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Máquinas Térmicas
Prof. Carlos Gurgel
Dep. Engenharia Mecânica – FT
Universidade de Brasília
Capítulo X – Ciclo de Turbina a Gás (Eastop & McConkey, 1993)
O ciclo de pressão constante já foi apresentado anteriormente. Neste
capítulo, vamos estudar mais detalhadamente os diversos processos que
compõem o ciclo. As turbinas a gás têm grande aplicação no transporte aéreo
embora nos últimos anos verifica-se um intensa utilização na geração de
potência para o produção de eletricidade. Turbinas a gás são também
utilizadas na propulsão de navios. Uma aplicação mais atual de turbinas a
gás é verificada em sistemas de cogeração onde o parte do calor rejeitado
na saída da turbina é utilizado na produção de vapor num ciclo Rankine.
Em termos práticos, uma unidade de turbina a gás opera num ciclo aberto,
onde o compressor e a turbina trabalham acoplados num único eixo. A Figura
X-1 ilustra um unidade.
Figura X-1: Ciclo aberto de uma turbina a gás.
Como pode ser visto, o ciclo é bastante simples. Ar é admitido pelo
compressor e injetado numa câmara de combustão em pressões elevadas.
Combustível é pulverizado no combustor reagindo com o ar elevando a
temperatura do gás. O gás com elevada entalpia é sofre expansão numa
turbina. Naturalmente a turbina tem que fornecer potência maior que a
necessária para o acionamento do compressor para a realização de trabalho
líquido.
Os compressores podem ser radiais ou centrífugos sendo, portanto,
irreversível o processo de compressão porém aproximadamente adiabático.
Devido às irreversibilidades no compressor e na turbina, a potência líquida
fornecida pela unidade será menor para uma dada razão de compressão. Em
alguns casos, as irreversibilidades serão tão altas que a unidade não se
auto sustenta. Estas foram as causas principais para o retardamento na
utilização do ciclo de turbina a gás.
O ciclo aberto da turbina a gás não pode ser comparado diretamente com o
ciclo ideal a pressão constante apresentado no Cap. VI. A diferença imposta
se resume no fato de que ocorrem reações químicas no combustor alterando a
composição dos gases inicialmente admitidos. O processo de transferência de
calor ocorre sem interação com a vizinhança. O aumento de entalpia é
oriundo da energia liberada na combustão. Portanto, deve se ter em mente
que uma análise mais detalhada deveria considerar a mudança na composição
química do fluido de trabalho. Com as simplificações necessárias podemos
visualizar o ciclo, num diagrama T ( s, com auxílio da Fig. X-1
A linha 1 – 2 representa a compressão adiabática irreversível; a linha 2 –
3 representa adição de calor a pressão constante no combustor; a linha 3 –
4 representa uma expansão adiabática irreversível na turbina. Os processos
1 – 2s e 3 – 4s são reversíveis, portanto ideais.
Tomando-se variações de energia cinética e potencial como desprezíveis, a
aplicação da primeira lei nos diversos processo nos conduz as diversas
expressões úteis.
Para o compressor:
Para o combustor:
Para a turbina:
Trabalho líquido:
Eficiência térmica:
O calor específico de um gás real é função da temperatura e da composição
química da mistura. Portanto, os calores específicos (cp) nas equações
acima devem ser ajustados. Da mesma forma, o coeficiente politrópico (. É
comum assumir-se um valor destas propriedades para o processo de compressão
e um valor médio, ajustado, para o processo de expansão na turbina.
Num ciclo de turbina a gás a massa de fluido na expansão é maior do que
aquela na compressão devido ao combustível que é injetado na câmara de
combustão. Contudo, a razão ar combustível (A / F) usualmente empregada é
elevada permitindo que se despreze a massa de combustível que é adicionada
ao sistema.
Como os processos reais na turbina e no compressor são irreversíveis, é
importante estabelecer a relação entre o processo real e aquele
isentrópico.
A eficiência isentrópica do compressor é dada por
Da mesma forma, e eficiência isentrópica da turbina é
Exemplo X-1:
Uma unidade de turbina a gás opera com razão de pressão de 10/1 e com
temperatura máxima no ciclo de 700 (C. A eficiência isentrópica do
compressor é 0.82 e da turbina 0.85. Calcule a potência de um gerador
elétrico acoplado à turbina quando 15 kg/s de ar entram no compressor a 15
°C.
Assuma cp = 1.005 kJ / kg K e ( = 1.4 para o processo de compressão e cp =
1.11 kJ / kg K e ( =1.333 para o processo de expansão.
Precisamos determinar, T2 e T4 uma vez que T3 é dado.
Na compressão necessitamos de T2s.
Portanto,
K
Com a relação de eficiência isentrópica para o compressor pode-se calcular
T2.
K
Da mesma forma para a turbina, na expansão necessitamos de T4s.
Portanto,
K
Com a relação de eficiência isentrópica para a turbina pode-se calcular T4.
Desta forma,
K
Finalmente, o trabalho de compressão é
kJ / kg.
O trabalho produzido pela turbina é
kJ / kg.
Trabalho líquido:
kJ / kg.
A potência de acionamento do gerador será
kW.
Exemplo X-2:
Calcule a eficiência do ciclo e a razão de trabalho (WR) para a planta do
exercício anterior assumindo que cp no combustor é 1.11 kJ / kg K.
Para o cálculo da eficiência precisamos do calor adicionado.
kJ / kg.
Portanto,
Da definição da razão de trabalho,
Exatamente como foi visto no estudo do ciclo Rankine, a eficiência geral da
unidade de turbina a gás pode ser aumentada através de modificações no
ciclo básico.
Para tanto, apresentam-se as mais comuns.
A utilização de uma turbina de potência para acionar exclusivamente o
compressor e uma segunda turbina que aciona o gerador permite um ganho
modesto de potência devido ao processo de expansão ocorrer em duas etapas.
Para cada etapa utiliza-se turbinas com eficiências específicas. A Figura X-
2 ilustra este arranjo.
Figura X-2: Ciclo aberto de uma turbina a gás com turbina de potência.
O trabalho na turbina de alta pressão é suficiente para acionar o
compressor, então
O trabalho líquido é
Exemplo X-3:
Uma unidade de turbina a gás admite ar a 17 °C e 1.01 bar. A taxa de
compressão é 8/1. O compressor é acionado por uma turbina de alta pressão e
uma segunda turbina, de baixa pressão, aciona um eixo de potência. A
eficiências isentrópicas são 0.8, 0.85 e 0.83 para o compressor a turbina
de alta e a de baixa, respectivamente.
Calcule pressão e temperatura dos gases de entrada da turbina de potência
(compressor) e a potência líquida desenvolvida pela unidade, a eficiência
do ciclo e a razão de trabalho WR.
A temperatura máxima está limitada à 650 °C. Assuma cp = 1.005 kJ / kg K e
( = 1.4 para o processo de compressão e de combustão e cp = 1.15 kJ / kg K
e ( =1.333 para o processo de expansão. Despreze a massa de combustível.
Na compressão necessitamos de T2s.
Portanto,
K
Com a relação de eficiência isentrópica para o compressor pode-se calcular
T2.
K.
O trabalho de compressão é
kJ / kg.
Este é o trabalho que deve ser providenciado pela turbina de alta pressão.
Isto é,
kJ / kg.
Portanto,
K.
Da mesma forma para a turbina, na expansão necessitamos de T4s.
K.
Então, para o processo isentrópico,
ou
. Então,
. Então,
bar.
Consequentemente, a pressão e a temperatura na entrada da segunda turbina
são, 1.65 bar e 393 °C.
A potência fornecida pela segunda turbina é função de T5.
A razão de pressão p4/p5 pode ser calculada por (p4/p3)((p3/p5) uma vez que
, lembrando que p2 = p3 e p5 = p1.
Desta forma,
Substituindo em
Portanto,
K.
Com a relação de eficiência isentrópica para a turbina pode-se calcular T5.
Desta forma,
K
Finalmente, o trabalho de expansão é
kJ / kg.
Para 1 kg/s,
kW.
A razão de trabalho é,
kJ / kg.
O calor suprido pela queima do combustível é
kJ / kg.
Logo, a eficiência do ciclo será
kJ / kg.
A potência de acionamento do gerador será
kW.
Turbinas de Aviação
Num motor a jato, a turbina é empregada apenas para acionar o compressor. A
entalpia remanescente será utilizada numa expansão que ocorre num bocal. A
Figura X-3 ilustra o motor a jato e o ciclo num diagrama T – s.
Figura X-3: Motor a jato.
O avião é mantido em vôo pelo empuxo reativo dos gases que abandonam o
bocal, as custas de diminuição de entalpia entre os pontos 4 e 5. A
turbina é projetada para liberar uma potência que seja suficiente para o
acionamento do compressor mais uma parcela para vencer as perdas
mecânicas.
Um bocal é um duto com área variável onde um fluxo permanente de gás é
acelerado as custas da queda de pressão ao longo do duto. Os bocais
encontram inúmeras aplicações práticas, como, por exemplo, em vapor,
turbinas a gás, motores a jato, foguetes e na medida de fluxos, entre
outras. Quando o fluxo é desacelerado com aumento simultâneo da pressão
utiliza-se um difusor. Difusores são utilizados na prática em compressores
centrífugos e em "ramjets". Será apresentada a seguir uma análise
simplificada (1-D) de bocais. Maior aprofundamento no assunto pode ser
obtido em livros de dinâmica dos gases.
O formato do bocal é um parâmetro de projeto. Isto é, pode-se determinar
uma forma específica para a variação da área transversal ao longo do
bocal de forma a se promover aceleração do fluido com o decréscimo na
pressão. Um primeira hipótese é assumir-se que o bocal não troca calor com
a vizinhança (adiabático). Como o bocal possui paredes rígidas, nenhuma
interação de trabalho ocorre.
A equação da primeira lei para um bocal torna-se,
.
Verifica-se que a seção 1 é de referência e com ela podemos calcular a
entalpia e a pressão em qualquer seção do bocal.
A velocidade numa dada seção será,
.
Se a área da seção é A, e o volume específico é v, então,
.
Ou, relacionando-se a área por unidade de fluxo mássico tem-se,
. Substituindo-se a velocidade nesta expressão obtém-se,
.
Verifica-se nesta expressão que para determinarmos a área em diversas
seções do bocal precisamos avaliar o volume específico e a entalpia nas
respectivas seções. Até o momento, a única hipótese adotada para o
escoamento no interior do bocal foi que este processo ocorre de maneira
adiabática. Contudo, o processo tende a ser reversível e com isto, podemos
dizer que é isentrópico. Consequentemente,
A variação desta propriedades pode ser obtida em tabelas ou, no caso de
gás perfeito, empregando-se a lei . A Figura X-4 ilustra o processo.
Figura X-4: Variação da área do bocal com algumas propriedades.
Pode se verificar que a área inicialmente diminui, atinge um mínimo e
aumenta na medida em que o fluido é acelerado. Este comportamento pode ser
verificado pela análise dos termos v e C na equação
.
Quando o volume específico v aumenta menos rapidamente que a velocidade C,
a área da seção diminui. Por outro lado, nas regiões do escoamento em que v
aumenta mais rapidamente que a velocidade C, a área da seção aumenta.
Portanto, os bocais que usam gás como fluido de trabalho são sempre do
tipo convergente-divergente. Na parte convergente o escoamento é subsônico.
O regime sônico é atingido na garganta e na parte divergente o fluxo é
eminentemente supersônico. No caso de líquidos, cujo volume específico é
constante, os bocais são sempre convergentes quando se deseja altas
velocidades de saída.
Um segundo tipo de motor é o turbo-prop. No turbo-prop, a turbina aciona o
compressor e a hélice que é responsável pela propulsão da aeronave. A
Figura X-5 ilustra o motor turbo-prop e o ciclo num diagrama T – s.
Figura X-5: Turbo-prop.
Se desprezarmos as perdas mecânicas, a potência líquida para acionar a
hélice é dada por,
.