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Principais Fatores Que Geram Rupturas De Vínculos Familiares

Trabalho de Conclusão de Curso

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FACULDADE DA AMAZÔNIA CURSO DE SERVIÇO SOCIAL PRINCIPAIS FATORES QUE GERAM A RUPTURA DOS VÍNCULOS FAMILIARES LETÍCIA DA SILVA SANTOS Vilhena-RO 2015 PRINCIPAIS FATORES QUE GERAM A RUPTURA DOS VÍNCULOS FAMILIARES Trabalho apresentado à FAMA - Faculdade da Amazônia como requisito final para obtenção do Título de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Prof.ª Esp.ª Pricilla de Melo dos Santos Martins. Vilhena-RO 2015 LETÍCIA DA SILVA SANTOS PRINCIPAIS FATORES QUE GERAM A RUPTURA DOS VÍNCULOS FAMILIARES Trabalho de conclusão de curso apresentado a FAMA- Faculdade da Amazônia, como requisito final para obtenção do Título de Bacharel em Serviço Social, julgado e aprovado, obtendo a média ____ atribuída pelos professores examinadores. COMISSÃO EXAMINADORA ________________________________________________ Orientadora ________________________________________________ 1º Membro ________________________________________________ 2º Membro Vilhena-RO 2015 Dedico este trabalho, primeiramente a Deus pelo dom da vida e da sabedoria, a minha família e amigos que me apoiaram e me deram forças para concluir esta longa caminhada. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus que sempre me iluminou nos meu objetivos, me proporcionando fé e sabedoria para enfrentar as dificuldades e vencer as barreiras da vida. Agradeço a minha família em especial minha mãe Sandra, meu pai Leonardo e minhas irmãs Leidiane e Leidneis pelo amor e compreensão que tiveram por mim durante incessante dias de dedicação aos estudos Agradeço as minhas colegas de trabalho que me incentivaram para não desistir dos estudos, em especial a Dona Rosa e a Eliane, que não mediram esforços para me ajudar nos horários de estágio em que me ausentei no trabalho. Também agradeço ao meu patrão Sr. Bruno Boff, que foi compreensivo e cooperou para que meus objetivos fossem alcançados. Não posso deixar de agradecer a todas as minhas colegas e companheiras de faculdade que tanto me incentivaram e me apoiaram. O que dizer de vocês? Que sempre as guardarei no coração e sempre me lembrarei com saudades de todos os momentos que passamos juntas durante esses quatro anos de estudos. Agradeço a minha orientadora Sr.ª. Pricilla, que cooperou para que esse trabalho fosse concluído com sucesso, também deixo meu muito obrigado a todos os meus professores que são ótimos profissionais. E em especial deixo o meu muito obrigado a prof.ª Angelita Martignago Carvalho, pelas dicas e aconselhamentos que me deu durante a elaboração desta monografia. Deixo aqui registrado a minha gratidão às minhas orientadoras de campo de estágio, Gleci Campos e Jackeline Kramer, pelos ensinamentos práticos e saberes profissional, que foi de grande relevância para minha formação acadêmica. Não deixando de agradecer a Faculdade da Amazônia, que oportunizou para mim a janela do ensino superior, que hoje me vislumbro em poder concluir, foi lugar onde aprendi a ter um olhar crítico da realidade, e onde os meus sonhos e projetos de vida puderam se tornar realidade. “Se a aparência e a essência das coisas coincidissem, a ciência seria desnecessária” Karl Marx RESUMO PRINCIPAIS FATORES QUE GERAM A RUPTURA DOS VÍNCULOS FAMILIARES Este estudo tem como principal objetivo conhecer os principais fatores enfrentados pelas famílias que geram a ruptura dos vínculos familiares entre crianças e adolescentes, bem como entender como acontece esse problema na sociedade brasileira. O ponto de partida metodológico consiste em entender a multiplicidade familiar e a relação do sistema capitalista e mundo tecnológico nas mudanças estrutural da família. Conhecer a historicidade da infância e da juventude é crucial para compreender o presente, o texto traz essa abordagem, contextualizando a forma que a criança era vista e tratada pela família e sociedade bem como o andamento das políticas sociais e legislações destinadas a essa parcela da sociedade brasileira. Elenca a profissão de Serviço Social, em seu surgimento e desenvolvimento, passando pelo Movimento de Reconceituação para assim conhecer as demandas deste profissional no campo das políticas sociais, em especial na Política de Assistência Social, abordada aqui como a política de proteção integral da família. A violência intrafamiliar e doméstica como as principais causas de rompimentos dos vínculos familiares, em contrapartida a retração do Estado em assumir sua responsabilidade de proporcionar condições sociais para que a família possa exercer suas obrigações parentais. É partindo dessas questões que este estudo de caráter quantitativo e qualitativo, apoiado em pesquisa teórica, bibliográfica, documental e de campo, tem o propósito de levantar o problema de ruptura de vínculos e estabelecer suas causas e consequências, para isso este trabalho traz em especial os resultados da pesquisa de campo realizada na Casa de Acolhimento Institucional Lar da Criança e do Adolescente do Munícipio de Vilhena/RO. Palavras Chaves: família, criança e adolescente. Vínculos, violência e assistência social. Acolhimento institucional. ABSRACT KEY FACTORS GENERATING BREAK FAMILY TIES This study aims to know the main factors faced by families that generate the breakdown of family ties among children and adolescents, as well as understand how this problem happens in Brazilian society. The methodological starting point is to understand the multiplicity family and the relationship of capitalism and technological world in the family structural changes. Knowing the historicity of childhood and youth is crucial to understand the present, the text brings this approach, contextualizing how the child was seen and treated by family and society as well as the progress of social policies and legislation aimed at this segment of society Brazilian. It lists the profession of social work in its emergence and development, through Reconceptualization Movement order to meet the demands of this professional in the field of social policies, especially in the Social Assistance Policy, discussed here as the full protection of family policy. Intra-family and domestic violence as the main causes of disruptions of family bonds, on the other hand the decline of the state to assume its responsibility to provide social conditions for the family to exercise their parental obligations. It is from these questions that this study of quantitative and qualitative, supported by theoretical research, bibliographical, documentary and field, aims to raise the bonds break problem and establish its causes and consequences, so that this work brings in special the field research results performed on Institutional Home Home Home of Children and Adolescents of the Municipality of Vilhena/RO. Key Words: family, children and adolescents. Bonds, violence and social assistance. Residential care. LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1: Distribuição das pessoas responsáveis pelas famílias únicas e principais em domicílios particulares, segundo o nível de instrução das pessoas responsáveis pelas famílias Brasil – 2000/2010. GRÁFICO 2: Idade e sexo dos acolhidos. GRÁFICO 3: Bairro onde as crianças e adolescentes moravam antes de serem acolhidos. GRÁFICO 4: Tipo de composição familiar. GRÁFICO 5: Situação da residência familiar. GRÁFICO 6: Algum benefício assistencial ou previdenciário recebido pela família. GRÁFICO 7: Reincidência no acolhimento. GRÁFICO 8: Após o desabrigamento da criança e do adolescente à aquém foram entregues? GRÁFICO 9: na vida escolar da criança e do adolescente em situação de acolhimento, houve distorção ou evasão? GRÁFICO 10: Os fatores que geraram a ruptura dos vínculos familiares. LISTAS DE TABELAS TABELA 1: Unidades domésticas em domicílios particulares, por tipo e total de famílias nas unidades domésticas com duas ou mais pessoas com parentesco, segundo a situação do domicilio Brasil, 2010. TABELA 2: Famílias únicas e conviventes principais em domicílios particulares, por classificação, segundo o tipo de composição familiar Brasil, 2010. TABELA 3: Ocupação no mercado de trabalho ou fonte de renda dos pais ou responsáveis pelo acolhido. LISTA DE ABREVITURAS E SIGLAS ABRINQ – Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos CC – Código Civil CF – Constituição Federal CRAS – Centros de Referência de Assistência Social CREAS – Centros de Referência Especializados de Assistência Social DNA – Ácido Desoxirribonucleico ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente FEBEM – Fundação Estadual do Bem Estar do Menor FUNABEM – Fundação Nacional de Bem Estar do Menor IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBRA – Instituto Brasileiro de Reforma Agrária INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social NOB – Normas Operacionais Básicas PIA – Plano Individual de Atendimento PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra e Domicílios PNAS – Política Nacional de Assistência Social PNBEM – Política Nacional de Bem Estar do Menor RIAD – Diretrizes das Nações Unidas para Prevenção da Delinquência Juvenil SAM – Serviço de Assistência ao Menor SUAS – Sistema Único de Assistência Social TCCs – Trabalhos de Conclusão de Cursos UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância VL – Ventre Livre SUMÁRIO RESUMO....................................................................................................................................7 LISTA DE GRÁFICOS ..............................................................................................................9 LISTA DE TABELAS................................................................................................................9 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLA..................................................................................10 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................13 1 CONTEXTUALIZANDO O FOCO: A FAMÍLIA BRASILEIRA E CRIANÇA E ADOLESCENTE EM UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA 1.1 A FAMÍLIA BRASILEIRA EM SUA MULTIPLICIDADE HISTÓRICA ...................................................................................................................................................15 1.2 TIPO DE COMPOSIÇÃO FAMILIAR BRASILEIRA NA ATUALIDADE.....................20 1.3 UMA VISÃO HISTORICA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE................................27 2 O SERVIÇO SOCIAL E A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL .............................................................................................................................................36 2.1 O SERVIÇO SOCIAL E O MOVIMENTO DE RECONCEITUAÇÃO.............................42 2.1.1 O Serviço Social e a Tradição Marxista............................................................................49 2.2 A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL..................................................53 2.3 AS FACETAS DA VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR E A TRÁGEDIA DA RUPTURA DOS VÍNCULOS......................................................................................................................58 3 PESQUISA DE CAMPO REALIZADA NA CASA DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL LAR DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DO MUNICÍPIO DE VILHENA/RO.........................................................................................................................67 3.1 ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL ...............................................................................67 3.2 SITUANDO O MUNICÍPIO DE VILHENA /RO ..............................................................69 3.2.1 Casa de Acolhimento Institucional Lar da Criança e do Adolescente de Vilhena/RO ......70 3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E RESULTADOS DA PESQUISA ...............71 3.3.1 apresentação dos Indicadores ...........................................................................................72 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................................79 REFERÊNCIAS........................................................................................................................82 ANEXO ....................................................................................................................................87 13 INTRODUÇÃO A família representa um espaço privilegiado para o desenvolvimento físico e intelectual de qualquer criança e adolescente, e em seu interior encontra-se o vínculo, este que é considerado como a sustentação da vida familiar. Conforme assevera Sarti (2010, p. 21), falar em família neste começo do século XXI, no Brasil, implica referência à mudanças e a padrões difusos de relacionamento, pois com seus laços esgarçados, tona-se cada vez mais difícil definir os contornos que a delimitam, contudo além de sofrer importantes abalos internos, tem sido alvo de marcantes interferências externas. O presente trabalho busca aprofundar conhecimentos na área da família, buscando sua historicidade e transformações sofridas no contexto familiar, para que seja compreendido o tema: principais fatores que geram rupturas de vínculos familiares. Este estudo buscará compreender, como se manifesta a problemática na vida de crianças e adolescentes, com a intensão de destacar quais são os principais fatores de tais ruptura levando em consideração as expressões da questão social que encontram-se engendradas no cotidiano das famílias. Abordar a problemática familiar em todas as suas dimensões e particularidades constitui-se uma tarefa difícil e complexa, pois da forma como vem se modificando e se estruturando nos últimos tempos, impossibilita identificá-la como um modo único e ideal, pelo contrário, ela se manifesta como um conjunto de trajetórias individuais que se expressam em arranjos diversificados e em espaços e organizações domiciliares peculiares (FERRARI; KALOUSTIAN, 2011, p. 14). Busca-se neste estudo, delimitar os problemas sociais comumente sofrido pelas famílias, e como o Estado tem atuado através das políticas sociais de manutenção e fortalecimento dos vínculos familiares. A família é vista como um grupo privilegiado para oferecer condições de desenvolvimento às crianças, onde incumbi aos pais os deveres de sustentar, ter sob sua guarda e educar. Porém vale ressaltar que é dever do Estado proteger e assistir essa mesma família no adequado exercício de suas funções. Conforme os estudos de Rizzini; et al. (2006, p. 18), na atualidade, ressalta-se as competências da família, mas na prática, com frequência, cobra-se dos pais que dêem conta de criar seus filhos, mesmo que faltem políticas públicas que assegurem condições mínimas de vida digna: emprego, renda, segurança e apoio para aqueles que necessitam. O objetivo central desta pesquisa consiste em conhecer quais são os principais fatores enfrentados pelas famílias que levam a ruptura de sus vínculos, bem como entender como acontece este problema, contextualizado às mudanças estruturais da família e das políticas 14 sociais brasileiras. E tem como objetivos específicos, identificar os tipos de famílias, verificar as legislações e a rede de políticas sociais destinadas a proteção e manutenção dos vínculos familiares, e por fim identificar e pontuar os principais fatores favorecem a ruptura dos vínculos familiares entre crianças e adolescentes em situação de acolhimento institucional. A metodologia utilizada para elaboração deste trabalho, parte primeiramente pela pesquisa bibliográfica, examinando a literatura cientifica produzida sobre o tema abordado. Está revisão bibliográfica foi abordada de forma cuidadosa para que tivesse a compreensão de seu conteúdo, para assim favorecer uma fundamentação teórica sólida do tema. Um segundo procedimento metodológico utilizado, foi a pesquisa de campo realizada na Casa de Acolhimento Institucional Lar da Criança e do Adolescente do Município de Vilhena/RO, com a finalidade de levantar dados pertinentes sobre a questão familiar, social e política dos acolhidos e seus familiares. A pesquisa de campo teve sua natureza qualitativa e quantitativa, foi realizada nas pastas documentais, onde encontra-se toda as informações do acolhido, está pesquisa de caráter documental de levantamento de dados, teve como finalidade reunir informações pertinentes relacionada ao tema em estudo. A presente obra encontra-se estruturada em três capítulos, o primeiro traz uma contextualização da família brasileira e da criança e adolescente em uma perspectiva histórica, esse capitulo possui uma abordagem sistemática das mudanças históricas sociais da família contextualizado no período de antes e após Revolução Industrial, traz também as mudanças éticas-culturais e legislativas na concepção de infância e juventude. O segundo capítulo remete ao conhecimento da profissão de Serviço Social e da Política Pública de Assistência Social, trazendo uma abordagem geral do surgimento da profissão e de seu movimento de Reconceituação, este capítulo também visa abordar a Política de Assistência Social na égide da proteção da família, ainda traz uma discussão da violência intrafamiliar e a tragédia da ruptura dos vínculos. É no terceiro e último capítulo que será tratado o resultado da pesquisa de campo bem como os apontamentos pertinentes aos resultados, neste capítulo encontra-se também uma discrição da instituição de acolhimento institucional pesquisada bem como, as formas que se deve aplicar o acolhimento conforme estabelecido no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Por fim as considerações finais finaliza está produção, com alguns aspectos importantes e situações problematizadas ao longo da obra, destacando algumas sugestões e recomendações. 15 1. CONTEXTUALIZANDO O FOCO: A FAMÍLIA BRASILEIRA E CRIANÇA E ADOLESCENTE EM UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA 1.1 A FAMÍLIA BRASILEIRA EM SUA MULTIPLICIDADE HISTÓRICA Hauaiss (2009, p. 871) define família como um grupo de pessoas vivendo sob o mesmo teto, com ancestralidade comum, ligadas por casamento, filiação ou adoção, unidas por convicções, interesses, provindas de um mesmo lugar ou seja, ligadas por algum vínculo. Ou seja, compreende-se como família, uma associação de pessoas que escolhe conviver por razões afetivas e assume um compromisso de cuidado mútuo para, com crianças, adolescentes e/ou adultos na visão de Szymanski (2002, p.9). Observando os estudos sobre a historicidade da família, é notável que antes do século X não se tem registros do termo família, foi a partir da influência do Estado, que a concepção de linhagem ganha destaque como forma de preocupação com o patrimônio em sua não-divisão. Somente no século XV as crianças do sexo masculino passam a ser educadas em escolas e a família começa a se concentrar em torno delas, garantindo entre outras coisas, a transmissão de conhecimentos de uma geração a outra por meio da participação das crianças na vida dos adultos. No século XVI a situação da mulher é alvo de mudanças caracterizadas pela perda gradativa de seus poderes culminando com a formalização da incapacidade jurídica da mulher casada e a soberania do marido na família, assim a mulher perde o direito de substituir o marido nas situações em que ele se ausenta, sendo que qualquer ato da mulher para efeito legal necessitava da autorização do marido, dessa forma a legislação reforça o poder do marido e dos homens em geral, estabelecendo a desigualdade entre o homem e a mulher (ARIÈS apud GUEIROS, 2002, p. 105: 106). Nesse período os laços de linhagem caracterizado na Idade Média, se enfraquecem, e paralelamente ao fortalecimento do poder do marido, passa-se a valorizar os laços de família, e a partir de então o desenvolvimento da família moderna, nesse contexto acontece a separação entre família e sociedade, ou seja entre público e privado enfatizando a intimidade familiar, que deixa suas marcas principalmente na arquitetura da casa, que passa a ter cômodos com separações enfatizando a privacidade dos indivíduos na própria família, fato esse apontado como uma das maiores mudanças na vida cotidiana da família (ARIÈS apud IDEM, IBIDEM p. 107). A família ao longo do tempo vem se transformando, tomando formas e tipos diferenciados, observa-se que se trata de um grupo de pessoas inserido no processo de abstração 16 de suas vivências em que se constitui palco de diversas expressões de sua objetividade e subjetividade em contexto com a sociedade. Contextualizar a família brasileira remete a atenção em sua multiplicidade étnicacultural, levando em conta os aspectos históricos e culturais da população. O que acarreta controversas desde a fundação da República do Brasil em 1889 que introduziu no país um conjunto de modernizações acompanhado da urbanização e industrialização que incumbiu no fim do trabalho escravo e a urbanização, conforme relatos: Quanto a discussão sobre a formação da nacionalidade da cidadania tinha, enfim, que levar em conta a massa de ex-escravos e de miscigenados de origem africana e indígena. Ou seja, na sua origem, a formação nacional brasileira teria que englobar e amalgamar1 as três raças e como o paradigma científico hegemônico no contexto da Proclamação da República era o racismo de inspiração biologista (o darwinismo social que fundamentava o positivismo e o evolucionismo), tal situação criava um constrangimento (NEDER, 2011, p. 26). Para estudo da família brasileira é necessário partirmos do modelo de família patriarcal de origem ibérica, segundo a ótica do pensamento cristão tomista presente na formação da família patriarcal histórica que justificou a dominação colonial escravista, sendo tomada como civilizadora, ao impor sua ordem e sua solidariedade a uma ordem social que seria, de outra maneira, desorganizada e anômica, sendo as outras organizações familiares possíveis “apêndices” e complementos da estrutura patriarcal (TERUYA, 2000, p. 02). Para tanto, é possível observar que a família patriarcal no Brasil não era o único tipo de organização familiar, existiam outros grupos advindos da própria forma patriarcal formados provavelmente de escravos, miscigenados e indígenas que são grupos de pessoas que já faziam parte da população brasileira desde colônia, e que também se relacionavam formando outros tipos de família. Sobre a forma de organização da família patriarcal Teruya assevera que: O modelo de família patriarcal pode ser descrito em um extenso grupo composto pelo núcleo conjugal e sua prole legítima, ao qual se incorporam parentes, afilhados, agregados, escravos e até mesmo concubinas e bastardo, todos abrigados sob o mesmo domínio na casa grande ou na senzala sob a autoridade do patriarca dono das riquezas, da terra, dos escravos e do mando político. Ainda se caracterizaria por traços tais como: baixa mobilidade social e geográfica alta taxa de fertilidade e manutenção dos laços de parentesco com colaterais e ascendentes tratando-se de um grupo multifuncional (TERUYA, 2000, p. 3: 4). A família tradicional ou patriarcal como o nome já diz, trata-se de um grupo familiar onde a concentração do poder e prestigio encontra-se na figura do patriarca. Estudos históricos têm apontado que existiram algumas diferenciações e particularidades regionais Norte-Sul, 1 Fazer ou sofrer mistura, combinação, fusão; misturar-se, reunir-se, juntar-se (HOUAISS, 2009, p. 108). 17 sendo que no Nordeste a mulher da família patriarcal apresenta o perfil de docilidade e passividade com atividades voltadas para o interior da casa-grande. Já na região do Sul foram encontradas as bandeirantes voltadas ao caráter militar e estratégico da colonização, as mulheres foram convocadas a administrar fazendas e controlar a escravaria na ausência do homem o que aponta um modelo mais ativo do que passivo da mulher, contudo sem perda do caráter subordinado e submisso da mulher na família nem mesmo das características extensivas da estrutura familiar. Em contraponto, outra organização familiar à família de origem africana escravizada, eram vigentes as concepções racistas de não reconhecimento de sua condição humana, relacionado a justificativa de “inumanidade” da pessoa negra, pautado em uma condição pré-humana é a escravidão sendo tachada como uma missão de salvação (NEDER, 2011, p. 29: 30). É evidente que a família patriarcal, foi o tipo de organização familiar inicial no Brasil e que através desta criam-se outras através do processo de emancipação, crescimento urbano e industrial que ocorrem até aos dias de hoje, sendo assim é correto afirmar que o modelo de família patriarcal foi a base de todas as outras. De acordo com Teruya (2000, p.10), quando o Brasil começa a se industrializar após a Revolução Industrial no século XIX, onde o foco da economia deixa de ser no campo para se concretizar na produção fabril, ocorre um grande êxodo rural devido ao processo de modernização e urbanização trazendo uma nova compreensão do modo de vida familiar, ou seja, ao perder sua função produtiva a família se nuclealiza para atender as demandas da sociedade moderna, o grupo tende a se relacionar única e exclusivamente a partir dos laços de afeto mútuo, que segundo a teoria geral da sociedade, a família nuclear combinaria com a sociedade industrial, na medida em que contrasta com a família patriarcal, onde a solidariedade do grupo de parentesco implicava em obrigações extensivas. Este novo modelo de família caracteriza-se pela perda de importância do parentesco extenso, independência econômica dos filhos, acarretando a diminuição da autoridade paterna, verificada também o aumento da participação da mulher no sistema produtivo, natalidade planejada e reduzida. Neste contexto, compreende-se que durante o processo de modernização e industrialização no Brasil, comicamente com a migração, os meios de produção deixam de estar nas mãos das famílias passando para os capitalistas e depois para o Estado, onde se opera em meio dessas distintas relações as exigências do mercado, onde se espera das famílias uma adaptação ao novo processo de produção. Evidencia-se nesse processo, que existe uma maior participação da mulher na dinâmica familiar e social, em que se espera da mulher conhecimento 18 intelectual para desempenhar o papel de mãe e educadora e para desempenhar melhor a função de dona de casa e auxiliar do marido (TERUYA, 2000, p.10). As transformações no tradicional arranjo familiar, ou seja, casal com filhos, assinalam aspectos significativos de mudanças e também de continuidade no relacionamento entre seus membros. Esposas e filhos participam mais intensamente nas atividades do mercado de trabalho e na renda monetária familiar, sendo compartilhado com o chefe (homem) as responsabilidades de manutenção da família, e provendo uma redefinição nos padrões de hierarquia e sociabilidade (GOLDANI, 1994, p. 08). Desde a revolução industrial, que separou o mundo do trabalho do mundo familiar e instituiu a dimensão privada da família, contraposta ao mundo público, mudanças significativas a ela referentes relacionam-se ao impacto do desenvolvimento tecnológico. Mais recentemente, destacam-se as descobertas científicas que resultam em intervenções tecnológicas sobre a reprodução humana (SCAVONE apud SARTI, 2010, p. 21). Com descoberta da pílula anticoncepcional2, que separou a sexualidade da reprodução e interferiu decisivamente na sexualidade feminina, sendo o fato que criou as condições materiais para que a mulher deixasse de ter sua vida e sexualidade atadas à maternidade como um destino, recriou o mundo subjetivo feminino e aliado à expansão do feminismo, ampliando as possibilidades de atuação da mulher no mundo social (SARTI, 2010, p.21). Nesse processo de avanço da tecnologia que interferiu nas organizações e arranjos familiares, demostrou uma crescente queda no número de filhos nas famílias, uma inserção maciça da mulher no mercado de trabalho e também crescente número de famílias chefiadas por mulheres, isso em concordância com estudos de Goldani: A análise das trajetórias de vida familiar das mulheres brasileiras tem mostrado que os efeitos de uma continuada melhoria da mortalidade tem compensado os efeitos das disjunções matrimoniais e da queda da fecundidade, possibilitando que uma proporção cada vez maior de mulheres alcance sua trajetória de vida familiar “preferida”: estarem unidas e com filhos aos 50 anos. Nesta segunda metade do século, o ganho no tempo que uma mulher brasileira alguma vez unida passaria em uma família do tipo conjugal foi de 3 anos. Entretanto, estes ganhos foram ainda maiores de 4 anos no tempo que uma mulher passaria na condição de chefe de família só com filhos. Estes aumentos são diferenciados por raça e mostram que são as mulheres negras as que mais tempo passariam na condição de chefes de família (GOLDANI, 1994, p. 09). 2 Ver Movimento Feminista, começou nas universidades e pequenos círculos, após o lançamento dos livros (A Mulher na Construção do Mundo Futuro e Libertação Sexual da Mulher, de grande impacto na década de 60 e 70, tomando força com a vinda da feminista americana Betty Friedan ao Brasil, para o lançamento do seu livro em português, A Mística Feminina, constitui o evento mais explosivo em relação a discussão pública da condição da mulher no Brasil. Pela primeira vez levanta-se em nosso país, juntamente no período do AI-5, o problema da mulher, vivia-se no Brasil de então a fase hippie que se iniciara no final dos anos 60 (MURARO, 1996, p. 13). 19 Observa-se neste contexto de mudança nos arranjos familiares, acompanhados do desenvolvimento tecnológico que há uma disparidade social existente na sociedade pois os novos modelos de famílias também surgem devido a situação econômica, discriminação e desigualdade social. De acordo com as pesquisas de Goldani (1994, p. 09), a maior proporção de famílias monoparentais em 1989 era entre as mulheres pretas (21%) comparadas com as pardas (18%) e com as brancas (14%) no que vem ao encontro de outros resultados que mostram que as mulheres pretas esperariam viver hoje mais da metade de suas vidas adultas na condição de não casadas ou sem companheiro (56%) comparando-se às pardas (48%) e ás brancas (42%). Para isso, destaca-se os 8 anos a mais de expectativa de vida das mulheres brancas, bem como os padrões diferenciados de nupcialidade por raça. Tal fato revela as diferentes estratégias de comportamento das mulheres ante uma estrutura de oportunidades desigual, em que a discriminação racial aparece como elemento fundamental. A desigualdade social constitui no fenômeno que mais influenciam nas relações familiares de estrutura e convivência pois as famílias pobres dificilmente passam pelos ciclos de desenvolvimento do grupo doméstico, sobretudo pela fase de criação dos filhos sem ruptura, pois implica em alterações muito frequentes nas unidades domésticas. As dificuldades enfrentadas para realização dos papéis familiares no núcleo conjugal, diante de uniões instáveis e empregos incertos, desencadeiam arranjos que envolvem a rede de parentesco como um todo, afim de viabilizar a existência da família, como também a vulnerabilidade da família pobre ajuda a explicar as rupturas conjugais (SARTI, 2010, p. 29). O Projeto Republicano inspirado no positivismo3 de Augusto Comte4 penetrado no Brasil nas últimas décadas do século XIX projetavam as modificações que adquiriam um caráter de modernização, mantendo um padrão de controle político e social excludente, pensava também na organização da família moderna. Sendo que até aos dias atuais, todo o processo de mudança na organização das famílias que acompanha o aburguesamento da sociedade moderna, divórcio, nova parentela oriunda dos filhos de outros casamentos, a exemplo de maior 3 Doutrina de Conte, tenta entender o funcionamento da sociedade capitalista da mesma forma que a Biologia entende o funcionamento de um corpo animal, isto é Durkaheim achava que, ao desenvolver-se, a sociedade ia multiplicando-se, em atividades a serem realizadas; a partir daí, cada indivíduo teria uma função, a cumprir, a qual seria importante para funcionamento de todo o corpo social (MEKSENAS, 2005, p. 67). 4 Conte (1798-1857) este pensador francês lutava para que, em todos os ramos de estudos, se obedecesse à preocupação da máxima objetividade, defendia o ponto de vista de que somente serem válidos as análises das sociedades quando feitas com o verdadeiro espírito cientifico, com objetividade e com ausência de metas preconcebidas, próprias da ciência em geral, nos estudos das relações humanas, estas não deveriam limitar-se penas a analise, mas propor normas de comportamento, seguindo a orientação resumida na famosa formula positivista: “saber para prever, a fim de prover” (LAKATOS, 1999, p. 45). 20 liberalidade dos costumes e da vida sexual, que em seu conjunto, implique em modernidade, recebe a designação de nova família (NEDER, 2011 p.31). 1.2 TIPO DE COMPOSIÇÃO FAMILIAR BRASILEIRA NA ATUALIDADE Na atualidade, o termo nova família se constitui por diferentes modelos e arranjos familiares, não se tratando de algo estático pois a família vem mudando ao longo do tempo e cada vez mais nos deparamos com novas formas de organização familiar. Para tal evidência o Censo Demográfico 2010; Famílias e Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que informou o atual quadro das organizações familiares no Brasil conforme: O questionário utilizado no levantamento de informações abriu a possibilidade identificação dos moradores dos domicílios em relação à pessoa responsável pelo mesmo, possibilitando, por exemplo, identificar cônjuge ou companheiro (a) do mesmo sexo além de desagregar a categoria de filhos em três alternativas (filho da pessoa responsável e cônjuge, filho só da pessoa responsável e filho só do cônjuge), o que representa um avanço na compreensão dos novos arranjos familiares (IBGE, 2010, p. 50). Atualmente as famílias são formadas por diversas tipos sendo difícil de explicitar todos, por exemplo, conforme Nascimento (2006, p. 11) há mães solteiras com seus filhos (monoparental feminina); pais com filhos adotivos (monoparental masculina); famílias formadas por casais que já tiveram outros casamentos com filhos e decidiram ter outros filhos dessa união (família reconstituída ou recompostas); famílias formadas por casal e filhos (nuclear); famílias formadas por duas pessoas do mesmo sexo (família homoafetiva); famílias constituída de apenas uma pessoa (unipessoal). Família matrimonial: decorrente do casamento como ato formal e litúrgico, Família paralela: é aquela que afronta a monogamia, realizada por aquele que possui vínculo matrimonial ou de união estável e um dos integrantes participa como cônjuge de mais de uma família, Família anaparental: é a relação que possui vínculo de parentesco, é o caso de dois irmãos que vivam juntos, entre várias outras (SOUZA, 2009, p. 01: 04). Para melhor compreensão da família contemporânea brasileira é preciso analisarmos os tipos de composições familiares, existentes nas residências brasileiras, bem como as mudanças também na legislação, visto que a Constituição Federal de 1988 institui duas profundas alterações no que se refere à família: a quebra da chefia conjugal masculina, tornando a sociedade conjugal compartilhada em direitos e deveres pelo homem e pela mulher; o fim da diferenciação, entre filhos legítimos e ilegítimos, reiterada pelo Estatuto da Criança e do 21 Adolescente (ECA), que os define como “sujeitos de direitos”. Com o exame de DNA5, que comprova a paternidade, qualquer criança nascida de uniões consensuais ou de casamentos legais pode ter garantidos seus direitos de filiação (SARTI, 2010, p. 24). Tabela 1 – Unidades domésticas em domicílios particulares, por tipo e total de famílias nas unidades domésticas com duas ou mais pessoas com parentesco, segundo a situação do domicilio – Brasil, 2010. Situação do domicílio Total Urbana Rural Unidades Domésticas em Domicílios Particulares Total 2 ou mais 2 ou mais Unipessoal pessoas sem pessoas com parentesco parentesco 57 314 048 49 281 255 8 032 794 6 938 023 6 107 511 830 512 393 843 360 928 32 914 49 982 183 42 812 816 7 169 367 Total de famílias nas unidades domésticas com 2 ou mais pessoas c/ parentesco 54 357 190 46 632 308 7 724 883 Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010. Observamos nesta primeira tabela, que existe uma ampla diferença entre o número de domicílios rurais para urbanos, onde se comprova que houve, ao passar dos anos, desde a revolução industrial, um excedente êxodo rural, influenciando no crescimento das cidades em grande escala, fato que influencia nos modelos e organizações familiares, pois com o desenvolvimento da economia industrial as famílias nuclearizam-se para atender melhor as demandas da sociedade moderna que tende a relacionar única e exclusivamente a partir dos laços de afeto mútuo (TERUYA, 2000, p. 10). É possível observar um grande número de famílias unipessoal constituída por somente uma pessoa, sem perder o caráter familiar nos domicílios urbanos sendo em maior número comparado aos domicílios rurais. Conforme Goldani (1994, p. 12), em 1989 no Brasil existia cerca de 2.697 milhões de pessoas morando sozinhas, tipo de composição familiar unipessoal, sendo que em 2010 esse número saltou para 6.938.023 milhões de unidades unipessoal, o que se entende é que esse tipo de composição familiar vem sendo uma forma alternativa para se viver na sociedade, aos DNA – Ácido desoxirribonucleico é a “impressão digital genética” ou DNA fingerprint é feita com base em certos trechos do DNA cujas sequencias repetidas de nucleotídeos são exclusivas para cada pessoa e transmitidas de pais para filhos, de acordo com a herança mendeliana. Esses códigos são tão exclusivos de um indivíduo quanto suas impressões digitais, não existindo duas pessoas iguais, a não ser gêmeos univitelinos, o exame de DNA, permite confirmar a paternidade com 99,9% de certeza (LOPES; ROSSO, 2005, p. 497). 5 22 padrões do individualismo, competitividade da vida social, buscando um isolamento da família nuclear, observando que seu crescimento é predominantemente urbano. Tabela 2 – Famílias únicas e conviventes principais em domicílios particulares, por classificação, segundo o tipo de composição familiar – Brasil, 2010. Famílias unidas e conviventes principais em domicílios particulares Tipo de composição Classificação Total familiar Total Nuclear básica Nuclear extensa Composta 49 975 934 79,9 18,4 1,7 Casal sem filhos 8.859.442 98,7 - 1,3 Casal sem filhos e com parentes Casal com filhos 1.273.093 - 97,6 2,4 24.690.256 98,8 - 1,2 2.733.478 - 97, 4 2,6 6.093.226 97,5 - 2,1 1.995.399 - 97,5 2,5 881.716 96,5 - 3,5 283.596 - 96,6 3,4 3.165.729 - 96,5 3,5 Casal com filhos e com parentes Monoparental feminina com filhos Monoparental feminina com filhos e com parentes Monoparental masculina com filhos Monoparental masculina com filhos e parentes Outro Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010 Observando a tabela 2 é possível verificar formas variadas de composições familiares na atual conjuntura da sociedade brasileira, destacando-se em maior abrangência a composição casal com filhos que abrange mais de 24 milhões de lares, seguido por casal sem filhos 8,8 milhões de lares, a cada ano se acentua drasticamente a diminuição do número de filhos em todas as camadas sociais, observando ainda que somados as duas formas monoparental feminina com filhos e monoparental feminina com filhos e parentes, constitui em mais de 8 milhões de lares brasileiros, sendo isso possível pela inserção da mulher no mercado de 23 trabalho e que pela ausência do cônjuge ou por qualquer outro motivo a mulher tem assumido a chefia da família. Para Sarti (2010, p. 30), a sobrevivência dos grupos domésticos das mulheres “chefes de família” é possibilitada pela mobilização cotidiana de uma rede familiar que ultrapassa os limites da casa. Tal como acontece, o deslocamento dos papéis masculinos, passam ser também femininos, na impossibilidade de serem atendidos mãe-esposa-dona de casa, são igualmente transferidos para outras mulheres de fora ou de dentro da unidade doméstica. Tendo a mulher que deixar os filhos aos cuidados de parentes ou terceiros sendo assim é mais comum a forma nuclear extensa e composta entre famílias monoparentais feminina comparada as monoparentais masculina. Conforme relatos de Vitale (2010, p. 93), no sistema de trocas intergeracionais, destacase o papel dos avós, que são antigas e novas figuras da constelação familiar de nosso tempo. Os avós aparecem, como personagens-chaves diante das fragilidades conjugais, da recomposição familiar e monoparentalidade, se apresentam tanto como rede de apoio concreta, mesmo para aqueles mais pobres, como laços dentre as gerações que conferem identidade à história familiar. Entender a família contemporânea em um campo complexo e contraditório em que requer atenção especial, é necessário entender que: Embora a família continue sendo objeto de profundas idealizações, a realidade das mudanças em curso abalam de tal maneira o modelo idealizado que se torna difícil sustentar a ideia de um modelo “adequado”. Não se sabe mais, de antemão, o que é adequado ou inadequado relativamente a família. No que se refere às relações conjugais, quem são os parceiros? Que família criaram? Como delimitar a família se as relações entre pais e filhos cada vez menos se resumem ao núcleo conjugal? Como se dão as relações entre irmãos, filhos de casamentos, divórcios, recasamentos de casais em situações tão diferenciadas? Enfim, a família contemporânea comporta uma enorme elasticidade (SARTI, 2010, p. 24). É evidente que a família brasileira está em constante mudança e com isso tem sido difícil entender qual o seu papel na sociedade, tanto quanto a importância de seu caráter afetivo. A afetividade é um meio de penetrar no que há de mais singular na vida social coletiva, pois ela constitui um universo peculiar da configuração subjetiva das relações sociais de dominação (VYGOTSKY apud SAWAIA, 2010, p. 39). Todo ser humano, para seu relacionamento social, se faz necessário a afetividade que é o sentimento, o vínculo necessário para criação e manutenção da família, conforme Sawaia (2010, p.39) “negar ou desprezar a afetividade é nada menos do que negar ou desprezar o homem, sua humanidade, o que é negar a própria vida”. Se tornando campo privilegiado para ação do neoliberalismo e pela pós-modernidade em que corpos e sentimentos são as mercadorias de manipulação comercial e publicitária. 24 Nesse contexto, para compreender a família contemporânea é fundamental analisar o contexto socioeconômico e político capitalista do Brasil, pois são os grandes influenciadores ideológicos da sociedade a qual em um processo de alienação perde sua identidade para responder as exigências dominantes. O neoliberalismo6, caracterizado por um Estado mínimo7, capital volátil, crise de emprego, aumento da miséria, manipulação comercial e publicitária de corpos e sentimentos como causa de sua ação influenciadora, as instituições não mais promovem modelos de identificação e confiabilidade, e o indivíduo está fechado em si mesmo, encastelado e auto absorto em seu narcisismo, pode se lembrar o enaltecimento de paixões mesquinhas e medíocres, que isolam as pessoas, legitimado pelo hino do direito à diferença e pela valorização dos recursos internos e das emoções que levam a pessoa à busca da satisfação num outro que só existe imaginariamente. Nesse contexto o Estado, isentando-se dos deveres de prover os cuidados dos cidadãos, sobrecarrega a família, conclamando-a a ser parceira da escola e das políticas públicas, e a sociedade confusa, na ausência de afetividade, elege-a como o lugar da proteção social e psicológica (SAWAIA, 2010, p. 42:43). Entre as inúmeras obrigações, exigências e responsabilidades direcionadas as famílias é de extrema importância que os pais tenham a companhia de seus filhos, dando a eles a direção, criação e educação sendo que esses deveres compete aos cônjuges em comum, mesmo que separados (BRASIL, C.C 2002, Art. 1. 589). E ainda observando que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade (BRASIL, C.F 1988, Art. 229). Verificamos que a família é de fundamental importância para vida do ser humano, e também são atribuídas a ela inúmeros deveres a serem exercidos dentro do seio familiar, porém no contexto contraditório de sociedade a qual está inserida a família, existem inúmeras barreiras 6 Uma reformulação do liberalismo, alimentado pelas teses de David Ricardo e sobretudo de Adam Smith, que formula a justificativa econômica para a necessária e incessante busca do interesse individual, introduz a tese que vai se cristalizar como um fio condutor de ação do Estado liberal: cada indivíduo agindo em seu próprio interesse econômico, quando atuando junto a uma coletividade de indivíduos, maximiza o bem estar coletivo. É o funcionamento livre e ilimitado do mercado que asseguraria o bem estar, e a “mão invisível” do mercado livre que regula as relações econômicas e sociais e produz o bem comum, caracterizou-se no Brasil por medidas de ajuste na economia, com severas restrições aos gastos públicos em especial na área social e privatizações de empresas e organizações estatais (BEHRING; BOSCHETTI, 2011, p. 56). 7 O Estado é assim considerado, como o “agente principal” que age pela sociedade civil para tornar acessível este mínimo para “proteção” material dos indivíduos. Esta concepção paternalista do Estado se traduz por uma série de medidas para possibilitar a acessibilidade a esse mínimo: eliminação das barreiras geográficas pela descentralização; das barreiras financeiras pelas transferências; e das barreiras técnicas pela racionalização (FALEIROS, 2008, p. 49). 25 que podem impedir o funcionamento do papel da mesma, são as chamadas expressões da questão social que permeiam a sociedade. Gráfico 1 - Distribuição das pessoas responsáveis pelas famílias únicas e principais em domicílios particulares, segundo o nível de instrução das pessoas responsáveis pelas famílias - Brasil 2000/2010 66,10% 50,80% 23,40% 15,50% 12,90% 14,70% 6,30% sem instrução e fundamental completo e ensino médio e superior fundamental incompleto médio incompleto incompleto 2000 10,00% superior 2010 Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000/2010. Podemos visualizar neste gráfico a situação das famílias brasileiras segundo o nível de instrução do responsável provedor da família, em uma comparação com o censo do ano de 2000. Observamos que no ano de 2000 o responsável pela residência era em sua maioria pessoas sem instrução ou fundamental incompleto, constituindo assim 66,1% da população, dez anos depois com o censo de 2010, verificamos uma queda para 50,8%, porém mesmo diante dessa melhora no grau de instrução dos brasileiros, nos deparamos com um país onde mais da metade de sua população não possuem nem mesmo o Ensino Fundamental completo, caso esse que reflete muito no contexto de vida familiar, pois a desigualdade social vivenciada se constitui na principal causa dos problemas familiares. Apenas 10% dos chefes de famílias no Brasil possuem grau de escolaridade superior, o que censo revela, pode ser confirmado na fala de Neder (2011, p. 27), em que o fracasso escolar não pode ser explicadas pela, “desestruturação” ou “irregularidade” da família e sim na incapacidade da política educacional oficial no país de enxergar as diferenças culturais, para então formular estratégias eficazes de educação pública de qualidade. 26 As mudanças que ocorrem no mundo afetam a dinâmica familiar como um todo e de forma particular, cada família conforme sua composição, histórica e pertencimento social, sendo as consequências de uma política monetária ditada pelos países mais ricos, para os países do terceiro mundo ou seja para camadas socioeconômicas com menor poder aquisitivo nos países em desenvolvimento como o Brasil, Índia e argentina. Numa cultura que valoriza o homem como o poderoso provedor da família, é desconcertante a situação em que a mulher, ou mesmos os filhos adolescentes, consigam trabalho e remuneração mais facilmente do que o “chefe” da família (SZYMANSKI, 2002 p. 17:18). A vulnerabilidade da família pobre ajuda a explicar a frequência de rupturas conjugais, diante de tantas expectativas não cumpridas. Dada a configuração das relações de gênero, o homem se sente fracassado e a mulher vê rolar por água abaixo suas chances de ter alguma coisa através do projeto do casamento. O lugar central do homem na família, como trabalhador, provedor, torna-o também vulnerável, porque o faz dependente de condições externas cujas determinações escapam a seu controle (SARTI, 2010 p. 29). Nesse contexto a pobreza que se faz presente na vida da maioria das famílias brasileiras é a responsável pelas perdas e rupturas de vínculos entre pais e filhos gerando também uma reprodução dos problemas sociais que estão dentro das famílias mas provenientes do sistema desigual promovido pelo capitalismo e agravado pelo projeto neoliberal com suas políticas sociais focalizadas8 e assistencialistas9 e na fuga de suas responsabilidades, acabando assim por sobrecarregar as famílias. A pobreza é fundamentalmente uma experiência humana frustrada, uma deteriorada qualidade de vida. Não seria, somente, uma determinada relação destas consigo mesmas, com os outros e com o ambiente psicológico, social e ecológico (AMAT et al. apud TAKASHIMA, 2011 p. 79). Compreendendo a família como instituição indispensável para o ser humano e que essa em sua maioria é bombardeada pelas desigualdades sociais, sendo necessário a família pobre buscar estratégias para sobrevivência e manutenção de seus laços de afeto, sendo assim: A convivência familiar entre os pobres é garantida a duras penas como estratégias indispensável à sobrevivência material e afetiva, a família nuclear é quase subsumida 8 As possibilidades preventivas e até eventualmente redistributivas tornam-se mais limitadas, prevalecendo o referido trinômio articulado do ideário neoliberal para as políticas sociais, qual seja: a privatização, a focalização e a descentralização (BEHRING; BOSCHETTI, 2011, p. 156). 9 Não podemos esquecer que por sua vinculação histórica com o trabalho filantrópico, voluntário e solidário a Assistência Social brasileira carrega uma pesada herança assistencialista que se consubstanciou a partir da “matriz o favor do apadrinhamento, do clientelismo e do mando, formas enraizadas na cultura política do país, sobretudo no trato com as classes subalternas” (YAZBEK apud YAZBEK, 2008, p. 81). 27 pela família ampla, formada por conterrâneos. A solidariedade conterrânea e parental é condição primeira para a sobrevivência e a existência de famílias em situação de pobreza e discriminação. Pode se dizer que vivem em comunidades cuja identidade é marcada pela carência, sangue e terra natal (CARVALHO, 2011 p. 96: 97). Conforme os estudos de Carvalho (2011, p. 97: 98), as famílias empobrecidas criam formas e estratégicas para sobreviverem na sociedade destacando a solidariedade conterrânea e parental que é expressa através dos empréstimos para pagar uma prestação, uma conta de luz ou água com alguém que tome conta das crianças em uma emergência; solidariedade apadrinhada um fator importante de uma dependência estratégica. Este vínculo assegura um canal de doação de roupas, remédios, eletrodomésticos, fundamental na composição do consumo das famílias em situação de pobreza; solidariedade missionária é um terceiro componente nesta difícil e precária sobrevivência das famílias empobrecidas, a igreja é sempre uma porta que acalenta a esperança, através de seus programas pastorais, representando um suporte espiritual, mas especialmente um suporte emocional, afetivo e material. É a escola para aprender a viver na cidade, um canal de convivência a partir do culto, um espaço de lazer, de cura dos doentes e de uma assistência social que mesmo paliativa é próxima e mais acessível. A condição de pobreza crescente acarreta a utilização de novas estratégias para lidar com a mesma, que são, por sua vez, atravessadas por fatores como as relações de gênero e geração que modificam os referenciais de sociabilidade atualmente presente entre as populações mais pobres urbanas (GUIMARÃES apud SZYMANSKI 2002, p. 20). A família brasileira carece de mais atenção do Estado e reconhecimento como instituição primordial para o desenvolvimento humano, e resultados de políticas sociais eficazes no enfrentamento da pobreza e desigualdades sociais, que como vimos é o causador das rupturas dos vínculos familiares através dos vários fatores sociais que ocorrem no interior da família causados pela constante luta pela sobrevivência. Pensar a família como uma realidade que se constitui pelo discurso sobre si própria, internalizado pelos sujeitos, é uma forma de buscar uma definição que não se antecipe à sua própria realidade, mas que nos permita pensar como ela constrói, sua noção de si, supondo evidentemente que isto se faz em cultura, dentro, portanto, dos parâmetros coletivos do tempo e do espaço em que vivemos, que ordenam as relações de parentesco entre irmãos, pais e filhos, marido e mulher entre outros. Sabemos que não há realidade humana exterior à cultura, uma vez que seres humanos se constituem em cultura (SARTI, 2010 p. 27). 1.3 UMA VISÃO HISTÓRICA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 28 No que revela Aríes (2014, p. 17;18), até meados do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la, não por ausência de habilidade ou incompetência, sendo mais provável que não houvesse lugar na infância nesse mundo, até o fim do século XIII não existia crianças caracterizadas por uma expressão particular e sim homens de tamanho reduzido, a recusa em aceitar na arte a morfologia infantil é encontrada na maioria das civilizações arcaicas. Partimos de uma noção de mundo onde a infância não é reconhecida, a criança no interior da família não é vista como uma composição da família, e sim como um ser em processo de transição para vida adulta e que logo seria ultrapassado, em que está fase de desenvolvimento pouco importava pois suas lembranças eram logo perdidas. No século XVI nas categorias escolarizadas em que se observaram mais cedo hábitos de precisão moderna, as crianças sem dúvidas sabiam sua idade, porém um habito curioso de boas maneiras obrigava-as a não confessa- lá claramente e responder com certas reservas. Na Idade Média os tratados pseudocientíficos as idades da vida, seus autores empregavam uma terminologia puramente verbal: infância e puerilidade, juventude e adolescência, velhice e sensibilidade, cada uma dessas palavras designando um período da vida, nesses textos, as idades correspondem aos planetas, em número de sete (ARÍES, 2014 p. 6). A primeira idade é a infância que planta os dentes e essa idade começa quando a criança nasce e dura até os sete anos, nessa idade aquilo que nasce é chamado de enfant (criança), que quer dizer não falante pois nessa idade a pessoa não pode falar bem, pois ainda não tem seus dentes bem ordenados nem firmes; após a infância, vem a segunda idade, chama-se pueritia (infância), chamada assim porque nessa idade a pessoa é ainda como a menina do olho, essa idade dura até os 14 anos; depois segue-se a terceira idade, que é chamada de adolescência, que termina segundo estudos no vigésimo primeiro ano, podendo se estender até aos 35 anos, chamado adolescência pois a pessoa já é bastante grande para procriar, nesta idade os membros são moles e aptos a crescer e receber força e vigor do calor natural, por isso à pessoa cresce nessa idade toda a grandeza que lhe é devida pela natureza (IDEM, IBIDEM). Segue após a juventude, que está no meio das idades, embora a pessoa esteja na plenitude de suas forças essa idade dura até 45 ou até 50 anos, é chamada de juventude devido à força que está na pessoa, para ajudar a si mesma e aos outros; a senectude (gravidade) que está no meio caminho entre a juventude e a velhice, chama assim porque a pessoa nessa idade é grave nos costumes e nas maneiras, não sendo velha, mas passou a juventude; por fim segue a velhice, que dura segundo alguns até 70 anos, ou não tem fim até a morte, é assim chamada porque as pessoas velhas já não têm os sentidos tão bons como já tiveram e caducam em sua velhice (IDEM, IBIDEM p.7). 29 É possível observar que os estudos sobre a vida na Idade média eram bastante vazias de conhecimentos científicos, levadas pelas vivencias do cotidiano empírico das pessoas, porém segundo o autor ela tinha total importância aos seus leitores, pois nesse contexto de astrologia dava sentido ao laço que unia o destino do homem aos planetas. As condições demográficas do século XIII ao XVII, a mortalidade infantil era muito elevada, onde as crianças mortas muito cedo eram enterradas no quintal de casa sem nenhuma significância, como hoje enterramos um animal doméstico, em razão desse fato explica Aríes: Embora a mortalidade infantil se tenha mantido num nível muito elevado, uma nova sensibilidade atribui a esses seres frágeis e ameaçados uma particularidade que antes ninguém se importava em reconhecer: foi como se a consciência comum só então descobrisse que a alma da criança também era imortal, é certo que essa importância dada à personalidade da criança se ligava a uma cristianização mais profunda dos costumes (ARÌES, 2014 p. 25). Ou seja não se acreditava que a alma das crianças era imortal, ou até mesmo se pensava que não possuíam, segundo o autor essa concepção só é mudada após uma conscientização mais profunda do cristianismo, como se a consciência só então descobrisse que a alma da criança também era imortal, a partir disso a criança passa ser pouco a pouco mais valorizada no seio familiar. Segundo os estudos de Aríes (2010, p. 105), surgiu ainda na Idade Média, duas formas de sentimentos da infância, sendo o primeiro caracterizado pela “paparicação” iniciou no meio familiar na companhia das crianças pequenas. A segunda forma de sentimento, proveio de uma fonte exterior à família, dos eclesiásticos ou dos homens da lei, sendo esses raros até o século XVI, porém de maior número de moralista no século XVII, preocupados com a disciplina e a racionalidade dos costumes, esses moralistas tornaram sensíveis ao fenômeno de negligência da infância, recusavam-se a considerar as crianças como brinquedos encantadores, pois viam nelas frágeis criaturas de Deus que era preciso simultaneamente preserva-las e disciplina-las, sentimento esse que passou a ocupar também espaço na vida familiar. No século XVIII, é encontrado um novo elemento no que diz respeito ao trato com a infância, surge a preocupação com a higiene e saúde física, os cuidados com o corpo, tratava-se dos docentes com dedicação, porém não havia interesse pelo corpo dos que desfrutavam de boa saúde, a não ser com o objetivo moral, no que dizia “um corpo mal cuidado inclinava à moleza, à preguiça, à concupiscência, à todos os vícios. No que se refere a historicidade da política escolar destinada as crianças e adolescentes nessa época somente aos do sexo masculino, a qual nos revela um total descaso com o desenvolvimento intelectual dos infantes, observados nos estudos de Aríes. 30 No século XIII, os colégios eram fundados por doadores, funcionavam como asilos para estudantes pobres como bolsistas viviam em comunidades que se inspiravam em regras monásticas, a partir do século XV, essas pequenas comunidades democráticas tornaram-se institutos de ensino. No início a política escolar que eliminava as crianças muito pequenas, independente de seus dotes, que recusando a entrada na escola, ou como era mais comum concentrando-as nas classes mais baixas, ou ainda fazendo com que repetissem de ano, implicava um sentimento novo de distinção entre uma primeira infância mais longa e a infância propriamente escolástica, até o meio do século XVII, tendia-se a considerar como termino da primeira infância idade de 5 a 6 anos, era quando o menino deixava sua mãe, sua ama ou suas criadas, aos sete anos ele poderia entrar para o colégio, mais tarde essa idade é retardada para 9 a 10 anos, portanto eram as crianças de até 10 anos que eram mantidas fora do colégio. O sentimento expresso para justificar a necessidade de retardar a entrada no colégio era a fraqueza, “a imbecilidade”, ou a incapacidade dos pequeninos (ARÍES, 2014 p. 110: 114). A criança é nova e em formação, vivendo em um mundo que lhe é estranho e que também está em formação, como um ser humano em formação, ela não difere de outras formas vivas, mas é nova em relação ao um mundo que existia antes dela e que continuará após sua morte e no qual transcorrerá a sua vida. Se a criança fosse um animal, a educação se preocuparia apenas em habilitá-la a preservar sua vida, entretanto não é esse o caso, os pais ao educarem seus filhos, assumem a responsabilidade pela vida destes tanto como pela continuidade do mundo. Nesse pensamento é possível compreender a importância da criança, bem como a responsabilidade dos pais para com elas (ARENDT apud SZYMANSKI, 2010, p. 57). Analisando o exposto até aqui, verificamos a incapacidade da sociedade da época em reconhecer a criança e ao adolescente como seres humanos em desenvolvimento, dependentes de cuidados e afeto, que tem necessidades a ser supridas em cada momento de suas vidas, porém o que verificamos, é que a sociedade pouco se importava com a infância, em função disso a criança também não tinha espaço na família, pois segundo estudos a infância era conhecida somente como uma fase de transição e logo seria esquecida. Nas palavras de Szymanski (2010, p. 53: 54), a mudança de atitude em relação à criança, no sentido de considerá-la em sua individualidade, ocorre simultaneamente às mudanças culturais associadas à emergência de uma vida urbana mais intensa, no decorrer de um período de tempo que tem início no século XV. Os textos históricos mostram claramente como as práticas de nutrição, de cuidados e de educação estiveram sempre atreladas à noção predominante da infância, portanto ora a expressão de afeto era desejável, ora não; ora se propunha uma educação privada, ora esta era considerada trágica. A passagem da família-tronco (linhagem), para a família nuclear, ao longo da renascença, traz consequências diretas para as crianças, para integrá-las na comunidade por meio de uma educação escolar como indivíduo de 31 direito na sociedade, demostra o início de um processo que somente se consolidou na contemporaneidade. No Brasil durante o século XVII, assevera Poletto (2012, p. 02) que o alto número de crianças abandonadas nas portas das casas, igrejas e nas ruas, tornou-se um problema, e sob os moldes de atendimento ditados pela Corte que passava essa responsabilidade a Igreja, destacase nesse período o papel das Santas Casas de Misericórdias, instituição voltada a caridade e tratamentos de saúde, a função destas se tornaram muito importante nos cuidados das crianças abandonadas. No império, as Casas de Misericórdias passam a estar a serviço e sob o controle do estado, pelo fato de ter vivenciado drásticas e constantes dificuldades materiais, época que acabou sendo instituído um segundo sistema de proteção, a Roda dos Expostos, Casa dos Expostos e o recolhimento para meninas pobres, quase sempre resultante de convênios firmados entre as municipalidades e as Santas Casas de Misericórdia (MARCÌLIO apud POLETTO, 2012, p. 02). A legislação no período imperial gravitou em torno do recolhimento de crianças órfãs e abandonadas por meio de medidas assistenciais privadas e de cunho religioso e, no início da República, estabeleceram-se, gradativamente, as bases para a organização da assistência à infância, o que resulta no primeiro Código Penal da República, em 1890, marcando o início de um debate entre os defensores da educação em detrimento do predomínio da punição (PEREZ; PASSONE, 2010, p. 654). O Código Criminal de 1830, constitui no primeiro conjunto de leis a mencionar a inimputabilidade penal para menores de quatorze anos, porém essas leis não se aplicava aos escravos, pois para estes não existia legislação. Na época da escravidão o destino das crianças que sobreviviam da decorrência de diversos fatores, como os abortos por maus tratos das escravas gravidas, a alta mortalidade infantil, em virtude das péssimas condições de cativeiros, bem como os infanticídios praticados pelas mães como forma de livrar seus filhos da escravidão, sofriam humilhações, maus tratos e abusos sexuais, e, no entanto não havia muitas crianças escravas abandonadas, uma vez que sua sina estava traçada como propriedade individual, patrimônio e mão-de-obra (FALEIROS apud POLETTO, 2012, p. 2). A situação das crianças escravas, ocorrem mudanças tímidas somente, com a Lei N° 2040/71 do Ventre Livre que declara em seu Art. 1º “os filhos da mulher escrava que nascessem no Império desde a data desta lei, serão considerados na condição de livre” ainda explica como deveria ser formalizada esta lei, conforme o §1 “os ditos filhos menores ficarão em poder e sob a autoridade do senhores de suas mães, os quais terão obrigação de cria-los e tratá-los até a idade de oito anos completos, chegando a esta idade, o senhor da mãe terá a opção, de receber 32 do Estado uma indenização de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos”, é observado que a criança escrava era vista como mercadoria, moeda de troca e que mesmo após está lei, permaneceu sobre o regime de escravidão pois continuariam a exploração, devendo este permanecer sobre o domínio do senhor até os 21 anos, e nos casos de serem entregues ao Estado mediante o recebimento de indenização, explica o Art. 2° “o governo poderá entregar à associações por ele autorizados os filhos das escravas, nascidos desde a data desta lei, que sejam cedidos ou abandonados pelos senhores delas, ou tirados do poder destes. Estas instituições terão o direito aos serviços gratuitos dos menores até a idade de 21 anos, desde que os criem”, está lei nem mesmo consegue enxergar o que seria liberdade a essas crianças e jovens (BRASIL, V. L. 1871, p. 1; 2). Com a promulgação da Lei Áurea em 1971, o Brasil passa por rápidas e importantes transformações decorrentes da urbanização. Nisso os higienistas se destacam trazendo conhecimentos médicos sobre higiene, controle e prevenção de doenças infectocontagiosas, esse tipo de trabalho também era voltado as crianças pobres, delineando atos de aconselhamentos e punição às ações que infringiam essas regras de higienização. Uma mentalidade filantrópica médico-higienista, assumindo um ideal positivista de ordem e progresso, se fazendo necessário a instalação de instituições para atendimento dos carentes, visando fornecer educação e capacitação profissional dos jovens, com a intenção de prevenir a “delinquência” juvenil (POLETTO, 2012, p. 04). De acordo com os estudos de Poletto (2012, p. 5), no ano de 1923, através do Decreto 16. 271 foi criado o primeiro Juízo de Menores do Brasil e, após um ano foi regulamentado o Conselho de Assistência e Proteção dos Menores, e consolidado no ano de 1927 através do Código de Menores, esse que trouxe o início do atendimento às crianças e aos adolescentes através de uma política especifica, onde utilizava para os adolescentes infratores o internato, o perdão cumulado com advertência e a liberdade vigiada. Também conhecido como Código Mello Mattos, daria base legal a toda e qualquer ação referente a menores abandonados, delinquentes ou em situação de riscos, deixando claro a condição do Estado protecionista, onde liga a situação do menor pobre com a criminalidade, buscando afastar dos olhos da sociedade os menores que pudessem pela sua situação de miséria, tornar-se criminosos, concretizando um vínculo entre assistência social e justiça. A Constituição de 1937, ampliou o âmbito da proteção à infância e colocou a assistência nos casos de carência do menor a encargo do Estado, assim em 1942, foi oferecido a esfera da criança e do adolescente o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), que poderia ser equiparado a um sistema penitenciário voltado ao menor de idade, na forma de reformatórios, casas de 33 correção, e aos menores abandonados patronatos agrícolas e escolas de aprendizagem de ofícios urbanos. Já no final da ditadura do Estado Novo, é criada a Constituição de 1946, que manteve os mesmos cuidados com o menor da constituição passada, o que realmente sofre alteração é o pensamento da sociedade, a qual buscava a implantação de uma política social, porém seus ideais foram destruídos pelo Regime Militar de 1964 (CURY; SILVA; MENDES apud OTENIO; OTENIO; MARIANO, 2008, p. 05). Também em 1964 é formulada a Lei 4. 513, a Política Nacional de Bem Estar do Menor (PNBEM), uma política assistencialista que visava a padronização das ações sobre o menor através de órgãos executores, uniformes em conteúdo, método e gestão, sendo como órgão nacional responsável pela aplicação desta política a Fundação Nacional de Bem Estar do Menor (FUNABEM), que subdividiu a nível estadual nas Fundações Estaduais do Bem Estar do Menor (FEBEM), com a ideia de retirar o caráter correcional-repressivo, aplicado no antigo SAM, entretanto herdando sua estrutura física, equipamentos e pessoal de trabalho, o que resultou apenas na modificação do nome do projeto, pois o modelo era o mesmo (MACHADO apud OTENIO; OTENIO; MARIANO, 2008, p. 05). De acordo com Roberti, (2012, p. 9) a Lei 6.697 de 1979 novo Código dos Menores, era voltado para a assistência, proteção e vigilância, fundamentado na doutrina da situação irregular do menor, da visão autoritária e repressiva do Regime Militar, via a pobreza como caso de polícia e não de política. A situação irregular era direcionada às crianças pobres que passavam a ser objeto de intervenção do sistema de administração da Justiça de Menores e, incorporava tanto o menor pobre, vítima de maus tratos quanto o menor causador de ato infracional, tinha um caráter visivelmente assistencialista e com a responsabilidade voltada ao Juiz que tinha que decidir, em nome da criança e do adolescente, o que seria melhor para ele (POLETTO, 2012, p. 7). Nas informações de Perez e Passone (2010, p. 663), a partir de 1980, a crescente organização da sociedade contra a ditadura e em favor da liberdade e da democracia, levou à redemocratização da sociedade e do Estado brasileiro, reconquistando-se os direitos de expressão individual e coletiva de organização popular e partidária, de greve, e voto, culminando nas mobilizações sociais de 1984/1985 que reivindicavam as eleições diretas para presidência da república, campanha denominada “Diretas Já”. Com a redemocratização, no ano de 1985, Tancredo Neves, foi eleito presidente do Brasil, através de um colégio eleitoral, porém antes de assumir morre e quem assumiu a presidência foi José Sarney, o qual teve como primeira medida a reunião da Assembleia Constituinte, para elaboração de uma nova constituição, 34 decretando após dezoito meses de deliberações, no dia 05 de novembro de 1988 a então Constituição Federal do Brasil também conhecida como Constituição Cidadã. A qual em seu Art. 227, trata sobre a proteção integral da criança e do adolescente. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, CF, 1998, p. 130). Consolidada a democracia no Brasil, começam a ser articulados alguns movimentos por uma legislação especial para as crianças e os adolescentes, para que sejam tratados como cidadãos de direitos. Podemos citar as campanhas de maior efeito, A Criança Constituinte e a Criança Prioridade Absoluta, movimentos esses que contribuíram para a formulação da política destinada as crianças e adolescentes o ECA. Em 1990, foram promulgadas as Diretrizes de RIAD, que tratava em especial da prevenção da delinquência juvenil, como parte da prevenção do crime na sociedade, ao incluírem em atividades lícitas, úteis, adaptando uma orientação humanista em relação a sociedade e a vida. Considerando que os jovens devem ter um papel ativo e colaborante dentro da sociedade, e não devem ser considerados como meros objetos de medidas de socialização e controle. No processo de socialização deve ser adotada importância especial às políticas preventivas que facilitem uma socialização e integração bem sucedida de todas as crianças e jovens, em especial através da família e comunidade em geral, essas e outras orientações para com a criança e adolescente, constitui no documento de grande impacto para construção de uma política especial destinada as crianças e adolescentes no Brasil (UNICEF, RIAD, 1990, p. 03: 04). Com base nas Diretrizes de RIAD, foi promulgada a Lei 8.069 de 13 de julho de 1990 Estatuto da Criança e do adolescente (ECA), que substitui por completo todas as legislações anteriores destinadas as crianças e adolescentes. O ECA, tem como objetivo principal definir os direitos e os deveres das crianças e dos adolescentes, bem como legalizar a situação dessa parcela da sociedade, vista agora como ser humano em desenvolvimento, conforme em seu Art. 3º. A criança e ao adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (BRASIL, ECA, 1990 p.19). E ainda conforme seu Art. 4º que: 35 É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (IDEM, IBIDEM). Nas palavras de Ferrari e Kaloustian (2011, p.11;12), esclarece que a família é o espaço indispensável para a garantia da sobrevivência de desenvolvimento e da proteção integral dos filhos e demais membros, independente do arranjo familiar ou da forma como vem se estruturando, é ela que propicia os aportes afetivos e sobretudo materiais necessários ao desenvolvimento e bem-estar dos seus componentes, é em seu espaço que são absorvidos os valores éticos e humanitários, sendo também em seu interior onde se constroem as marcas entre as gerações e onde são observados valores culturais. A família enquanto forma especifica de agregação tem sua dinâmica de vida própria, afetada pelo processo de desenvolvimento socioeconômico e pelo impacto da ação do Estado através de suas políticas econômicas e sociais, sendo assim ela demanda de políticas e programas eficazes que deem conta da manutenção de seu espaço doméstico, a situação das famílias é também afetada por problemas sociais de natureza diversa, tais como atentados aos direitos humanos, exploração e abuso, barreiras econômicas, sociais, e culturais ao desenvolvimento integral de seus membros. Nessa visão se torna impossível para a família cumprir com suas obrigações no que refere-se o ECA, sem que o Estado cumpra primeiramente com o que cabe a ele. 36 2. O SERVIÇO SOCIAL E A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL A profissão de Serviço Social, afirma-se como um tipo de especialização do trabalho coletivo, ao ser expressão de necessidades sociais derivadas da prática histórica das classes sociais no ato de produzir e reproduzir os meios de vida e de trabalho de forma social determinada. O desenvolvimento das forças produtivas e as relações sociais engendradas nesse processo determinam novas necessidades sociais e novos impasses que passam a exigir profissionais especialmente qualificados para seu atendimento, segundo os parâmetros de racionalidade e eficiência inerentes a sociedade capitalista. (IAMAMOTO; CARVALHO, 2003, p. 76: 77). Este capítulo tem a finalidade de apresentar fatos históricos que influenciaram a profissionalização do Serviço Social, até aos dias atuais. Bem como definir a forma organizacional da Política de Assistência Social, descrevendo suas principais características, afim de localizar suas contradições e conflitos diante da garantia de direitos, visto que tal política é de fundamental importância diante dos programas de abrigamento, proteção e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários entre crianças e adolescentes, principal objeto deste trabalho. A partir da Revolução Industrial, Iamamoto; Carvalho (2003, p. 127) relatam que a questão social assume uma nova qualidade nos grandes centros Urbano-industriais, derivado do alto crescimento do proletariado, da solidificação dos laços de solidariedade política e ideológica que formou como base para construção e possibilidade objetiva e subjetiva de um projeto alternativo à dominação burguesa. De tal forma é visto que é de interesse burguês manter a ordem social, bem como a dominação do proletariado que crescia velozmente. A implantação do Serviço Social ocorre nesse processo histórico, surge da iniciativa particular de grupos e frações da sociedade de classe, que se manifestam por intermédio da Igreja Católica com o recrutamento e formação de agentes sociais, sendo assim a origem do Serviço Social tem sua legitimação apenas a grupos e frações restritos das classes dominantes, com ações pautadas na imposição. Ou seja desde de que existem pobres; a gente que se preocupa com eles; mas a partir do surgimento da sociedade capitalista, quando o lucro deixou de ser pecado ou imoralidade, que a preocupação com as “classes despossuídas” e os problemas sociais e políticos que está população poderia criar, tornou-se uma necessidade de defesa da burguesia recém-chegada ao poder, contudo são articuladas formas de assistencialismo a essas pessoas onde Igrejas e Estado vão dividir tarefas, ressalva-se que toda a assistência social é feita de 37 forma não sistemática, sem qualquer teorização, sendo apenas por justificativas religiosas e ideológicas (ESTEVÃO, 1992, p. 11). O histórico das condições de existência e de trabalho do proletariado industrial no início do século XIX, quando começam a aglutinar-se nos centros maiores as empresas industriais mostram a extrema voracidade do capital por trabalho excedente, a população operária se constitui majoritariamente por imigrantes, marginalizada social e ecologicamente dentro das cidades, algumas já bem desenvolvidas, há relatos que essa população urbana vivia em condições angustiantes, amontoados em bairros insalubres juntos a aglomerações industriais, em casas infectas, sendo muito frequente a carência, falta absoluta de água, esgoto a luz. Grande parte das empresas funcionavam em prédios adaptados, com mínimas condições de higiene e segurança, com frequentes acidentes, e com o preço da força de trabalho pressionado para baixo, força a entrada das mulheres e crianças de ambos os sexos com idade prematura ao mercado de trabalho funcionando como um mecanismo de reforço ao rebaixamento salarial (IAMAMOTO; CARVALHO, 2003, p. 128: 129). Contudo surgem as luta reivindicatórias, centrada na defesa do poder aquisitivo dos salários, em período de constantes surtos inflacionários, na duração da jornada normal de trabalho, na proibição do trabalho infantil e regulamentação do trabalho de mulheres e menores, no direito a férias, seguro contra acidentes e doença, contrato coletivo de trabalho e reconhecimento de suas entidades reivindicatórias, esse período se estende de 1917 a 1920, a densidade e combatividade das manifestações de inconformismo, que marcou a sociedade burguesa a presença ameaçadora de um proletariado à beira do pauperismo, porém é somente em 1919 que foi implantada a primeira medida ampla de legislação social, responsabilizando as empresas industriais pelos acidentes de trabalho, no entanto não apresentou grande mudança. É diante da incapacidade do Estado de propor e implementar políticas sociais eficazes a resposta principal e evidente aos movimentos desencadeados era a repressão policial, fato que se faz constantemente presente na trajetória das lutas sociais (IAMAMOTO; CARVALHO, 2003, p. 131;133). A legitimidade dos sindicatos só acontece dentro do período ditatorial de Getúlio Vargas, ao tempo que busca impedir que a arbitragem do conflito saia da esfera policial. Dentre os diversos aspectos da prática social do empresariado durante esse período, dois elementos que se relacionam diretamente com a implantação e desenvolvimento do Serviço Social, o primeiro refere-se à crítica do empresariado à inexistência de mecanismo de socialização do proletariado, ou seja de instituições que tenham por objetivo produzir trabalhadores integrados física e psiquicamente ao trabalho fabril, o segundo aspecto a ser retido refere-se ao conteúdo 38 substancialmente diverso da política assistencialista desenvolvida pelo empresariado no âmbito da empresa , a maioria das empresas de grande porte propiciava a seus empregados de forma mais ou menos ampla uma série de serviços assistenciais, em suma maioria assistência médica, a qual era paga por seus usuários, geralmente a preço modesto, cuja contribuição era frequentemente compulsória, essa assistência aparece de forma mais elaborada nas grandes empresas com vilas operárias, ambulatórios, creches, escolas, o uso desses equipamentos em geral com preços reduzidos ou gratuitos tem como contrapartida o rebaixamento salarial ante ás empresas que não os possuem (IAMAMOTO; CARVALHO, 2003, p. 135: 139). Assim assevera Santos; Teles e Bezerra (2013, p. 153), que em meio a tudo isso surge a necessidade da classe trabalhadora em unir-se, organizar-se em prol de melhores condições de vida, começam a surgirem as Ligas Operárias que vão dar origem aos sindicatos e as Sociedades de Resistência, e até mesmo organizações mais avançadas como Congressos Operários e Confederações Operárias, contando inclusive com uma imprensa operária. Sendo essas entidades muitas vezes combatidas, reprimidas e seus líderes perseguidos e presos. Os operários também se organizam em greves e manifestações em prol de melhores condições e aos poucos a classe trabalhadora vai alcançado algumas conquistas, como o Conselho Nacional do Trabalho criado em 1925, e as Leis de Proteção ao Trabalho em 1926, bem como, Lei de Férias, Código de Menores, Seguro Doença e outros. Segundo Iamamoto e Carvalho (2003, p. 140), após os grandes movimentos sociais, tendo como protagonista o proletariado, a questão social fica definitivamente colocada para a sociedade, porém o aparecimento do Serviço Social, enquanto conjunto de atividades legitimamente reconhecidas dentro da divisão social do trabalho, percorre um itinerário de mais de duas décadas. De acordo com Iamamoto e Carvalho (2003, p. 146), na década de 30 inicia-se um novo período do movimento católico laico, a crise de poder originada da indefinição de um novo bloco hegemônico, a bipolarização dos setores mais dinâmicos da pequena-burguesia e a retomada das lutas do proletariado, com maior intensidade, dos movimentos reivindicatórios e de uma nova estratégia política criam as condições para que a Igreja seja chamada a intervir na dinâmica social de forma mais ampla. Fortalece-se definitivamente, e diretamente orientada pela hierarquia, procura organizar e qualificar seus quadros intelectuais laicos para uma ação missionária e evangelizadora na sociedade, se contrapondo aos princípios do liberalismo e ao comunismo que aparecem como uma perigo ameaçador à sua posição na sociedade. O movimento católico é respaldado em uma vasta rede de organizações difusoras de um projeto de recristianizarão de ordem burguesa, sob o imperativo ético do comunitarismo cristão, com as grandes mobilizações da classe operária, o debate sobre a questão social atravessa toda a 39 sociedade e obriga o Estado, as frações dominantes e a Igreja a se posicionarem diante dela. A Igreja a encara segundo os preceitos estabelecidos nas encíclicas, em especial a Rerum Novarum10 e Quadragesimo Anno11, fonte inspiradora das posições assumidas diante da “questão social” que para Igreja antes de ser econômico-política é uma questão moral e religiosa. Já o Estado deve preservar e regular a propriedade privada, impor limites legais aos excessos da exploração da força de trabalho, bem como tutelar os direitos de cada um, especialmente dos que necessitam de amparo. Sendo assim o Serviço Social surge da iniciativa de grupos e frações de classes dominantes, que se expressam através da Igreja, voltado para uma ação de soerguimento moral da família operária atando preferencialmente com mulheres e crianças (IAMAMOTO, p. 18: 19). Nos estudos de Estevão (1992, 13: 15), um marco importante para a organização da Assistência Social é a fundação em 1869 da Sociedade de Organização da Caridade em Londres, a partir daí sociedades como estas se formam em todos os países capitalistas mais desenvolvidos, principalmente nos Estados Unidos, o objetivo principal era a necessidade de criar instituições que se encarregassem de formar pessoas em especial para realizar as tarefas de assistência social bem como colocar em pauta a institucionalização do Serviço Social. Em 1899 na cidade de Amsterdã na Holanda, funda-se a primeira escola de Serviço Social do mundo, e com isso inicia-se o processo de secularização da profissão, as explicações religiosas são substituídas por científicas, a Sociologia vai dar esse suporte teórico a profissão. Segundo Martinelli (2007, p. 107), os cursos destinados à formação de agentes sociais multiplicaram-se pela Europa e Estados Unidos, em 1908, fundou-se na Inglaterra a primeira escola de Serviço Social, porém com outra denominação, logo em seguida foram fundadas duas escolas em Paris, uma em 1911 de orientação católica, e outra em 1913 com orientação Protestante. Porém essa nova profissão segue caminhos diferentes em todo o mundo, vale ressaltar que o Brasil copiou os métodos e técnicas do Estados Unidos que até então o poder público, não estava interessado em assumir os custos da assistência social, deixando-a nas mãos de instituições particulares e religiosas, havia na sociedade americana várias experiências de filantropia e caridade. Foi quando Mary Richmond uma assistente social norte americana, busca 10 Encíclica do papa Leão XIII, avaliava as relações operários-patronais, o papel do Estado, a função dos católicos e o perigo que a crescente influência que socialismo representava a ordem burguesa (CASTRO, 2003, p. 105). 11 Encíclica do papa Pio XI, decorridos quarenta anos desde a encíclica de Leão XIII, tentou aportar uma visão orgânica e abrangente da ordem burguesa, dizia que a Rerum Novarum fora a inspiradora de uma verdadeira ciência social católica, fomentada e enriquecida por “homens esclarecidos” aos quais chamava “cooperadores”. Entretanto para avançar mais além e conquistar vantagens proveitosas e “alegres” para a sociedade humana, são necessárias “principalmente duas coisas: a reforma das instituições e a melhoria dos costumes”. Segundo essa encíclica, esta reforma era tão importante que, sem ela, era impossível a ‘restauração da ordem social” (CASTRO, 2003, p. 105; 106). 40 dar seriedade a profissão no início do século XX, começa a pensar e escrever sobre a profissão de Serviço social e de como esta deveria ser exercida, é através de seu livro Caso Social Individual que surgem as primeiras formas de pratica profissional não institucionalizada. Para ela, fazer Serviço Social implicava trabalhar a personalidade das pessoas e o seu meio social, criando a proposta profissional de Serviço Social de Casos Individuais, seu maior mérito foi dar um estatuto de seriedade à profissão, mostrou que é possível fazer mais do que caridade (ESTEVÃO, 1992, p. 17: 25). Segundo Castro (2003, p. 104: 107), no Brasil em 1936 é criada a Escola de serviço Social de São Paulo, diretamente inspirada pela Ação Católica e pela Ação Social, iniciando uma nova etapa na prática da assistência social, juntando-se também com uma demanda profissional que começava a revelar-se a partir de alguns aparelhos do Estado, tornando mais exigente a qualificação acadêmica, religiosa e técnica. Também sobre a inspiração católica, em 1937, fundou-se a primeira escola de Serviço Social do Rio de Janeiro através do Instituto de Educação Familiar e Social, formado por duas escolas: uma de Serviço Social e uma de Educação Familiar. No Rio de Janeiro o processo constitutivo do Serviço Social desenvolveuse segundo diversas variantes, provavelmente porque na capital do país estavam centralizadas muitas repartições públicas sob cuja demanda se profissionalizou o Serviço Social, a fundação das escolas foi patrocinada pelo Grupo de Ação Social, pela Escola de Enfermagem Ana Nery e pelo Juizado de Menores, porém mesmo que as últimas duas instituições não estivessem sobre a tutela da Igreja, suas bases doutrinarias continuavam sendo a moral e os princípios religiosos católicos (CARVALHO apud CASTRO, 2003, p. 108). Nos relatos de Iamamoto e Carvalho (2003, p. 306: 309), aparecem novas técnicas sociais, associativas ao revolucionamento dos processos produtivos e o aumento da composição orgânica do capital, o estado assume as funções de zelar pelo disciplinamento e reprodução da Força de Trabalho a qual as instituições assistenciais é de fundamental importância para desempenhar funções políticas, econômicas e ideológicas vitais para a manutenção da dominação de classe. O aprofundamento do capitalismo traz a necessidade de uma nova racionalidade, por meio da qual a questão social deve ser conduzida, procurou-se analisar em função das necessidades que as instituições integram, nas relações e práticas sociais que desenvolvem em âmbito de atuação, os métodos e técnicas do Serviço Social. Nesse processo de surgimento e desenvolvimento das grandes entidades assistenciais estatais, autárquicas ou privadas, faz-se juntamente com o processo de legitimação e institucionalização da profissão em que o Assistente Social aparecerá como uma categoria de assalariados cuja principal instancia mandataria é o Estado, deixando de ser uma forma de distribuição controlada da mera 41 caridade particular das classes dominantes, para constituir-se numa das engrenagens de execução das políticas sociais do Estado e corporações empresariais. Nas palavras de Martinelli (2007, p. 128), a alienação presente na sociedade capitalista, tendo encontrado a base social necessária, penetrou na consciência dos agentes profissionais, constituindo sério obstáculo para que pudessem estruturar sua consciência política e social, tornando-se incapazes de realizar o trânsito para o nível da compreensão política das contradições inerentes ao sistema capitalista. Sendo assim a profissão, que agora se inicia com formação acadêmica, sofre alienação pelo processo capitalista sendo este o criador da identidade profissional do Serviço Social. Contudo o Assistente Social é chamado pelo Estado, para ter sua atuação determinada pelos interesses hegemônicos da classe dominante, por isso se distanciava da classe trabalhadora, Martinelli expõe que: A pratica dos assistentes sociais era engendrada pela classe dominante e não respondia a nenhum de seus projetos de classe, a nenhuma de suas reinvindicações coletivas em termos de trabalho, salário ou legislação. Eram ações que tinham por real objetivo a manutenção da ordem social e o equilíbrio necessários à expansão do capital, dedicavam-se cada vez com mais intensidade a praticas alienadas e alienantes, caminhando em rota oposta à marcha histórica dos trabalhadores (MARTINELLI, 2007, p. 129; 130). Com o adensamento do aparato burocrático institucional do Estado, especialmente após a Segunda Guerra, demandava a presença de um número crescente de profissionais, para operacionalizar suas propostas políticas. As instituições viram verdadeiros aparelhos ideológicos de enquadramento da classe trabalhadora, precisavam de agentes qualificados para colocar em marcha suas ações programáticas (MARTINELLI, 2007, p. 133). Contudo o Brasil tende a seguir o método expansionista americano o qual forneceu estratégias mais ágeis e com resultados mais rápidos com o método de Organização de Comunidade, assim assevera Martinelli: Foi principalmente nesse seu novo campo de intervenção profissional a organização de comunidade, que o Serviço Social americano abriu possibilidades de realização do programa de intercâmbio cultural com o Brasil, recebendo assistentes sociais para treinamento, a partir do final da década de 40, tanto nos Estados Unidos como em seus programas em andamento na América Latina. Através de tal intercâmbio instalava-se um canal de que lhe permitia repassar a ideologia subjacente na metodologia de seus programas, além de facilitar o tráfico de influência em relação à profissão, que contava com pouco mais de um decênio de existência no Brasil (MARTINELI, 2007 p. 133). Com isso podemos constatar que as mudanças nas práticas profissionais, seguiram a direção da internacionalidade do eixo teórico no país, sobre a hegemonia norte-americana, que refletia na mesma intensidade sobre as produções teóricos metodológicas da profissão que estavam constituídas das disciplinas aspectos psicológicos e sociológicos primordiais, que 42 definiram o modelo de formação profissional, levando em consideração a visão harmônica de sociedade e absolvendo o princípio da neutralidade (SILVA; SILVA, apud FREIRE; CÃNDIDO, 2013, p. 355). 2.1 O SERVIÇO SOCIAL E O MOVIMENTO DE RECONCEITUAÇÃO Segundo Netto (2009, p. 34), o ciclo autoritário burguês recobre quinze anos, de abril de 1964 a março de 1979, sendo este período do golpe à posse do general Fiqueiredo. O fim do ciclo autocrático burguês, não corresponde à emergência de um regime político democrático, o que Fiqueiredo demarcou claramente e de modo inédito, no bojo dos instantes finais do ciclo autocrático, foi a incapacidade da ditadura em reproduzir-se como tal, em face do acúmulo de forças da resistência democrática e da ampla vitalização do movimento popular, sendo já estreita a base de sustentação da ditadura experimentou um rápido processo de erosão que a compeliu a empreender negociações a partir de uma posição política defensiva. Para situarmos o período de reconceituação do Serviço social é fundamental partirmos dos constantes movimentos populares, deflagrados pelo descontentamento com o Regime Militar, os profissionais se veem na necessidade de compreensão da problemática social, bem como se posicionar de forma fundamentada diante da questão social. Com os fenômenos de pauperização de amplos setores da população, as sequelas do desenvolvimento orientado para privilegiar o grande capital, os processos de migração que inflaram as regiões urbanas e entre outros, enfim o quadro próprio do modelo econômico da ditadura compeliram organizações de filantropia privada a requisitar o concurso de profissionais. Este mercado colocou para o Serviço Social, já dada sua contextualidade sociopolítica, um novo padrão de exigências para o seu desempenho profissional quer nas agencias estatais, quer nos espaços privados recém-abertos, a modernização conservadora passou a requisitar do assistente social uma postura moderna no sentido da compatibilização do seu desempenho com as normas, fluxos, rotinas e finalidades dimanantes da racionalidade12 burocrático-administrativa. A prática dos profissionais teve de revestir-se de características formais e processuais capazes de possibilitar, tanto o seu controle e a sua verificação segundo 12 Adotando uma determinada maneira de conceber a razão, vemos que ela é por si só determinante, não da realidade, mas de uma forma de apreensão e compreensão do real. É a via que (re)estabelece a unidade entre o sujeito que conhece e o sujeito a ser conhecido, está concepção supõe uma unidade entre sujeito/objeto, que não se confunde com a identidade, uma vez que a realidade é sempre mais rica de determinações que a capacidade do sujeito de apanhá-las (GUERRA, 2011, p. 43). 43 critérios burocrático-administrativos das instancias hierárquicas, quanto a sua crescente intersecção com outros profissionais (NETTO, 2009, p. 122; 123). Nas palavras de Guerra (2011, p. 123), o racionalismo formal-abstrato encontra-se nos processos e relações que se estabelecem pelo trabalho nas formações socioeconômicas capitalistas, e seu desenvolvimento assume expressões peculiares nas diversas instituições e organizações da sociedade burguesa. A realidade social não se constitui da “positividade” tão propalada pelas correntes positivistas, tampouco o estado das forças sociais, mantém-se em equilíbrio: a contradição, por não ser algo que possa se agregar aos sistemas sociais, coloca em cheque a “ordem” burguesa que se vê submetida a constantes processos de reorganização, criando e recriando mecanismos para prevenir e controlar a ebulição dessas forças, resultado este nem sempre alcançado com o sucesso. Com isso é correto afirmar que o processo de modernização colocada pela ditadura no Brasil, revela uma racionalidade de caráter positivista em busca da organização e controle social, ideia que também rodeia a formação dos assistentes sociais, visto aqui, que os mesmo entram nesse processo, pois lhe é cobrado uma adequação conforme os parâmetros capitalista. Vista a necessidade, inegável de uma formação adequada ao Serviço Social capaz de atender as exigências colocadas aos profissionais, surgem novas necessidades bem como a inscrição do Serviço Social no campo universitário, isso acontece juntamente com o colapso da Ditadura Militar, fato esse que está bem elencado por Netto: As escolas isoladas, mantidas destacadamente por organizações confessionais ou leigas, com parcos recursos materiais e humanos, funcionando à base do esforço e da dedicação de profissionais e docentes que exerciam o magistério impulsionados sobretudo por valores morais, contado com alunos em número reduzido, relacionando-se com outras escolas e cursos superiores especialmente através de mecanismos e condutos informais, estas pequenas agencias de formação, convertemse, em pouco tempo, em unidades e complexos universitários (NETTO, 2009, p. 125). Com o ingresso na universidade propiciou institucionalmente a interação das preocupações técnico-profissionais com as disciplinas vinculadas às ciências sociais, sendo a partir daí que a formação recebe de fato o influxo da sociologia, da psicologia social e da antropologia, sendo um aspecto positivo, ao levar em conta o fato anteriormente, da ausência de fortes tradições intelectuais e de investigação na formação profissional, que agora se faz presente nas universidades, abrindo possibilidades de dedicação e envolvimento intelectuais, que puderam acumular reservas de forças e engendrar, no âmbito do Serviço Social, uma massa crítica, inexistente anteriormente (NETTO, 2009, p. 125: 126). Conforme Guerra (2011, p. 135), as consequências do modo de aparecer das políticas sociais na sociedade capitalista brasileira, resultante do processo de racionalização estatal, são 44 múltiplas, ao isolar as questões sociais do âmbito das relações de trabalho, entendidas como expressão das relações de forças entre classes ou segmentos de classes que se confrontam nesse processo, o Estado acaba por obscurecer a organicidade entre políticas sociais e processo de acumulação/valorização do capital. Este novo padrão de racionalidade, exigido pela ordem capitalista na era dos monopólios, passa a necessitar de profissionais para a operacionalização de medidas instrumentais do controle social, o controle de técnicas e tecnologias sociais, enquanto meios de influenciar a conduta humana, adequando-a aos padrões legitimados de vida social, manipulando racionalmente os problemas sociais, prevenindo e canalizando a eclosão de tensões para os canais institucionalizados estabelecidos oficialmente (IAMAMOTO; CARVALHO apud GUERRA, 2011, p. 136). Assim explica Netto (2009, p. 127), que a formação profissional do assistente social dispõe com as demandas do mercado nacional de trabalho constituído e consolidado no processo de autocracia burguesa, passa a oferecer àquele um profissional “moderno”, cuja a legitimação advém menos de uma (auto)representação humanista abstrata que de uma fundamentação teórica-técnica do seu exercício como assistente social, a “modernização conservadora” revela-se inteiramente neste domínio, no que se redefine-se a base da legitimidade profissional ao se redefinirem as exigências do mercado de trabalho e o quadro da formação para ele. É neste contexto que se desenvolve a renovação do Serviço Social, em busca da tal “modernização” ainda muito ligada com o conservador e encharcada da concepção positivista, que, porém vão fornecer as balizas históricas-sociais e ideoculturais para a transformação da profissão. Para melhor compreensão, desse conflito que começa a se passar na profissão do Serviço Social, cabe analisar a concepção de Guerra: Na intersecção entre a “velha” razão subjetiva, de cunho ético-moral e as “novas” demandas colocadas à ação profissional do assistente social, assiste-se à primeira crise no interior da profissão que ameaça destruir as bases ético-filosóficas e religiosas sob as quais o arcabouço teórico e metodológico do Serviço Social havia sido construído, e do enfrentamento desta crise engendra-se no final da década de 60, um movimento marcado por continuidades e rupturas, que se convencionou chamar de “reconceituação” (GUERRA, 2011, p. 138; 139). Para Iamamoto (2007, p. 205), o movimento de reconceituação, tal como se expressou na América Latina, representou um marco decisivo no deslocamento do processo de revisão crítica do Serviço Social no continente, emergido na metade dos anos de 1960 e prolongandose por uma década foi, na sua especificidade, um fenômeno tipicamente latino-americano, dominado pela contestação ao tradicionalismo profissional, implicou um questionamento 45 global da profissão, de seus fundamentos ideo-teóricos, de suas raízes sociopolíticas, da direção social da prática profissional e de seu modus operandi.13 Sintetizando os principais aspectos do processo de renovação do Serviço Social, mencionamos as observações de Netto: A instauração do pluralismo teórico, ideológico e político no marco profissional, deslocando uma sólida tradição de monolitismo ideal; a crescente diferenciação das concepções profissionais (natureza, funções, objeto, objetivos e práticas do Serviço Social), derivada do recurso diversificado a matriz teórico-metodológica alternativas, rompendo com o viés de que a profissionalidade implicaria uma homogeneidade (identidade) de visão e de práticas; a sintonia da polemica teórico-metodológica profissional com as discussões em curso no conjunto das ciências sociais, inserindo o serviço Social na interlocução acadêmica e cultural contemporânea como protagonista que tenta cortar com a subalternidade intelectual posta por funções meramente executivas; a constituição de segmentos de vanguarda, sobretudo mas não exclusivamente inseridos na vida acadêmica, voltados para a investigação e a pesquisa (NETTO, 2009, p. 135: 136). Assim afirma Netto (2009, p. 166) o Movimento de Reconceituação, se configurou na existência de diversas vertentes que se expressaram-se em agrupamentos e produções teóricometodológicas distintas, vale colocar aqui o Documento de Araxá e Teresópolis, sendo estes de uma concepção desenvolvimentista que se conecta a perspectiva renovadora, é visualizado como um elenco de mudanças para o Serviço social. Contudo vale lembrar que todo o Serviço Social latino-americano é sensibilizado pelos desafios da prática social, sendo sua resposta o movimento de reconceituação, esse perfilou-se, desde o seu nascedouro, como um movimento de denúncia de autocritica e de questionamentos societários que tinha como contra face um processo seletivo de busca da construção de um novo Serviço Social latino-americano, saturado de historicidade, que apontasse na criação de novas formas de sociabilidade a partir do próprio protagonismo dos sujeitos coletivos (IAMAMOTO, 2007, p. 207). O primeiro Seminário de Teorização do Serviço Social, realizado em Araxá (MG), em março de 1967, este documento define a inserção do Serviço Social no processo de desenvolvimento, isto é aquele que leva à plena utilização dos recursos naturais e humanos e, consequentemente, a uma realização integral do homem, destaca-se a promoção humana, a importância do processo de conscientização como ponto de partida para fundamentação ideológica do desenvolvimento global, donde a urgência de romper com o tradicionalismo configura em deixar o uso exclusivo dos processos de Caso, Grupo e Comunidade, e rever seus elementos constitutivos, elaborando e incorporando novos métodos e processos, todo o Os “modelos de intervenção” importados são submetidos ao crivo da crítica, que aponta a inadequação e inoperância do arsenal operativo voltada para uma atuação microscópica ante os “problemas sociais”, metamorfoseados em problemas dos indivíduos isolados, tidos como fundamentos de uma ordem social naturalizada (IAMAMOTO, 2007, p.206). 13 46 documento vai na direção desse “rompimento”, entendido como a ruptura com a exclusividade do tradicionalismo, porém não há rompimento, há a captura do tradicional sobre novas bases (NETTO, 2009, p. 167: 168). Na perspectiva de globalidade, a reflexão de Araxá vai conduzir à adequação da metodologia às funções do Serviço Social, o documento reconhece que elas se efetivam em dois níveis: o da microatuação, essencialmente operacional, arrolando-se a administração e a prestação de serviços diretos; e o da macroatuação compreende a integração das funções do Serviço Social ao nível de política e planejamento para o desenvolvimento, supondo a participação no planejamento, na implantação e na melhor utilização da infraestrutura social, a subsunção modernizadora se efetiva, ao ser revestida pela tecnicidade, de uma clara dominância teórica do referencial estrutural-funcionalista. Uma vez que não se rompe consequentemente com o tradicionalismo, seus traços rebatem e repicam na justificação da ação interventiva, na delimitação dos meios e objetos de intervenção e na própria representação da funcionalidade da profissão (IDEM, IBIDEM, p.170: 177). Pelo fato do debate brasileiro de reconceituação, dar-se tardiamente no Brasil devido a Ditadura Militar, diferenciando das temáticas polarizadas na maioria dos países latinoamericanos, fato que contribuiu para que o Serviço Social tradicional se revertesse em uma modernização da profissão que atualiza a sua herança conservadora, verificou-se uma mudança no discurso, nos métodos de ação e nos rumos da pratica profissional, no sentido de reforçar sua legitimidade junto as instancias demandantes da profissão, em especial o Estado e as grandes empresas, adequando-se a ideologia dos governantes. Diante desse clima repressivo, os assistentes sociais se refugiam-se cada vez mais em uma discussão interna, sobre elementos que conferem um perfil peculiar, tratando dos objetos, objetivos, métodos e procedimentos de intervenção caindo nas amarras do fetiche do metodologismo, refletido das construções teóricas do estrutural funcionalismo e do discurso do positivismo (IAMAMOTO, 2007, p. 215). Em continuidade deste primeiro seminário, um segundo encontro foi realizado em Teresópolis (RJ), em janeiro de 1970, deste resultou o Documento de Teresópolis, com características diversas porém centralizada na necessidade de um estudo sobre a metodologia do Serviço Social face à realidade brasileira, no texto de Teresópolis, o “moderno” triunfa completamente sobre o “tradicional”. Ressaltando que esse seminário se dividiu em dois grupos de debate em torno dos Fundamentos da Metodologia do Serviço Social, onde três textos constituíram o objeto desta reflexão conjunta, sendo eles: “Introdução às questões de metodologia. Teoria do Diagnostico e da intervenção em Serviço Social”, de Costa (1978); “Bases para a reformulação da metodologia do Serviço Social”, de Soeiro (1978), sendo que 47 nenhum destes estava sincronizado àquele momento de maturação do processo de renovação do Serviço Social no Brasil, o primeiro porque apontava para além do horizonte modernizador, e o segundo porque se situava aquém dele. O terceiro texto de José Lucena Dantas “A teoria metodológica do Serviço Social: uma abordagem sistemática” (1978), atendo-se rigorosamente ao tema central que era objeto do seminário, Dantas ofereceu ao debate uma concepção extremamente articulada da metodologia do Serviço Social, a mais compatível com a perspectiva modernizadora, consequentemente o profundo teorizador. Afirma “que a definição de um modelo de prática do Serviço Social adequado à problemática social brasileira depende, grandemente, da solução do seu problema metodológico, e sua pretensão consiste, exatamente em oferecer uma introdução à metodologia do Serviço Social voltada para que a prática profissional se desenvolva e adquira um nível mínimo de cientificidade (NETTO, 2009, p. 177: 181). De acordo com Netto (2009, p. 183: 192), Dantas forneceu as mais adequadas respostas a duas demandas que à época amadureciam no processo renovador sendo a requisição de uma fundamentação “cientifica” para o Serviço Social e a exigência de alternativas para redimensionar metodologicamente as práticas profissionais, atribuindo objetivamente ao Serviço Social o estatuto decorrente da “aplicação das ciências”, solucionava tanto a fundamentação epistemológica da profissão quanto a sua conexão com as ciências sociais, portanto os valores ideoculturais embasada no Documento de Araxá não são ultrapassados, a noção de desenvolvimento permanece, mas a herança tradicional é sem dúvida dissolvida no cariz operativo que se concretiza em Teresópolis, suas formulações apreciadas globalmente, possuem um tríplice significado no processo de renovação da profissão no Brasil, aponta para requalificação do assistente social; definem o perfil sociotécnico da profissão; e a inscrevem conclusivamente no circuito da modernização conservadora. O desempenho das funções que se atribuem, no documento, ao Serviço Social, implica um técnico capaz de se mover com uma familiaridade mínima entre disciplinas acadêmicas como o Planejamento, a Administração, a Estatística, a Política Social, a Economia, os mais diversos ramos da Sociologia. Depois de Araxá e Teresópolis, veio os seminários realizados no Rio de Janeiro, no Centro de Estudos de Sumaré em novembro de 1978 e no Alto da Boa Vista em novembro de 1984, o seminário de Sumaré deveria enfrentar três temas básicos: a relação do Serviço Social com a cientificidade, a fenomenologia e a dialética, nos dois documentos sobre cientificidade tem por base uma ciência rigorosamente formalista, remetem as teses de Goldstein, esperadamente funcionalistas, o documento opera com categorias que reenviam ao “pensamento dialético” entretanto, fá-lo eclética e vulgarmente: a historicidade é compreendida 48 sob a lente de Dilthey, a dialética recebe um tratamento ininteligível e a própria concepção dialética acaba por se reduzir à construção do objeto a partir da concepção da realidade enquanto movimento no processo histórico, o que se oferece é uma caricatura do método dialético na tradição marxista (NETTO, 2009, p. 193: 197). Quando se examina o material publicado do encontro do Alto da Boa Vista é que se pode avaliar como o simplismo das intervenções dos conferencistas convidados tornou-se mesmo um fato central, ficam claras a defasagem e a pobreza teórica, que estão absolutamente aquém do nível alcançado pela bibliografia de uso generalizado nos cursos de pós-graduação e, sobretudo, aquém da própria problematização operada no bojo do Serviço Social e das suas instâncias profissionais, analisando esses dois encontros, em que se afirmou e consolidou a perspectiva modernizadora, o seu deslocamento não derivou num debate profissional capaz de empolgar os setores de ponta do Serviço Social no Brasil, o exame dos resultantes de Sumaré e do Alto da Boa Vista demostra que o processo de renovação profissional já transitava por outros condutos e envolvia outros protagonistas (IDEM, IBIDEM, p. 200: 201). De acordo com Iamamoto (2007, p. 216: 217), vale ressaltar que a expansão monopolista, que provocou no processo de produção o desenvolvimento tecnológico, alterando os processos de trabalho e na reorganização do aparelho de Estado com irradiações nos conjuntos do aparelho de hegemonia da sociedade civil em especial a Universidade, criou as condições históricas que tornaram possível a gestação, no período ditatorial, dos pilares de novo perfil da categoria profissional, que se consolida-se em um mercado efetivamente nacional de trabalho para os Assistentes sociais, ampliando o contingente de profissionais e das unidades de ensino públicas e privadas, realiza-se a real inserção do Serviço Social nos quadros universitários submetendo-se as exigências de ensino da pesquisa e da extensão, instala-se a pós graduação nesta área criando as bases para nutrir a produção cientifica e criar um mercado editorial até então praticamente inexistente. Renovam-se e qualificam-se os quadros docentes, novos e jovens professores ingressam no circuito universitário, trazendo em suas histórias de vida a experiência da participação política e da crítica social. Visto aqui, o tamanho da contribuição desses documentos de teorização para a efetiva renovação da profissão, desenvolveu uma busca incessante por teoria cientifica capaz de responder os questionamentos levantados, são criados densos materiais teóricos baseados nos estudos científicos nas mais diversas áreas de conhecimento, é através das universidades que vão sendo formulados as fundamentações cientificas da profissão. Identificado que no movimento de reconceituação foi marcado a presença no cenário profissional análises e propostas com nítida inspiração marxista, abrindo uma fratura com suas 49 próprias produções, ou seja a descoberta do marxismo pelo Serviço Social latino-americano contribuiu decisivamente para um processo de ruptura teórica e prática com a tradição profissional, as formas pelas quais se deu aquela aproximação com o amplo e heterogêneo universo marxista foram também responsáveis por inúmeros equívocos e impasses de ordem teórica, política e profissional cujas refrações até hoje se fazem presentes. Apreciando tais caminhos teóricos, que moldavam a aproximação da Reconceituação aos múltiplos “marxismos”, constata-se que o personagem mais ausente é o próprio Marx, em outras palavra um “marxismo sem Marx”, seu resultado foi um universo teórico presidido por fortes traços ecléticos14, dando lugar a uma “invasão, às ocultas, do positivismo no discurso marxista do Serviço Social (IAMAMOTO, 2007, p. 210: 211). Diante dessa problemática instaurada no processo de renovação da profissão, quando a teoria metodológica comtempla uma aproximação “pirata” das obras de Marx, a pratica profissional é delimitada, assim entendemos nas palavra de Guerra: As representações sobre o real constituem-se medições analíticas na compreensão da realidade social, do significado da prática profissional, do processo de intervenção, visto de outro ângulo, a ausência de entendimento sobre as representações da consciência, sobretudo da base material que as produz e as mantém, encaminha o assistente social a tomar os fatos e fenômenos tal como eles aparecem à sua consciência, e a buscar em modelos teóricos explicativos da sociedade seu referencial operativo de atuação que, pela reincidência dos problemas enfrentados, tende a cristalizar-se em modelos de intervenção profissional (GUERRA, 2011, p. 150). Contudo ressalta Pontes (2010, p. 90: 91), que os segmentos intelectuais mais provenientes da profissão centraram, naquele momento, o foco de suas análises nas questões teórico-metodológicas, lutando contra as consequências da incorporação enviesada do marxismo desde os últimos anos da década de setenta. A partir de então, as vanguardas intelectuais da profissão mudaram a direção da análise acadêmica, fazendo com que o discurso, tipicamente militante e anti-institucional, abrisse espaço para iluminação de temas extremamente necessários para o avanço da concepção inspiradora na tradição marxista. 2.1.1 O Serviço Social e a Tradição Marxista Analisando os estudos de Barroco (2008, p. 142), é no fim da ditadura, que o Serviço Social começa a se organizar como categoria; cria associações vinculadas às lutas gerais dos 14 Traço eclético potenciado por uma herança intelectual e política de salientes raízes conservadoras e positivista, da qual o Serviço Social é caudatário contra o qual se insurgia o movimento de reconceituação, esse ecletismo, expressando-se como conciliação no plano das ideias, aliava-se a um tipo de chamamento à militância que diluía as bases propriamente profissionais (IAMAMOTO, 2007, p. 212). 50 trabalhadores, organizada, ainda que em minoria, muda as normas do Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais15, exigindo sua democratização e seu compromisso político com os trabalhadores. Disso ocorre uma prática característica da reconceituação, em sua origem: a exigência moral de assumir um posicionamento em face da desigualdade e dos “oprimidos”, a opção ideológica é um dever moral, um “imperativo categórico”, em face dessa sociedade, enquanto homem e profissional o assistente social tem que optar, ou aderir a mudança que se processa no sentido de humanização verdadeira do homem, ou acomodar-se em favor da permanência, é em favor deste imperativo moral que o assistente social é chamado a se posicionar (KISNERMAM apud BARROCO, 2008, p. 144) O crescente protagonismo acadêmico e político desenvolvido por uma vasta rede de entidades representativas dos assistentes sociais, criada no decorrer dos anos de 1980, espaços são abertos pelas direções dessas entidades, assumidas por quadros jovens, inquietos intelectualmente e politicamente progressistas nos seus fórum específicos para as interpretações tributarias da teoria crítico-dialética, favorecendo a sua difusão. A polêmica no Serviço Social é, pois, estimulada, favorecendo o ativo diálogo com pesquisadores de outras áreas conexas, os limites profissionais são rompidos, redundando no enriquecimento da massa crítica acumulada no circuito do Serviço Social, com isso a polêmica plural expande-se ao interior da tradição marxista nessa área profissional, contribuindo para maturação teórico-metodológica (IAMAMOTO, 2007, p. 232; 233). Pontes (2010, p. 92), revelou que, para tal avanço da concepção marxista, ocorreu um giro de abordagens, pontuadas em três direções: a primeira rediscutiu a questão teóricametodológica da profissão com base em outros autores marxistas tais como: Gramsci, Goldmam, Lukács, e em última análise no próprio Marx, amadurecem as formulações teóricometodológicas vigentes na profissão, aprofundando principalmente a discussão do método dialético; a segunda buscou resgatar a historicidade e a inserção estrutural da profissão na sociedade capitalista, reencontrando os determinantes que condicionaram a emergência da profissão na trama das relações sociais do Brasil, esta direção tem como expoente máximo o texto de Iamamoto e Carvalho (1982), este trabalho produziu um impacto considerável na categoria de Serviço Social, influenciando o deslocamento de uma série de pesquisas, teses, dissertações, TCCs; e a terceira direção operou-se no plano da discussão da inserção do Serviço Tratou-se da “Virada” do III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, em 1979, que substituiu a comissão de honra do congresso, composta por representantes oficiais do governo militar, por uma nova comissão homenageando trabalhadores que morreram e lutaram pelas liberdades democráticas (SILVA apud BARROCO, 2008, p. 142). 15 51 Social na esfera das políticas sociais capitalistas e das próprias questões provenientes da especialidade desta inserção, a discussão da assistência social, como o campo interventivo da prática do assistente social, emergiu como uma efetiva tentativa de resgatar a especificidade profissional, demarcando o imperativo de resgatar as mediações ontológicas que estruturam e articulam sócio historicamente a profissão à sociedade. Analisando que as fieis elaborações da análise marxista, desencadeia, em alguns pequenos núcleos profissionais, um desafiante empreendimento de apropriação do patrimônio categorial e metodológico do marxismo, incorporando um manancial inesgotável de sugestões, para, com inteligência e criatividade, continuar pesquisando os problemas do tempo presente. O tipo de relação intelectual que parcela de pesquisadores passa a manter com este patrimônio permite-lhes tanto reter a base explicativa da historicidade da sociedade burguesa e suas determinações na sua idade madura, como o seu método, utilizando-o na compreensão dos fenômenos particulares do Serviço Social, como totalidades constituídas por múltiplas determinações (IAMAMOTO, 2007, p. 235). A formação profissional recebe novos direcionamentos, passando a contar como um currículo explicitamente orientado para uma formação crítica e comprometida com as classes subalternas. Em 1986, o Código de Ética, que permaneceu praticamente igual desde 1948, é reelaborado, buscando-se garantir uma ética profissional objetivadora da nova moralidade profissional. O Código e a reformulação curricular de 1982 são marcos de um mesmo projeto que pressupõe o compromisso ético-político com as classes subalternas e a explicação da direção social da formação e da prática profissional. Ressaltando que já não aparecem as simplificações anteriores, como o mecanicismo, o moralismo, o voluntarismo ético-moral, fato que deve ao amadurecimento teórico e político da vertente em questão, especialmente pelo recurso às fontes do pensamento de Marx e pela aproximação de Gramsci. Em 1993 o Código de ética é reelaborado, superando as fragilidades do anterior (1986), o processo de debates que culminou nesse novo código é marcado pela sensibilização da sociedade civil em face da questão ética, o que se concretiza em mobilizações que reivindicam a ética na política e na vida pública, levando ao impeachment de 1992 (BARROCO, 2008, p. 168: 178). Desde os anos 80, a ontologia social de Marx se apresenta na literatura profissional, fundamentalmente, através da obra de Netto e da interlocução com cientistas sociais e filosóficos estudiosos de Lukács, tais como Coutinho, Lessa, Antunes e Tonet, orientada pelo tema do cotidiano, da reificação, e do método crítico-dialético16. A apreensão da centralidade Na concepção marxista, o método dialético não se configura como uma estrutura independente, como um “emsi”, que possa ser destacado do corpo da teoria social, sem que se perca sua real configuração teórico-metodológica. 16 52 do trabalho no processo de constituição do ser social contribui para a compreensão de questões emergentes no âmbito das transformações que marcam os anos 199017 (IDEM, IBIDEM, p.181). Conforme relata Pontes (2010, p. 59), a ontologia marxista volta-se primordialmente para os “processos de produção e reprodução da vida humana”, sendo que as representações que surgem na mente humana, são reflexos do real captados como representações na consciência, não possuem estas uma existência autônoma em si mesmas. Marx reconhece uma só ciência: a história, que engloba tanto a natureza como o mundo dos homens, a historicidade é compreendida como o inteiro vir-a-ser do ser humano, em sua produção, no sentido mais pleno da palavra, por ele mesmo em sua atividade prática. A produção do homem se dá através do seu trabalho, a partir da natureza e das necessidades, em uma relação conflituosa com a natureza que o circunda e apropria-se de seu próprio ser natural, em relação com os outros homens. Produz-se como ser social, ao produzir os instrumentos de trabalho, as relações sociais, ao criar necessidades: objetiva-se nas suas obras e produtos. Contudo o fundamento da prática social é, pois, o trabalho social; atividade criadora, produtiva por excelência, condição de existência do homem e das formas de sociedade, mediatizando o intercâmbio entre o homem e a natureza, através do qual o homem realiza seus próprios fins (IAMAMOTO, 2002, p. 116: 117). Compreendendo que a prática profissional do assistente social possui um significado social, analisando a afirmação de Iamamoto: O significado social da prática profissional não se revela de imediato, não se revela no próprio relato do fazer profissional, das dificuldades que vivenciamos cotidianamente. A prática profissional não tem o poder miraculoso de revelar-se a si própria. Adquire seu sentido, descobre suas alternativas na história da sociedade da qual é parte. Assim sendo, é lançado o olhar para mais longe, para o horizonte do movimento das classes sociais e de suas relações nos quadros do Estado e da sociedade nacional, apreender os fios que articulam ás estratégias políticas das classes, desvendar a sua necessidade, os seus efeitos na vida social assim como os seus limites e suas possibilidades (IAMAMOTO, 2002, p. 120). É considerável a relevância da dialética marxista e da categoria de mediação no trabalho do assistente social em seu complexo ambiente institucional, a particularidade histórico-social Este método é componente endógeno da teoria social de Marx, portanto, incomprimível e inseparável (PONTES, 2010, p. 58). 17 Identificado pelas consequências da logica excludente e destrutiva do capitalismo, aprofundadas no processo de globalização neoliberal, são visíveis mundialmente e particularmente no Terceiro Mundo, eliminam-se toda estrutura e responsabilidade social do Estado em face da “questão Social”, privatizam-se serviços públicos e empresas estatais, desmontam-se, gradualmente, as legislações de proteção social e do trabalho. O desemprego, o subemprego, o empobrecimento crescente das camadas médias, a “precarização” dos contratos de trabalho, a repressão aos movimentos sociais e às organizações de classe dos trabalhadores são algumas das consequências desse modelo político-econômico (BARROCO, 2008, p. 178; 179). 53 da profissão representa o alcance de um complexo processo de análise-síntese do movimento do modo de ser mesmo da profissão na estrutura social. É no plano da singularidade que comparecem as formas existenciais irrepetíveis do fazer profissional no cotidiano sócio institucional, em que os sujeitos estão imersos na repetitividade e heterogeneidade da vida cotidiana. Na dimensão da universalidade, o fazer profissional é projetado nas leis sociais tendenciais e universais que regem a sociedade, e encontram o sentido de sua inserção históricosocial, sendo através desta reconstrução da particularidade, que se pode ter a visibilidade concreta do movimento das demandas sociais para a profissão e, portanto a factibilidade de se dimensionar a teorização sobre a profissão e suas formas de intervenção (PONTES, 2010, p. 164: 165). 2.2 A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL A Seguridade Social estabelecida como direito do cidadão, somente a partir da Constituição Federal de 1988, visa a assistência social como um dos tripé da Seguridade, conforme o Art. 194: A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da Sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e a assistência social (BRASIL, CF, 1988, p. 117). Ainda que de forma contraditória, a Constituição põe a assistência social na condição de um direito social. Buscando afirma-se como Estado liberal, é mantida no texto legal a disjunção entre a política da economia, no qual o social afirma-se de maneira exterior à questão social. não se remete constitucionalmente a assistência social de modo explícito à questão da pobreza, não se estabelece seus vínculos de classe. Porém ao mesmo tempo a assistência social é remetida aqueles que não possui renda (SPOSATI, 2012, p. 32: 33). A política pública de assistência social, foi fundamentada a partir, da referida Constituição que estabelece em seus Artigos: Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar independente da contribuição à seguridade social [...] Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos da seguridade [...] organizadas através da: I – descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas à esfera estadual e municipal bem como entidades beneficentes e da assistência social. II – participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis (BRASIL, 1988, p.122: 123). 54 Sendo assim, a Política de Assistência Social, passa a ser uma obrigação estatal, a qual é realizada através de recursos oriundos da Seguridade, devendo também ser descentralizada, e organizada através da participação popular em suas representatividades. Segundo Sposati (2012, p. 33), é pela primeira vez que uma Constituição Brasileira indicava a organização de um sistema governamental de assistência social, ante ao reconhecimento, mesmo que frágil, da necessidade dos segmentos mais espoliados, cabe ao Estado organizar-se para respondê-las. Entretanto a Constituição de 1988 avança quando reconhece as representações das organizações populares como um interlocutor legitimo na sua capacidade de reivindicar direitos, é fato que não se trata de um reconhecimento igualitário, mas de possibilidade de começar a reivindicar as atenções inerentes o que se pode chamar de cidadania elementar (SPOSATI, 2012, p. 36). O Estado assistencial compete a sociedade civil a cooperação na produção dos serviços sociais, forjando um nível bastante baixo de gastos públicos em políticas distributivas e sociais, forja-se juntamente a “sociedade providencia” que constitui uma hipótese sugestiva para caracterizar a forma indireta com que o Estado estende serviços sociais aos mais espoliados através de convênios de serviços com organizações filantrópicas, de benemerência e comunitárias constituindo as denominadas relações de parceria (SPOSATI apud CARVALHO 2012, p. 154). Cria-se a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, em 7 de Dezembro de 1993, para regulamentar este aspecto da constituição e estabelece normas e critérios para organização da assistência social, que é um direito, e este exige definições de leis, normas e critérios objetivos para concessão dos benefícios da assistência (BRASIL, LOAS, 1993 p. 04). Conforme o Art. 1º da LOAS, está determinado como objetivo principal que: A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de seguridade Social não contributiva que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas (BRASIL, LOAS, 1993, p. 06). Sposati (2012, p. 22), assevera que a Assistência Social é uma forma discriminada e parcial de entender algumas condições para a reprodução social de determinados segmentos da população, a que não é imediatamente visível aos olhos do capital. Na forma de constituição do mercado de trabalho no Brasil mantém uma massa ponderável de trabalhadores vivendo e produzindo ao redor do mercado formal, sendo estes imediatamente reconhecidos como segmento marginal, embora produtivo no circuito econômico, sendo que o trabalhador que não se insere formalmente no mercado de trabalho não ganha visibilidade econômica e política. A Assistência Social, em princípio se destina a esse trabalhador pouco visível para o capital e, 55 com isto, tem também a sua visibilidade embaçada até mesmo ao trabalhadores formalmente empregados que pode enfrentar uma situação adversa como um rebaixamento salarial, doença, ou até mesmo uma aposentadoria. Cabendo a assistência social, como um mecanismo econômico e político, cuidar daqueles que aparentemente “não existem para o capital”: o trabalhador parado, o que não possui vínculo formal, o desempregado, o indigente, os deserdados. Como a política de proteção social, a assistência social tem um campo próprio de atenções e provisão social, a qual articula uma rede de segurança contra riscos pessoais e sociais a indivíduos, famílias e coletividades, viabilizando um conjunto de serviços, programas, benefícios e transferências de recursos materiais e monetários, que devem ser planejados, monitoramentos e avaliados continuamente. Diante da necessidade é aprovado a Política Nacional de Assistência Social - PNAS em 2004, consolidando princípios e diretrizes, objetos e ações da assistência social, em particular a proteção básica e especial, nesta se propõe o Sistema Único de Assistência Social – SUAS consolidado em 2005, que através de suas Normas Operacionais Básicas (NOB), busca implementar um sistema público que institua um modo de gestão compartilhada, o co-financiamento, a cooperação técnica entre os três entes federativos, hierarquizando as ações (BRASIL, SUAS, 2008 p. 21, 41, 42). Diante desse fato, Sposati (2012, p. 33), entende que a Assistência Social é formada de um universo estilhaçado de organismos em cada uma das instâncias governamentais e entre elas ocorre um entrelaçamento obscuro, sobreposto e desarticulado de políticas e órgãos, sendo que os programas assistenciais nos três níveis da Federação cobrem amplo espectro de atividades: da alimentação, à moradia, do recém-nascido ao idoso; do lazer à assistência jurídica, não distinguem usuários que lhe sejam próprios daqueles já cobertos por outros programas e políticas sociais. Tal conjunto difuso de usuários e de objetos inespecíficos de ação fragiliza a assistência social como interlocutor legitimo ante as demais políticas sociais. A Política de Assistência Social, conforme elucida a LOAS, em seu Art. 2º tem por objetivos: I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II – o amparo às crianças e adolescentes carentes; III – à promoção da integração ao mercado de trabalho; IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de 1 (um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (BRASIL, LOAS, 1993, p. 06). A proteção social a ser operada pela assistência social envolve a garantia de um conjunto de seguranças dinamicamente articuladas, conforme a NOB/SUAS (2005, p. 90: 93), sendo 56 essas: a Segurança de acolhida: trata-se da oferta pública de espaços e serviços para permanência de indivíduos e famílias sob curta, média ou longa duração; Segurança social de renda: é complementar à política de emprego e renda e se efetiva mediante a concessão de bolsas-auxílios financiados sob determinadas circunstâncias, aos usuários que apresentem, vulnerabilidades decorrentes do ciclo de vida e/ou incapacidade para vida independente e para o trabalho; Segurança de convívio: oferta pública de serviços continuados e de trabalho socioeducativo que garantam a construção, restauração e fortalecimento de laços de pertencimento e vínculos sociais de natureza geracional, intergeracional, familiar, de vizinhança, societários; a Segurança de desenvolvimento da autonomia: exige ações que visem o desenvolvimento de capacidades e habilidades para que indivíduos e grupos possam ter condições de exercitar escolhas, conquistar maiores possibilidades e independência pessoal, superar vicissitudes e contingências que impedem seu protagonismo social e político; a Segurança de benefícios materiais ou em pecúnia: garantia de acesso à provisão estatal, em caráter provisório, de benefícios eventuais para indivíduos e famílias expostas a riscos e vulnerabilidades circunstanciais, de emergência ou calamidade pública. O SUAS (2008, p. 46; 47), como um novo ordenamento da política de assistência social, configurou a Proteção Social em duas modalidades a Básica e a Especial, conforme sua natureza e complexidade envolvidas: A Proteção Social Básica engloba as ações preventivas, de convivência, socialização, inserção e acolhida, voltadas prioritariamente para famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade social, visando desenvolver potencialidades, aquisições e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Nessa modalidade estão incluídos os serviços, programas e projetos locais de acolhimento, convivência e socialização e os benefícios de prestação continuada, eventuais e outras formas de transferência de renda exemplo o Programa Bolsa Família. A realização dessas atenções se concretiza nos Centros de Referência de Assistência Social – CRAS (PNAS, apud SUAS 2008, p. 48). A Proteção Social Especial refere-se a programas e serviços mas especializados, dirigidos às famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social, se divide em duas modalidades de proteção social especial, média e alta complexidade. Para a Proteção Especial de Média Complexidade, consideram-se os serviços que ofertam atendimentos às famílias e indivíduos com seus direitos violados em maior grau que os da proteção básica, cujos vínculos familiar e comunitário, embora fragilizados, não foram rompidos tais serviços são realizados comas demais políticas sociais e com as instituições que compõem o Sistema de Garantias de Direitos são realizados nos Centros de Referência Especializados de Assistência Social – CREAS. Já a Proteção Especial de Alta Complexidade 57 prevê assistência integral (moradia, alimentação, higienização e trabalho protegido) a famílias e indivíduos que se encontram sem referência e/ ou sob ameaça, necessitando a sua retirada do núcleo familiar ou comunitário (IDEM, IBIDEM). É visto na Política de Assistência Social o reconhecimento da importância da família como unidade/referência, fundamentado na ideia de que esta é o espaço primeiro de proteção e socialização dos indivíduos e para que cumpra tais funções, precisa ser protegida. O formato de família que se fala na política de assistência social compreende relações estabelecidas por laços consanguíneos, afetivos e/ ou de solidariedade (BRASIL, SUAS, 2008, p.111). Conforme os estudos na área da família, revelam que a família ocupa um papel de destaque na política social contemporânea como um importante agente privado de proteção social, e esta tendência está ligada à retração do Estado e ao declínio do compromisso estatal, dando lugar a um pluralismo de bem estar, na qual outras instâncias passam a ser provedoras de bem-estar, bem como o mercado, as organizações voluntárias e caritativas e a rede familiar. Nisso se constata também em uma estratégia de esvaziamento da política social como direito de cidadania, visto que há o desvanecimento entre das fronteiras entre esferas públicas e privadas, alargando a possibilidade de privatização das responsabilidades públicas (PEREIRA apud RIZZINI et al. 2006, p. 36). Na visão de Carvalho (2012, p. 156: 158), o Estado através de uma rede complexa de instituições da esfera federal, estadual e municipal, trabalha com um usuário especifico: o pauperismo, inserido ou não no mercado de trabalho. Este Estado assistencial abarca uma oferta de serviços extensa, que vai desde o “pronto socorro social” (cesta alimentar, ajuda financeira), prestação de serviços sociais (creches, internatos para menores abandonados, abrigos para idosos, casas para adolescentes, centros comunitários, clinicas para deficientes, cursos profissionalizantes, programas de geração de renda), até a oferta de infraestrutura urbana (rede de esgotos, habitação, energia elétrica). Dada a massa populacional em situação de pobreza e a insignificante rede de serviços sociais e urbanos em grande escala, tal Estado apresenta projeções contraditórias, com a nova Constituição este se insinua como algo que pode ganhar maior poder. A assistência social associada à benevolência passa a ser encarada como uma prática social natural, banal, nascida da própria condição de solidariedade dos indivíduos humanos em sociedade, mas é nesse sentido de benevolência e “pronto socorro social”, percebido nas esmolas da solidariedade ou nas imagens televisivas da distribuição da cesta alimentar e leite pelo governo, que há uma outra assistência poderosa, tanto na sua positividade como na sua 58 perversidade, a assistência social se apresenta como mecanismo de formação de redutos eleitorais, por excelência, daí a sua ambiguidade e perversidade (CARVALHO, 2012, p. 159) É preciso reconhecer que a Assistência Social, por mais que tenha sido objeto de lutas sociais para consolidação dos direitos e interesses sociais, é forte objeto de manipulação política o que configura em sua centralidade como a principal característica da política, seu caráter assistencialista e imediatista, incapaz de se consolidar em uma política social transformadora e emancipadora da pessoa humana. 2.3 AS FACETAS DA VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR E A TRÁGEDIA DA RUPTURA DOS VÍNCULOS Entende-se por violência intrafamiliar “toda ação ou omissão que prejudique o bemestar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de um membro familiar. Podendo ser cometida dentro e fora de casa, por qualquer integrante da família que esteja em relação de poder com a pessoa agredida; incluindo também as pessoas que estão exercendo a função de pai, ou mãe, mesmo sem laços consanguíneos. Já o termo violência doméstica inclui as pessoas que convivem no ambiente familiar, como empregados, agregados e visitantes esporádicos (DAY, et al., 2003, p. 10). Para ser possível de identificar tais facetas, é necessário partimos do ponto de vista de Guerra (2011, p. 21: 24), revela que após segunda Guerra Mundial dá-se o processo de transformação que iria alterar profundamente nossa sociedade, que era predominantemente rural, começa a ser substituída por uma sociedade urbano-industrial, que por outro lado nunca conseguiu apresentar as mesmas características de uma sociedade industrial avançada, com a passagem de um tipo sociedade para outra, foi se constituindo um mercado nacional de trabalho, tal modelo que tinha como pressuposto implícito a forte exploração da mão-de-obra, com salários aviltantes, conduziu a uma das distribuições de renda mais desiguais do mundo, bem como foi responsável pela existência de um contingente significativo de famílias pobres. Essa breve introdução serve para entendermos a situação enfrentada pela infância e adolescência em nosso país, que em 1980, se constituía em grupo majoritário em termos da população brasileira, salientando que já em 1990 a sua participação relativa tenha começado a declinar. As profundas desigualdades sociais que vivemos têm um reflexo direto na condição de vida da infância e adolescência brasileira, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra e Domicílios (PNAD), em 1990 53, 5% das crianças e adolescentes viviam em famílias cuja renda mensal não ultrapassava ½ salário mínimo, isso corresponderia a quase 32 milhões de pessoas. 59 É evidente que este quadro de pobreza alarmante de uma grande parte de nossas crianças e adolescentes tem muito a ver com as também precárias condições de habitação, de saúde, e educação enfrentados por este segmento, que segundo dados do IBGE (1992), menos da metade, 41% dessa população infanto-juvenil vive em domicílios que poderia considerar adequados, ou seja com água encanada e de instalação sanitária ligada a uma rede geral ou fosso séptica (GUERRA, 2011, p. 24: 25). Em dados atuais, o Brasil possui segundo dados do IBGE censo 2010, aproximadamente 60 milhões de crianças e adolescentes sendo que mais de 1/3 deles concentra no Sudeste. Sendo que 81, 6% deste total vivem em domicilio urbano e 18, 4% em domicilio rural. Em dados gerais de moradia 9,8 milhões de domicílios no Brasil ainda não possuem se quer acesso à rede de distribuição de água e rede de esgoto em seus domicílios, conforme dados do IBGE/PNAD 2012, aproximadamente 55 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza no Brasil, sendo quase 20 milhões deste total encontram-se em situação de extrema pobreza. Destes dados também encontram-se crianças e adolescentes entre 0 e 14 anos que vivem em situação domiciliar de pobreza totalizando 45% (20, 43 milhões) em situação de pobreza e de18% (8, 20 milhões) em situação extrema pobreza (ABRINQ, 2015, p. 8; 12). Nas últimas décadas, registram-se mudanças significativas na dinâmica da vida familiar, devido a rápidas transformações políticas, econômicas e sociais, sendo algumas dessas mudanças apontadas em grande parte do mundo, são: as famílias apresentam-se cada vez menores, elas são chefiadas por mulheres em percentuais que aumentam rapidamente, cada vez mais mulheres entram no mercado de trabalho e as famílias necessitam de novos arranjos para a criação de seus filhos, crescem as distâncias entre a casa e o trabalho nas grandes cidades o que leva que as crianças permaneçam mais tempo sem a presença dos pais, a dinâmica dos papeis parentais e de gênero estão se modificando em diversas sociedades (RIZZINI et al. 2006, p. 35). Observando os estudos relacionados, violência é uma forma de relação social, está certamente atada ao modo pelo qual os homens produzem e reproduzem suas condições de existência, nesta óptica, a violência expressa padrões de sociabilidade, modos de vida, modelos atualizados de comportamento vigentes em uma sociedade e em momento determinado de seu processo histórico. Ao mesmo tempo que ela expressa relações entre classes sociais, expressa também relações interpessoais, estando presente nas relações intersubjetivas que se verificam entre homens e mulheres entre adultos e crianças, entre profissionais de categorias distintas, seu resultado mais visível é a conversão de sujeitos em objeto, sua coisificação (ADORNO apud GUERRA, 2011, p. 31). 60 Bernardi (2010, p. 37), aponta que as famílias em condição de pobreza sofrem influência dos processos culturais e sociais de exclusão sistemática, que enfraquece sua capacidade de fazer valer seus direitos e prerrogativas na sociedade. Essa família empobrecida, embora conte eventualmente com relações de solidariedade parental e conterrânea, tem experimentado uma crescente diminuição de sua capacidade de proteger seus membros, afim de garantir-lhes o usufruto de todos os direitos de que são titulares como pessoas em situação peculiar de desenvolvimento, sendo difícil de ser cumprida pelas famílias submetidas em condições precárias, sem a garantia de alimento, de moradia, de trabalho, de assistência, à saúde, escolaridade, enfim todos os serviços que definem uma vida minimamente digna. Conforme Guerra (2011, p. 31), a violência doméstica apresenta uma relação com a violência estrutural (entre classes sociais, inerente ao modo de produção das sociedades desiguais), no entanto tem outros determinantes, é um tipo de violência que permeia todas as classes sociais. O quadro entre as famílias mais fragilizadas, favorece a violação de direitos da criança e do adolescente, contudo salientamos que tal violação é um fenômeno complexo que deve ser abordado de maneira mais profunda, pois ocorre em todas as classes sociais, atinge meninos e meninas, em todos as classes ricas ou pobres (BERNARDI, 2010, p. 38). Conforme assevera Guerra, a violência doméstica consiste: Numa transgressão do poder disciplinador do adulto, convertendo a diferença de idade, adulto-criança/adolescente, numa desigualdade de poder intergeracional; numa negação de valor liberdade, exige que a criança ou adolescente sejam cúmplices do adulto, num pacto de silêncio; num processo de vitimização como forma de aprisionar a vontade e o desejo da criança e do adolescente, submetendo-as ao poder do adulto a fim de coagi-la a satisfazer os interesses e expectativas e as paixões deste. Por isso o abuso-vitimização consiste, pois, num processo de completa objetalização da criança ou adolescente, isto de sua redução a condição de objeto de maus tratos (GUERRA, 2011, p. 32). Guerra também aponta, que existem quatro tipos de violência doméstica reconhecidas como: A Violência Sexual se configura como todo ato ou jogo sexual, relação hetero ou homossexual entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança ou adolescente ou utilizá-los para obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa (AZEVEDO; GUERRA apud IDEM IBIDEM, p. 33). A Violência Psicológica também designada tortura psicológica ocorre quando um adulto constantemente deprecia a criança, bloqueia seus esforços de auto aceitação, causando-lhe grande sofrimento mental. Ameaças de abandono também podem tornar uma criança medrosa e ansiosa, representando formas de sofrimento psicológico GUERRA, 2011, p. 33). A Negligência representa uma omissão em termos de prover as necessidades físicas e emocionais de uma criança ou adolescente. Configura-se quando os pais (ou responsáveis) falham em termos de alimentar, de vestir adequadamente seus filhos etc., e quando tal falha não é o resultado das condições de vida além do seu controle (IDEM). 61 A Violência Física é considerada como um ato executado com intenção, ou intenção percebida de causar dano físico a outra pessoa. O dano físico pode ir desde a imposição de uma leve dor, passando por um tapa até o assassinato. A motivação para este ato pode ir desde uma preocupação com a segurança da criança (quando ela é espancada por ter ido para rua) até uma hospitalidade tão intensa que a morte da criança é desejada (GELLES apud IDEM, IBIDEM, p. 35). Com isso é correto afirmar que a violência é simultaneamente a negação dos valores considerados universais: a liberdade, a igualdade e a vida, entendendo como a filosofia política clássica que a liberdade é fundamentalmente capacidade, vontade, determinação e direito natural do homem, a violência enquanto manifestação de sujeição e de coisificação só pode atentar contra a possibilidade de construção de homens livres. A violência não é necessariamente condenação à morte, ela tem por referência à vida, porém a vida reduzida, esquadrinhada, alienada sendo, uma permanente ameaça à vida pela constante alusão à morte, ao fim, à supressão, à anulação (ADORNO apud IDEM, IBIDEM, p. 31). A violência contra criança e adolescente é uma violação ao direito dos mesmos previsto pelo ECA em seu Art. 5°, onde afirma que: Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais (BRASIL, ECA, 1990. P. 20). De acordo com Day (et al., 2003, p. 14) A violência contra crianças e adolescentes pode afetar todos os aspectos da vida da criança, como psicológicas, físicas, comportamentais, acadêmicas, sexuais, interpessoais, espirituais, comprometendo o autoestima e estimulando a ocorrência de violência subsequente. “Sendo assim, vale dizer que a criança e o adolescente que sofreram algum tipo violência, têm em si mesmos a possibilidade de reproduzirem com seus filhos ou familiares a violência vivida e aprendida” (grifo nosso). Analisando o problema da violação dos direitos da criança e do adolescente em números, o balanço geral do Disk 100, analisou a proporção dos tipos de violação que foram notificadas durante o ano de 2013, a qual recebeu mais de 252 mil denúncias em todo o país, sendo que 91.095 foi por negligência; 62.501 por violência psicológica; 52. 836 por violência física; 31.725 por violência sexual e 13.973 por outros tipos de violência (ABRINQ, 2015, p. 24). A violência intrafamiliar e doméstica tratam-se de um fenômeno complexo e contraditório para ser analisado, pois foi entendido até aqui, que envolve toda a situação histórica familiar, entretanto é uma problemática bastante enraizada em nossa sociedade e devido os dados alarmantes faz se necessária maior atenção a tal problemática que tem assolado os direitos de nossas crianças e adolescentes. 62 O vínculo, tem sua dimensão biológica, afetiva e social, Vicente assevera que: A todo nascimento corresponde um encontro entre um homem e uma mulher. O recém-nascido é, em si, expressão concreta de uma experiência de encontro. A própria gestação é impensável sem um vínculo concreto entre mãe e feto. Um cordão os une. Um cordão possibilita a vida. Após o nascimento, o seio assumirá esta função de vinculação orgânica, biológica e crescerá e se desenvolverá com a constituição de uma vinculação simbólica, afetiva e social (VICENTE, 2011, p. 47). Cada criança recebe um nome próprio e um sobrenome que indicam esta pertinência, sua condição enquanto ser social e enquanto individuo, ao ser nomeado, inclui imediata e intrinsecamente uma família, toda a rede de parentesco ao qual estará vinculado. Nos primeiros anos de vida o vínculo é vital, a criança depende desta ligação para crescer, ela carece de cuidados com o corpo, com a alimentação e com aprendizagem, sendo que nada disso é possível se ela não encontrar um ambiente de acolhimento e afeto. A criança nasce, em uma comunidade qualquer um situar-se no mundo. A nacionalidade é um presente imediato de qualquer sociedade a uma criança, são as raízes brotando, é a faceta comunitária da necessidade humana fundamental de não estar só (IDEM, IBIDEM, p. 47: 48). Conforme os estudos de Sawaia (2010, p. 43), a família tem como principal característica o valor afeto, está é a principal força que explica sua permanência na história da humanidade. Ela é o único grupo que promove sem separação, a sobrevivência biológica e humana, ao mesmo tempo da conservação e da expansão. Porém sua eficiência depende da sensibilidade e da qualidade dos vínculos afetivos, especialmente da “paixão pelo comum”. Portanto conforme relatos de Vicente (2011, p. 49), no processo interativo tanto a criança quando o adulto têm papel ativo na constituição da ligação afetiva. O vínculo pode ser com outras pessoas que se ocupam ou não das necessidades básicas da criança. No entanto, separar ou perder pessoas queridas ou romper temporária ou definitivamente os vínculos produz sofrimento. Diante da importância estabelecida e necessidade dos vínculos familiares, a Política Nacional de Assistência, assegura o convívio familiar estabelecendo que: A segurança da vivência familiar ou a segurança do convívio [...] supõe a não aceitação de situações de reclusão, de situações de perda das relações [...]. A dimensão societária da vida desenvolve potencialidades, subjetividades coletivas, construções culturais, políticas e, sobretudo, os processos civilizatórios. As barreiras relacionadas criadas por questões individuais, grupais, sociais por discriminação ou múltiplas inaceitações ou intolerância estão no campo do convívio humano. A dimensão multicultural, intergeracional, interterritóriais, intersubjetiva, entre outras, devem ser ressaltadas na perspectiva do direito ao convívio (PNAS, 2004, p. 26). O ECA (1990, p. 25), enfatiza a responsabilidade da família e o direito da criança a permanecer, em seu contexto familiar e comunitário: “toda criança e adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente em família substituta, 63 assegurada a convivência familiar e comunitária [...]”. Por tanto família é um observador especial pela proximidade e afeto pela criança, é necessário entender que a família, ao cuidar das crianças, trabalha pela reprodução social. (VICENTE, 2011, p. 56). O vínculo é um aspecto tão fundamental na condição humana, e particularmente essencial ao desenvolvimento, por isso os direitos da criança os levam em consideração na categoria convivência, o que está em jogo não é uma questão moral, religiosa ou cultural, mas sim uma questão vital. Na discussão de risco para a criança a questão da mortalidade infantil ou da desnutrição é imediata, sobreviver é uma condição básica, óbvia, para o direito à vida. Em outras palavras sobreviver é pouco, a criança tem direito a viver, a desfrutar de uma rede afetiva, na qual possa crescer plenamente, brincar, contar com a paciência, a tolerância e a compreensão dos adultos sempre que estiver em dificuldade (IDEM, IBIDEM, p. 51) Se a criança encontra pais e adultos que a enxergam, escutam, acompanham com interesse e com expectativa positiva, seus passos tornar-se-á uma criança feliz e segura. Porquanto se a família e a comunidade não dão conta de garantir a vida dentro dos limites de dignidade, cabe ao Estado assegurar aos cidadãos tais direitos para que a criança desfrute de bens que apenas a dimensão afetiva pode fornecer, o vínculo passa a ter uma dimensão política quando, para sua manutenção e desenvolvimento, necessita de proteção do Estado, assim o vínculo por meio da convivência passa a fazer parte de um conjunto de pautas das políticas públicas (IDEM, IBIDEM). Nas palavra de Vicente (IBIDEM, p. 54), o fato de a família ser um espaço privilegiado de convivência, não significa que não haja conflitos nesta esfera. Existem conflitos e tensões no decorrer de toda a existência da família, tais conflitos podem ser manifestos ou latentes. As formas de lidar com os conflitos pode variar de modelos autoritários e intolerantes, nos quais predomina um relacionamento adultocêntrico de opressão e silenciamento dos mais fracos, em geral as crianças. O modo de lidar com o problema também pode ser democrático e de respeito pelas diferenças, e mesmo de valorização da crise, quando o modo preferencial de lidar com as dificuldades é pelo entendimento, pela linguagem e pela conversa. Dialogar e aprender a conviver com as diferenças são instrumentos fundamentais para esta mudança no relacionamento do mundo adulto com o infanto-juvenil. O ECA também estabelece em seus Art. 22 e 23 que, aos pais incumbe o dever de sustento e educação dos filhos menores com a responsabilidade de fazer cumprir os interesses destes e as determinações judiciais, é diante da omissão ou descumprimento injustificado dos pais ou responsáveis pode constituir-se na perda e na suspenção do poder familiar, ambas decretadas judicialmente. Salientando que conforme o Art. 23, a falta ou a carência de recursos 64 materiais não se constitui motivo suficiente para a perda ou suspenção familiar (BRASIL, ECA, 1990, p. 27). Nos estudos de Becker (2011, p. 62: 63), a autora afirma que existe uma confusão conceitual entre abandono e pobreza, uma vez que a imensa maioria das crianças pobres, mesmo as que estão nas ruas ou recolhidas a abrigos, possuem vínculos familiares. Os motivos que as levam a essa situação de risco, em suma maioria não é a rejeição ou a negligência por parte de seus pais, e sim as alternativas, às vezes desesperadora de sobrevivência. Por isso ver na colocação em família substituta até mais além na adoção nacional ou internacional uma solução para o problema da pobreza, é grave equívoco em que incidem inúmeras pessoas que operam na área de atenção à infância, inclusive assistentes sociais, juízes, promotores, advogados, na grande imprensa nacional e internacional e em entidades assistenciais. Tal fato é melhor explicado por Neder (2011, p. 42), essa contradição leva-se em conta primeiramente que muitas percepções construídas historicamente pelas elites persistem de forma hegemônica, e em segundo lugar, observa-se que a formulação mais simpáticas às classes populares que trata a organização familiar ainda está presa nas malhas de um enfoque que enfatiza a relação pobreza/família irregular. Existem casos que a tragédia da ruptura de vínculos familiares se estabelecem entre crianças e adolescente, em razões que estão acompanhadas da situação de pobreza, mas não estão diretamente relacionadas, são independentes da falta ou carência de recursos: em primeiro lugar, a mais radical de todas as formas de separação é a morte dos progenitores, é ao mesmo tempo a mais dramática das perdas e em geral as soluções são encontradas de forma mais imediata e natural, sendo os membros da família ampliada, sobretudo avós , irmãos e tios, são os sucessores naturais dos pais falecidos em assumir a responsabilidade pelas crianças; Há casos em que mães, predominantemente solteiras ou sozinhas, não desejam ou reconhecem não possuir condições para assumir a criação do filho. Isto pode ocorrer quando a gestação foi indesejada, fruto de alguma relação eventual ou mesmo de estupro, nestes casos é frequente a ser a situação de pobreza o real motivo para a entrega, e a oferta do bebê, o encaminhamento a serviços assistenciais ou a localização de parentes dispostos a ajudar pode ser a solução porém não se pode assumir a posição de “manter o vínculo a qualquer preço”; A perda do pátrio poder será decretada sempre que a manutenção da criança ou adolescente junto aos pais representar sério risco ao seu desenvolvimento, à saúde até mesmo a sua vida, a tendência nessa situação é de estigmatizar, à primeira denúncia, a família agressora, promove-se a retirada imediata da criança, sem tentar ao menos entender o que se passa (BECKER, 2011, p. 65: 66). 65 Diante disso o que se pode propor como desejável e compatível com os direitos da criança é que todos os casos de vitimização sejam detectados e estudados em profundidade, para que as medidas pertinentes (orientação, tratamento com vistas à manutenção do vínculo ou, quando necessárias, a perda ou a suspensão do pátrio poder) sejam aplicadas a tempo e com equanimidade; É necessário considerar, também, a existência de crianças cujos pais são desconhecidos ou se encontram em lugar ignorado. São aquelas encontradas sozinhas em logradouros públicos, abandonadas em hospitais ou em abrigos deixadas em companhia de vizinhos ou parentes, por pais que desaparecem sem deixar pistas. Empreendidos todos os esforços para localizar os pais, sem êxito, ou uma vez localizados os mesmo, comprovado que tinha real e definida intenção de abandonar os filhos, estabelece também diante desses casos a perda do pátrio poder e, consequentemente, a busca de uma família substituta (IDEM, IBIDEM, p. 67). Concretizado o acolhimento da criança ou adolescente, os abrigos trabalham com as alternativas de reintegração familiar e comunitária, podendo acontecer pelo: Retorno à família de origem ou natural18 trata-se do regresso da criança ou adolescente ao grupo familiar onde ele vivia até o acolhimento institucional e também pela Integração em famílias substitutas entendese que está assume os cuidados da criança ou adolescente substituindo temporariamente ou definitivamente a família natural, podendo ser legalizada mediante guarda19, tutela20 e a adoção21 nacional e internacional (BERNARDI, 2010, p. 42). É de prioritária importância a garantia do direito da criança e do adolescente de convivência familiar e comunitária, sendo que nos casos de ruptura dos vínculos, se fazem necessárias em primeiro lugar, a manutenção dos vínculos com a família natural, e na sua impossibilidade a colocação em família substituta portanto deve se tomar muito cuidado para que os direitos e interesses das crianças e do adolescentes sejam respeitados. Diante disso é recomendável o apoio aos vínculos familiares, promovendo programas de assistência social especialmente destinados a complementar a renda das famílias empobrecidas, para que possam 18 Conforme o Art. 25 do ECA, entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendestes (BRASIL, ECA, 1990, p. 28). 19 De um modo geral, a guarda é concebida em situações em que os requerentes aguardam a decisão judicial sobre concessão de tutela ou adoção, bem como em casos de suspensão do pátrio poder, enquanto se procede ao atendimento aos pais biológicos, com vistas a restaurar os vínculos ou, quanto isso for impossível, chegar à decisão definitiva sobre a perda do poder familiar (BECKER, 2011, p. 67: 68). 20 É a medida aplicada geralmente, no sentido de encarregar aqueles que sucedem os pais no exercício do pátrio poder, principalmente nos casos de orfandade, quando cabe prioritariamente os avós, irmãos maiores ou tios, e implica a administração dos bens e o dever de guarda (IDEM, IBIDEM, 69). 21 É a forma mais definitiva e radical de colocação em família substituta. Através dela se forma uma nova família, uma vez que, quem adota, confere a criança ou adolescente o status de filho, com todas as consequências jurídicas e psicossociais que tal situação acarreta (IDEM). 66 criar e educar seus filhos; disseminando a criação de equipamentos sociais e educacionais para o cuidado das crianças durante o período de trabalho dos pais; organizando programas de assistência e orientação psicossocial a famílias em situação de crise; estabelecendo critérios para casos de suspensão ou perda do pátrio poder, levando em consideração o Art. 23 do ECA já citado neste texto; estimulando as entidades e as agências de cooperação internacional, no campo da proteção à infância, a operar preferencialmente com programas que preservem os vínculos familiares e culturais da população atingida (BECKER, 2011, p. 74: 75). Partindo dos princípios básicos para a colocação em família substituta quando não existe a possibilidade do retorno da criança e adolescente à família natural, é recomendado: dar preferência a soluções dentro da família extensa, ou da comunidade onde ela vive, e nos casos em que a adoção for a medida mais adequada, privilegiar os candidatos nacionais ; criar junto aos juizados da infância e da juventude, serviços especializados que procedam à seleção de famílias adotivas, com critérios que contemplem as condições afetivas e a motivação para o exercício da maternidade e paternidade; evitar todas as formas de “adoção independente”, em que os futuros pais adotivos tomam a si o encargo de “selecionar” crianças a serem adotadas; respeitar o direito da criança e do adolescente em manifestar sua opinião a respeito da medida bem como mate-lo informado a respeito de sua origem, identidade e história; considerar a adoção internacional somente em casos de extrema excepcionalidade, sendo a única forma de garantir o direito da criança e do adolescente à convivência familiar (IDEM, IBIDEM, p. 75). 67 3. PESQUISA DE CAMPO REALIZADA NA CASA DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL LAR DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DO MUNÍCIPIO DE VILHENA/RO Essa pesquisa, nasceu do interesse que tive em conhecer a realidade familiar, das crianças e adolescente que passam por acolhimento institucional no Lar da Criança e do Adolescente do Município de Vilhena/RO. A ideia surgiu no momento em que eu estava estagiando na instituição, onde surgiu-me a curiosidade de saber quais foram os fatores que veio a prejudicar a crianças e aos adolescentes de tal forma que o rompimento do vínculo familiar foi inevitável. Tal questionamento somente seria verdadeiramente respondido através de uma pesquisa de campo, assim conhecer um pouco mais sobre a realidade das dessas famílias vilhenenses atendidas pela instituição que vivenciam algum tipo de expressão da questão social, fazendo como suas principais vítimas as nossas crianças e adolescentes. 3.1 ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL Rizzine (2006, p. 87), diz que utilizamos o termo acolhimento institucional, para marcar a diferença entre prática de institucionalizar, é exemplificar a medida de abrigamento, de forma excepcional e provisória, conforme está estabelecido no ECA em seu Art. 101 §1°: O acolhimento institucional e o acolhimento familiar são medidas provisórias e excepcionais, utilizáveis como forma de transição para integração familiar ou, não sendo esta possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade (BRASIL, ECA, 1990, p. 87). O atendimento institucional, nos moldes da postura de acolhimento à criança, deve cumprir a função de ser um suporte de caráter excepcional e provisório, com o firme propósito de reinserção familiar, constituindo em uma medida de proteção para os casos em que há violação dos direitos da criança e /ou adolescente e se avalia a necessidade do afastamento da família (RIZZINE et al., 2006, p. 89). A inserção de crianças e adolescentes em programas de acolhimento institucional, deveria acontecer somente quando são submetidas a situações graves de abandono, vitimização, exploração sexual e de trabalho, desde que essas agressões não possam ser interrompidas com sua permanência na família de origem natural ou extensa, família de apoio ou até mesmo junto à sua comunidade. Tal acolhimento também se torna uma necessidade quando a criança e o 68 adolescente se encontram em situação de abandono, fuga do lar, vivência de rua e situações que denunciam vulnerabilidade22 social e pessoal (BERNARDI, 2010, p. 20). O abrigo institucional trata-se de um serviço que oferece atendimento especializado, cuidado e espaço de desenvolvimento e socioeducação para grupos de crianças e adolescentes de 0 a 18 anos incompletos, cujas famílias ou responsáveis encontram-se temporariamente impossibilitados de cumprir estas funções. O abrigo oferece especializado e funciona como moradia provisória até que seja viabilizado o retorno à família de origem, ou na sua impossibilidade o encaminhamento para família substituta. O atendimento prestado pelo abrigo deve ser personalizado e feito em pequenos grupos, com o máximo de 20 usuários de ambos os sexos, respeitando-se o não desmembramento de grupos de irmãos ou outros vínculos de parentesco, este também deve estar inserido nos equipamentos e serviços da comunidade local, além de estarem localizados em área residencial, a mais próxima possível, do ponto de vista geográfico e socioeconômico, da comunidade (BERNARDI, 2010, p. 28). Conforme Rizzini, et al (2006, p. 98), o acolhimento governamental normalmente faz parte da política de atendimento oferecida pela Secretária de Municipal responsável pela assistência social local. Diante disso as equipes são compostas por funcionários públicos e seguem as diretrizes da gestão municipal. O fluxo de entrada de casos de violação de direitos apresenta algumas variações nos municípios, porém em linhas gerais, os procedimentos que seguem se assemelham de acordo com tal roteiro: Denúncia; Notificação aos órgãos de garantia de direitos disponíveis no nível local (Conselhos Tutelares, Varas da Infância e da Juventude, Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente e serviços de triagem municipais e estaduais); Procedimentos padronizados (formulários, estudos de casos, pesquisa, e dados sobre os atendimentos etc.); Recebimento da criança ou adolescente vitimizado, com atendimento direcionado à demanda apresentada (casos de violência física, sexual, negligencia, situação de rua etc.); Trabalho especifico comas famílias (busca da família, encaminhamentos, reuniões e tentativa de reintegração na família de origem ou extensa); Grupos de pais; Estimulo à independência ou autonomia nos casos de adolescentes em que a reinserção familiar não é possível ou a medida mais indicada (inserção em programas de geração de renda, cursos profissionalizantes, entre outros) (RIZZINI et al., 2006, p. 98). 22 Quando se refere aos grupos ou indivíduos que, por diversos motivos são mais atingidos pelos efeitos das desigualdades socioeconômicas e pela precariedade das políticas; o risco tende a indicar algum tipo de perigo, demandando medidas de proteção, independentemente da condição social (RIZZINE apud BERNARD, 2010, p. 20). 69 O Art. 101 do ECA, também deixa bem claro no § 4° que imediatamente após o acolhimento da criança ou do adolescente, a entidade responsável pelo programa de acolhimento institucional ou familiar elaborará um plano individual de atendimento, visando à reintegração familiar, ressalvada a existência de ordem escrita e fundamental em contrário de autoridade judiciária [...], este plano será elaborado conforme o § 5°, sob a responsabilidade da equipe técnica do respectivo programa de atendimento e levará em consideração a opinião da criança ou do adolescente e a oitiva dos pais ou do responsável (BRASIL, ECA, 1990, p. 88: 89). Considerando os estudos de Bernardi (2010, p. 108), é possível entender o Plano Individual de Atendimento (PIA), como uma ferramenta de trabalho elaborada e desenvolvida pelo serviço de acolhimento, com a participação da criança ou do adolescente, para planejar todas as ações que possam lhe garantir um atendimento personalizado, o objetivo principal do PIA é garantir a compreensão de cada criança ou adolescente enquanto pessoa revestida de uma singularidade particular, que tem um plano constituído com ele para ele. No plano individual inclui-se especialmente as possibilidades e metas do trabalho com a família, para que a reintegração familiar ocorra no mais rápido possível. O pia também visa em última instância, resgatar o direito à convivência familiar e comunitária e promover todos os direitos fundamentais da infância e juventude. 3.2 SITUANDO O MUNICÍPIO DE VILHENA/RO Vilhena teve início no século XX, por volta de 1910, com a passagem da expedição chefiada pelo Tenente Coronel Cândido Mariano da Silva Rondon que colocou nos Campos do Planalto dos Parecis um posto telegráfico, na linha Cuibá/Santo Antônio do Alto Madeira, onde ligariam as principais cidades da região oriental do país. Foi nomeada Vilhena por Rondon, em homenagem ao ex-chefe Álvaro Coutinho de Melo Vilhena, Diretor Geral dos Telégrafos. Em 1964 a cidade foi povoada em grande escala, por meio do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA) e depois pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a distribuição de terra da união aos colonos, dispostos a adquiri-los e se fixarem na região, atrai migrantes de todo país. Foi elevada à categoria de município com a denominação de Vilhena, pela Lei Federal n° 6. 448, de 11 de outubro de 1977 (IBGE, 2014). Vilhena está localizada na porção Sul-leste do Estado de Rondônia na Chapada dos Parecis. O tipo de clima é o Equatorial, quente e úmido, com friagens entre os meses de junho 70 e julho podendo chegar a 7° C. o Período chuvoso vai de setembro a maio. A temperatura média anual é de aproximadamente 23° C (DELMONICO; FERRETE, 2013, p. 03). Vilhena possui a população, estimada em 2015 de 91. 801 mil habitantes, com área territorial de 11. 518,913 Km², o município está sobre a atual gestão do prefeito José Luiz Rover. A cidade possui o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de 0, 731 registrado em 2010 (IBGE, 2014). 3.2.1 Casa de Acolhimento Institucional Lar da Criança e do Adolescente de Vilhena/RO Fundado no ano de 1995, o Lar da Criança e do Adolescente é uma instituição pública ligada a política de assistência social realizada pela Secretaria de Assistência Social, sendo assim é mantida financeiramente com verbas advindas da Prefeitura Municipal de Vilhena, e também de doações da comunidade. O Abrigo Municipal Lar da Criança e do Adolescente está localizado atualmente na Rua Floriano Peixoto, nº 5342, Bairro 5º BEC, não possui identificação, por motivo de sigilo e melhor proteção dos acolhidos, atualmente está sob a coordenação de Maximiliano Machado. A instituição conta com o espaço físico amplo, residência edificada em alvenaria, forrada provida de pintura e muro. Conta com área de lazer composto por parquinho e piscina e para a locomoção um carro Fiat Dobló a serviço exclusivo da instituição. O Lar da Criança e do Adolescente oferece atendimento institucional em ambiente residencial, através do acolhimento, proteção integral, moradia, alimentação, higienização, orientação pedagógica e social em um espaço que oferece desenvolvimento aos acolhidos. Tendo a capacidade de atender no máximo 25 crianças e/ou adolescentes do sexo masculino e feminino com idade de 0 a 17 anos. Em concordância com o Art. 101 (op cit.), funciona como moradia provisória e excepcional até que seja viabilizado o retorno do infante e/ou adolescente à família natural ou substituta. Os educadores/cuidadores trabalham em turnos fixos, diários e noturnos, a fim de garantir estabilidade das tarefas de rotina, e estar preparado para acolhimento emergencial, com profissionais a disposição para receber a criança/adolescente em qualquer horário do dia ou da noite. A área de Serviço Social no Lar da Criança e do Adolescente, realiza sua ação profissional desenvolvendo suas atividades na abordagem direta da população usuária da instituição. O trabalho técnico-operativo do profissional engloba: estudo social, visita 71 domiciliar, entrevista, relatórios, pareceres, orientações, encaminhamentos, reuniões, trabalhos com indivíduos e familiares, é também atribuição deste profissional criar, implementar e desenvolver projetos que visam qualidade de vida e fortalecimento dos vínculos familiares e afetivos dos usuários. É primordial na intervenção profissional do assistente social a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes que se encontram em situação de risco, abandono e vulnerabilidade social, viabilizando a esse público a assistência, proteção e cuidados com a saúde, educação e lazer. Afim de proporcionar o desenvolvimento físico, psicológico e social de cada criança e adolescente. 3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E RESULTADOS DA PESQUISA Para a presente pesquisa foi iniciada através de uma ampla revisão bibliográfica, nesta busquei estudar fatos históricos, leis, pesquisas e propostas metodológica ligada ao tema ruptura de vínculos familiares entre crianças e adolescentes, tema que procurei dar base teórica, localizando autores renomados que estudam e pesquisam sobre tal problemática, afim de adquirir conhecimentos que foram construídos cientificamente sobre determinado assunto, por outros estudiosos que abordaram antes de nós e lançaram luz sobre a nosso pesquisa , palavra de Minayo (2013, p. 16). A natureza desta pesquisa de campo é de cunho qualitativa e quantitativa, com base em levantamento de dados a partir de dez questionamentos formulados para ser respondidos conforme dados presentes na pasta de cada acolhido. A observação também foi um instrumento bastante fundamental para o conhecimento do campo da pesquisa, este saber foi adquirido na fase de estágio onde estava inserida na rotina da instituição, nesse período já estava estabelecido a Casa de Acolhimento Institucional como espaço para iniciar um trabalho de campo. Assim conforme Minayo (2013, p. 61) “este permite a aproximação do pesquisador da realidade sobre a qual formulou uma pergunta, mas também estabelece uma interação com os “atores” que conformam a realidade e, assim, constrói um conhecimento empírico importantíssimo para o pesquisador”, esse conhecimento empírico adquirido durante meu estágio I foi fundamental para a formulação, desenvolvimento e conclusão da pesquisa me levando a resultados satisfatórios. Em relação aos dados pesquisados e encontrados, levou-se em consideração fundamentar e deixar claro o objetivo geral da pesquisa que é conhecer os principais fatores enfrentados pelas familias que levam a ruptura dos vínculos famíliares, bem como se dá esse 72 fenômeno em contexto com as mudanças estruturais da família e das políticas sociais brasileiras. Conforme definido no projeto deste trabalho, a pesquisa foi de levantamento de dados, através do material documental do acolhido no ano de vigente, definido o espaço amostral de 30% das pastas onde nessas encontran-se a documentação pessoal do acolhido, relatorio do Conselho Tutelar, estudo social da familia, decisões judiciais e o PIA. A pesquisa de campo foi realizada no dia 19 de outubro de 2015, de um total de 36 pastas de acolhidos sendo 27 pastas de não residentes e 9 pastas de residentes, foram analisadas 8 de não residentes e 3 de residentes. 3.3.1 Apresentação dos Indicadores: Gráfico 2: Idade e sexo dos acolhidos 10% 27% 36% 27% 0-11 Anos/Feminino 12-17 Anos/Feminino 0-11 Anos/Masculino 12-17 Anos/Masculino Fonte: Dados coletados na pesquisa. Conforme o ECA estabelece em seu Art. 2° (1990, p. 18) considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa de até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Este gráfico apresenta a proporção de crianças e adolescentes, definindo por sexo e idade, verifica-se que a proporção de crianças do sexo masculino é mais elevada com 36% dos acolhidos e a totalidade de crianças entre 0 a 11 anos é maior do que a de adolescentes com 63%. 73 Gráfico 3: Bairro onde as crianças e os adolescentes moravam antes de serem acolhidos 18,18% 18,18% 9,09% Hab. Parque São Alvorada Paulo 9,09% 9,09% 9,09% Alto Alegre Jardim Eldorado 9,09% Embratel Cristo Rei 9,09% 9,09% Jardim Zona Rural Não Consta América Fonte: Dados coletados na pesquisa. Este gráfico apresenta, os bairros do munícipio onde os acolhidos residiam com suas famílias antes do acolhimento, é visto que a proporção de casos é bastante distribuida, ou seja o problema não se concentra em bairros distintos, apesar da maior parte dos bairros serem considerados periféricos, os atendimentos monstram que tal problema engloba boa parte da cidade de Vilhena inclusive zonas rurais. Gráfico 4: Tipo de composição familiar 36,36% 27,27% 18,18% Nuclear Nuclear Extensa Monoparental Fem. 9,09% 9,09% Monoparental Masc. Recomposta Fonte: Dados coletados na pesquisa. Neste gráfico observa-se os tipos de composições familiares encontradas entre os acolhidos, ressaltando que o tipo nuclear (família composta por casal e filhos) é em maior proporção somando 36,36% e se torna em maior proporção se juntado com a nuclear extensa totaliza 54,54% esses dados rompem com a ideia preconceituosa de tomar apenas esse tipo de 74 composição familiar como forma “estruturada” de família. Visto também que a monoparentalidade feminina tem a segunda maior proporção dos tipos de familias encontradas, comprovando um aumento significativo na proporção de famílias sendo chefiadas por mulheres. Os estudos de Goldani (1994, p. 10), revelam que a interpretação para o aumento das famílias chefiadas por mulheres vai na linha da modernização, industrialização e abertura no leque ou opções para a mulher nos países ricos, ou das más condições de vida gerando instabilidade nas relações pessoais e familiares nos países pobres. Gráfico 5: Situação da residência familiar 45,45% 45,45% 9,09% Própria Alugada Cedida Fonte: Dados coletados na pesquisa. Este gráfico situa a condição de moradia do grupo famíliar, revela-se uma igual proporção entre casas próprias e alugadas, seguido da situação cedida com apenas 9,09%. Gráfico 6: Algum benefício assistencial ou previdenciário recebido pela família 6 5 5 4 4 3 2 2 1 1 Auxílio Doença BPC 1 0 Fonte: Dados coletados na pesquisa. Prog. "Minha Casa Minha Vida" Bolsa Família Não Consta 75 Lembrando que tais benefícios podem ser acumulativo ou seja uma família pode receber mais que um destes benefícios. Este gráfico evidenciou que o Programa Bolsa Família é o benefício assistencial de maior proporção com quatro famílias beneficiárias, e em segundo o Programa “Minha Casa Minha Vida” com o total de duas famíias beneficiárias. Resaltando que o topico “não consta” totalizam quatro famílias, neste caso não encontra-se especificado na pasta do acolhido se a família é beneficiaria ou não de algum tipo de benefício. Gráfico 7: Reincidência no Acolhimento 27,27% 72,73% Não Reincidente Reincidente Fonte: Dados coletados na pesquisa. Este gráfico evidência a proporção de reincidência no acolhimento, tal questionamento revelou que 27,27% entre crianças e adolescentes, foram acolhidos por mais de uma vez, proporção pequena se comparada à 72,73% que foram acolhidos somente uma vez. Esse dado demostra que os trabalhos desenvolvidos na Casa de Acolhimento Lar da Criança e do Adolescente de Vilhena estão sendo eficazes na manutenção dos vínculos famíliares. Gráfico 8: Após o desabrigamento da criança e do adolescente, à quem foram entregues? 50% 25% Família Natural 12,50% 12,50% Família Extensa Família Substituta (Adoção) Fonte: Dados coletados na pesquisa. Transferido p/ Outro Abrigo 76 Este gráfico revela que 50% dos casos de desabrigamento a crianças e/ou adolescente foi entregue a família natural (composta por pais e seus descendentes), de acordo com Rizzini et al. (op cit. p. 89), “o atendimento institucional deve cumprir a função de ser um suporte de caráter excepcional e provisório , com o firme próposito de reinserção familiar”. Dentre os dados chama-se a atenção para a proporção de 12,50% para colocação em família substituta neste caso empregado a adoção, sendo essa a modalidade mais crítica devida sua complexidade, conforme Becker (op cit. p. 70), a adoção é indicada nos casos em que a criança é separada definitivamente de seus pais biologicos e quando não existam parentes com direito e condições pessoais de assumir sua tutela. Salientando que os dados deste gráfico tomou em consideração somente as crianças e adolescentes não residentes ou seja somente os que obviamente já foram desabrigados institucionalmente. Gráfico 9: Na vida escolar da criança e do adolescente em situação de acolhimento houve distorção ou evasão? 18,18% Não Houve 18,18% 63,64% Houve Não Possui Idade Escolar Fonte: Dados coletados na pesquisa. Este gráfico revela um dado importante, devido a complexidade dos comflitos sociais e familiares em que as crianças e os adolescentes acolhidos estão inseridos, é comum se pensar que suas vidas escolares sejam bastante comprometidas, porém tal pesquisa provou ao contrário pois 63,64% dos acolhidos não sofreram nenhuma evasão escolar ou distorção de série, mesmo vivênciando situações adversas ao seu desenvolvimento permaneceram, em suma maioria com bom rendimento escolar. 77 Tabela 3: Ocupação no mercado de trabalho ou fonte de renda dos pais ou responsáveis pelo acolhido. Sexo masculino Quant. Sexo feminino Quant. Servidor público 1 Ajudante de produção 1 Mecânico 1 Do lar 2 Tráfico de drogas 2 Diarista 1 Agricultor 1 Serviços Gerais 1 Serviços gerais 1 Mercado do Sexo 1 Desempregado 1 Tráfico de drogas 3 - - Agricultora 1 Fonte: Dados coletados na pesquisa. Esta tabela teve como objetivo evidenciar a ocupação no mercado de trabalho ou fonte de renda dos pais ou responsáveis pelos acolhidos, com isso está evidenciado todas as fontes de lucro encontradas na pesquisa independente se é lícita ou ilícita. É evidente que todas essas formas encontradas de se obter fonte de renda, não necessitam de uma formação acadêmica, subintende-se que a grande maioria desses pais ou responsáveis não possuem grau superior de escolarização. Contudo fazem parte de classe de trabalhadores que vivenciam as expressões da desigualdade social portanto, conforme Rizzini et.al. (op cit. p. 53), a situação de pobreza não explica e muito menos justifica as violações de direitos de crianças e adolescentes, como casos de exploração e abuso. Porém, ela constitui um dos desafios para os quais devem existir respostas priorizadas pelo poder público, pois debilita a família no cumprimento de seu papel parental. Gráfico 10: Os fatores que geraram a ruptura dos vínculos famíliares 36,36% 18,18% 18,18% 18,18% 9,09% Negligência Violência Física Fonte: Dados coletados na pesquisa Violência Sexual Prisão dos Pais Orfandade 78 Este último gráfico responde o principal objetivo desta pesquisa, que é descobrir quais são os principais fatores que geram a ruptura dos vínculos famíliares entre as crianças e adolescentes emsituação de acolhimento institucional. Evidência-se neste gráfico a negligência com a proporção de 36% dos casos, está como a principal forma de violação dos direitos da criança e adolescente tais esses estabelecido pelo ECA em seu Art. 5° que: Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punidona forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais (op cit. p. 20). Encontrou-se também a violência doméstica e sexual ambas com a proporção de 18,18% dos motivos de acolhimento e consequentemente a ruptura dos vínculos famíliares. Destacando também que a prisão dos pais com a proporção de 18,18% e orfandade de (ambos genitores) com proporção de 9,09%, somente se configurou em abrigamento institucional, devido não existir nenhum famíliar que apresente condições ou disponibilidade de assumir a tutela dos mesmos. 79 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo considerou-se que a família é de fundamental importância para vida das crianças e dos adolescentes esses que são considerados como pessoas em desenvolvimento, e mais além a família é importante para todo ser humano, sendo assim necessita de atenção especial. Sawaia (2010, p. 43), diz em seus estudos sobre família que “a escolha da família se justifica graças à sua principal característica, o valor afeto, está é a principal força que explica sua permanência na história da humanidade, é o único grupo que promove sem separação, a sobrevivência biológica e humana. Não obstante, esta obra tratou a família em sua multiplicidade que se potencializou com o aprofundamento do capitalismo, com isso a família modificou e continua a modificar sua estrutura conforme as exigências do mercado, sendo principalmente pela desigualdades sociais, relações do trabalho, desemprego, situação econômica e discriminação. As mudanças nas estruturas familiares foram profundas conforme tratado no texto a família patriarcal justificou a dominação colonial escravista era a forma considerada civilizadora detendo o poder e prestigio ao patriarca, porém já nesse tempo existiam formas anômicas de famílias que viviam em redor da patriarcal, foi com o processo de industrialização que levou as famílias aos centros urbanos, assim esperava-se delas a adaptação ao novo modelo de econômico e processo de produção, ocorrendo contudo, a separação do mundo do trabalho do mundo familiar, antes disso o trabalho era realizado de uma forma conjunta da família na terra com a produção agrícola. As mudanças ocorridas estão relacionadas com o impacto tecnológico, a mulher passa a participar do mercado de trabalho, a descoberta da pílula anticoncepcional além de interferir na sexualidade feminina, amplia as possibilidades da mulher no mundo social. não se pode negar que todas essas mudanças ocorridas no Brasil e no mundo afetam a dinâmica familiar, a concentração de renda, cria-se a cada dia o aumento da pauperização e pobreza que são na maioria das vezes os fatores sociais responsáveis pela ruptura de vínculos entre pais e filhos, e acabam se reproduzindo diante das políticas sociais focalizadas e assistencialistas do Estado, incapazes de promover a proteção e manutenção da família, diante desse fato a família brasileira carece de mais atenção do Estado e de seu reconhecimento como instituição primordial para o desenvolvimento humano. A criança e adolescente desde os primórdios viveram em uma sociedade incapaz de reconhece-los como seres humanos, uma explicação e que eram vistos em uma fase de transição para vida adulta, sem espaço e importância na família. Todo o auxílio quando oferecidos a esses eram realizadas em forma de caridade pela Igreja. Quando Estado começa a assumir suas 80 responsabilidades centraliza suas ações nas políticas disciplinadoras, marginalizando a pobreza, todas as suas formas de ação estavam encharcadas de autoritarismo e repressão as crianças e adolescentes que dependiam dessas políticas, as mazelas vivenciadas por eles eram vistas como situações irregulares. É somente com a Constituição Federal de 1988, que a criança e o adolescente passaram a serem vistos pelo Estado como pessoas de direitos, que carece, de ações do Estado e da sociedade para que seus direitos e deveres sejam exercidos. Criando-se assim um aparato legislativo que solidificou no Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, lei que ampara este trabalho na dimensão dos direitos fundamentais, da convivência familiar, bem como a aplicação do acolhimento institucional. Outro fato de grande relevância, ocorrida com a constituição de 1988, foi o estabelecimento da Seguridade Social como direito do cidadão e dever do Estado, e fazendo parte do triple da seguridade social, a Política de Assistência Social, mesmo diante de seus impasses tem sido importante, pois tem suas ações voltadas à família, através da manutenção e fortalecimento dos vínculos familiares. O maior problema visto nesta política social é a focalização de suas ações, na retração do Estado, e declínio de seu compromisso, resultando em enfrentamentos fragmentados, deixando uma insuficiência de suas ações para o enfrentamento das expressões da questão social. Conclui-se que a ruptura dos vínculos acontecem devido as profundas desigualdades sociais que tem seu reflexo direto na condição da criança e do adolescente no campo familiar, não somente pela pobreza que se instaura mas também pela exclusão sistemática, que enfraquecem as capacidades da família em cobrar e exercer seus direitos. Guerra (2011, p. 31), afirma que a violência doméstica apresenta, uma relação com a violência estrutural (entre classes inerente ao modo de produção das sociedades desiguais), mas que também permeia todas as classes sociais. A violência pode afetar todos os aspectos da vida da criança e do adolescente, tanto psicológicas, físicas, sexuais, intelectuais, sociais, espirituais, interpessoais e etc. a nível de Brasil a violação contra os direitos da criança e do adolescente somam números alarmantes, mesmo com o aparato do ECA, somente no ano de 2013, o disque 100, recebeu mais de 252 mil denúncias entre elas as mais frequentes estão a negligência, violência psicológica, violência física e sexual. Através dos resultados encontrados na pesquisa de campo, conclui-se que a ruptura dos vínculos entre crianças e adolescentes acolhidos no Município de Vilhena, acontecem quase na sua totalidade em famílias empobrecidas, que vivenciam as dificuldades da má distribuição de 81 renda, das péssimas condições e oportunidades de trabalho, famílias essas que se veem debilitadas para o cumprimento de seu papel parental. Evidenciando que a negligência está como o principal fator gerador da ruptura de vínculos familiares. Guerra (2011, p. 33), esclarece que a “negligência representa uma omissão em termos de prover as necessidades físicas e emocionais em termos de alimentar, de vestir adequadamente seus filhos etc. Quando tal falha não é o resultado das condições de vida além do seu controle”. “O fato é, será que a negligência que ocorrem são mesmo devida a omissão dos pais ou são o resultado das situações socioeconômicas vivenciadas que fogem de seu controle” (grifos nossos). Diante de toda essa problemática elencada nesta obra, coloca-se a necessidade da ampliação do campo de Serviço Social e da sociedade no aprofundamento desta discussão, não delimitando apenas nos limites desta pesquisa. A garantia e proteção dos vínculos familiares entre crianças e adolescentes é dever do Estado pois deste depende a criação de vida favorável para esta garantia; a sociedade tem a obrigação de zelar pela convivência comunitária e garantia dos direitos da criança e do adolescente; já à própria família incumbi o dever de criar, educar e proporcionar um ambiente saudável para o desenvolvimento da criança e do adolescente. Fazem-se necessário e em maior proporção a garantia e proteção dos vínculos familiares através de políticas eficazes e universais que possam alcançar todas as famílias, para isso é necessário desenvolver métodos de conscientização e emancipação dos direitos das crianças e adolescentes frisando a importância da convivência familiar, e garantindo a proteção desta parcela da sociedade. 82 REFERÊNCIAS: ABRINQ; Fundação - Save the Childrem. Cenário da Infância e Adolescência no Brasil. São Paulo. Hawai Gráfica e Editora, 2015. Disponível em: . Acesso em: 20 Out. 2015. 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