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Capítulo 7 Integrais de Linha e de Superfície Os conceitos de integral de linha e de integral de superfície são abordados a um nível elementar neste curso de análise. Algumas noções deverão ser aceites intuitivamente e priviligia-se a geometria dos problemas, cientes que algumas das noções apresentadas exigem uma preparação matemática que está fora do âmbito deste curso.
7.1
Integrais de Linha
Seja Γ uma linha regular de R3 , de classe C 1 . Isto significa que Γ é a imagem (ou traço) de uma função r : I = [a, b] ⊂ R → R3 de classe C 1 e tal que r′ (t) 6= 0R3 , ∀t ∈ I. A função r diz-se uma parametrização de Γ. Uma parametrização induz na linha Γ uma orientação. Duas parametrizações distintas da mesma linha podem preservar ou inverter a orientação da linha. Exemplo 102 A função r : I = [0, 2π] → R2 definida por r(t) = (cos t, sin t) parametriza uma circunferência Γ de centro na origem e raio 1. A orientação induzida é a contrária ao movimento dos ponteiros do relógio, o sentido directo. Também a função c : I = [0, 2π] → R2 definida por c(t) = (cos t, − sin t)
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
168
parametriza a circunferência Γ. No entanto a orientação induzida por c é a dos ponteiros do relógio, o sentido retrógado. Vamos agora definir um novo conceito, o conceito de integral de uma função escalar ou de uma função vectorial ao longo da linha Γ assim como as propriedades mais importantes destes integrais. Consideremos primeiramente as funções escalares.
7.1.1
Integrais de linha de uma função escalar
Seja Γ uma linha regular de R3 , de classe C 1 e r : [a, b] → R3 uma sua parametrização. Seja f : D ⊆ R3 → R um campo escalar cujo domínio D contenha a linha Γ tal que a função composta f ◦ r é uma função contínua. Definição 68 O integral Z
f ds =
Γ
Z
f ds =
Zb
(f ◦ r) (t) kr′ (t)k dt
a
r
Designa-se por integral da função escalar f ao longo da linha Γ ou integral de linha do campo escalar f. Vejamos agora que o integral de linha de uma função escalar não depende da representação paramétrica usada para definir a da linha. Teorema 34 Sejam r : I = [a, b] ⊂ R → R3 e c : J = [d, e] ⊂ R → R3
duas parametrizações da curva regular Γ de classe C 1 . Seja f : D ⊆ R3 → R um campo escalar cujo domínio D contenha a linha Γ. Admitamos que quer f ◦ r quer f ◦ c são funções contínuas. Então Z Z f ds = f ds r
c
7.1 Integrais de Linha
169
Demonstração: Se r e c parametrizam a mesma linha, então existe uma bijecção h : [d, e] → [a, b] tal que c = r ◦ h. Usando a definição, Z
f ds =
Z
f ds =
c
Γ
Ze
(f ◦ c) (t) kc′ (t)k dt
d
Mas pelo teorema da derivada da função composta, c′ (t) = (r ◦ h)′ (t) = r′ (h(t))h′ (t), logo Z
f ds =
c
Ze
f (r (h(t))) kr′ (h(t))k |h′ (t)| dt
d
Fazendo a mudança de variável θ = h(t), dθ = h′ (t)dt podemos considerar dois casos 1. Se h(d) = a ∧ h(e) = b então dizemos que c e r determinm a mesma orientação na linha. Neste caso, h é monótona crescente e h′ (t) > 0, logo |h′ (t)| = h′ (t) e Z
f ds =
c
Zb
′
f (r (θ)) kr (θ)k dθ =
a
Z
f ds
r
2. Se h(d) = b ∧ h(e) = a então dizemos que c e r determinam orientações opostas na linha. Neste caso, h é monótona decrescente e h′ (t) < 0, logo |h′ (t)| = −h′ (t) e Z
f ds =
Za
−f (r (θ)) kr′ (θ)k dθ
=
Zb
f (r (θ)) kr′ (θ)k dθ
c
b
=
Za r
f ds
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
170
cqd Como acabámos de verificar o integral de linha de uma função escalar reduz-se a um integral definido através de uma representação paramétrica da linha e o valor desse integral não depende da parametrização escolhida. Exemplo 103 Seja f : R3 → R definida por f (x, y, z) R= x + 3y 2 + z e Γ o segmento de recta que une (0, 0, 0) e (1, 1, 1). Calcular f ds. Uma parameΓ
trização deste segmento é
r(t) = (t, t, t), t ∈ [0, 1] Então,
Z
f ds =
Z1
f (t, t, t) kr′ (t)k dt
=
Z1
√ t + 3t2 + t 3dt
0
Γ
0
√ 2 t=1 = 3 t + t3 t=0 √ = 2 3
Exemplo 104 Seja f : R3 → R definida por f (x, y, z) = x2 + y 2 + z 2 . Considere-se hélice Γ definida por r(t) R= (sin t, cos t, t), t ∈ [0, 2π] e cujo traço se pode ver na figura 7.1. Calcular f ds. Ora, r′ (t) = (cos t, − sin t, 1) Γ √ √ 2 ′ 2 2 e kr (t)k = cos t + sin t + 1 = 2, logo Z Γ
f ds =
Z2π
sin2 t + cos2 t + t2
0
2π √ Z = 2 1 + t2 dt 0
t=2π t3 2 t+ = 3 t=0 √ 8π 3 = 2 2π + 3 √
√
2dt
7.1 Integrais de Linha
171
6 5 4 3 -1
2
-1
-0,5 1-0,5 0 00 0,5 1
0,5 1
Figura 7.1: Hélice definida por r(t) = (sin t, cos t, t)
Exemplo 105 Seja f : R2 → R definida por f (x, y) = xy e Γ a fronteira do triângulo T = (x, y) ∈ R2 : 0 ≤ x ≤ 1 ∧ 0 ≤ y ≤ x R Calcular f ds. Neste caso não é possível definir uma parametrização de Γ Γ
de classe C 1 , mas sim de classe C 1 aos bocados. Seja, por exemplo seja (0, t), t ∈ [0, 1] (1, t − 1) t ∈ [1, 2] r(t) = (3 − t, 3 − t) t ∈ [2, 3]
uma parametrização de Γ. Então, Z Γ
f ds =
Z1
f (0, t) kr′ (t)k dt +
Z2
f (1, t − 1) kr′ (t)k dt +
Z3
f (3 − t, 3 − t) kr′ (t)k dt+
0
1
2
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
172 Ora,
(0, 1), t ∈ [0, 1] (0, 1) t ∈ [1, 2] r (t) = (−1, −1) t ∈ [2, 3] ′
e portanto Z
f ds =
Z1
0dt +
(t − 1) dt +
Donde, Z
Z3
(3 − t)2
√
2dt
2
1
0
Γ
Z2
√ 2 1 f ds = 0 + + 2 3
Γ
Um caso particular é aquele em que a linha Γ é uma linha do plano. Admitamos que r : I = [a, b] ⊂ R → R2 definida por r(t) = (x(t), y(t)) parametriza Γ. Admita-se que f é uma função de duas variáveis. Então Z
f ds =
Zb
f (x(t), y(t))
a
Γ
q
(x′ (t))2 + (y ′ (t))2 dt
Se f (x, y) ≥ 0 este integral tem uma interpretação geométrica simples. Representa a área de uma ”vedação” em que a base é a linha Γ, imagem de r e a altura no ponto (x, y) é f (x, y), tal como a figura 7.2 ilustra. Exemplo 106 Calcular a área da vedação que é mostrada na 7.2 sabendo que f (x, y) = x e a curva é parametrizada por r(t) = (t, t2 ), t ∈ [0, 2] . A área pedida é Z r
f ds =
Z2 0
q f t, t 12 + (2t)2 dt 2
Z2 √ = t 1 + 4t2 dt 0
i2 1 h 2 3/2 = = 1 + 4t 12 0 √ 1 17 17 − 1 = 12
7.1 Integrais de Linha
173
2 z 1,5 4 1
y 3 2
0,5 1 00 0
0,5
1
1,5 x
2
Figura 7.2: Integral de linha como a área de uma vedação Definição 69 O comprimento de uma linha parametrizada por r : I = [a, b] ⊂ R → R3 é Z
1ds =
c
Zb
kr′ (t)k dt
a
Exemplo 107 Calcular o perímetro do cardióide mostrado na figura 6.18. A equação polar do cardióde é ρ = a (1 + cos θ) com θ ∈ [0, 2π] sendo a uma constante positiva. Portanto uma parametrização é, r(t) = (a (1 + cos θ) cos θ, a (1 + cos θ) sin θ) ,
θ ∈ [0, 2π]
Deste modo r′ (t) = −2a sin θ cos θ − a sin θ, a cos θ + a cos2 θ − a sin2 θ ,
θ ∈ [0, 2π]
e
kr′ (t)k = =
q
√
(−2a sin θ cos θ − a sin θ)2 + (a cos θ + a cos2 θ − a sin2 θ)2
2a2 cos θ + 2a2
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
174 Logo Z
f ds =
r
Z2π p
2a2 (1 + cos θ)dθ
0
2π √ Z √ 1 + cos θdθ = a 2 0
√ √ = a 24 2 = 8a
Observe-se que √
1 + cos θ =
e portanto Z2π √
p
1 + 2 cos2 (θ/2) − 1 = 2 |cos(θ/2)|
1 + cos θdθ = 2
0
7.1.2
Zπ
√ 2 cos(θ/2)dθ = 4 2
0
Integrais de linha de um campo vectorial
Seja Γ uma linha regular de R3 , de classe C 1 e r : [a, b] → R3 uma sua parametrização. Seja F : D ⊆ R3 → R3 um campo vectorial cujo domínio D contenha a linha Γ tal que a função composta F ◦r é uma função contínua. Definição 70 O integral Z Γ
F · ds =
Z
F · ds =
r
Zb
(F ◦ r) (t) · r′ (t)dt
a
Designa-se por integral da função vectorial F ao longo da linha Γ ou integral de linha do campo vectorial F. Definição 71 Se admitirmos que F representa um campo de forças, o integral da função vectorial F ao longo da linha Γ representa o trabalho realizado por F para deslocar uma partícula de r(a) para r(b) ao longo da linha Γ. Isto é, Z W =
F · ds
Γ
7.1 Integrais de Linha
175
Vejamos agora que o integral de linha de um campo vectorial depende da orientação da representação paramétrica usada para definir a linha. Teorema 35 Sejam r : I = [a, b] ⊂ R → R3 e c : J = [d, e] ⊂ R → R3 duas parametrizações da curva regular Γ de classe C 1 . Seja F : D ⊆ R3 → R3 um campo vectorial cujo domínio D contenha a linha Γ tal que a quer F ◦ r quer F ◦ c são funções contínuas. 1. Se a orientação de Γ induzida por r é a mesma que a orientação induzida por c então Z Z F · ds = F · ds r
c
2. Se a orientação de Γ induzida por r é oposta à orientação induzida por c então Z Z F · ds = − F · ds r
c
Demonstração: Se r e c parametrizam a mesma linha Γ, então existe uma bijecção h : [d, e] → [a, b] tal que c = r ◦ h. Usando a definição, Z
F · ds =
Z
F · ds =
c
Γ
Ze
(F ◦ c) (t) · c′ (t)dt
d
Mas pelo teorema da derivada da função composta, c′ (t) = (r ◦ h)′ (t) = r′ (h(t))h′ (t), logo Z
F · ds =
c
Ze
F (r (h(t))) · r′ (h(t))h′ (t)dt
d
Usando a mudança de variável θ = h(t), dθ = h′ (t)dt podemos considerar dois casos 1. Se h(d) = a ∧ h(e) = b então dizemos que c e r determinm a mesma orientação na linha. Neste caso, h é monótona crescente e Z c
F · ds =
Zb a
′
F (r (θ)) · r (θ)dθ =
Z r
F · ds
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
176
2. Se h(d) = b∧h(e) = a então dizemos que c e r determinam orientações opostas na linha. Neste caso, h é monótona decrescente e Z
F · ds =
c
Za
F (r (θ)) · r′ (θ)dθ
b
= − = −
Zb
Za
F (r (θ)) · r′ (θ)dθ F · ds
r
cqd O integral de limha de um campo vectorial pode ser visto como o integral de linha de um outro campo escalar. De facto basta obervar que se kr′ (t)k 6= 0 então r′ (t) F (r (t)) · r′ (t) = F (r (t)) · ′ kr′ (t)k kr (t)k
Observando que T (t) =
r ′ (t) kr ′ (t)k
é o versor tangente à trajectória de r em t,
a função escalar definida por F (r (t)) · tangente à curva em t. Assim Z
r ′ (t) , kr ′ (t)k
é a projecção do campo F na
F · ds =
Za
F (r (t)) · r′ (t)dt
=
Za
F (r (t)) ·
r
b
=
Zb
r′ (t) kr′ (t)k dt kr′ (t)k
(F · T ) ds
r
Ou seja o integral do campo vectorial F ao longo de Γ é igual ao integral do campo escalar resultante da projecção de F sobre a tangente a Γ ao longo de Γ. R Exemplo 108 Calcular F · ds em que r é a hélice da figura 7.1, defir
nida por r(t) = (sin t, cos t, t), t ∈ [0, 2π] e F o campo vectorial definido por
7.1 Integrais de Linha
177
F (x, y, z) = (x, y, z). Ora Z r
Z2π F · ds = (sin t, cos t, t) · (cos t, − sin t, 1)dt 0
Z2π = (sin t cos t − cos t sin t + t)dt 0
= 2π 2 Definição 72 Dada uma parametrização r : I = [a, b] ⊂ R → R3 de uma linha Γ, podemos definir a parametrização oposta rop : I = [a, b] ⊂ R → R3 definida por rop (t) = r(a + b − t) R Exemplo 109 Calcular F · ds em que c é a parametrização oposta a dec
finida por r(t) = (sin t, cos t, t), t ∈ [0, 2π] , hélice da figura 7.1 e F o campo 35 e vextorial definido por F (x, y, z) = (x, y, z). Podemos R usar o teorema 2 uma vez que c inverte a orientação induzida por r, F · ds = −2π . Usando c
a definição, temos necessidade de parametrizar c. Assim,
c(t) = rop (t) = r(0 + 2π − t) = (sin(2π − t), cos(2π − t), 2π − t), t ∈ [0, 2π] Ou seja, c(t) = (− sin(t), cos(t), 2π − t), t ∈ [0, 2π]
e Z r
Z2π (− sin(t), cos(t), 2π − t) · (− cos t, − sin t, −1)dt F · ds = =
0 Z2π
(t − 2π)dt
0
= −2π 2 Um modo usual de escrever integrais de linha de campos vectoriais recorre ao conceito de forma diferencial. Seja F : D ⊆ R3 → R3 um campo vectorial tal que F (x, y, z) = (f1 (x, y, z), f2 (x, y, z), f3 (x, y, z))
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
178
e r(t) = (x(t), y(t), z(t)) , t ∈ [a, b]. De facto Z Z F · ds = F (r(t)) · r′ (t)dt r
r
=
Zb
(f1 (r(t)), f2 (r(t)), f3 (r(t))) · (x′ (t), y ′ (t), z ′ (t)) dt
Zb
[f1 (r(t))x′ (t) + f2 (r(t))y ′ (t) + f3 (r(t))z ′ (t)] dt
a
=
a
Zb dy dz dx + f2 + f3 dt = f1 dt dt dt a
Consideremos a forma diferencial f1 dx + f2 dy + f3 dz, o integral de linha escreve-se Zb Z F · ds = f1 dx + f2 dy + f3 dz a
r
Exemplo 110 Calcular I =
R
2xyzdx + x2 zdy + x2 ydz em que Γ é o seg-
Γ
mento de recta que une os pontos A(1, 1, 1) e B(1, 2, 4), orientado de A para B. Uma parametrização de Γ é, por exemplo, (x, y, z) = A + t(B − A), t ∈ [0, 1], ou seja, (x, y, z) = (1, 1 + t, 1 + 3t), t ∈ [0, 1]. Então, I =
Z1 0
=
Z1 0
=
Z1
dx 2 dy 2 dz 2xyz +x z +x y dt dt dt dt
2.1(1 + t)(1 + 3t).0 + 12 (1 + 3t).1 + 12 (1 + t).3 dt
(1 + 3t + 3 + 3t) dt
0
1 = 4t + 3t2 0 = 7
7.1 Integrais de Linha
179
Teorema 36 Seja Γ uma linha regular de R3 , de classe C 1 e r : [a, b] → R3 uma sua parametrização. Seja f : D ⊆ R3 → R um campo escalar de classe C 1 . Então Z ∇f · ds = f (r(b)) − f (r(a)) Γ
Demonstração: Pela definição, Z
∇f · ds =
Zb
∇f (r(t)) · r′ (t)dt
a
Γ
Mas pela regra da derivada da função composta, (f ◦ r)′ (t) = ∇f (r(t))·r′ (t), logo Z
∇f · ds =
Zb
∇f (r(t)) · r′ (t)dt
Zb
(f ◦ r)′ (t)dt
a
Γ
=
a
e pelo teorema fundamental do cálculo integral, Z
∇f · ds =
Zb
(f ◦ r)′ (t)dt
a
Γ
= f (r(b)) − f (r(a))
cqd Usualmente um campo de vectores que seja o gradiente de uma função escalar diz-se um campo de gradientes e a função escalar designa-se por função potencial. O teorema que acabámos de mostrar diz-nos que o integral de linha de um campo de gradientes não depende da linha, apenas da diferença de potenciais entre o ponto final e do ponto inicial da linha. R Exemplo 111 Calcular ∇f · ds em que f (x, y) = x2 cos y e Γ é a linha Γ parametrizada por r(t) = et−1 , sin πt , t ∈ [1, 2] . Basta observar que Z ∇f · ds = f (r(b)) − f (r(a)) Γ
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
180
e como f (r(2)) = f (e, 1) = e2 cos 1 e f (r(1)) = f (0, 0) = 0, segue-se que Z ∇f · ds = e2 cos 1 Γ
Exemplo 112 Calcular o trabalho do campo de forças F , definido por F (x, y, z) = x3 , y, z
ao longo de Γ, sendo Γ a circunferência no plano xz de raio 2 e centro na origem. Observe-se que F é o gradiente da função escalar definida por f (x, y, z) = De facto, ∇f (x, y, z) = Z
4x3 2y 2z , 2, 2 4
F · ds =
Γ
Z
x4 y 2 z 2 + + 4 2 2 = F (x, y, z). Então
∇f · ds = f (r(b)) − f (r(a))
Γ
em que r é uma parametrização da circunferência de raio 2 no plano xz. Por exemplo, r:
x = 0, y = 2 cos θ, z = 2 sin θ,
0 ≤ θ ≤ 2π
Como se trata de uma linha fechada, r(b) = r(a), Z Z F · ds = ∇f · ds = f (r(2π)) − f (r(0)) = 0 Γ
Γ
portanto o trabalho é zero.
7.2
Integrais de Superfície
Para iniciarmos o estudo das superficies, consideremos dois casos distintos. Primeiramente, o das superfícies que são gráfico de uma função escalar f : D ⊆ R2 → R e seguidamente o caso das superfícies que não estão nessa condição.
7.2 Integrais de Superfície
181
2
6 5 4
1
3
y
2 00 0
1 1 2 3
-1
4 x
-2
5 6
Figura 7.3: Superfície S, gráfico de f (x, y) = sin x + sin y, (x, y) ∈ [0, 2π] × [0, 2π] Exemplo 113 Consideremos a superfície S, gráfico da função definida por f (x, y) = sin x + sin y, (x, y) ∈ [0, 2π] × [0, 2π] tal como a figura 7.3 ilustra Exemplo 114 Consideremos a superfície S, cujunto de nível de valor 4 da função h : R3 → R definida por h(x, y, z) = (x − 1)2 + y 2 + z 2 tal como a figura 7.4 ilustra Como sabemos esta superfície não é gráfico de uma função
2 1 -1 z 0
0
-1
1 x 2
-2 -2
-1
0 y
1
3 2
Figura 7.4: Superfície S, conjunto de nível da função h : R3 → R de duas variáveis.
182
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
Tal como sucedia com as linhas, vamos definir superfície como sendo a imagem de uma função. Definição 73 Seja ϕ : D ⊂ R2 → R3 em que D é um domínio de R2 . A superficie S, parametrizada por ϕ, é o conjunto dos pontos R3 , imagem de D por ϕ. S = ϕ(D) Se ϕ for uma função de classe C 1 , dizemos que a superfície S é de classe C 1 . Exemplo 115 A superfície do exemplo 113 ilustrada na figura 7.3 por ser gráfico de uma função tem uma parametrização simples ϕ : [0, 2π] × [0, 2π] → R3 (u, v) 7→ (u, v, sin u + sin v) Exemplo 116 A superfície do exemplo 114 ilustrada na figura 7.4 tem uma parametrização mais complexa ϕ : [0, 2π[ × [0, π] → R3 (u, v) 7→ (1 + 2 cos u sin v, 2 sin u sin v, 2 cos v) Verifique que (1 + 2 cos u sin v − 1)2 + (2 sin u sin v)2 + (2 cos v)2 = 4 Definição 74 Seja ϕ : D ⊂ R2 → R3 uma função de classe C 1 definida por ϕ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) parametrização da superficie S. Seja ϕ(u0 , v0 ) um ponto de S. O vector ∂x ∂y ∂z Tu (u0 , v0 ) = (u0 , v0 ), (u0 , v0 ), (u0 , v0 ) ∂u ∂u ∂u se não nulo é um vector tangente em ϕ(u0 , v0 ) à curva de S definida por v = v0 . O vector ∂x ∂y ∂z Tv (u0 , v0 ) = (u0 , v0 ), (u0 , v0 ), (u0 , v0 ) ∂v ∂v ∂v se não nulo é um vector tangente em ϕ(u0 , v0 ) à curva de S definida por u = u0 . O vector N , definido por N = Tu × Tv se não nulo é um vector normal à superfície S no ponto ϕ(u0 , v0 ). Se N 6= 0R3 , ∀(u, v) ∈ D, dizemos que S é uma superfície regular.
7.2 Integrais de Superfície
183
Definição 75 Se ϕ parametriza a superfície regular S e ϕ(u0 , v0 ) = (x0 , y0 , z0 ) ∈ S então (x − x0 , y − y0 , z − z0 ) · Tu × Tv = 0 diz-se plano tangente a S no ponto ϕ(u0 , v0 ). Exemplo 117 Verificar se a superfície definida pela parametrização ϕ(u, v) = (u cos v, u sin v, u) com u ≥ 0 e v ∈ [0, 2π] é uma superfície diferenciável e regular. Dizemos que é uma superfície diferenciável porque a função ϕ é uma função vectorial diferenciável. Existem os vectores Tu (u, v) = (cos v, sin v, 1) e Tv (u, v) = (−u sin v, u cos v, 0) O vector N = Tu × Tv é N = (cos v, sin v, 1) × (−u sin v, u cos v, 0) ou seja, N = (−u cos v, −u sin v, u) Ora, N = 0R3 se e só se −u cos v = 0 −u sin v = 0 ⇔ u = 0 u=0
Logo a Superficie não é regular em ϕ(0, v) = (0, 0, 0). Geometricamente verificamos que ϕ descreve a superfície definida por p z = x2 + y 2
ou seja a folha superior de um cone com vértice na origem, o ponto em que a superfície não é regular.
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
184
Exemplo 118 Seja S o gráfico de uma função diferenciável f : R2 → R. Verificar que a superfície é regular em todos os pontos. Consideremos a parametrização ϕ(u, v) = (u, v, f (u, v)) com (u, v) ∈ R2 . Então ϕ é uma função vectorial diferenciável e existem os vectores ∂f (u, v) Tu (u, v) = 1, 0, ∂u e ∂f Tv (u, v) = 0, 1, (u, v) ∂v Além disso, o vector N = Tu × Tv é ∂f ∂f (u, v) × 0, 1, (u, v) (7.1) N = 1, 0, ∂u ∂v ∂f ∂f = − (u, v), − (u, v), 1 6= 0R3 ∂u ∂v uma vez que a terceira componente é 1. Vamos agora definir um novo conceito, o conceito de integral de uma função escalar ou de uma função vectorial sobre a superfície S, assim como as propriedades mais importantes destes integrais. Consideremos primeiramente as funções escalares.
7.2.1
Integrais de superfície de uma função escalar
Seja S uma superfície parametrizada por ϕ : D ⊂ R2 → R3 uma função de classe C 1 tal que ϕ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) Seja f : S ⊆ R3 → R um campo escalar contínuo. Definição 76 O integral Z Z f dS = f (ϕ(u, v)) kTu × Tv k dudv S
D
Designa-se por integral da função escalar f sobre a superfície S ou integral de superfície do campo escalar f .
7.2 Integrais de Superfície
185
Veremos mais adiante que este integral é independente da parametrização da superfície. Uma aplicação deste integral é o cálculo de áreas de superfícies. Definição 77 A área da superfície S parametrizada por ϕ : D ⊂ R2 → R3 é Z Z A(S) = 1dS = kTu × Tv k dudv S
D
Proposição 17 Seja S uma superfície, gráfico de uma função diferenciável f : D ⊂ R2 → R. Então de 7.1, a área da superfície é Z A(S) = 1dS S Z
∂f ∂f
− (u, v), − (u, v), 1 dudv =
∂u ∂v D
=
Z
D
s
∂f ∂u
2
+
∂f ∂v
2
+ 1dudv
Exemplo 119 Calcular a área de da superfície esferica x2 +y 2 +z 2 = 1, z ≥ 0. Uma parametrização desta superfície é √ ϕ(u, v) = u, v, 1 − u2 − v 2 com u2 + v 2 ≤ 1. Então uma vez que
−u ∂f =√ ∂u 1 − u2 − v 2
e
∂f −v =√ ∂v 1 − u2 − v 2
o integral A(E) =
Z
D 2
s
2
∂f ∂u
2
+
∂f ∂v
2
+ 1dudv
com D = {(u, v) : u + v ≤ 1} é um integral impróprio, Z 1 √ A(E) = dudv 1 − u2 − v 2 D
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
186
Este integral existe, e fazendo uma mudança de variável para coordenadas polares, ZL Z2π
ρ p dθdρ L→1 1 − ρ2 0 0 iL h p = 2π lim− − 1 − ρ2 L→1 0 √ 2 = 2π lim− − 1 − L + 1
A(E) =
lim−
L→1
= 2π
Por forma a evitar o aparecimento de um integral imprópio poderíamos parametrizar a superfície usando outra função. É o que fazemos no exemplo seguinte. Exemplo 120 Uma parametrização da superfície x2 + y 2 + z 2 = 1, z ≥ 0 é ϕ(u, v) = (cos u sin v, sin u sin v, cos v)
(7.2)
com (u, v) : u ∈ [0, 2π[ ∧ v ∈ 0, π2 . Então
Tu (u, v) = (− sin u sin v, cos u sin v, 0)
e Tv (u, v) = (cos u cos v, sin u cos v, − sin v) Além disso, o vector N = Tu × Tv é
Logo,
N = − cos u sin2 v, − sin u sin2 v, − sin v cos v = 6 0R3 kN k = =
q
p
p
− cos u sin2 v
2
+ − sin u sin2 v
2
+ (− sin v cos v)2
cos2 u sin4 v + sin2 u sin4 v + sin2 v cos2 v
= sin4 v + sin2 v cos2 v = sin v
(7.3)
7.2 Integrais de Superfície
187
e π
A(E) =
Z2 Z2π 0
sin vdudv
0
π
= 2π
Z2
0
sin vdv
= 2π − cos
= 2π
7.2.2
π + cos 0 2
Integrais de superfície de um campo vectorial
Seja S uma superfície parametrizada por ϕ : D ⊂ R2 → R3 uma função de classe C 1 tal que ϕ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) Seja F : S ⊆ R3 → R3 um campo vectorial contínuo. Definição 78 O integral Z Z Z F · dS = F · dS = F (ϕ(u, v)) · (Tu × Tv ) dudv ϕ
S
D
Designa-se por integral da função vectorial F sobre a superfície S ou integral de superfície do campo vectorial F . Exemplo 121 Calcular
R S
F ·dS em que F é o campo de vectores definido por
F (x, y, z) = (x, y, z) e S a superfície da esfera x2 +y 2 +z 2 = 1. Consideremos a parametrização definida por 7.2 mas agora com (u, v) : u ∈ [0, 2π] ∧ v ∈ [0, π] . O vector N = Tu × Tv é dado por 7.3 e portanto, pela definição de integral de superfície de um campo vectorial, Z Z F · dS = F (ϕ(u, v)) · (Tu × Tv ) dudv S
D
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
188
com D = [0, 2π] × [0, π] . Como F (ϕ(u, v)) = (cos u sin v, sin u sin v, cos v) e (Tu × Tv ) = − cos u sin2 v, − sin u sin2 v, − sin v cos v segue-se que
F (ϕ(u, v)) · (Tu × Tv ) = − sin v Logo, Z
F · dS =
Z2π Zπ 0
S
(− sin v) dvdu
0
=
Z2π
(cos π − cos 0) du
=
Z2π
−2du = −4π
0
0
Tal como para as linhas em que a parametrização induzia uma orientação na linha, vejamos que para algumas superfícies ( superficies de duas faces) a parametrização também induz uma orientação. No caso da superficie esférica a normal à superficie num ponto tem, como sabemos, a direção radial. No exemplo que considerámos, a parametrização definida por 7.2 é tal que o vector normal é N = − cos u sin2 v, − sin u sin2 v, − sin v cos v = − sin v (cos u sin v, sin u sin v, cos v) Como − sin v ≤ 0, para todo v ∈ [0, π] , facilmente verificamos que N = −r sin v em que r é o vector posição, r = (x, y, z), aponta para o centro da esfera. Dizemos que a parametrização 7.2 parametriza a esfera segundo a normal interior.
7.2 Integrais de Superfície
189
Definição 79 Uma superfície orientada é uma superfície de duas faces para a qual se especifica o versor normal. Em cada ponto da superfície podemos considerar dois versores n1 e n2 tais que n1 = −n2 . A cada um destes versores associamos uma face da superfície. Exemplo 122 Consideremos a superfície de uma esfera. Podemos considerar a superfície da esfera orientada segundo a normal que aponta para o centro da esfera, normal interior ou a esfera orientada segundo a normal que aponta para fora da esfera, a normal exterior. Exemplo 123 Se considerarmos um plano, podemos também definir duas orientações distintas. No entanto a noção de exterior e interior não é clara. Convenciona-se considerar a normal exterior aquela que tem a terceira componente positiva. R Definição 80 Calcular F · dS em que F é o campo de vectores definido S
por F (x, y, z) = (x, y, z) e S a superfície da esfera x2 + y 2 + z 2 = 1 orientada segundo a normal exterior. A parametrização definida por 7.2 parametriza S segundo a normal interior. Para que N = Tu × Tv aponte para fora da esfera podemos fazer uso da conhecida regra da mão direita e daí decorre que u deve ser a variável associada ao crecimento da latitude e v a variável associada ao crescimento da longitude. Assim vamos definir a parametrização ϕ(u, v) = (cos v sin u, sin v sin u, cos u)
(7.4)
com (u, v) : u ∈ [0, π] ∧ v ∈ [0, 2π] . Então Tu (u, v) = (cos u cos v, cos u sin v, − sin u) e Tv (u, v) = (− sin u sin v, sin u cos v, 0) Além disso, o vector N = Tu × Tv é N = sin2 u cos v, sin2 u sin v, sin u cos u = 6 0R3 N = sin u (sin u cos v, sin u sin v, cos u)
Como sin u ≤ 0, para todo u ∈ [0, π] , facilmente verificamos que N = r sin u
(7.5)
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície
190
em que r é o vector posição, r = (x, y, z), aponta para fora da esfera. Assim Z Z F · dS = F (ϕ(u, v)) · (Tu × Tv ) dudv S
D
com D = [0, π] × [0, 2π] . Como F (ϕ(u, v)) · (Tu × Tv ) = sin u Logo, Z
F · dS =
Z2π Zπ
(sin u) dudv
0
0
=
Z2π
(− cos π + cos 0) du
=
Z2π
2du = 4π
S
0
0
Verificamos assim que o integral sobre a superfície orientada segundo a normal exterior é simétrico ao integral sobre a superfície orientada segundo a normal interior. Mais geralmente, os teoremas seguintes permitem garantir que o integral sobre uma superfície orientada é independente da parametrização. Teorema 37 Seja S uma superfície orientável e ϕ1 e ϕ2 suas parametrizações regulares de S que induzem a mesma orintação a S. Então Z Z F · dS = F · dS ϕ1
ϕ2
Teorema 38 Seja S uma superfície orientável e ϕ1 e ϕ2 suas parametrizações regulares de S que induzem orintação contrária a S. Então Z Z F · dS = − F · dS ϕ1
ϕ2
7.2 Integrais de Superfície
191
O integral de um campo vectorial sobre uma superfície S pode ser visto como o integral de um outro campo escalar. De facto basta obervar que se kTu × Tv k 6= 0 então F (ϕ(u, v)) · (Tu × Tv ) = F (ϕ(u, v)) ·
Tu × Tv kTu × Tv k kTu × Tv k
×Tv Observando que n = kTTuu ×T é o versor normal à superfície em ϕ(u, v) com o vk ×Tv é a projecção mesmo sentido de Tu × Tv , a função escalar F (ϕ(u, v)) · kTTuu ×T vk do campo F sobre a direcção definida pelo versor n. Assim Z Z F · dS = F (ϕ(u, v)) · (Tu × Tv ) dudv S
D
=
Z
F (ϕ(u, v)) ·
Z
(F · n) dS
D
=
Tu × Tv kTu × Tv k kTu × Tv k
S
Ou seja o integral de superfície do campo vectorial F é igual ao integral de superfície do campo escalar resultante da projecção de F sobre o ×Tv . versor normal à superfície n = kTTuu ×T vk
192
Cap. 7: Integrais de Linha e de Superfície