles que desempenham atividades individualmente; a assiduidade do tratamento depende do conhecimento ou da experiência prévia com tais grupos, assim como do tipo de deficiência apresentado (NUNN; MURRAY, 1988). Asseguraram que se os estudantes de Odontologia tivessem contato com esses pacientes desde a Graduação, facilmente desenvolveriam uma atitude positiva em relação à pessoa com deficiências. Somente com mais e melhor qualificação, tanto na Graduação quanto na Pós-Graduação, será possível evitar os sentimentos percebidos nesse estudo, isto é, rejeição pela Odontologia para pessoas com deficiências, concluíram os autores. Em relação ao cuidado odontológico de populações especiais, especificamente de pessoas com deficiências do desenvolvimento, notou-se a necessidade de incluir no currículo, tanto da Graduação como da Pós-Graduação, não apenas bases teóricas, mas aplicações práticas (ALBUM, 1990). A falta de experiências clínicas interessantes e motivadoras durante a Graduação, faz com que o profissional enfrente, mais tarde, grandes dificuldades que resultam em rejeição, frustração e apatia, principalmente quando os pacientes apresentam problemas clínicos maiores. Portanto, os alunos precisam ser apropriadamente qualificados e motivados a participarem ativamente dos serviços que tratam esses pacientes, pois assim, aprenderão a considerar em primeiro lugar o paciente e depois a deficiência. Na opinião do autor, somente o profissional qualificado poderá destruir os mitos em relação às pessoas com deficiência física ou mental, estará preparado para responder às dúvidas dos familiares, se mostrará sensível, acessível e interessado pelas informações relacionadas ao paciente. Em relação ao ensino, observou-se que, embora existam algumas faculdades que exijam de seus alunos alcançar certo grau de competência com pacientes portadores de deficiências, incapacidades e infecções, o número dessas instituições ainda é pequeno (FRIEDMAN, 1990). Conseqüentemente, os pacientes são permanentemente reencaminhados devido à falta de instrução, habilidade clínica limitada e conhecimento insuficiente por parte dos profissionais. Por essa razão, o autor questiona: “Será que o objetivo da Odontologia é capacitar o aluno para realizar procedimentos clínicos apenas em pessoas saudáveis?”. Desse modo, manifestou a importância de reavaliar os conceitos e as estratégias educacionais para determinar como está sendo desenvolvido o ensino em relação ao paciente com necessidades especiais, ressaltando, ainda, a necessidade de que o profissional se conscientize como tal e assuma com responsabilidade seu papel na sociedade, isto é, proporcionar o tratamento adequado para todos os pacientes, evitando conflitos ou preconceitos pessoais. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 433 Os objetivos da educação odontológica para o atendimento do paciente com deficiências do desenvolvimento são: (1) sensibilizar o aluno com relação às necessidades desses pacientes; (2) facilitar práticas clínicas suficientes, as quais permitam ao estudante aplicar o conhecimento teórico adquirido às técnicas de manejo e ao planejamento do tratamento, este último baseado principalmente, na prevenção e na reabilitação (FERGUSON; BERENTSEN; RICHARDON, 1991). Os autores consideraram que tais experiências clínicas durante a Graduação são essenciais para que o acadêmico aprenda a dominar suas ansiedades e incertezas, desenvolva consciência social, habilidades e confiança no manejo dos pacientes. Questionários foram utilizados para conhecer as opiniões de cirurgiões-dentistas de Londres (Inglaterra) a respeito da educação e do treinamento prático em Odontologia para pacientes especiais (SOTO ROJAS; CUSHING, 1992). Dos 365 questionários enviados, 246 (67,4%) foram respondidos, sendo que, 70% indicaram como relevante o a capacitação prática em Odontologia para pacientes especiais e 98% manifestaram seu particular interesse em participar de métodos de ensino e linhas de pesquisa na área. Também, expuseram a necessidade de instrução, na Graduação e na Pós-Graduação, pois apenas cursos de educação continuada estão disponíveis nessa área. Os problemas odontológicos nas pessoas com deficiências não são diferentes daqueles das saudáveis, mas essas deficiências proporcionam condições adicionais possíveis de afetar a qualidade de vida das mesmas (WALDMAN; PERLMAN, 1997). Embora tenha sido demonstrada a necessidade de um serviço odontológico específico para tais pacientes, ainda existem algumas dificuldades: (1) na prática privada, nem todos os consultórios dispõem da infra-estrutura necessária para oferecer um atendimento adequado; (2) geralmente os dentistas não fazem parte de equipes multidisciplinares de atendimento, sendo, muitas vezes, relegados a um segundo plano ou, simplesmente, omitidos; (3) as faculdades de Odontologia freqüentemente não incluem nos seus programas práticas clínicas, suficientes e adequadas, no manejo de pessoas com deficiências. Os autores salientaram a necessidade de maiores investimentos tanto econômicos como educacionais na área, principalmente na Odontologia para adultos com deficiências, já que as crianças em geral são atendidas por odontopediatras. Para conhecer as experiências, as percepções e, as dificuldades em relação à disponibilidade de serviços odontológicos, foi realizado um estudo descritivo qualiquantitativo, por meio de entrevistas aos administradores de 82 instituições londrinas que acolhem pacientes com retardo mental associado a distúrbios físicos, sistêmicos e psiquiátricos (PRATELLI; GELBIER, 1998). Os participantes responderam (sim-ou-não) a um questionário e relataram suas experiências em relação aos serviços odontológicos oferecidos. As entrevistas revelaram que, provavelmente por falhas educativas, alguns profissionais mostram atitudes negativas e pouca sensibilidade, principalmente no relacionamento com o paciente: “Tratam dentes, mas não pessoas”. Destacaram ainda, a importância que tem para o sucesso do tratamento, a comunicação constante e clara entre pacienteprofissional-responsável. Os pesquisadores concluíram que, na percepção dos administradores, a oferta de serviços é suficiente, porém o profissional não parece capacitado para manejar esses pacientes, mostra-se intimidado e receoso. Como resultado, os pacientes resistem ao tratamento e o mesmo não é finalizado. Os cirurgiões-dentistas não atendem pessoas com deficiências pelas seguintes razões (WALDMAN; PERLMAN; SWERDLOFF, 1998): (1) ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 434 insuficiente qualificação, tanto na Graduação quanto na Pós-Graduação, o que resulta em profissionais pouco preparados e desinteressados em tratar desses pacientes; (2) o deslocamento dos pacientes até os locais de atendimento é difícil e exige grandes despesas; (3) as limitações financeiras; (4) a ignorância e/ou a negligência em relação à saúde bucal, tanto das instituições que os acolhem como dos pais e/ou responsáveis; (5) esses pacientes alteram a rotina do consultório, requerem tempo adicional, que não é remunerado e, por último, podem assustar ou perturbar os demais pacientes. Os autores recomendaram como objetivos da qualificação profissional, a identificação e solução de situações complicadas e o incentivo à interação com pessoas com deficiências, ressaltaram que é dever da Odontologia assegurar a saúde bucal para todos os indivíduos, cabendo às instituições proporcionar um ensino adequado e, ao profissional, uma atuação responsável. Uma pesquisa qualitativa foi efetuada por meio de questionários para conhecer a posição dos cirurgiões-dentistas de Kansas (Estados Unidos) em relação aos serviços odontológicos (disponibilidade, facilidade de acesso, rentabilidade e, principalmente, atendimento adequado) para pessoas com deficiências do desenvolvimento (REICHARD; TURNBULL; TURNBULL, 2001). Pela análise de conteúdo, os autores observaram que, em relação à disponibilidade, os 26 entrevistados consideraram que a oferta de serviços odontológicos é suficiente, mas a concentração é maior nas áreas urbanas que nas rurais; reconheceram alguns fatores que dificultam o acesso ao tratamento: consultas prolongadas, equipamentos especiais, necessidade de treinamento específico, de sedação ou de anestesia geral. Acrescentaram, ainda, que no curso de Graduação a capacitação do aluno quanto às pessoas com deficiências é mínima, gerando, por ocasião do atendimento, sentimentos de incerteza e intimidação. Levando em conta os fatores citados, bem como o insuficiente investimento do Estado, os entrevistados explicaram que tratar essas pessoas no consultório particular representa grandes despesas e pequenos ganhos profissionais, econômicos ou emocionais. Visto que as necessidades odontológicas das pessoas com deficiências são as mesmas daquelas de pessoas saudáveis, os autores asseguraram que o problema está no ensino, recomendando, pois, que as faculdades estabeleçam programas que proporcionem maior interação entre o futuro profissional, o paciente e o grupo familiar, beneficiando o tratamento, a qualidade de vida do paciente e, conseqüentemente, a relação paciente-famíliaprofissional. O tratamento para os principais problemas odontológicos (gengivite, doença periodontal, cárie e mal-oclusão dentária) dos pacientes com deficiências não diverge daquele oferecido às demais pessoas (SHENKIN; DAVIS; CORBIN, 2001). Entretanto, esses pacientes não recebem o tratamento adequado às suas necessidades devido à falta de incentivos governamentais, conhecimento insuficiente por parte dos profissionais e escassez de estudos que mostrem tanto o estado de saúde desses pacientes como padrões de conduta a serem seguidos. Os autores recomendaram a instituição de novas estratégias que proporcionem ganhos econômicos para os profissionais e promovam programas educativos que proporcionem o conhecimento suficiente para o cuidado dessas populações. Com o objetivo de verificar quais são as oportunidades educacionais existentes em Odontologia para pacientes com deficiências do desenvolvimento, foi aplicado um questionário em 55 faculdades de Odontologia dos Estados Unidos e do Canadá, nos níveis de Graduação e Pós-Graduação (DOUGHERTY; ROMER; LEE, 2001). Os resultados desse trabalho indicaram que na graduação a maioria das ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 435 faculdades (84%) oferece menos de cinco horas/aula durante o curso para abordar assuntos relacionados a deficiências, e o tempo clínico destinado para o tratamento desses pacientes varia de 0 a 5% do total de horas designadas à prática clínica. Na segunda fase desse trabalho, foram avaliados os 57 programas de Pós-Graduação em Odontopediatria, também, nos Estados Unidos e no Canadá, já que os odontopediatras são tradicionalmente considerados os especialistas com melhor qualificação para tratar pacientes com deficiências (DOUGHERTY; ROMER; LEE, 2001). Foi constatado que os programas de Pós-Graduação em Odontopediatria proporcionam o preparo adequado tanto teórico como prático para o atendimento de tais pacientes. Entretanto, os coordenadores desses Programas salientaram que entre as pessoas com deficiências, também há adultos e que a maior parte de seus alunos não se sente habilitada para tratar adequadamente as necessidades dos pacientes desse grupo etário; portanto, ressaltaram o grande avanço que representaria para a Odontologia a qualificação específica para tratar a população adulta. Avaliar a acessibilidade e identificar as dificuldades enfrentadas pelos pacientes com deficiências na consecução de serviços odontológicos foram os objetivos de determinado estudo (EDWARDS; MERRY, 2002). Para tanto, os pesquisadores aplicaram um questionário a 157 generalistas de Liverpool (Inglaterra). A análise estatística das respostas (sim-ou-não) indicou que 90% dos entrevistados estavam interessados em oferecer seus serviços às pessoas com alguma deficiência; todavia, esse interesse diminuiu devido à carência de recursos econômicos por parte dos pacientes, à falta de incentivos governamentais e à necessidade de modificar as instalações dos consultórios para tal fim. Além disso, os profissionais manifestaram preocupação com o fato de virem se tornar centro de referência para pacientes com deficiências. Outro fator que impede o acesso dos pacientes aos serviços odontológicos, segundo os autores, é o pouco tempo de que dispõem os cirurgiões-dentistas tanto para o atendimento como para o aperfeiçoamento de seu conhecimento no cuidado dessas pessoas. Desta maneira, ressaltaram a necessidade de encontrar caminhos para que a classe odontológica possa assumir a saúde bucal desse grupo, melhorando o acesso e concedendo benefícios ao profissional. No intuito de verificar o conhecimento alcançado pelos estudantes durante as práticas clínicas com populações especiais, os ensaios escritos pelos alunos, versando a situação mais difícil que enfrentaram durante um estágio (hospital público, prisões e atendimento a pessoas com deficiências) foram estudados e avaliados o aprendizado nessa ocasião (MOFIDI et al., 2003). Os resultados da análise de conteúdo mostraram que, tanto durante o atendimento a esses pacientes quanto nas atividades realizadas nessas instituições, os alunos mostram-se mais atentos, desenvolvem destreza, empatia, mecanismos de comunicação com o paciente e autoconfiança. Nessas situações críticas, os alunos percebem a complexidade do tratamento odontológico e a relevância dos dilemas éticos. Esse tipo de experiências educativas permite aos acadêmicos conhecer diretamente o paciente, a realidade da vida profissional e as vicissitudes do cuidado além da sala de aula. Entretanto, também, observou-se que apenas essas experiências não são suficientes para desenvolver conhecimento e habilidades (MOFIDI et al., 2003). A análise crítica de tais atividades é de fundamental importância para que a educação baseada na experiência comunitária seja efetiva. Pela reflexão, o aluno aprende a ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 436 analisar suas experiências, ganha conhecimento, desenvolve critérios, habilidades e valores. Os autores concluíram que se a educação odontológica inclui o atendimento a populações especiais e a análise crítica estará promovendo a compreensão da complexidade humana e estimulando o desenvolvimento moral dos futuros profissionais. As pessoas com deficiências do desenvolvimento sofrem distúrbios bucais de grande importância e, dificilmente recebem o tratamento adequado. Isso ocorre por falhas na educação odontológica e, conseqüentemente, pelo escasso número de profissionais dispostos a tratar esses pacientes (MOURADIAN; CORBIN, 2003). Ao mesmo tempo, mencionaram falhas na educação médica, no reconhecimento da estreita relação de dependência entre a saúde bucal e a sistêmica, os poucos investimentos econômicos, as insuficientes bases de dados a respeito da saúde bucal dessas pessoas, a deficiência de estudos de intervenção clínica e o preconceito social que designa uma condição inferior para esses pacientes. Assim, pelo alto risco de desenvolver doenças e pelas dificuldades de encontrar serviços odontológicos apropriados, os autores indicaram a prevenção como principal objetivo no tratamento de pessoas com deficiências. Destacaram que o aumento dessas populações exige mudanças urgentes na educação dos profissionais da saúde, e propuseram como estratégia educativa, reunir a Odontologia e a Medicina, desenvolvendo habilidades, capacidade de serviço e pesquisa em favor dessas pessoas; enfatizando a importância da multidisciplinaridade e da cooperação entre a Odontologia e a Medicina. A partir disso, sugeriram disponibilizar nos cursos de Graduação de todas as áreas da saúde o atendimento a pacientes com necessidades especiais, priorizando a promoção e a prevenção e fomentar cursos de PósGraduação que desenvolvam capacidades e competências no cuidado de populações especiais. Até recentemente o cuidado da saúde das crianças com deficiências do desenvolvimento tanto na Medicina como na Odontologia era limitado às especialidades pediátricas (FENTON et al., 2003). Entretanto, os avanços médicos têm contribuído para a sobrevida dessas crianças, que se tornam adolescentes e adultos com deficiências. Da mesma forma, têm aumentado os obstáculos para encontrar serviços de saúde que proporcionem cuidados preventivos e restauradores nessas populações (falta de profissionais qualificados e investimento governamental insuficiente). Em relação ao ensino, ressaltaram que, com poucas exceções, nos currículos das faculdades de Odontologia são dedicadas apenas cinco horas de instrução clínica em deficiências do desenvolvimento, tempo sabidamente insuficiente para que o aluno desenvolva as habilidades necessárias ao cuidado desses pacientes. Os pesquisadores advertiram sobre a necessidade de inovar a educação odontológica, o que permitirá ao aluno entender o impacto das deficiências sobre a saúde e o cuidado bucal, diagnosticar e planejar um tratamento tanto para crianças como para adultos com deficiências, solucionar problemas relacionados ao tratamento, desenvolver pesquisas e publicar estudos que permitam estabelecer padrões de conduta e cuidado. Para alcançar tais objetivos, asseguraram os autores que, é imperioso reconhecer a importância da colaboração entre médicos e cirurgiões-dentistas, assim como, assumir a responsabilidade de avançar no conhecimento em relação às populações vulneráveis. Com a finalidade de conhecer as percepções de cirurgiões-dentistas em relação ao ensino e ao cuidado odontológico de pacientes com paralisia cerebral, retardo mental e comprometimento sistêmico, foram entrevistados 1.251 generalistas ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 437 vinculados à American Dental Association (ADA) (CASAMASSIMO; SEALE; RUEHS, 2004). Os questionários incluíram os seguintes itens: freqüência de atendimento; qualidade da instrução recebida; necessidade de aperfeiçoamento e fatores que influenciam na motivação dos profissionais para atender esses pacientes. Para avaliar as respostas os autores utilizaram a escala modificada de Likert, designando números para cada resposta: muitas vezes (5); sempre (4); algumas vezes (3); quase nunca (2); nunca (1). Os resultados analisados estatisticamente indicaram que um de cada 10 profissionais presta atendimento a pacientes com necessidades especiais. Quanto ao ensino, 30% dos participantes receberam aulas práticas e teóricas na Graduação. Conseqüentemente, os mesmos consideraram o aperfeiçoamento nessa área pertinente e necessário. Em relação ao atendimento, 60% dos entrevistados apontaram o comportamento dos pacientes como a principal dificuldade enfrentada no atendimento, o que afeta a motivação e a dedicação dos profissionais na prestação dos serviços. Os autores sugeriram que a instituição de programas de Odontologia para atender pacientes com deficiências não necessariamente aumentará o número de cirurgiões-dentistas dispostos a cuidar deles, mas provavelmente proporcionarão o conhecimento e a experiência apropriados, além de reforçar a determinação daqueles profissionais interessados. Um estudo foi realizado para verificar se os estudantes de Odontologia estavam qualificados para cuidar de pessoas com retardo mental e, se a prática clínica e o contato prévio com populações vulneráveis influenciavam nas atitudes dos estudantes (WOLFF et al., 2004). Para tanto, os autores entrevistaram 312 alunos da Graduação (terceiro e quarto anos) de cinco faculdades de Odontologia nos Estados Unidos. Os questionários incluíram aspectos como prática clínica, motivação e confiança. As respostas agrupadas em categorias (definitivamente; provavelmente; pouco provável; nunca) foram estatisticamente analisadas. Em relação à experiência clínica, os resultados indicaram que, na maioria das faculdades, os alunos (68,2%) receberam cinco ou menos horas de aulas práticas, excetuando-se duas faculdades cujos alunos (17% da amostra) assistiram a mais de 15 horas-aula durante o curso. Quanto à motivação, 83% dos entrevistados declararam-se motivados, embora pouco qualificados para atender pacientes com necessidades especiais. Salientaram que a capacidade do cuidado depende da severidade do retardo mental do paciente; assim, quanto maior o comprometimento do paciente, maior insegurança no aluno. Os investigadores concluíram que as oportunidades educacionais são limitadas, portanto os alunos sentem-se pouco qualificados para atender esses pacientes. Indicaram que assim como a Odontologia capacita o aluno para atender crianças, adolescentes, adultos e idosos, também, deve preparar seus estudantes para tratar pacientes com comprometimento físico, sistêmico ou mental. PESQUISA Procedimentos metodológicos Os procedimentos metodológicos são apresentados em termos de abordagem de pesquisa, definição da amostra, coleta de dados e análise de dados. Antes da realização deste estudo um projeto de pesquisa foi elaborado, submetido à avaliação e, posteriormente, aprovado pela Comissão Científica e de Ética da Faculdade de Odontologia da PUCRS e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCRS. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 438 Abordagem da pesquisa Este estudo, centralizado no paradigma naturalístico, também conhecido como interpretativo ou qualitativo, teve por objetivo conhecer as percepções, os sentimentos e as manifestações de alunos da FO-PUCRS e de familiares de pacientes portadores de deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor do Instituto do Excepcional, em relação à Odontologia para pacientes com necessidades especiais. Assim, os achados deste estudo basearam-se no posicionamento de um grupo selecionado intencionalmente e o instrumento aplicado foi a entrevista semi-estruturada, conferindo a esta pesquisa características de estudo de caso (ENGERS, 1987, 1994). Considerando a complexidade do assunto e a natureza do problema focalizado, optou-se por uma abordagem dinâmica e flexível, que oportunizasse compreender a realidade em várias dimensões. Portanto, a pesquisa qualitativa procurou aprofundar o conhecimento de forma sistemática, válida e exata, visando à compreensão do significado do fenômeno em estudo (ENGERS, 1994; DEMO, 2000; PONZONI, 2001; STOLZ, 2003). Nesta investigação, a abordagem qualitativa foi utilizada com a finalidade de compreender os aspectos que, na percepção dos entrevistados, influenciam no atendimento odontológico e na saúde bucal dos pacientes. Para tal, foram realizadas entrevistas, o que permitiu a análise detalhada quanto às informações obtidas por meio da análise de conteúdo (ENGERS, 1987, STOLZ, 2003). Pela natureza desta pesquisa, não foram formuladas hipóteses, sendo estas substituídas pelas seguintes questões norteadoras: 1. Como o aluno sente-se e percebe-se como cirurgião-dentista tratando pacientes com necessidades especiais? 2. Quais são os sentimentos dos familiares desses pacientes com relação aos cirurgiões-dentistas? 3. De que maneira essas percepções podem influir no exercício da Odontologia? Definição dos sujeitos de pesquisa Participaram desta pesquisa 15 alunos do quinto ano do Curso de Graduação da FO-PUCRS, com idades entre 23 e 27 anos, e 15 familiares (mãe ou pai) de crianças entre 4 e 14 anos de idade com deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor, atendidas no Instituto do Excepcional de Porto Alegre, no estado do Rio Grande do Sul, no período de março a agosto de 2004. Conforme os preceitos do paradigma assumido, a definição dos sujeitos da pesquisa foi intencional. Todos os participantes foram informados e esclarecidos no que diz respeito ao objetivo e à metodologia desta pesquisa. Uma vez assentindo, assinaram voluntariamente o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo selecionados como participantes. Coleta de dados e entrevista A coleta de dados foi desenvolvida por meio de entrevistas, tentando fazer com que os participantes deste estudo manifestassem livremente suas ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 439 percepções e sentimentos com relação à Odontologia para pacientes com necessidades especiais, e como suplementação aos dados, incluíram-se as observações da pesquisadora, uma vez que o paradigma pressupõe e adota a subjetividade no contexto da pesquisa. A pesquisa constou de uma entrevista semi-estruturada, realizada pela pesquisadora, com o auxilio de um gravador, para possibilitar a transcrição literal e com o intuito de manter a originalidade e a autenticidade do discurso dos participantes. As entrevistas ocorreram em tempo livre (variando de 40 a 60 minutos), conforme previsão, e ofereceram um valioso material para análise. O roteiro da entrevista teve as seguintes formulações: 1. Aos familiares: - Em relação à Odontologia para pacientes com necessidades especiais, quais situações (positivas e/ou negativas) você gostaria destacar? Quais as suas maiores preocupações em relação aos serviços odontológicos? - O que você acha que poderia ser feito para minimizar as situações negativas sofridas por você e por seu filho? 2. Aos alunos: - O que você considera que seja um paciente com necessidades especiais? - Já atendeu esses pacientes? Como você se sente quando trata um paciente com necessidades especiais (preocupações, angústias, dificuldades...)? - O curso de Odontologia tem lhe oferecido o conhecimento e a instrução suficientes em relação ao atendimento desses pacientes? Como você considera seu conhecimento nessa área da Odontologia? Tem interesse em aperfeiçoar seu conhecimento nessa área? - O que poderia ser feito para minimizar as situações negativas do atendimento a esses pacientes? - Atenderia esses pacientes no seu consultório? Os procedimentos utilizados durante as entrevistas foram direcionados, visando aprofundar o conhecimento sobre o fenômeno em investigação. Procurou-se, portanto, no início da entrevista, estabelecer um bom relacionamento com o entrevistado, esclarecendo-lhe os propósitos deste estudo, garantindo que sua identidade não seria revelada, e que suas manifestações seriam utilizadas tão-somente para esta pesquisa, sem qualquer intenção de uso como fonte de avaliação. Em relação às posturas dos entrevistados, observou-se aceitação em participar da pesquisa e espontaneidade na forma de expressar seus sentimentos e suas percepções. Análise de dados As informações obtidas nas entrevistas foram estudadas qualitativamente, por meio da análise de conteúdo, utilizando a técnica desenvolvida (ENGERS, 1987). A sistemática empregada para tanto, passou, em um primeiro momento, pela leitura e pela releitura das entrevistas, objetivando compreender os conteúdos latentes e os significados dos discursos. Em um segundo momento, os procedimentos foram conduzidos direcionando uma análise vertical e outra horizontal, síntese e categorização. Inicialmente, procedeu-se à análise das manifestações expressas na entrevista de cada participante, retirando-se dela os conteúdos que se destacaram para cada questão da mesma (análise vertical – Fig. 1). ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 440 Após, analisou-se, em separado, cada questão da entrevista, considerando-se a totalidade da amostra, revendo-se, para cada item, os aspectos destacados entre os discursos dos participantes (análise horizontal – Fig. 1). A seguir, as manifestações dos informantes foram agrupadas (síntese – Figs. 2 e 3) e, finalmente, categorizadas (Fig. 4), tomando como referencial o próprio discurso dos participantes. Desta maneira, a análise do conteúdo do discurso dos entrevistados caracterizou-se por um processo de ir e vir entre o discurso original dos participantes e as categorias que emergiam dessa análise reflexiva. Análise horizontal V e r t i c a l Questão 01 Entrevistado 01 Entrevistado 02 Entrevistado 03 Observação Questão 02 Entrevistado 01 Entrevistado 02 Entrevistado 03 Observação Questão 03 Entrevistado 01 Entrevistado 02 Entrevistado 03 Observação Observação Observação Observação Síntese Fig. 1 - Análise de conteúdo: análises horizontal e vertical. Síntese (alunos) Definições Sentimentos Conhecimento Encaminhamento Relação paciente/profissional Soluções Fig. 2 - Análise de conteúdo: síntese (alunos) ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 441 Síntese (familiares) Familiares percebem o cirurgião-dentista Dificuldades Relação paciente-profissional Sentimentos produzidos nos familiares Fig. 3 - Análise de conteúdo: síntese (familiares) Categorias Percepções e sentimentos associados à Odontologia Conhecimento Relação pacienteprofissional Fig. 4 - Análise de conteúdo: categorias RESULTADOS E DISCUSSÃO A fim de situar o leitor no processo de análise das informações obtidas nesta pesquisa, optou-se por descrever os resultados junto à discussão. Portanto, considerou-se necessário iniciar este capítulo esclarecendo-se a natureza da metodologia de pesquisa utilizada. Todos os estudos científicos são realizados dentro de um conjunto de crenças básicas, constituindo um sistema de idéias que possibilitam julgar a realidade ou valorar alguns aspectos mais do que outros. Esse conjunto de idéias, crenças e valores, acompanhado pelo método de análise, denomina-se paradigma (ENGERS, 1999). O paradigma interpretativo, também, conhecido como qualitativo, tem por objetivo estudar os significados e as ações humanas. Desenvolve-se em ambiente natural, considera o instrumento humano, o conhecimento tácito e intuitivo, a escolha intencional dos participantes e a interação entre eles, a análise de dados indutiva, a geração de uma teoria emergindo do grupo, portanto utilizando um ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 442 delineamento emergente e critérios especiais para chegar a uma análise coerente com a real percepção dos participantes (ENGERS, 1999). Este paradigma utiliza a descrição detalhada de situações, pessoas, interações e comportamentos, citações literais dos discursos das pessoas com relação às suas experiências, atitudes, crenças e pensamentos, trechos de documentos, correspondências ou relatórios de casos para compreender como as pessoas percebem e explicam o mundo onde habitam (PATTON, 1996). Os resultados do estudo qualitativo dependem da interpretação idiográfica, isto é, as compreensões alcançadas no estudo dependem do contexto, do local e do momento em que foram geradas, e devem permitir a compreensão holística do fenômeno. Se, de certa forma, a pesquisa qualitativa perde sua possibilidade de generalização estatística, ganha em compreensão e em profundidade na interpretação de uma situação (CASTRO, 1994). Neste estudo buscou-se compreender as percepções, os sentimentos e as manifestações de alunos da FO-PUCRS e de familiares de pacientes portadores de deficiências do desenvolvimento neuropsicomotor, em relação à Odontologia para pacientes com necessidades especiais. Para alcançar os objetivos propostos e concordando com ENGERS (1999), quando afirma que o comportamento humano não pode ser descrito e compreendido por meio de condições externas e objetiváveis, escolheu-se o paradigma qualitativo. Assim sendo, estabeleceram-se questões norteadoras que visaram, essencialmente, buscar subsídios esclarecedores quanto aos fatores que influenciam essas percepções, sentimentos e manifestações. As informações coletadas por meio das entrevistas foram estudadas pela análise de conteúdo. As manifestações dos entrevistados organizaram-se e agruparam-se em núcleos comuns, obtendo-se, desta forma, uma primeira categorização, a qual foi depurada entre um ir e vir entre releituras das entrevistas e anotações da pesquisadora até a obtenção das categorias finais. É importante explicitar que, inicialmente, a análise dos dados foi direcionada, considerando dois segmentos, o discurso dos familiares e o dos alunos, mas devido à semelhança dos resultados, os segmentos foram agrupados em uma única discussão. As categorias emergentes nesta pesquisa foram agrupadas em três grandes grupos: percepções e sentimentos associados à Odontologia; conhecimento e relação paciente-profissional. Em uma visão geral e conjunta do conteúdo das entrevistas, observa-se que as manifestações tanto de alunos quanto dos familiares dos pacientes são semelhantes aos relatos da literatura. Cabe ressaltar que a maioria dos estudos que constituem o referencial teórico desta pesquisa está sob o olhar do paradigma positivista, sendo escassos os trabalhos realizados dentro do paradigma qualitativo. Na categoria percepções e sentimentos associados à Odontologia incluíram-se insegurança, medo, rejeição, desinteresse e frustração. Quando os familiares dos pacientes foram solicitados a relatar as situações mais destacadas em relação aos serviços odontológicos, procurou-se conhecer como eles percebem a Odontologia e seus sentimentos para com os profissionais; assim, referiram com unanimidade que desde o primeiro encontro os profissionais mostram insegurança, medo e rejeição frente aos pacientes. Alguns exemplos são transcritos a seguir: “Eles não estão preparados para o atendimento ao excepcional [...] quando sabem que a criança tem problemas eles se recusam, porque têm medo [...] parecem inseguros.” (familiar 01). ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 443 “Mesmo pagando, eles atendem com medo.” (familiar 08). “Eles se negam a atender [...] eles não se interessam por essas crianças.” (familiar 13). “Eles nunca se mostraram à vontade com meu filho.” (familiar 15). A insegurança, o medo e a recusa que os familiares dos pacientes percebem nos profissionais são sentimentos que, nesta pesquisa, se relacionaram diretamente ao conhecimento. Portanto, essas categorias, conhecimento, e percepções e sentimentos são discutidas simultaneamente. Há consenso na literatura quanto a essa relação; a falta de oportunidades educativas que motivem, qualifiquem e sensibilizem o aluno, em relação às pessoas com deficiências, resulta em profissionais inseguros, desinteressados e intimidados frente a tais pacientes. Da mesma forma, reconhece-se a importância e a necessidade de práticas clínicas motivadoras durante a Graduação, que preparem o acadêmico para assumir com responsabilidade seu papel como profissional da saúde frente a si mesmo, ao paciente, à sua família e à comunidade (ALBUM, 1990; NUNN; MURRAY, 1988; PRATELLI; GELBIER, 1998; STIEFEL; SHAFFER; BIGELOW, 1981; STIEFEL; TRUELOVE; JOLLY, 1987; ÚDIN; KUSTER, 1986; WALDMAN; PERLMAN; SWERDLOFF, 1998). Entende-se que, além das barreiras sociais e do medo em relação à Odontologia, a falta de conhecimento dos profissionais sobre o paciente com necessidades especiais foi indicada como uma das dificuldades e principal preocupação dos familiares desses pacientes na consecução de serviços odontológicos: “Eu fico com um pé atrás com quem vai atender meu filho, parece que os dentistas não sabem resolver.” (familiar 01). “Eu tenho medo porque eles não sabem lidar.” (familiar 02). Por sua vez, cientes de sua falta de saber, os profissionais evitam esses pacientes ou desenvolvem sentimentos de frustração e desinteresse (ALBUM, 1990; CRESPI; FERGUSON, 1987). Neste sentido, salientou-se que a mínima capacitação na graduação provoca, no momento do atendimento, ansiedade, incerteza e intimidação no profissional (REICHARD; TURNBULL; TURNBULL, 2001). Nesse trabalho, os entrevistados manifestaram sua frustração, declarando que o manejo de pacientes com necessidades especiais representa grandes despesas e poucos ganhos econômicos, profissionais e emocionais; desta forma, os pacientes não recebem o tratamento adequado às suas necessidades ou são encaminhados para outro profissional. A estreita relação entre conhecimento, percepções e sentimentos, também, foram revelados aqui no discurso dos alunos, quando solicitados a definir o que eles consideram um paciente com necessidades especiais e quando relataram suas experiências com os mesmos. Reconheceram ter pouca ou nenhuma experiência nessa área e manifestaram, de forma geral, medo, insegurança, frustração e piedade frente a essas pessoas: “São pacientes que necessitam de um tratamento diferente; recursos diferentes; têm problemas físicos e motores e não te deixam trabalhar.” (aluno 07). ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 444 “Eu atendi um paciente e, pela experiência ruim que tive com ele, depois não consegui mais atender esses pacientes [...] Eu senti pena daquela criança, tomei muito cuidado, senti medo, me senti muito inseguro, isso me causou uma grande frustração.” (aluno 05). “Eu senti muita frustração, senti pena, fiquei irritada, ele não parava de gritar, me deixou muito nervosa, não consegui atender, foi o professor que atendeu.” (aluno 14). Quanto ao conhecimento propriamente dito, os alunos reconheceram suas limitações, mas, em geral, demonstraram desejo de crescimento, demandaram por aulas práticas e, acima de tudo, revelaram seu interesse em aperfeiçoar esse conhecimento para melhorar seu desempenho como profissionais. Considerações como as que seguem foram expressas pelos alunos: “Eu acho pouco nosso conhecimento nessa área. Não sei se sozinha saberia o que fazer com esses pacientes.” (aluno 02). “Falta preparação durante a Graduação; deveria ter uma disciplina específica, com certeza não teríamos tanta dificuldade para atender esses pacientes [...] eu teria interesse em melhorar meu conhecimento tanto na teoria como na prática.” (aluno 04). “Eu acho meu conhecimento um pouco fraco [...] o curso não proporciona o ensino suficiente para atender esses pacientes. Falta uma clínica especifica para atender esses pacientes.” (aluno 03). “Claro que eu gostaria de saber como lidar com esses pacientes [...] no consultório não posso escolher os pacientes [...] gostaria de saber atender pacientes com necessidades especiais.” (aluno13). Entretanto, também, houve manifestações como: “Eu acho que esses pacientes não deveriam ser atendidos pela Graduação [...] não há necessidade de mais conhecimento, só depende da boa vontade do dentista. Eu não gosto desses pacientes.” (aluno 09). Os resultados do presente estudo coincidem com os de outros autores, quando destacaram que ainda são poucas as Faculdades de Odontologia que proporcionam ao aluno o preparo adequado para o atendimento de pacientes com necessidades especiais (DOUGHERTY; ROMER; LEE, 2001; FENTON et al., 2003). A maioria desses programas dedica menos de cinco horas de aula teórica durante a Graduação para discutir sobre deficiências, sendo esse tempo insuficiente para que o estudante desenvolva as habilidades e, a motivação necessárias para o cuidado de tais pacientes. As considerações que seguem confirmam que a ansiedade dos alunos diminui com o contato freqüente dos mesmos com os pacientes: “No início foi muito difícil, porque eu não conseguia me comunicar com eles, mas depois já peguei o jeito e agora é bem legal [...] Eu senti insegurança, eu pensei ‘será que eu vou conseguir?, mas depois tive confiança, conheci os pacientes, agora estou mais tranqüila.” (aluno 12). “Eu acho que deveria ter mais contato com eles.” (aluno 15). ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 445 Assim, a maioria dos autores consultados para este estudo ressaltou a importância de que o aluno tenha a possibilidade de conhecer sobre pessoas com necessidades especiais para que se sensibilize, adquira conhecimento prático e teórico das técnicas de manejo e planejamento do tratamento. Aprenderão dessa forma, a dominar suas ansiedades e incertezas, desenvolvendo, além das características ideais ao profissional, habilidade e confiança. Assim, no futuro será capaz de responder às necessidades de todos os seus pacientes, melhorando a qualidade do cuidado, fortalecendo sua imagem e adicionando satisfação à sua atuação profissional (DELBANCO, 1992; FERGUSON; BERENTSEN; RICHARDSON, 1991; MOFIDI et al. 2003; NUNN; MURRAY, 1988; REICHARD; TURNBULL; TURNBULL, 2001). A experiência prática e, principalmente, a discussão de tais experiências, permitem ao aluno alcançar a competência para prover o cuidado a diversos grupos, desenvolvem empatia, revelam atitudes mais humanas, centrando o desempenho nos valores, nas preferências do paciente, na promoção de saúde e na autoavaliação (MOFIDE et al., 2003). Concorda-se com esses autores quando declararam que a educação baseada na experiência comunitária contribui para o desenvolvimento de atitudes positivas frente a situações complicadas e à compreensão da complexidade humana. Deve-se levar em consideração que devido à falta de conhecimento, também, representada pela insuficiência de bases de dados e de estudos de intervenção clínica, os pacientes não recebem o tratamento apropriado. Torna dessa maneira a Odontologia para pessoas com necessidades especiais um problema de caráter social, exigindo mudanças nas estratégias educativas e políticas que favoreçam tanto a saúde pública quanto o exercício profissional (FENTON et al., 2003; MOURADIAN; CORBIN, 2003). Em relação ao desempenho dos cirurgiões-dentistas, os familiares manifestaram insatisfação de forma geral, destacando o encaminhamento constante e, conseqüentemente, a falta de continuidade e de acompanhamento, interpretando esse comportamento como insensível e discriminatório. As colocações a seguir exemplificam tal afirmação: “Eles dizem que como ela tem dificuldades, ela vai chorar e não vai deixar atender, então eles me encaminham para um dentista e esse para outro, e assim, já fui em seis.” (familiar 06). “Há muito preconceito.” (familiar 08). “Ele atendeu bem, mas só quis atender uma vez, depois recomendou outro dentista e esse não quis atender.” (familiar 10). “Às vezes eles atendem, mas só uma vez, depois eles ficam inseguros e preferem não atender.” (familiar 11). “Eles só atendem pacientes normais, não têm sensibilidade nem paciência.” (familiar 14). “Há muitos dentistas, mas eles não atendem, eu já levei minha filha em dez dentistas e eles fizeram apenas o primeiro exame, depois me encaminharam para outro, e assim vai.” (familiar 15). Neste trabalho, comportamentos dessa natureza, também, foram associados ao conhecimento. Essa declaração, também, foi ratificada, pois, em suas pesquisas, os profissionais sem treinamento no manejo de pessoas com deficiências ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 446 preferiram encaminhar os pacientes a outros colegas, fundamentando esse comportamento na falta de instrução e na habilidade clínica limitada (NUNN; MURRAY, 1988; FRIEDMAN, 1990). Nesta pesquisa, houve consenso entre os alunos entrevistados, que assim se manifestaram: “Por enquanto eu não atenderia esses pacientes no meu consultório. Se tivesse mais embasamento eu atenderia. Eu vou encaminhar esses pacientes.” (aluno 06). “Isso deve ser pensado, esses receio que a gente tem [...] Se o paciente tem um problema muito difícil, deve ser encaminhado.” (aluno 10). “Eu não atenderia esses pacientes, eu não gosto, [...] encaminharia para alguém.” (aluno 11). “Eu daria uma olhada e encaminharia para alguém da Pediatria. Se anestesiam o paciente e ele não fala, não grita, não se mexe, de repente eu atendo.” (aluno15). O encaminhamento dos pacientes está amparado no Código de Ética Odontológica, capítulo II dos Direitos Fundamentais, artigo 3º inciso V, (CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA, 2003, p. 7) versando: “Direito de renunciar ao atendimento do paciente, durante o tratamento, quando da constatação de fatos que, a critério do profissional, prejudiquem o bom relacionamento com o paciente ou o pleno desempenho profissional. Nestes casos tem o profissional o dever de comunicar previamente ao paciente ou seu responsável legal, assegurando-se da continuidade do tratamento e, fornecendo todas as informações necessárias ao cirurgião-dentista que lhe suceder”. Embora encaminhar pacientes para um profissional especializado seja um comportamento contemplado no Código de Ética Odontológica, é importante ressaltar que no discurso de todos os familiares entrevistados neste estudo o encaminhamento constante foi apontado como a principal dificuldade enfrentada na consecução de serviços odontológicos. Tal fato é, também, destacado e causa grande preocupação, segundo os autores consultados para esta pesquisa, pois a maioria busca conhecer os motivos pelos quais os profissionais não atendem esses pacientes. Ao mesmo tempo, demonstram que o escasso conhecimento e o reduzido número de profissionais que tratam pacientes com deficiências, refletem-se no encaminhamento constante, no estado da saúde bucal, além da qualidade de vida dessas pessoas (McPHERSON et al. 1998; PRATELLI; GELBIER, 1998; WALDMAN; PERLMAN; SWERDLOFF, 1998; REICHARD; TURNBULL; TURNBULL, 2001; SCULLY; KUMAR, 2003;). Além disso, o Capítulo III do mesmo Código de Ética Odontológica, artigo 5º, inciso IV, determina como dever profissional: “Manter atualizados os conhecimentos profissionais, técnico-científicos e culturais, necessários ao pleno desempenho do exercício profissional” (CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA, 2003, p. 8). ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 447 Uma vez que o aluno obtenha a qualificação apropriada, espera-se que, no futuro, como profissional atue com responsabilidade e assuma seu papel na sociedade, oferecendo o tratamento adequado para todos os pacientes, evitando conflitos ou preconceitos pessoais (FRIEDMAN, 1990; WALDMAN; PERLMAN; SWERDLOFF, 1998; ROBERTO, 1996). Desta forma, situações como as relatadas neste estudo poderão ser evitadas: “Ele se queixava de dor de dente e não houve quem atendesse ele; ele gritava de dor, fui a um hospital, mas não consegui atendimento; fui a uma dentista particular, mas ela não atendia esse tipo de pacientes, me aconselhou outra e não consegui atendimento [...]” (familiar 04). É importante lembrar que constitui infração ética: ”Deixar de atender paciente que procure cuidados profissionais em caso de urgência, quando não haja outro cirurgião-dentista em condições de fazê-lo” (Código de Ética Odontológica, capítulo V, artigo 7º, inciso VII) (CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA, 2003, p. 11). Todavia, apesar de possuir esse conhecimento, o encaminhamento constante e a recusa podem ocorrer; sendo que, esses comportamentos, amplamente explicados na literatura, podem ser modificados. Diante do desconhecido ou de situações estressantes, as pessoas utilizam mecanismos de defesa para se proteger. Nesse caso, os profissionais utilizam inconscientemente atitudes autoritárias ou argumentos intelectualmente convincentes e aceitáveis para lidar com seus próprios sentimentos de ansiedade frente ao sofrimento e aos riscos de fracasso (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999; DALLY; HARRINGTON, 1978; FREUD, 1986; SOAR FILHO, 1998). Nesta perspectiva, os familiares manifestaram: “Ele apenas me disse: - Olha mãe, eu não atendo teu filho; é um caso muito difícil.” (familiar 13). “Eles não sabem atender e se fazem de bravos e gritam para disfarçar que não sabem.” (familiar 15). Em concordância com TÄHKÄ (1998), durante a graduação o aluno precisa obter as informações suficientes para se conhecer e aprender a manejar suas incertezas. Igualmente, foram apontadas como fundamentais as experiências clínicas que, durante a graduação, proporcionam, além da confiança no manejo dos pacientes, autoconhecimento, ferramenta essencial para dominar a ansiedade e as incertezas em relação aos pacientes (FERGUSON; BERENTSEN; RICHARDSON, 1991). A categoria relação paciente-profissional refere-se à percepção que o paciente-familiar e o profissional possuem um do outro (CHIAPPIN, 1998; HICK, 1999). Os familiares entrevistados, neste estudo, manifestaram dificuldades na interação com o profissional e declararam sua insatisfação: “Os dentistas nem olham para cara da minha filha, não falam com ela, só falam um pouco conosco, como se ela não existisse.” (familiar 02). ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 448 “Eles não conversam, são muito duros, gritam com ela e reclamam que ela não deixa fazer o trabalho.” (familiar 07). “Eu acho que eles não gostam dessas crianças.” (familiar 14). Para o sucesso de qualquer terapia é indispensável que entre o profissional e o paciente exista uma relação baseada na confiança, no respeito e na solidariedade. Tudo isso coincide com determinadas afirmações, no sentido de que uma má relação com o paciente ou com sua família implica na falta de cooperação, piora das condições do paciente e, idéias falsas, tanto a respeito do tratamento quanto da resposta da doença ao mesmo, provocando insatisfação no paciente e induzindo-o a trocar de profissional (LERNER; PEIXOTO; VON EYE, 1983). A eficácia da terapia depende não apenas dos conhecimentos e das habilidades técnicas do profissional, mas também de sua capacidade de estabelecer um vínculo entre si mesmo e o paciente, apoiando, desse modo, os objetivos terapêuticos da melhor forma possível. É fundamental considerar que os pacientes estão geralmente prontos a compreender inclusive grandes dificuldades práticas e imperfeição dos serviços, caso tenham certeza de que os seus sentimentos estão sendo respeitados (TÄHKÄ, 1988). É preciso reconhecer que a família é um fator imprescindível de suporte e colaboração ao tratamento, sendo insubstituível como fonte de segurança e afeto ao paciente, principalmente na interação com àqueles com deficiências. Portanto, a participação da família deve ser valorizada pelos profissionais, fazendo-a aliada e colaborada do processo terapêutico (SOAR FILHO, 1998). Entre os fatores influentes para uma relação adequada com o paciente, foram mencionados o respeito pelos valores, preferências e necessidades do paciente, comunicação e educação, envolvimento da família, suporte emocional e alívio do medo e, da ansiedade, o que significa compreender o sofrimento tanto do paciente quanto da família, assumindo a responsabilidade pela promoção da saúde em todos os níveis (DELBANCO, 1992; CAPRARA; FRANCO, 1999). Os familiares entrevistados neste estudo demonstraram preocupação quanto à relação paciente-família-profissional. Seus discursos coincidiram com determinadas recomendações (ROBERTO et al., 1996; MORAES; ONGARO, 1998), considerando indispensável para essa interação o respeito, a sinceridade, a valorização do paciente, a continuidade do vínculo estabelecido e a inclusão da família no tratamento: “Não por serem excepcionais deixam de ser pessoas.” (familiar 01). “Ele nunca foi reconhecido, sempre foi visto como um bicho.” (familiar 04). “Um dentista que assuma a saúde de meu filho, que fale com a gente e que não tenha medo.” (familiar 15). Por sua vez, os alunos expressaram: “Eu não sabia como conversar com ela.” (aluno 06). “Eu não gosto de atender esses pacientes e não gosto de ficar conversando, explicando ou brincando para que o paciente deixe fazer o tratamento.” (aluno 09). “Esses pacientes são muito esquisitos.” (aluno14). Revela-se, assim, a importância de incentivar o amadurecimento pessoal durante a Graduação e que, além do desenvolvimento cognitivo, o aluno ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 449 adquira e fortaleça as qualidades necessárias à identidade profissional (empatia, continência, escuta, curiosidade, humildade e comunicação) para que no futuro possa estabelecer uma relação adequada com o paciente e, com sua família (BRANCH, 2000; SOAR FILHO, 1998; OSÓRIO; SOAR FILHO, 2003; ZIMMERMAN, 2003). A maior parte das entrevistas dos familiares é redundante na sugestão de aumentar o número de profissionais preparados ou, então, especializados no atendimento de pessoas com deficiências, destacando, também, a necessidade de estratégias políticas que incentivem os profissionais e beneficiem a saúde bucal desses pacientes. “O governo deveria investir mais nesse atendimento: mais dentistas que saibam lidar [...] alguém poderia se interessar por fazer alguma coisa boa tanto para os dentistas como para nossos filhos.” (familiar 02). Tais manifestações coincidem com as afirmações (EDWARDS; MERRY, 2002), que salientaram a necessidade de encontrar caminhos para que a classe odontológica possa assumir a saúde dessas populações, melhorando o acesso e outorgando benefícios ao profissional. Nesse sentido, foi recomendado conceder incentivos econômicos para os profissionais e promover programas educativos que proporcionem o conhecimento apropriado das necessidades e, do comportamento desse grupo (SHENKIN; DAVIS; CORBIN, 2001). Os alunos igualmente ofereceram sugestões e defenderam que os temas relacionados à saúde de pessoas com necessidades especiais deveriam ser mais enfatizados durante o curso: “Deveria ter preparo específico nessa área.” (aluno 05). “Acho que poderia ter aqueles estágios ou pelo menos uma cadeira optativa.” (aluno 07). Reforça-se, assim, a necessidade de inovar a educação odontológica no que diz respeito ao paciente com necessidades especiais, permitindo que o aluno desenvolva as habilidades necessárias ao cuidado dessas pessoas e, contribuir ao avanço do conhecimento, desenvolvendo métodos de ensino e linhas de pesquisa nesta área. Desta forma, pode ser que não aumente o número de profissionais dispostos a cuidar de pacientes com necessidades especiais, mas aqueles interessados terão o conhecimento e a experiência adequados para tal fim (CASAMASSINO; SEALE; RUEHS, 2004). CONSIDERAÇÕES FINAIS Art. 7o São objetivos da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência: I - o acesso, o ingresso e a permanência da pessoa portadora de deficiência em todos os serviços oferecidos à comunidade; ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 450 II - integração das ações dos órgãos e das entidades públicas e privadas nas áreas de saúde, educação, trabalho, transporte, assistência social, edificação pública, previdência social, habitação, cultura, desporto e lazer, visando à prevenção das deficiências, à eliminação de suas múltiplas causas e à inclusão social; III - desenvolvimento de programas setoriais destinados ao atendimento das necessidades especiais da pessoa portadora de deficiência; IV - formação de recursos humanos para atendimento da pessoa portadora de deficiência; V - garantia da efetividade dos programas de prevenção, de atendimento especializado e de inclusão social. Decreto Nacional no. 3.298, de 20 de dezembro de 1999. (BRASIL, 1999). Apesar dos grandes avanços tecnológicos e da existência de sofisticados instrumentos para diagnóstico e terapia que trazem importantes melhorias para a Odontologia, a compreensão das percepções, dos sentimentos e das manifestações dos alunos e dos familiares de pacientes com deficiências indica claramente que o futuro cirurgião-dentista não possui o conhecimento suficiente e adequado para atender às exigências odontológicas das populações vulneráveis, mostrando-se, portanto, perplexo, ansioso ou hesitante na presença de tais pacientes, no que se refere ao relacionamento com os mesmos ou ao seu atendimento. As observações e as reflexões presentes neste estudo, bem como os resultados evidenciados na análise dos discursos dos entrevistados, revelam que do conhecimento prático e teórico dependem o desempenho profissional, a relação com o paciente e os sentimentos que acompanham esta relação. A falta de tal conhecimento lesa o exercício profissional, provoca rejeição do paciente e sentimentos de insegurança e abandono nos familiares deste, com relação aos cirurgiões-dentistas. Reconhece-se que os profissionais da Odontologia devem ser capazes de responder às necessidades de atenção básica primária de todas as pessoas. Contudo, esse reconhecimento supõe a responsabilidade das instituições na formação do cirurgião-dentista, preparando-o de acordo com a realidade, alertando-o para os fatores que podem influir na prática profissional e conscientizando-o do compromisso que tem frente a todos os pacientes. Salienta-se que o aluno preparado, no sentido do saber, comprometese com seu desempenho, assume sua responsabilidade pelo avanço do conhecimento, supre, com qualidade e competência, as necessidades de seus pacientes e sente-se satisfeito com a própria atuação profissional. Portanto, permite-se definir como relevante a construção e a incorporação de conteúdos específicos sobre os pacientes com necessidades especiais nas faculdades de Odontologia. ODONTOLOGIA PARA PACIENTES COM NECESSIDADES ESPECIAIS Percepções, sentimentos e manifestações de alunos e familiares de pacientes. 451 Considera-se importante o estudo da percepção que, neste caso, permitiu a compreensão das necessidades, dos sentimentos e da relação do paciente com o futuro profissional. Além disso, provavelmente, proporcione subsídios para a tomada de decisões quanto ao ensino da Odontologia para pacientes com necessidades especiais. Cabe ressaltar que, ciente deste problema social e ante a necessidade de recursos humanos competentes, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) reconheceu o atendimento a pacientes com necessidades especiais como uma especialidade, concedendo, em um primeiro momento, o título de especialista àqueles profissionais que dedicaram muitos anos de sua profissão a atender tais pacientes. Assim sendo, há um total de 279 especialistas em pacientes especiais no Brasil, dos quais 17 são do Rio Grande do Sul (CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA, 2002). Entretanto, até a realização desta pesquisa, uma disciplina que tratasse especificamente pessoas com necessidades especiais ainda não fazia parte do currículo da Graduação nas faculdades de Odontologia deste estado. Embora a FO-PUCRS não inclua no seu currículo uma disciplina específica para pacientes com necessidades especiais, vem trabalhando nessa direção, proporcionando aos alunos do Curso de Especialização em Odontopediatria, aulas teóricas e práticas. Porém, conforme revelado no discurso dos entrevistados desta pesquisa, essas oportunidades educativas são escassas na Graduação, havendo necessidade de progredir quanto à qualificação do aluno nessa área para o benefício do futuro profissional, do paciente e da sociedade em geral. REFERÊNCIAS ALBUM, M. M. The philosophy of dental care of the handicapped: past, present, and future. Special Care in Dentistry, Chicago, v.10, n. 4, p. 129-132, jul.,/aug., 1990. AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRIC DENTISTRY. Guideline on behavior management. Pediatric dentistry, Chicago, v. 25, n. 7, p. 69-74, 2003a. AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRIC DENTISTRY. Guideline on elective use of conscious sedation, deep sedation and general anesthesia in pediatric dental patients. 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