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Nota Técnica

Análise do Projeto de Lei nº 4.941, que autoriza a União a ceder 5 bilhões de barris para a PETROBRAS

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A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris e a participação especial PAULO CÉSAR RIBEIRO LIMA Consultor Legislativo da Área XII Recursos Minerais, Hídricos e Energéticos OUTUBRO/2009 2 Paulo César Ribeiro Lima SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO.................................................................................................... 3 2. O PROJETO DE LEI Nº 5.941 ......................................................................... 3 3. A CESSÃO DOS DIREITOS E DA TITULARIDADE............................... 5 4. PROPOSTA ALTERNATIVA........................................................................... 8 5. CONCLUSÕES..................................................................................................... 9 © 2009 Câmara dos Deputados. Todos os direitos reservados. Este trabalho poderá ser reproduzido ou transmitido na íntegra, desde que citados o autor e a Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. São vedadas a venda, a reprodução parcial e a tradução, sem autorização prévia por escrito da Câmara dos Deputados. Este trabalho é de inteira responsabilidade de seu autor, não representando necessariamente a opinião da Câmara dos Deputados. Câmara dos Deputados Praça 3 Poderes Consultoria Legislativa Anexo III - Térreo Brasília - DF A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica 3 Paulo César Ribeiro Lima A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris e a participação especial 1. INTRODUÇÃO As recentes descobertas da PETROBRAS e de outras empresas na província do Pré-Sal, localizada na plataforma continental brasileira, podem representar a agregação de reservas superiores a 50 bilhões de barris de petróleo, volume quatro vezes maior que as atuais reservas nacionais. No contexto dessas descobertas, no dia 31 de agosto de 2009, o Poder Executivo Federal lançou sua proposta de novo marco legal para exploração de áreas estratégicas como o Pré-Sal. Essa proposta é composta de quatro projetos de lei que tratam, respectivamente, da introdução do regime de partilha de produção; da criação de uma nova empresa pública; da criação de um fundo social; e da cessão de direitos de pesquisa e lavara da União e capitalização da PETROBRAS. A capitalização da PETROBRAS com direitos da União pode elevar o percentual de participação da própria União no capital social, caso os acionistas privados e o BNDESPar não exerçam seus plenos direitos de acompanhar o sócio controlador. O objetivo deste trabalho é a análise dessa operação de capitalização, contida no Projeto de Lei nº 5.941/2009 (PL 5.941), e a apresentação de uma proposta alternativa, de forma que o interesse público seja preservado. 2. O PROJETO DE LEI Nº 5.941 O PL 5.941 autoriza a União a ceder onerosamente à PETROBRAS, dispensada a licitação, o exercício das atividades de pesquisa e lavra de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos de que trata o inciso I do art. 177 da Constituição Federal, em áreas não concedidas localizadas no Pré-Sal. O Projeto limita a cessão ao volume máximo de 5 bilhões de barris equivalentes de petróleo e prevê que o pagamento pela PETROBRAS poderá ser efetivado em títulos da dívida pública mobiliária federal. Também está previsto que os volumes de barris equivalentes de petróleo, assim como os seus respectivos valores econômicos, serão determinados a partir de laudos técnicos elaborados por entidades certificadoras. Estabelece ainda que caberá à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) subsidiar a União nas negociações a serem realizadas com a PETROBRAS para a determinação dos volumes disponíveis de hidrocarbonetos e de seus valores econômicos correspondentes. A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica 4 Paulo César Ribeiro Lima Além disso, o PL 5.941 estipula que serão devidos royalties sobre o produto da lavra, nos termos da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997. No entanto, não estipula que será devida participação especial, como ocorre no caso da exploração e produção dos campos concedidos de grande volume de produção. Por fim, o PL 5.941 autoriza a União a subscrever ações do capital social da PETROBRAS e a integralizá-las com títulos da dívida pública mobiliária federal, que poderão ser emitidos a critério do Ministro de Estado da Fazenda, precificados a valor de mercado e sob a forma de colocação direta. Os diagramas mostrados a seguir apresentam, de forma muito simplificada, os registros contábeis que poderão ser feitos no balanço patrimonial da PETROBRAS, caso o PL 5.941 seja aprovado. De acordo com o art. 1º, a União fica autorizada a ceder à PETROBRAS, dispensada a licitação, o exercício das atividades de pesquisa e lavra de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos de que trata o inciso I do art. 177 da Constituição Federal, em áreas não concedidas localizadas no Pré-Sal. Essa autorização poderá produzir o seguinte registro no balanço patrimonial da PETROBRAS: PETROBRAS ATIVO PASSIVO Dívida com a União Direito de exploração O art. 9º, por sua vez, autoriza a União a subscrever ações do capital social da PETROBRAS e a integralizá-las com títulos da dívida pública mobiliária federal. Na ocasião da integralização do capital social, será efetuado o registro a seguir: PETROBRAS ATIVO PASSIVO Direito de exploração Dívida com a União Títulos públicos Capital Social integralizado A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica 5 Paulo César Ribeiro Lima O parágrafo 2º do art. 1º dispõe que a PETROBRAS poderá efetivar o pagamento devido pela cessão de que trata o caput do art. 1º em títulos da dívida pública mobiliária federal. Assim, a integralização do capital social da PETROBRAS feita pela União com títulos da dívida pública mobiliária federal fará com que a obrigação registrada no passivo (dívida com a União) seja “liquidada”, tendo como contrapartida a perda de um direito no ativo (títulos públicos). Essa transação acarretará a seguinte situação patrimonial: PETROBRAS PASSIVO ATIVO Direito de exploração Capital Social integralizado Cumpre ressaltar que o Projeto de Lei não estipula limites ao valor da subscrição e da integralização do capital da PETROBRAS. Também não são estabelecidos limites à emissão de títulos da dívida pública mobiliária. Dessa forma, não haverá, necessariamente, equivalência entre o valor dos títulos públicos a serem emitidos e o valor da dívida com a União. No entanto, da maneira como a operação está estruturada, pode-se inferir que esses valores devem ser iguais. 3. A CESSÃO DOS DIREITOS E DA TITULARIDADE No que concerne ao valor da cessão, em tese onerosa, dos 5 bilhões de barris equivalentes de petróleo, o projeto de lei não estabelece parâmetros, deixando sua quantificação a critério de “laudos técnicos elaborados por entidades certificadoras, observadas as melhores práticas da indústria”. Os valores estimados para o barril de petróleo sob a camada Pré-Sal variam significativamente. A maioria dos analistas indica valores abaixo de US$ 5,00 por barril. O analista da UBS Pactual, Gustavo Gattas, calcula que o valor do petróleo sob a camada PréSal seja de US$ 2,50 por barril. Já Emerson Leite, do Credit Suisse, estima que o valor seja de US$ 4,301. 1http://ultimosegundo.ig.com.br/economia/2009/09/04/uniao+pode+obter+ganho+extra+sem+participacoes +especiais+8268920.html. Acesso em 06 de setembro de 2009. A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica 6 Paulo César Ribeiro Lima O líder do governo no Senado Federal teria afirmado2 que o governo pretende promover uma capitalização de cerca de US$ 50 bilhões por meio de barris de petróleo, levando-se em consideração uma cotação para o petróleo sob a camada Pré-Sal de US$ 10,00 por barril. Com o objetivo de averiguar a adequação desses valores, cumpre analisar os custos incorridos para a exploração do petróleo no Pré-Sal. Segundo o Presidente da PETROBRAS, os custos de extração de Tupi podem ser menores que US$ 8,2 por barril3, que é próximo do custo de extração médio do Brasil. A Tabela 2.1 apresenta o custo de extração (lifting cost) do barril de petróleo pela PETROBRAS4, por trimestre, no período compreendido entre 2007 e 2009. Tabela 2.1 – Custo de extração do 2º trimestre de 2009 ao 1º trimestre de 2007. 2T 2009 1T 2009 4T 2008 3T 2008 2T 2008 1T 2008 4T 2007 3T 2007 2T 2007 1T 2007 preço médio de venda do barril (US$) Brasil Internacional lifting cost - Brasil (US$) sem participação governamental com participação governamental 48,68 48,92 32,23 39,21 47,95 47,34 100,58 68,74 105,46 75,41 86,13 62,23 76,75 59,42 64,42 54,12 57,04 46,92 47,79 42,41 8,72 19,5 7,82 14,69 8,24 18,11 10,21 30,27 9,88 31,08 8,55 24,82 8,6 23,16 7,65 20,13 7,33 17,95 7,2 16,24 Depreende-se da tabela anterior que o custo de extração sem participação governamental possui um valor relativamente estável, não sofrendo grande influência pelo valor de venda do petróleo. O valor médio do custo de extração, nesse período foi US$ 8,42 por barril. Já o valor da participação governamental depende do valor do petróleo. A participação governamental consiste na cobrança de royalties e de participação especial. A primeira (royalties) corresponde a até 10% do valor de venda do petróleo, enquanto a segunda (participação especial) é inferior a 40% da receita líquida. Registre-se que 50% da participação especial é destinada a Estados e Municípios. Dessa forma, a cessão pela União vai afetar as receitas estaduais e municipais. No caso das áreas não concedidas do Pré-Sal, cujos direitos de exploração serão cedidos à PETROBRAS, muito provavelmente elas são contíguas às áreas concedidas que já foram objeto de avaliação pela PETROBRAS, como os prospectos de Iara e Guará. 2 http://br.noticias.yahoo.com/s/31082009/25/economia-barbassa-diz-nao-ha-da.html&printer=1. Acesso em 08 de setembro de 2009. 3 http://www.reuters.com/article/OILINT/idUSN1036338620080610. Acesso em 5 de outubro de 2009. 4 http://www.petrobras.com.br. Acesso em 6 de setembro de 2009. A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica 7 Paulo César Ribeiro Lima A PETROBRAS já estimou os volumes de petróleo recuperável em Iara e Guará, onde possivelmente os campos se estendem além das áreas concedidas. Segundo a PETROBRAS, nas áreas concedidas, Iara deve ter de 3 a 4 bilhões de barris de petróleo equivalente recuperável e Guará de 1,1 a 2 bilhões5. Esses prospectos estão muito próximos a Tupi, que, como já mencionado, deve apresentar custos de extração inferiores a US$ 8,2 por barril. Os campos de Iara e Guará, caso estivessem totalmente em áreas concedidas, poderiam gerar elevados valores de participação especial, em razão da grande produção e do custo de produção ser comparável ao de Tupi. Apenas para efeito de comparação, analisa-se a seguir o pagamento da participação especial, no 2º trimestre de 2009, relativa ao campo de Roncador, cujas reservas são comparáveis às de Iara e Guará. Nesse trimestre, o campo de Roncador apresentou as seguintes características: - valor do barril: US$ 50,4 - custo de produção por barril: US$ 11,36 - royalties por barril: US$ 5,04 - participação especial por barril: US$ 10,8 Observa-se, então, que o valor da participação especial é mais de duas vezes superior ao valor dos royalties cobrados. Nesse caso, a participação especial é de cerca de 20% do preço do barril. Como o PL 5.941 não prevê a cobrança de participação especial, o estado brasileiro deverá deixar de arrecadar uma participação governamental de cerca de 20% do valor da produção. Se o valor do barril de petróleo a ser produzido pela PETROBRAS nas áreas cedidas pela União for de US$ 70,00 por barril, a perda de arrecadação seria de cerca de US$ 14,00 por barril. O valor presente dessa perda, com uma taxa de desconto anual de 4% e um período de produção de 26 anos, seria de cerca de US$ 12,00 por barril. A perda de arrecadação de participação especial seria maior que todas as estimativas já feitas do valor do petróleo sob a camada Pré-Sal que, como já mencionado, varia de US$ 2,5 a US$ 10,00 por barril. 5 http://www.valoronline.com.br/?online/petroleo_e_gas/203/5805128/petrobras-estima-que-guara-tenha-ate2-bilhoes-de-barris. Acesso em 27 de setembro de 2009. A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica 8 Paulo César Ribeiro Lima Dessa forma, pode não haver uma cessão onerosa da União para a PETROBRAS. Conforme mostrado, essa cessão poderá, até mesmo, ser com bônus para a PETROBRAS, se o preço do petróleo das áreas não concedidas for de US$ 70,00 por barril. 4. PROPOSTA ALTERNATIVA Uma alternativa ao PL 5.941 seria capitalizar a PETROBRAS sem haver a necessidade da cessão de direitos de exploração e produção em áreas não concedidas. De acordo com essa alternativa, o primeiro passo é a própria União certificar o volume e o valor de jazidas localizadas em áreas não concedidas e contabilizar esse valor no seu ativo. Desse modo, poderá haver a emissão de títulos da dívida pública mobiliária federal lastreados pelos direitos exploratórios lançados no ativo da União. A União subscreveria ações do capital social da PETROBRAS e faria a integralização com esses títulos, desde que esses títulos sejam de valor não superior ao das reservas certificadas. Essa opção com ativos financeiros, em vez de direitos exploratórios, disponibilizaria recursos para a PETROBRAS realizar os seus investimentos nas áreas já concedidas e no parque de refino em um prazo muito mais curto. No caso de exploração e produção em áreas não concedidas não contíguas a áreas concedidas, a própria PETROBRAS poderia ser contratada pela União no regime de prestação de serviços para explorar e produzir as jazidas certificadas. Para isso, a empresa poderia ser adequadamente remunerada pela União. A União, por sua vez, utilizaria as receitas líquidas das áreas não concedidas para resgatar os títulos públicos emitidos, para “alimentar” o fundo social proposto pelo Projeto de Lei nº 5.940 e para distribuir aos Estados e Municípios. No caso de a jazida certificada se estender por uma área já concedida, poderia ser celebrado, por intermédio de uma empresa pública a ser criada (Petro-Sal), um acordo para individualização da produção, também conhecido como unitização, com os concessionários da área adjacente à da União. Um bom acordo de individualização da produção poderia gerar receitas líquidas para a União muito maiores que as decorrentes da cessão dos direitos de pesquisa e lavra proposta pelo PL 5.941, de 2009. A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica Paulo César Ribeiro Lima 9 5. CONCLUSÕES O PL 5.941/2009 prevê a cessão de 5 bilhões de barris equivalentes de petróleo à PETROBRAS sem estabelecer parâmetros mínimos para assegurar que ela seja, de fato, onerosa. Computando-se a perda de arrecadação da participação especial, poderiam ser transferidos do estado brasileiro para a PETROBRAS direitos exploratórios sem ônus, e até mesmo com bônus. Como cerca de 60% do capital social da PETROBRAS é de acionistas privados, essa transferência do patrimônio público para o setor privado pode ser questionado pelos setores mais esclarecidos da sociedade brasileira. Uma alternativa ao PL 5.941 seria capitalizar a PETROBRAS sem haver a necessidade da cessão dos direitos de pesquisa e lavra de áreas não concedidas. Nesse caso, a própria União certificaria o volume e o valor de jazidas localizadas em áreas não concedidas e contabilizaria esse valor no seu ativo. Assim, poderia haver a emissão de títulos da dívida pública mobiliária federal lastreados pelo ativo da União referente aos 5 bilhões de barris. Com esses títulos, a União poderia subscrever ações do capital social da PETROBRAS e integralizá-las, de modo a promover a necessária capitalização da empresa. 2009_13967 A capitalização da PETROBRAS, os cinco bilhões de barris... Nota Técnica