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Materiais Avançados
Química quântica: moléculas superfrias abrem novos horizontes
Redação do Site Inovação Tecnológica - 24/03/2010
Esta é a primeira imagem de um gás molecular no qual cada molécula foi
levada ao seu mais baixo nível de energia possível. A imagem foi feita
detectando a absorção de um laser pelas moléculas, revelando sua
distribuição espacial e sua densidade. O fato de que é possível fazer uma
imagem destas indica que o gás quântico molecular é denso o suficiente para
permitir a observação das interações entre as moléculas. [Imagem: D.
Wang/JILA]
Um grupo de cientistas, com participação de um brasileiro,
afirma ter feito a primeira observação de reações químicas ocorrendo em
temperaturas criogênicas, perto do zero absoluto.
O feito, descrito na revista Science, demonstra que a química é possível em
temperaturas ultrabaixas e que a velocidade das reações pode ser controlada
com o uso da mecânica quântica, com as regras da física que imperam em
escalas submicroscópicas.
Novos horizontes da química
Os resultados, juntamente com as técnicas utilizadas para fazer as
observações, ajudarão os cientistas entender aspectos até hoje
desconhecidos de como as moléculas interagem - algo com implicações em uma
grande variedade de campos do conhecimento, do entendimento mais básico da
biologia à criação de novos materiais com propriedades não encontradas na
natureza e à produção de energia, apenas para levantar alguns exemplos.
O trabalho também irá ajudar nos estudos dos gases quânticos, nos quais as
partículas se comportam como ondas, e dos exóticos comportamentos da
matéria na fronteira entre o mundo quântico e o mundo macroscópico.
A descoberta dá uma reviravolta no que se acreditava até agora sobre as
interações moleculares. "É perfeitamente razoável esperar que quando você
vai para a região do ultrafrio não haveria como falar de química," diz a
física Deborah Jin, do Instituto Nacional de Padronização e Tecnologia
(NIST). "Nosso artigo diz 'Não, há um monte de química acontecendo'."
"Estamos observando um novo aspecto fundamental da química, que nos dá um
novo 'botão de controle' para compreender e ajustar as reações químicas,"
acrescenta Jun Ye, da Universidade de Colorado e coautor da pesquisa, que
também contou com a participação do brasileiro Marcio H. Gonçalves de
Miranda, físico formado pela Universidade Federal de Pernambuco.
Química quântica
Os cientistas vêm manipulando átomos superfrios há décadas, principalmente
para funcionarem como qubits em computadores quânticos.
Mas moléculas superfrias são algo muito mais recente, ainda que tenham um
potencial de interesse científico e de aplicações práticas muito maior.
Os cientistas sabem há muito tempo como controlar os estados internos das
moléculas, como os seus níveis de energia rotacional e vibracional. Além
disso, o campo da química quântica não é novo, compreendendo os estudos dos
efeitos do comportamento quântico dos elétrons e dos núcleos constituintes
das moléculas.
Mas, até agora, os cientistas foram incapazes de observar as consequências
diretas dos movimentos quânticos das moléculas sobre o processo de reação
química.
Isto agora foi feito criando moléculas simples e submetendo-as a um nível
de refrigeração que as leva quase a uma paralisação total, tornando
possível observar seu comportamento como que em câmera lenta, detectando
fenômenos rápidos ou sutis demais para as técnicas de observação
anteriores.
Efeitos quânticos sobre as reações químicas
Os cientistas foram capazes de observar como os efeitos quânticos da
molécula como um todo determinam sua reatividade. Esta verdadeira janela
para o comportamento molecular permitiu a observação de interações nas
quais é a mecânica quântica que determina se duas moléculas devem se unir
para reagir ou permanecerem separadas.
Desacelerador Stark - enquanto um acelerador de partículas é usado para
elevar as partículas ao seu mais alto nível de energia, um desacelerador
faz o contrário, trazendo as moléculas para algunas dezenas de miliKelvin.
[Imagem: Jun Ye]
Na química convencional, à temperatura ambiente, as moléculas podem colidir
e reagir para formar diferentes compostos, liberando calor. Nos
experimentos ultrafrios reina a mecânica quântica, e as moléculas se
espalham como suaves ondas, em vez de se comportarem como partículas
sólidas.
Eles não colidem no sentido convencional. Ao contrário, conforme suas
propriedades quânticas de onda se sobrepõem, as moléculas "sentem-se" como
se estivessem espaçadas umas das outras a uma distância 100 vezes maior do
que seria de se esperar em condições normais. A esta distância, as
moléculas ou se dispersam ou, se as condições quânticas permitirem, trocam
átomos.
Controle quântico das reações químicas
No prosseguimento das pesquisas, os cientistas esperam ser capazes de
controlar essas interações à distância criando moléculas com estados
internos específicos e ajustando suas energias de reação com campos
elétricos e magnéticos.
Os cientistas também descobriram que, embora as moléculas se movam muito
lentamente em temperaturas criogênicas, as reações podem ocorrer muito
rapidamente.
No entanto, as reações químicas podem ser suprimidas usando a mecânica
quântica. Por exemplo, uma nuvem de moléculas no mais baixo estado
eletrônico, vibracional e rotacional, reage de forma diferente se os spins
nucleares de algumas moléculas forem invertidos.
Se a nuvem de moléculas é dividida numa proporção 50/50 entre dois
diferentes estados de spin nuclear, as reações acontecem de 10 a 100 vezes
mais rapidamente do que se todas as moléculas possuírem o mesmo estado de
spin.
Assim, por meio da purificação do gás de moléculas - ajustando todas as
moléculas para o mesmo estado de spin - os cientistas podem deliberadamente
suprimir reações.
Os cientistas atribuem este comportamento ao fato das moléculas serem
férmions, um dos dois tipos de partículas quânticas encontradas na natureza
- o outro tipo são os bósons.
Dois férmions idênticos não podem ficar no mesmo lugar ao mesmo tempo. Esse
comportamento quântico dos férmions se manifesta como uma supressão da taxa
de reação química no gás superfrio. Ou seja, moléculas com spins nucleares
idênticos são menos suscetíveis de se aproximar umas das outras e reagir do
que as partículas com spins opostos.
Bibliografia:
Quantum-State Controlled Chemical Reactions of Ultracold KRb Molecules
S. Ospelkaus, K.K. Ni, D. Wang, M.H.G. de Miranda, B. Neyenhuis, G.
Quéméner, P.S. Julienne, J.L. Bohn, D.S. Jin, J. Ye
Science
February 2010
Vol.: 327. no. 5967, pp. 853 - 857
DOI: 10.1126/science.1184121