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Estrutura Da Mat

apostila com notas de aula sobre estrutura da mat

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Estrutura da Matéria-I (Notas de Aula) Roberto V. Ribas 14 de maio de 2009 Sumário 1 Teoria Cinética dos Gases 1.1 5 Evidências para uma descrição Atômica da Matéria . . . . . . . . . . . . . 5 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 1.1.1 A descoberta do elétron 1.1.2 A Experiência de Millikan . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 1.2 A Teoria Cinética da Pressão 1.3 Equipartição da Energia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 1.4 Capacidade Caloríca dos Gases . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 1.5 A Distribuição de Maxwell-Boltzmann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 1.6 O Movimento Browniano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 1.7 Exercícios 27 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2 As Origens da Mecânica Quântica 2.1 29 A Radiação do Corpo Negro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 2.1.1 Lei de Stefan-Boltzmann e Deslocamento de Wien . . . . . . . . . . 30 2.1.2 Aplicações e Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 2.1.3 A Lei de Rayleigh-Jeans . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 2.1.4 A Teoria de Planck Para a Radiação do Corpo Negro . . . . . . . . 40 2.1.5 O Calor Especíco dos Sólidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 2.2 O Efeito Fotoelétrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 2.3 Exercícios 50 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 Interação de Fótons com a Matéria 55 3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 3.2 Raios X 55 3.3 O Espalhamento Compton de Raios X 3.4 3.5 3.6 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 Produção e Aniquilação de Pares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 Absorção de Fótons Pela Matéria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 4 O Átomo de Bohr 73 4.1 Espectros Atômicos e Séries Espectrais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 4.2 O Espalhamento Rutherford . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75 4.3 O Modelo de Bohr para o átomo de Hidrogênio . . . . . . . . . . . . . . . 82 4.4 A Experiência de Franck-Hertz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85 4.5 Regras de Quantização de Wilson-Sommerfeld . . . . . . . . . . . . . . . . 89 3 Sumário 4.6 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria 92 95 5.1 Postulados de de Broglie . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95 5.2 Propriedades Gerais das Ondas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99 5.3 O Princípio de Incerteza . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106 5.4 Interferência Em um Sistema de Duas Fendas 5.5 Aplicações do Princípio de Incerteza 5.6 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . 107 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112 6 A Equação de Schroedinger 115 6.1 A Equação de Ondas Quântica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115 6.2 Operadores Quânticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117 Álgebra de Operadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119 6.3 Equação de Schroedinger Independente do Tempo . . . . . . . . . . . . . . 120 6.4 Aspectos Qualitativos das Soluções da Equação de Schroedinger 121 6.2.1 . . . . . . 7 Aplicações da Equação de Schroedinger 7.1 Partícula Livre 7.2 Potencial Degrau 7.3 7.4 7.5 7.2.1 Caso 7.2.2 Caso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . E < V0 : E > V0 Barreira de Potencial 7.3.1 Caso 7.3.2 Caso E > Vo E < Vo 123 123 124 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131 Partícula em Uma Caixa (Poço Quadrado) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134 7.4.1 Poço Innito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134 7.4.2 Poço Finito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135 O Oscilador Harmônico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137 7.5.1 Espectro Vibração-Rotação Molecular . . . . . . . . . . . . . . . . . 143 7.5.2 Operadores de Criação e Aniquilação de Fonons . . . . . . . . . . . 145 7.6 Caixa Cúbica: Equação de Schroedinger em 3 Dimensões . . . . . . . . . . 146 7.7 Exercícios 148 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 Bibliograa 153 9 Apêndice 155 4 1 Teoria Cinética dos Gases 1.1 Evidências para uma descrição Atômica da Matéria ˆ gregos (Demócrito, Epicuro ∼ 450AC). Daí vem a palavra átomo (a-tomo = indivisí- vel). Até o século XVII, essa idéia era associada aos quatro elementos dos quais era composto tudo na Terra (água, fogo, ar e terra). ˆ Newton (∼1662) tenta explicar a lei de Boyle PV = cte. tratando gases como partículas rígidas estáticas que se repelem mutuamente com força inversamente proporcional ao quadrado da distância entre as partículas. ˆ Bernulli (∼1738) primeira descrição cinética dos gases. Formulou um modelo similar ao que apareceu mais de um século depois, conseguindo antecipar inclusive propriedades dos gases que só seriam conhecidas cerca de 50 anos depois. ˆ Em 1811, o italiano Amedeo Avogadro apresentou hipóteses para a teoria atômica, que entretanto não foram muito aceitas até meados do século XIX: Partículas de um gás são pequenas, comparadas com a distância média entre elas. Partículas dos elementos consistem, às vezes, de 2 ou mais átomos unidos (chamou esses agrupamentos de moléculas). Volumes iguais de gases em T e V constantes contêm números iguais de moléculas. ˆ Teoria cinética dos gases foi formalmente e amplamente desenvolvida a partir de meados do século XIX por Maxwell, Clausius, Boltzmann e outros. ˆ Descoberta do elétron por J. J. Thomson em 1897. 1.1.1 A descoberta do elétron Os raios catódicos foram descobertos no nal do século XIX e sua natureza não estava ainda bem estabelecida quando Thomson iniciou seus experimentos no Laboratório Cavendish, na Inglaterra. Contrariamente à maioria dos cientistas germânicos, que achavam os raios catódicos serem conseqüência de um processo ocorrendo no ether, Thomson (e outros cientistas ingleses) propunha que os raios eram partículas materiais carregadas negativamente 5 1 Teoria Cinética dos Gases e desenvolveu um método para medir a razão entre a carga e a massa dessas partículas, os elétrons. No tubo de raios catódicos (gura 1.1), os dois ânodos A e B são ligados ao potencial positivo e o catodo ao negativo. Com uma pressão baixa, mas ainda com uma quantidade razoável de gás no interior do tubo, há ionização do gás residual e uma luz é emitida na região entre o catodo e o ânodo A. Quando a pressão é diminuída abaixo de um certo valor, tudo se torna escuro, exceto uma faixa (imagem do ânodo) no anteparo fosforescente colocado na outra extremidade do tubo. campos elétricos ou magnéticos. Os raios catódicos podem ser desviados por Ao se aplicar uma diferença de potencial V entre as placas D e E, a imagem é desviada para cima ou para baixo. Figura 1.1: Tubo de Raios Catódicos como o usado por J. J. Thomson Aplicando-se um campo magnético uniforme B, por exemplo na região das placas D e E, na direção perpendicular ao plano do papel, na região em que existe campo, os raios catódicos terão como trajetória um arco de círculo, cujo raio é dado pela segunda lei de Newton, igualando-se a força magnética com a centrípeta: Fmag = Fcentr´ıpeta : qvB = mv 2 ; R R= mv qB Para determinar a velocidade v dos raios, Thomson coletava e media a carga total N q, onde N Q= é o número total de partículas dos raios catódicos atingindo uma pequena placa condutora onde a carga é coletada. Medindo-se o aumento de temperatura dessa placa e sabendo-se que a quantidade de calor gerado corresponde à perda de energia W Q 1 2 das partículas do raio, onde W = N mv . Substituindo-se N = na expressão para a 2 q 2 perda de energia, temos: v = 2W q/mQ o que resulta na expressão: 2W q = m QR2 B 2 Este procedimento resultava em valores muito incertos para a razão devido as diculdades de se determinar W. q/m, principalmente Num segundo método desenvolvido por J. J. Thomson, ele aplicava, além do campo magnético B, uma diferença de potencial V na região entre as duas placas. Supondo ser o raio devido a um feixe de partículas de carga q 6 1.1 Evidências para uma descrição Atômica da Matéria e massa m atravessando a região entre as placas com velocidade v perpendicular á direção do campo magnético (e à do elétrico), na região em que há campo B, a força magnética fará com que as partículas descrevam um arco de círculo de raio R dado pela expressão mostrada anteriormente, R = mv/qB . Note que com v na direção do eixo do instrumento e B perpendicular ao plano do papel, a força magnética terá direção perpendicular ao plano das placas, ou seja, na mesma direção da força elétrica. Se o campo elétrico entre as placas é E, a força elétrica nas partículas de carga q será qE. Ajustando-se a intensidade do campo elétrico de modo que a força elétrica cancele a força de direção oposta devido ao campo magnético (fazendo portanto que a faixa luminosa no anteparo que na mesma posição em que cava quando não havia nem B nem E), tem-se a igualdade: qvB = qE; de onde v = E B Mantendo-se agora este valor de E e desligando-se B, mede-se uma deexão vertical y na tela. Esta deexão pode ser calculada pela soma de dois termos: na região entre as placas, a partícula está sob a ação de uma força constante qE na direção vertical e o deslocamento na posição vertical é dado por: 1 qE 2 1 y1 = at21 = t 2 2m 1 Onde t1 é o tempo de transito da partícula no comprimento x1 das placas: x1 = vt1 e portanto, y1 = 1 qE x21 2 m v2 Ao deixar a região de aceleração, a velocidade na direção y é vy = at1 = qE x1 m v e a partícula continua com essa velocidade até atingir o anteparo fosforescente. O tempo gasto para percorrer a distância x2 e´ t2 = x2 /v y2 = vy t2 = e portanto: qE x1 x2 m v2 e a distância total y é dada por: qE y = y1 + y2 = mv 2  1 2 x + x1 x2 2 1  Medindo-se y, e e sabendo-se x1 e x2 pode-se então determinar q/m. Thomson repetiu o experimento trocando o gás residual e o elemento do catodo, obtendo sempre o mesmo resultado. Valores de q/m para íons eram conhecidos por medidas de eletrólise. Thomson notou que os valores de q/m para os raios catódicos (que ele chamou de corpúsculos e 7 1 Teoria Cinética dos Gases que depois seriam chamados de elétrons) eram cerca de 2000 vezes maiores que o q/m correspondente ao íon mais leve conhecido, o hidrogênio. Já a partir das medidas realizadas por Faraday, haviam evidências para uma quantidade mínima de carga elétrica. A quantidade de carga correspondente a 1 Faraday (∼96500 C) é usada para decompor 1 mol de íons monovalentes e o dobro dessa quantidade para o caso de íons bi-valentes. Como F = Avogadro, Faraday estimou e = NA e e com 10−20 C. as estimativas que haviam para o número de Thomson procurou então determinar o valor da carga elementar, experiências que foram realizadas por seu aluno J. S. Townsend. Fazendo o gás ionizado produzido por eletrólise borbulhar através da água, produzia uma nuvem de vapor d'agua, com cada gotícula contendo um (ou mais) íon. Coletando as gotículas da nuvem, media sua carga total com um eletrômetro, bem como sua massa. Determinando-se número de gotas como a razão entre a massa total e a massa se uma gota (o raio médio das gotas era estimado medindose a velocidade de queda livre das gotas - veja experiência de Millikan adiante) e com a suposição de que cada gotícula continha um íon, a carga elétrica de cada íon pode ser −19 determinada. Townsend estimou q = 10 C, as principais incertezas no raio das gotas (as gotículas evaporam muito rapidamente e seu raio varia com o tempo) e no número de íons contidos em cada gota. 1.1.2 A Experiência de Millikan Um método muito mais preciso para a medida da carga de uma única gota foi desenvolvido em 1910 por Millikan e Fletcher. Neste método são utilizadas gotículas de óleo, que ao contrário da água, não perdem muita massa por evaporação. Fletcher, a carga de cada gota é determinada. No método de Millikan e Embora cada gota contenha um número variado de cargas elementares, com a medida de um grande número de gotas foi possível −19 determinar com precisão o valor da carga elementar e =1.59 · 10 C). Figura 1.2: Aparelho utilizado na medida da carga elementar utilizando a técnica de Millikan-Fletcher. No método de Millikan (gura 1.2), gotículas de óleo são produzidas com um micro 8 1.1 Evidências para uma descrição Atômica da Matéria pulverizador (também chamado de atomizador, semelhante ao aparelho usado até 15-20 anos atrás para vaporização de remédio para asma) e introduzidas através de pequenos orifícios, no espaço entre duas placas de um capacitor. Com uma iluminação forte e um microscópio de pequena ampliação (∼3 a 10x) pode-se observar o movimento das gotículas (observa-se a luz difratada pelas gotas) ao se aplicar uma diferença de potencial entre as placas. Além da força elétrica qE e da gravitacional mg, deve-se considerar ainda agindo nas gotas, uma força resistiva, devido a viscosidade do ar (deve-se considerar ainda uma pequena correção devido ao empuxo). A força viscosa é proporcional à velocidade da gota e é dada pela lei de Stokes: Fv = −6πηav . Onde η é o coeciente de viscosidade do ar, a o raio da gota e v sua velocidade. Assim, uma gota com a força elétrica para baixo, paralela à da gravidade, faz com que a gotícula seja acelerada para baixo, aumentando sua velocidade e com isso também a força resistiva, até que esta se iguale à soma das outras fazendo com que a gota atinja uma velocidade constante (velocidade terminal). Como o −6 tempo gasto na parte acelerada do movimento é muito curto (∼ 10 s) a gota é sempre observada em movimento uniforme. Invertendo-se o campo elétrico (escolhendo-se E de tal forma que qE > mg) a gota passa a fazer um movimento ascendente. Desprezando-se o empuxo, as equações de equilíbrio de forças são:  mg + qE = 6πηavd (descida) qE = mg + 6πηavs (subida) Somando as equações e usando E = V/d, m = 34 πa3 ρ e sendo d a separação entre as placas do capacitor: q = 3πηa d (vd + vs ) V O raio pode ser obtido das mesmas medidas de vs , vd . Subtraindo-se as duas equações obtém-se: s a= 9η (vd − vs ) 4ρg O raio da gota poderia ser também determinado, medindo-se a velocidade terminal na queda livre, ou seja, sem nenhum campo elétrico. Neste caso, a força gravitacional é equilibrada pela força viscosa: 4 mg = πa3 ρo´leo g = 6πηavq 3 de onde se obtém: r a= 9ηvq 2ρo g No experimento realizado no laboratório didático, esta expressão é utilizada para se fazer uma primeira estimativa do tamanho das gotas, de modo a se poder selecionar gotas de tamanhos adequados para as medidas. 9 1 Teoria Cinética dos Gases Millikan e Fletcher estudaram ainda com cuidado a lei de Stokes e vericaram que a viscosidade do ar, determinada para o caso de objetos macroscópicos deveria sofrer uma pequena correção devido ao pequeno tamanho das gotas (nas medidas que fazemos no −5 Laboratório Didático, as gotas têm raio de cerca de 5 · 10 cm). Essas gotas têm tamanho comparável com o livre caminho médio das moléculas de ar e portanto o ar não se comporta como um "uido contínuo", como é o caso para esferas de raios muito maiores. A lei de Stokes correta é obtida calculando-se a viscosidade do ar para uma gota pequena com:  η = ηo Onde b 1+ pa −1 ηo é a viscosidade do ar para objetos macroscópicos, p a pressão atmosférica, a o −4 raio da gota e b =6,17 · 10 cmHg.cm é uma constante. Na gura 1.3, vemos a distribuição de valores para cerca de 300 gotas, medidas pelos alunos da disciplina Física Experimental V do IFUSP, acumuladas durante dois anos em meados da década de 90. Os resultados mostram claramente a quantização da carga e a análise de centróide dos três primeiros picos, permitem a determinação da carga elementar com incerteza menor que ∼ 1%. Figura 1.3: Distribuição de valores de carga de gotas medidas na experiência de Millikan (dados obtidos por alunos do IFUSP). Um interessante relato de H. Fletcher sobre seu trabalho com Millikan foi publicado postumamente (H. Fletcher - My work with Millikan on the oil-drop experiment. Physics 10 1.2 A Teoria Cinética da Pressão Today, June 1982, p. 43). Neste artigo, Fletcher, conta como foi o desenvolvimento do método e como Millikan lhe comunicou que seu nome não seria incluído no artigo a ser publicado sobre a determinação da carga do elétron (e que daria o prêmio Nobel a Robert Millikan). Mais recentemente, variações da técnica de Millikan-Fletcher têm sido utilizadas na procura de cargas fracionárias. Embora previstas no modelo padrão das partículas elementares, 1 2 os quarks (com carga ± e ± ) não devem ser observados separadamente, mas somente 3 3 combinadas de modo a ter carga total inteira. Mesmo assim, muitos pesquisadores têm efetuado essas experiências na busca de partículas com cargas fracionárias. Um bom artigo descrevendo essa busca é o de M. L. Perl e E. R. Lee Searching for elementary particles with fractional electric charge and the philosophy of speculative experiments - Am. J. Phys. 65, 698 (1997). 1.2 A Teoria Cinética da Pressão Conforme as idéias originais de Avogadro, um gás é constituído de um número grande de partículas (moléculas), separadas por distâncias grandes, comparadas com seus diâmetros e que executam colisões elásticas entre si e com as paredes do recipiente. Como as moléculas são eletricamente neutras e a força gravitacional entre elas é desprezível, podemos considerar que não há interação entre as moléculas, a não ser durante as colisões. Portanto, entre duas colisões, elas descrevem um movimento retilíneo e uniforme. Vamos então tentar obter a lei dos gases ideais, P V = nRT , à partir destas hipóteses. Consideremos as moléculas de um gás, contidas num recipiente na forma de uma caixa cúbica de lado L. Vamos calcular a pressão na superfície à direita, perpendicular ao eixo x, e com área A. Uma molécula do gás com velocidade v colidindo com aquela superfície do recipiente terá alterada somente o componente de sua velocidade na direção perpendicular à parede: vxi → −vxi . A variação do momento linear da molécula será portanto ∆pxi = 2mvxi , que corresponde portanto ao impulso aplicado à parede pela colisão com a molécula. As moléculas no gás devem ter as mais diferentes velocidades, em todas as direções. Consideremos que as N moléculas contidas no volume V da caixa e vamos agrupá-las conforme os valores 0 0 dos componentes x de suas velocidades: n1 com vx1 , n2 com vx2 e assim por diante. Num pequeno intervalo de tempo ∆t, o número total de moléculas com velocidade vxi que coli- dem com a parede à direita será dado pelo número de moléculas que se encontram a uma distância menor que ∆tvxi da parede. Este número é dado portanto pela quantidade de , moléculas contidas no volume ∆tvxi A, que corresponde à fração ni (∆tvxi A)/V . O Impulso total correspondente a esse grupo de moléculas será portanto: Ii = n0i ∆tvxi A 2mvxi V Sabemos que, por denição, o impulso de uma força é igual ao produto da força media pelo intervalo de tempo em que ela atua. Portanto a força média agindo na parede no 11 1 Teoria Cinética dos Gases intervalo de tempo ∆t é: hFi i = A 2 n0i 2mvxi V A pressão média devido a essa força será portanto: Pi = 2 n0i 2mvxi V Para obtermos a pressão total, devemos somar para todos os valores de P = X n0 2mv 2 i i Note que n0i xi V = vxi : 2m X 0 2 nv V i i xi é o número de moléculas com velocidade vxi positiva (atingindo a parede à direita do recipiente). Se considerarmos o número de partículas com componente −vxi , este 0 número deverá ser também ni , pois não há razão para que haja mais ou menos moléculas com componente de velocidade numa direção, em relação à outra. Chamando agora de ni 0 o número de partículas com módulo de velocidade vxi , temos que ni = 2ni . Substituindo na expressão acima, temos: P = mX 2 ni vxi V i O valor quadrático médio do componente x das moléculas do gás é, por denição, dado por: 2 1 X 2 vx = ni vxi N i com N= X ni i Portanto temos a relação: P V = N.m. vx2 O módulo quadrático da velocidade de uma molécula no gás é denida por vy2 + vz2 e portanto a velocidade quadrática média será dada por: v 2 = vx2 +  2 2 2 2 1 X 1 X 2 2 2 v = ni vi2 = ni vxi + vyi + vzi = vx + vy + vz N i N i Novamente, não há nenhuma razão para que qualquer um dos valores médios à direita 2 2 2 Portanto hvx i = vy = hvz i de da equação acima seja menor ou maior que um outro. 2 2 onde hv i = 3 hvx i e portanto: 12 1.2 A Teoria Cinética da Pressão 1 2 P V = N m v2 = N 3 3  1 2 m v 2  1 m hv 2 i corresponde à energia cinética média das moléculas do gás. 2 temos nalmente: O termo Assim, 2 P V = N hEc i 3 Comparando com a lei dos gases, P V = nRT , N onde n= N , temos: NA R 2 T = N hEc i NA 3 de onde se obtém, hEc i = onde k = R/NA 3 3 R T = kT 2 NA 2 é a chamada constante de Boltzmann (k = 1.38 · 10−23 J/K = 8.6 · 10−5 eV/K). A temperatura absoluta de um gás é portanto diretamente relacionada com a energia cinética média das moléculas do gás. Por exemplo, à temperatura ambiente (∼300 K), a energia média das moléculas de um gás é: Ec = 3 · 8.6 · 10−5 · 300 ∼ = 0.04 eV 2 Podemos também, com base nestes resultados, calcular a velocidade média das moléculas, p vrms = hv 2 i, onde rms corresponde em inglês a raiz da média quadrática denida como (root mean square ): r vrms = como k= p hv 2 i = 2 hEci = m r 3kT m R , temos: NA r vrms = 3RT = NA m r 3RT M onde M é a massa molar do gás. Essa velocidade pode ainda ser calculada em termos de grandezas macroscópicas. Com P V = nRT , temos vrms = q contida no volume V e portanto 3P V . nM nM V O produto nM corresponde à massa total do gás = ρ, a densidade do gás e condições normais de pressão e temperatura, que corresponde a ρ ∼ 1.4 kg/m3 e vrms = q p = 1 atm 3P . Para o ar em ρ = 1,0 · 105 N/m2 o vrms ' 460 m/s. 13 1 Teoria Cinética dos Gases Lembrando ainda que a velocidade do som em um gás é dada por vs = q γRT onde M Cp = 1.4, vemos que a velocidade do som é da mesma ordem de grandeza da velocidade Cv média das moléculas do gás. Como a onda sonora se propaga, em termos microscópicos γ= pelas colisões entre as moléculas, ela não poderia então ser maior que a velocidade com que essas moléculas colidem. Na obtenção da equação dos gases, ignoramos as colisões entre as moléculas, no volume do recipiente. Embora haja normalmente um número muito grande dessas colisões, uma vez que essas colisões são elásticas, tanto a energia cinética quanto o momento linear são conservados. Por outro lado, as moléculas do gás têm uma ampla distribuição de valores de velocidade (que veremos posteriormente) e essas colisões não alteram, em média essa distribuição, que é representada, na dedução pelos valores de n1 , n2 , ... Portanto, a dedução, embora não tenha considerado explicitamente as colisões entre as moléculas, é correta. 1.3 Equipartição da Energia Na sessão anterior, vimos que a energia cinética de translação (v no caso se refere à velocidade do CM das moléculas) é repartida igualmente nas três possibilidades dos componentes de velocidade da molécula: 1 1 1 Ec = mvx2 + mvy2 + mvz2 2 2 2 O argumento para que isso ocorra é que não deve haver uma coordenada privilegiada. Como cada pequeno volume de gás é homogêneo e isotrópico, as três direções espaciais são equivalentes naquele volume, e daí a eqüipartição da energia cinética. Para moléculas monoatômicas, a translação é a única maneira de uma molécula adquirir energia. Entretanto, moléculas formadas por dois ou mais átomos podem também girar e vibrar. Novamente observa-se nesses casos, que a energia média das moléculas se distribui eqüitativamente nos vários modos possíveis para a molécula adquirir energia. Na molécula monoatômica, como vimos, a energia total é igual à energia cinética de translação e igual 3 a Ec = kT . Portanto, cada termo da energia, escrita como função dos componentes 2 1 da velocidade, corresponde a kT . Vamos generalizar esta observação, com o chamado 2 Teorema da Eqüipartição da Energia: Num sistema em equilíbrio termodinâmico à temperatura T, a energia média de uma 1 molécula, por grau de liberdade, corresponde a 2 kT . Como grau de liberdade, entende-se cada coordenada (seja de velocidade ou de posição) que aparece elevado ao quadrado na expressão para a energia da molécula. Assim, uma molécula monoatômica pode adquirir energia somente na forma de translação nos três eixos independentes. Já uma molécula diatômica, se considerada idealmente como duas esferas (átomos) ligadas por uma haste rígida, como nos halteres, terá, além dos três graus de liberdade referentes à translação do CM, a possibilidade de rotação. halter pode se dar em A rotação do qualquer dos três eixos, mas como veremos posteriormente, essa molécula não pode adquirir energia por rotação ao longo do eixo de simetria, que passa pelo 14 1.4 Capacidade Caloríca dos Gases eixo da haste (podemos imaginar, a princípio, que o tamanho do átomo é desprezível em comparação com a distância entre os dois átomos na molécula e que o momento de inércia em relação a este eixo é zero, mas a verdadeira razão para que isso não possa ocorrer só pode ser compreendida com a mecânica quântica). Portanto, são dois os graus de liberdade de rotação da molécula diatômica e a energia da molécula é então escrita como:  1  1 E = m vx2 + vy2 + vz2 + = ωx2 + ωy2 2 2 e portanto E = 52 kT para moléculas diatômicas. As moléculas diatômicas não são rígidas. seriam ligados por uma mola. Num modelo mais realista, os dois átomos Esta molécula pode então ter energia de vibração, que corresponde a outros dois graus de liberdade, uma vez que a energia de vibração é dada 1 1 2 2 por E = kδ + mvr , onde δ é o deslocamento em relação à distância de equilíbrio e vr a 2 2 velocidade dos átomos da molécula em relação ao centro de massa. 1.4 Capacidade Caloríca dos Gases A capacidade caloríca molar a volume constante dQ Cv = dT Onde dQ Cv de um gás é denida como:  v é a quantidade de calor absorvido pelo gás e dT a correspondente variação de sua temperatura. Como nos processos a volume constante não há realização de trabalho, a quantidade de calor (energia) absorvida só pode ser armazenada na forma de energia interna, ou seja : translação, rotação ou vibração das moléculas. Chamando a energia por mol de moléculas por U (energia interna molar), a capacidade térmica molar a volume constante é dada por: dU Cv = dT  v 3 e portanto Cv = R. 2 5 Para moléculas diatômicas, usando-se o modelo de halteres rígidos, U = RT e portanto 2 Cv = 25 R. Estes valores estão em bom acordo com os valores de Cv observados para todos os gases monoatômicos e com aqueles para a maioria dos diatômicos (para moléculas com Para um mol de moléculas monoatômicas, U = 32 NA kT = 32 RT mais de dois átomos, o cálculo do número de graus de liberdade é muito mais complexo e não será discutido aqui). No caso das moléculas diatômicas, observa-se entretanto, que o valor de Cv varia com a 5 temperatura. Se numa faixa de temperatura tem-se Cv = R, baixando-se a temperatura 2 3 o valor de Cv diminui, até atingir R e então estabiliza. Aumentando-se a temperatura, 2 7 o valor vai aumentando, podendo atingir R, mas em geral este valor não chega a ser 2 atingido, pois antes as moléculas se dissociam. Isso pode ser entendido se admitirmos 15 1 Teoria Cinética dos Gases que abaixo de uma certa temperatura, as moléculas do gás não podem mais rodar e que somente acima de uma certa temperatura mais elevada, podem vibrar além de rodar. A explicação para esses fatos só pode ser obtida com a mecânica quântica, como veremos mais tarde. Essas idéias podem também ser aplicadas aos sólidos.Considerando-se os átomos num cristal como ligados uns aos outros por forças como numa mola. Cada átomo pode então adquirir energia vibrando em quaisquer dos três eixos e portanto,  1  1 E = k x2 + y 2 + z 2 + m vx2 + vy2 + vz2 2 2 correspondendo a seis graus de liberdade. Portanto, para sólidos Cv = 3R, de acordo com essas premissas. Realmente, este é o valor observado para o calor especíco a volume constante para sólidos, a altas temperaturas, mas Cv diminui gradativamente, á medida que a temperatura diminui. Posteriormente iremos estudar um modelo para o calor especíco dos sólidos, com base na mecânica quântica, onde este comportamento será previsto. 1.5 A Distribuição de Maxwell-Boltzmann No cálculo da velocidade quadrática média, na sessão anterior, utilizamos o conjunto {n1 , n2 , n3 , . . .} que caracteriza a distribuição de velocidades das moléculas do gás. Como o P N = ni , a razão fi = nNi corresponde à fração de moléculas com velocidade vxi . Utilizando-se o conjunto {f} ao invés de {n'}, a denição número total de moléculas no recipiente é da velocidade quadrática média é dada por: X 2 1 X 2 2 vxi ni = vxi vx = fi N e os fi obedecem ao que se chama de condição de normalização da distribuição: X fi = i 1 X ni = 1 N i O conjunto {f} é chamado função de distribuição, no caso, dos componentes de velocidade das moléculas de um gás ideal. Na verdade, em muitos casos, incluindo o das moléculas vx , são contínuos {vx1, vx2 ,...}, é apenas uma de um gás, os valores da grandeza a que a distribuição se refere, no caso e a atribuição que zemos, de um número discreto de valores aproximação. Neste e em muitos outros casos, o conjunto {f} deve ser substituído por uma função contínua f (vx ). Como no caso geral de substituição de uma somatória pela integral, a denição de média de uma grandeza para uma função de distribuição contínua é dada por: 2 vx = Z +∞ −∞ com a condição de normalização: 16 vx2 f (vx )dvx 1.5 A Distribuição de Maxwell-Boltzmann Z +∞ f (vx )dvx = 1 −∞ Na verdade, o conjunto {n} ou {f} que utilizamos na sessão anterior poderia ser melhor interpretado como cada ni correspondendo ao número de moléculas com velocidade dentro de um pequeno intervalo entre vxi e vxi + ∆vx (e portanto fi correspondendo à fração de moléculas dentro desse intervalo). Deste modo temos as seguintes relações: Z vxi +∆vx fi = Z vxi +∆vx f (vx )dvx e ni = N vxi f (vx )dvx vxi ∆vx tendendo a zero, temos: df = f (vx )dvx = fração de moléculas com velocidade entre vx e vx + dvx . Note que não há sentido em se dizer que f (vx ) é a fração de moléculas com velocidade vx . Uma vez que para qualquer intervalo nito de velocidades existem innitos valores de vx , para um fazendo-se número nito de moléculas o número médio com uma dada velocidade é zero. O valor da f (vx ) corresponde à densidade de probabilidade de se encontrar uma molécula com velocidade entre vx e vx + dvx . Qualquer outra grandeza, função de vx pode ter seu valor médio obtido à partir da função de distribuição f (vx ). Seja h(vx ) uma função qualquer de vx . Seu valor médio é dado por: Z +∞ hhi = h(vx )f (vx )dvx função −∞ Funções de distribuição são utilizadas em várias situações em física e análise estatística em geral. Por exemplo, quando tratamos dos erros aleatórios em um conjunto de N medidas realizadas de uma dada grandeza, esses valores se distribuem de acordo com a distribuição −(x−hxi2 )/2σ 2 normal ou gaussiana, f (x) = Ce em torno do valor médio da grandeza (que representa a melhor estimativa para o valor verdadeiro, na ausência de erros sistemáticos). No caso dos erros estatísticos, em geral nos interessamos pelo valor médio da grandeza hxi e pelo desvio padrão σ denido como σ 2 = (x − hxi)2 , ou seja, quanto em medida média cada medida individual difere do valor médio, o que sem dúvida é uma boa medida de nossa capacidade (ou do instrumento de medição) de determinar o valor verdadeiro da grandeza. Quanto maior σ, mais distantes, em média, estão os valores medidos do valor médio: 2 Z σ = Z 2 x f (x)dx − 2 hxi Z 2 (x − hxi) f (x)dx = Z xf (x)dx + x2 Z  x2 − 2x hxi + hxi2 f (x)dx = f (x)dx = x2 − 2 hxi2 + hxi2 = x2 − hxi2 Embora a distribuição de incertezas estatísticas e várias outras de interesse físico sejam dada por uma função gaussiana, em muitas situações a função de distribuição pode ser 17 1 Teoria Cinética dos Gases bem diferente. Portanto em muitos casos, o conhecimento somente da média e do desvio padrão podem não dizer muita coisa sobre o problema (como no caso da piada em que o sujeito no meio de um tiroteio leva um tiro de raspão no braço esquerdo e depois um outro semelhante no braço direito. Em média ele levou um tiro no peito e portanto deve estar morto - em média!). O nosso objetivo, nesta sessão é obter a função de distribuição para os componentes de velocidade das moléculas de um gás. Esta função de distribuição foi obtida pela primeira vez por James Clerk Maxwell por volta de 1859. Não vamos fazer aqui a dedução desenvolvida por Maxwell (ver H.M. Nussenzveig, vol. nativa proposta inicialmente por Boltzmann). 2 para uma demonstração alter- Vejamos, entretanto, alguns argumentos que permitem avaliar algumas características desta distribuição. Em sua demonstração, vx , vy e vz são independentes uns dos outros. Isso signica que o fato de uma molécula ter vx grande, não implica em nenhuma restrição para os valores de vy ou vz . Isto é razoável, pois numa colisão entre duas partículas, na situação em que apenas vx é alterado (colisão frontal), vx pode aumentar ou diminuir, Maxwell supôs que os valores de velocidade dependendo da colisão, e os outros componentes não se alteram. Com isso, a função de distribuição procurada, que fornece a fração de moléculas com componentes de velocidade entre vx e vx + dvx , vy e vy + dvy , vz e vz + dvz , F (vx ,vy ,vz ) pode ser fatorada como: F (vx ,vy ,vz ) = f (vx )f (vy )f (vz ) v x , vy e v z f (vx ). pelo fato das grandezas encontrar, por exemplo, serem independentes umas das outras. Com isso, basta Do que vimos na sessão anterior, f (vx ) deve ser uma função simétrica, pois não há razão para que as moléculas tenham preferência por vx vx f (vx ) = f (−vx ) à direita, em relação a com direção à esquerda. Sem muito rigor, podemos também dizer que como as colisões entre as moléculas são basicamente ao acaso, as velocidades devem se distribuir como no caso dos erros estatísticos. Esta foi efetivamente a solução encontrada por Maxwell: 2 f (vx ) = Ce−mvx /2kT onde C = R +∞ −∞ 1 f (vx )dvx =  m  12 2πkT e portanto  m  32 2 2 2 F (vx ,vy ,vz ) = e−m(vx +vy +vz )/2kT 2πkT Vamos precisar, nesta e nas próximas sessões, calcular várias integrais de produtos de funções de vx por f (vx ) para cálculos de valores médios. R∞ 0 18 2 e−λx dx = 1 2 pπ λ ; R∞ 0 Abaixo, algumas dessas integrais: 2 xe−λx dx = 1 2λ 1.5 A Distribuição de Maxwell-Boltzmann R∞ 0 R∞ 0 As integrais de 2 x2 e−λx dx = 2 x4 e−λx dx = 3 1√ πλ− 2 ; 4 R∞ 0 5 3√ πλ− 2 ; 8 R∞ 0 2 x3 e−λx dx = 12 λ−2 2 x5 e−λx dx = λ−3 −∞ a + ∞ são = 0 quando x aparece com potência ímpar no integrando e o dobro dos valores acima, para as potências pares de x. Vamos vericar a plausibilidade da função de distribuição encontrada, calculando hvx2 i, que já obtivemos na sessão anterior utilizando outro procedimento: 2 vx = as integrais em de vy, vz dvy e dvz Z Z Z vx2 F (vx ,vy ,vz )dvx dvy dvz podem ser facilmente efetuadas pois não há termos dependentes senão na própria função F e cada uma dessas integrais deve ser igual a 1, pela condição de normalização:  m  21 Z +∞ 2 e−mvy /2kT dvy = 1 2πkT −∞ e o mesmo em relação à integração em 2  m  12 vx = 2πkT Z +∞ dvz . Portanto temos: 2 vx2 e−mvx /2kT dvx = 2 −∞  m  12 1 √  m − 23 kT π = 2πkT 4 2kT m como havíamos encontrado anteriormente. Assim como encontramos a função de distribuição de velocidades F (vx ,vy ,vz ), chamada distribuição de Maxwell, poderíamos perguntar qual a função que descreve as posições das partículas na caixa. No exemplo que tomamos na sessão anterior, não há nenhuma posição privilegiada para as moléculas (a densidade do gás é uniforme) e portanto: F (x,y,x) = C onde C é tal que: Z Z F (x,y,z)dxdydz = C dxdydz = CV = 1 1 , sendo V o volume da caixa. Note que nem sempre a distribuição de V posições é uma constante. Na atmosfera terrestre, por exemplo, a densidade diminui com ou F (x,y,z) = a altitude, devido à ação da força gravitacional. Veremos posteriormente como obter essa distribuição. Se fôssemos representar gracamente a função F (x,y,z) num plano (x,y), por exem- plo, poderíamos desenhar um retângulo com as dimensões correspondentes a esse corte no volume da caixa, com pontos, distribuídos aleatoriamente no plano, representando as moléculas do gás com densidade uniforme. Poderíamos também desenhar algo semelhante para a distribuição de velocidades, F (vx ,vy ,vz ). Note que agora os eixos seriam v x , vy , vz e 19 1 Teoria Cinética dos Gases o espaço não seria o espaço físico usual, mas o espaço de velocidades. Para partículas localizadas numa caixa de dimensões (a,b,c), a representação de limitada no espaço físico. Na representação de F (vx ,vy ,vz ) F (x,y,z) se faz numa região para essas mesmas partículas, o espaço (de velocidades) necessário será innito, uma vez que a distribuição gaussiana, como sabemos, tende exponencialmente a zero, à medida que o valor de um componente de velocidade aumenta. Se nos restringirmos ao plano (x,y), por questão de simplicidade, vemos que v x , vy F (vx ,vy ) é máximo para vx = vy = 0 e gradativamente diminui, aumentando-se ou ambos. A representação teria portanto uma densidade de pontos maior na origem vx , vy e diminuindo radialmente, conforme visto na gura 1.4. Uma faixa p 2 2 circular de raio entre v e v + dv onde v = vx + vy nesse espaço, delimita as partículas que têm módulo de velocidade entre v e v + dv . O número de partículas nessa faixa é dado pelo produto da área da faixa, 2πvdv pela densidade de partículas com velocidade v, ou seja: N F (vx ,vy ). No caso real, tridimensional, devemos tomar o produto do volume da casca esférica de mesmo raio e multiplicar por N F (vx ,vy vz ). Agora, se representarmos por g(v) das coordenadas a função de distribuição dos módulos v de velocidade, esse número será também dado por N g(v)dv , e portanto: Figura 1.4: Representação da função de distribuição no plano, F (vx ,vy )  m  32 2 2 2 N g(v)dv = 4πv dvN F (vx vy vz ) = N 4πv e−m(vx +vy +vz )/2kT 2πkT 2 de onde 20 2 1.5 A Distribuição de Maxwell-Boltzmann g(v) = 4π Desta função  m  32 2 v 2 e−mv /2kT 2πkT g(v), podemos também facilmente obter a função de distribuição de energia cinética das moléculas, uma vez que: 1 Ec = mv 2 ; dEc = mvdv 2 e 1 v v dv = dEc = m m r 2 como no expoente da função temos 2Ec dEc m mv 2 /2kT = Ec /kT , a função de distribuição de energias cinéticas é: 1 F (E)dE = CE 2 e−E/kT dE 1 O fator (E 2 ) que multiplica a exponencial é válido somente para este caso, onde a energia total corresponde somente ao termo de energia cinética. Como veremos, quando a energia total depende de outras quantidades (como da posição) o fator será diferente. Da distribuição de velocidades g(v) podemos agora obter a velocidade média (em módulo) das moléculas do gás: r  m  23 8kT 2 −mv 2 /2kT v e dv = hvi = v · 4π 2πkT πm p valor é ligeiramente inferior ao de vrms = hv 2 i que Z note que este havíamos obtido anteriormente. Note também que a distribuição de velocidades não é simétrica. O valor mais provável para a velocidade das moléculas é dado por: valor é inferior a hvi e vrms , vm = q 2kT (verique). Este m conforme visto na gura 1.5. A vericação experimental da distribuição g(v) foi realizada pela primeira vez em 1926, por O. Stern. Mais recentemente, em 1955 Miller e Kusch repetiram o experimento utilizando o ltro de velocidades mecânico visto na gura 1.6, obtendo um excelente acordo com a distribuição g(v), conforme se vê na gura 1.7. As distribuições que obtivemos, F e g são casos particulares de uma distribuição mais geral, conhecida como a distribuição de Maxwell-Boltzmann, cuja obtenção envolve procedimentos ainda mais complexos. Consideremos agora o caso geral de um conjunto de partículas (não somente gás), cuja energia total x,y,z E é uma função tanto das coordenadas quanto das velocidades, ou melhor, do momento px ,py ,pz . Podemos pensar então 21 1 Teoria Cinética dos Gases Figura 1.5: Função de distribuição de v, g(v) nessas partículas como pontos de um espaço exa-dimensional (x,y,z,px ,py ,pz ), chamado es- paço de fase. A probabilidade de se encontrar uma partícula numa célula desse espaço de volume dτ = dxdydzdpx dpy dpz é dada por: f (x,y,z,px ,py ,pz )dτ = Ce−E/kT dτ Figura 1.6: Aparelho usado por Miller e Kusch para medir g(v) A distribuição de velocidades de Maxwell que vimos anteriormente corresponde ao caso de moléculas não interagentes, para as quais a energia total é dado somente pela energia 1 cinética, E = (p2 + p2y + p2z ). 2m x Uma aplicação interessante da função de distribuição de Maxwell-Boltzmann é a que se refere à atmosfera da Terra. Se considerarmos a atmosfera terrestre como um gás ideal, a uma temperatura T, a energia das moléculas será dada por: E= 22 1 2 (px + p2y + p2z ) + mgz 2m 1.6 O Movimento Browniano onde z é a altura em relação ao nível do mar. A distribuição de Maxwell-Boltzmann para essas moléculas será portanto: 1 2 2 2 f (x,y,z,px ,py ,pz ) = Ce− 2m (px +py +pz )/kT e−mgz/kT Figura 1.7: Comparação entre os valores medidos por Miller e Kusch, com a função de distribuição teórica g(v) se perguntarmos qual a probabilidade de encontrarmos uma molécula entre z e z + dz , (não importando o valor de x,y), temos (integrando-se em x e y): 0 f (z) = C e−mgz/kT Essa função é conhecida como lei das atmosferas, mostrando que a densidade do ar decresce exponencialmente com a altitude. 1.6 O Movimento Browniano Em 1827, o botânico inglês Robert Brown observou que as partículas de pólen em suspensão faziam um movimento irregular. Inicialmente pensou tratar-se de uma manifestação biológica, de vida dos pólens, mas depois de observar uma grande variedade de materiais, concluiu que o fenômeno se manifestava também em amostras inorgânicas, portanto não tendo nenhuma relação com processos vivos. Esse fenômeno, hoje conhecido como movi- mento browniano, permaneceu inexplicado por cerca de três quartos de século até 1905, quando Albert Einstein publicou sua teoria para o fenômeno, baseada na teoria cinética da matéria. A explicação de Einstein para este fenômeno deu um grande impulso para a aceitação da teoria cinética da matéria, bem como da teoria atômica, que até então não tinha ampla aceitação. Em sua autobiograa, Einstein descreve o desenvolvimento deste trabalho: Meu objetivo principal era encontrar fatos que garantissem, na medida do pos- sível, a existência de átomos de tamanho bem denido. Tentando fazê-lo, descobri que, segundo a teoria atômica, deveria existir um movimento observável de partículas microscópicas em suspensão, sem saber que observações do movimento browniano já eram familiares há muito tempo. 23 1 Teoria Cinética dos Gases No movimento browniano, uma partícula sólida, grande bastante para poder ser observada num microscópio (i.é. contendo um grande número de átomos), mas sucientemente pequena para que as colisões com as moléculas do gás ou líquido onde se encontra suspensa, possam ser observadas como pequenos deslocamentos da partícula. Este movimento é similar ao processo de difusão de moléculas, exceto pelo fato que para moléculas, com massas muito menores, a difusão se dá com velocidades muito maiores. O movimento da partícula em suspensão pode ser entendida com um exemplo simples, conhecido como passeio aleatório. Consideremos o caso de um bêbado, andando numa calçada. Consideremos por simplicidade, o movimento como unidimensional. Dadas suas condições, a probabilidade de o bêbado dar um passo para a direita, é igual à de dar um na direção oposta. Vamos então calcular a distância média a que o bêbado se encontra da posição inicial n passos. Claramente, como é igualmente provável um passo 2 para a direita ou esquerda, temos hxn i = 0. Entretanto, o valor médio de xn não é nulo. Seja xi a posição do bêbado após o i-ésimo passo de comprimento l : (porta do bar), após ter dados x1 = ±l ⇒ hx1 i = 0; x21 = l2 x2 = x1 ± l ⇒ hx2 i = 0; x22 = x21 ± 2l hx1 i + l2 = 2l2 .......... xn = xn−1 ± l ⇒ hxn i = 0; x2n = x2n−1 ± 2l hxn−1 i + l2 = nl2 √ nl da origem, com igual Portanto, após n passos, o bêbado estará a uma distância xrms = probabilidade de se encontrar à direita ou à esquerda dela. Para uma partícula browniana, o número de passos observado n, correspondente ao deslocamento médio medido num intervalo de tempo t, é proporcional ao número de colisões que a partícula sofre, com as moléculas do gás. Portanto, o número de passos n também será proporcional ao tempo 2 2 de observação. Portanto, hxn i pode ser dado por hxn i = 2Dt onde D é uma constante, chamada constante de difusão. Vejamos agora uma dedução mais formal do deslocamento quadrático médio, onde será possível obter explicitamente o valor de D. Consideremos a equação de movimento para a coordenada x da partícula browniana. Agem sobre a partícula, a força viscosa, dada pela lei de Stokes, Fv = −6πηav , além da força ocasionada pelas colisões com as moléculas do uido. Essa força é completamente aleatória e tem média zero. Macroscopicamente, essa força corresponde à pressão do uido sobre a partícula. Microscopicamente, sabemos que ela é devida às colisões com as moléculas e que não é sempre nula, devido às utuações no número de colisões. Forças desse tipo são chamadas forças estocásticas ou forças de Langevin. A equação de movimento para a coordenada x da partícula é portanto: m onde 24 µ = 6πηa. d2 x dx = −µ + Fe 2 dt dt Multiplicando a equação por x e utilizando as relações: 1.6 O Movimento Browniano d dt  dx x dt   = dx dt 2 d2 x d +x 2 e dt dt  x2 2  =x dx dt temos: d m dt  dx x dt   −m dx dt 2 d +µ dt Tomando a média dessa equação e notando que  x2 2  = xFe hxFe i = hxi hFe i = 0 pois não há nenhuma correlação entre o valor da força e a posição em que se encontra a partícula, temos:  m d dt  d dt  x2 2  − m vx2 + µ  d x2 dt 2  =0 Note que a operação de diferenciação em relação a t comuta com  Denindo então a  Z d d 2 x F (x)dx = = dt dt d 2 x = dtd hx2 i, função f = dt d 2 x dt Z x2 F (x)dx = h i, pois: d 2 x dt a equação acima ca: 1 1 df m − m vx2 + µf = 0 2 dt 2 Como, pela teoria cinética, 1 m hvx2 i 2 = 12 kT , m fazendo agora a substituição: obtemos a seguinte equação: df + µf = 2kT dt g(t) = f (t) − dg 2kT , e como µ dt = df , dt dg µ + g=0 dt m τ= dendo m , a solução dessa equação pode ser escrita como: µ g(t) = go e−t/τ Para partículas pequenas, como as onde o movimento browniano é perceptível, a razão −6 (τ ) entre a massa da partícula e a constante µ = 6πηa é cerca de 10 s. Portanto, para tempos normalmente usado na observação do movimento das partículas (segundos), g(t) ∼ 0. Portanto, da denição de g(t) e de f(t), temos: d 2 2kT x = dt µ de onde 25 1 Teoria Cinética dos Gases 2 2kT RT t= t x = µ 3πηaNA Em 1908, Jean-Baptiste Perrin conseguiu confeccionar micro esferas de látex, com raios determinados e estudou o movimento browniano dessas partículas numa série de emulsões, variando a dimensão das partículas, o líquido de suspensão, a temperatura, etc. e sempre 23 23 obtendo o mesmo valor para NA , entre 5,5 × 10 e 7,2 × 10 , conforme suas próprias palavras, no discurso que proferiu na entrega do premio Nobel que recebeu por seus trabalhos com o movimento browniano. A excelente concordância dos resultados fez com que a teoria atômica da matéria passasse a ter a ampla aceitação. Figura 1.8: Simulação numérica: Componente x da posição de uma partícula browniana em função do tempo para três gotas de mesmo raio. No laboratório didático, realizamos uma medida do número de Avogadro, com base no estudo do movimento browniano em gotas de óleo, utilizando o mesmo equipamento e técnica da experiência de Millikan. Nessas medidas entretanto, escolhe-se gotas bem menores que as usadas nas medidas da carga do elétron, de modo a aumentar o efeito, tornando a observação mais fácil e precisa. Se zermos um gráco, não dos deslocamentos a cada intervalo de tempo ∆t, mas da posição relativa a uma origem em relação ao tempo, teremos uma curva como as mostradas na gura 1.8. A principal característica dessas curvas, é que elas são semelhante em qualquer escala de tempo em que a observamos. Por exemplo, se numa das curvas da 1.8, tomarmos uma faixa de 0 a 50 ao invés de 0 a 500, o aspecto da curva não se altera. Uma 26 1.7 Exercícios curva com comportamento como as da gura, no qual ele se repete sempre, qualquer que seja a escala do eixo que utilizamos para observá-lo, é chamado fractal (embora no presente caso, haja um limite inferior de escala, dado pela escala atômica). 1.7 Exercícios 1.- No aparelho de Thomson mostrado nas notas de aula, as placas D e Estão separadas por 1.5 cm, têm 5 cm de comprimento e são mantidas a uma diferença de potencial de 50 V. a) Se os elétrons têm energia cinética igual a 2000 eV, encontre a deexão produzida após o percurso de 5 cm entre as placas. b) Qual a deexão total da mancha na tela, considerando que os elétrons percorrem uma distância adicional de 30 cm na região livre de campo, antes de atingir a tela? c) Qual a intensidade de campo magnético que seria necessária entre as placas para que não houvesse deexão? 2.- Para uma gota de óleo de raio a, caindo sob ação somente da força da gravidade e da resistência do ar, determina-se a velocidade de queda pela medida do tempo de queda 3 numa distância de 1 mm. Sabendo-se que a densidade do óleo é igual a 0.8 g/cm , e que −4 o coeciente de viscosidade do ar é ρ = 1,8 · 10 poises (sistema cgs), faça uma tabela de valores do raio em função do tempo de queda, para tq variando de 5 a 40 s em intervalos de 5 s. 3.- Calcule vrms para o H2 à temperatura de 300K. Calcule a temperatura T para o qual vrms iguale a velocidade de escape do campo gravitacional terrestre, de 11,2 km/s. 3 4.- Calcule o número médio de moléculas/cm e o espaçamento médio entre elas: a) em água líquida. b) em vapor de água, a 1 atm e 100 C (tratando como um gás ideal). c) no caso b), calcule a velocidade quadrática média das moléculas. d) Qual o tempo médio entre duas colisões? 5.- A função de distribuição de velocidades de um grupo de N partículas é dada por dNv = avdv onde dNv é o número de partículas que tem velocidades entre v e v + dv, e a é uma constante. Nenhuma partícula tem velocidade maior que V , sendo que as velocidades podem variar entre 0 e esse valor máximo, V. a) Esboce o gráco da função de distribuição, ou seja dNv /dv em função de v. b) Calcule o valor da constante a em termos de N e V. c) Calcule a velocidade média , a velocidade quadrática média e a velocidade mais provável em termos de V. d) Qual porcentagem das partículas tem velocidades entre a velocidade média e V? E entre a velocidade quadrática média e V? 6.- Assuma que os átomos de hidrogênio na atmosfera do sol obedeçam uma distribuição de velocidades Maxwelliana. a) Dado que a temperatura no sol é de 6000 K calcule a energia cinética de um desses átomos se movendo com a velocidade mais provável encontrada nessa distribuição. b) Calcule a velocidade desse átomo. 7.- Ao nível do mar, a composição volumétrica da atmosfera é 21% de oxigênio e 79% de nitrogênio (desprezando-se cerca de 1% de outros gases, principalmente argônio). Suponha (embora não seja uma boa aproximação) que a temperatura não varie com a altura e que seu valor seja 10C. Neste caso, qual seria a composição volumétrica da atmosfera a 10 km −27 de altitude? (tome 1 unidade de massa atômica = 1,66 · 10 kg ). 27 1 Teoria Cinética dos Gases 8.- Para um gás ideal em equilíbrio térmico, qual a fração das moléculas cujas velocidades diferem em menos de 1% da velocidade mais provável ∆v ≈ dv vmp ? Note que podemos aproximar neste caso. 9.- Mostre que g(v) tem valor máximo para v = vm = (2kT /m)1/2 . 10.- a) Mostre que a função de distribuição de componentes de velocidades f (vx ) pode ser escrita como: 2 2 f (vx ) = (2π)−1/2 vo−1 e−vx /2vo onde 0.01vo . vo = vrms = (kT /m)1/2 . dvx por ∆vx = vx = vo . c) vx = 8vo . Considere 1 mol de um gás e aproxime Encontre o número de moléculas em ∆vx para: b) vx = 0. c) 11.- Considere as seguintes forças em uma gota de óleo no experimento de Millikan: gravitacional, elétrica, atrito e boiante. Desenhe um diagrama mostrando as forças na gota a) quando o campo elétrico é desligado e a carga cai livremente. b) quando o campo elétrico aplicado faz com que a gota suba. 12.- Usando a distribuição de módulos velocidades de Maxwell a) Escreva a integral com a expressão para o número de moléculas num gas ideal com velocidade v>c a T=293 K. b) Explique porque o resultado numérico da expressão encontrada em a) é despresível. 13.- Encontre com T = 35 C. 28 vmp para o gás N2 do ar a) num dia frio com T = -10 C, b) num dia quente, 2 As Origens da Mecânica Quântica 2.1 A Radiação do Corpo Negro Sólidos aquecidos emitem a chamada radiação térmica. Isso pode ser facilmente observado numa lâmpada incandescente de bulbo transparente, quando aumentamos lentamente a tensão aplicada no lamento. Inicialmente, para baixas tensões (e temperaturas do lamento), não podemos ver nenhuma modicação aparente no aspecto do lamento, mas colocando-se a mão próximo ao bulbo, teremos uma sensação térmica indicando a maior temperatura do lamento. Depois, o lamento começa car a car avermelhado e continuamente, à medida que aumentamos a tensão, vai cando mais claro, até que atinja a tensão nominal de operação quando o lamento emite luz branca. Se dispersarmos essa radiação por um prisma ou outro tipo de espectrógrafo, veremos que o espectro de freqüências da radiação emitida é contínuo. Há vários outros tipos de radiação emitidos pela matéria. Gases e vapores ionizados podem emitir uma radiação característica de cada material, cujo espectro, no entanto, é constituído de freqüências discretas. Raios X são emitidos por sólidos, quando bombardeados por elétrons ou outras partículas carregadas em altas energias. Estes têm um espectro discreto, mas são sempre acompanhados por outros, de espectro contínuo, emitidos na desaceleração rápida dos elétrons, dentro do sólido onde incidem. Certos sólidos ou líquidos podem ainda emitir uma radiação característica, quando iluminados (excitados). Este fenômeno é chamado uorescência, quando a emissão de radiação cessa imediatamente após removida a fonte de luz excitadora e de fosforescência, se a emissão de radiação persiste após retirada a fonte excitadora. Os raios gamas, um outro tipo de radiação eletromagnética, de freqüência ainda maior que os raios X, são emitidos pelos núcleos atômicos em processos de desintegração radioativa (decaimento radioativo). Neste capítulo, entretanto, nos restringiremos à descrição das propriedades da radiação térmica. O espectro de freqüências da radiação térmica emitida por um corpo à temperatura T é especicada pela radiança espectral RT (ν) denida de modo que RT (ν)dν corresponda à energia, por unidade de área e por unidade de tempo, emitida pela radiação térmica de freqüência entre ν e ν + dν por um corpo à temperatura T. RT (ν) é portanto proporcional à função de distribuição de energia em função das freqüências, da radiação térmica. radiança, RT A corresponde à energia total, por unidade de tempo e de área do emissor é denida como: Z RT = ∞ RT (ν)dν 0 29 2 As Origens da Mecânica Quântica Observa-se experimentalmente, que as características de da constituição do corpo que emite a radiação. RT (ν) RT (ν) dependem muito pouco é basicamente uma função da tem- peratura do corpo. Na verdade, corpos muito reexivos ou muito transparentes, se comportam quantitativamente muito diferentes dos corpos opacos e pouco reexivos. Corpos como esses podem ainda ser caracterizados pelo coeciente de absorção de energia térmica. O coeciente de absorção a corresponde à fração de energia térmica incidente no corpo que é absorvido, o restante sendo portanto reetido. Sendo r o coeciente de reexão, temos portanto: a+r =1 Não consideramos aqui, os corpos translúcidos, para os quais teríamos ainda uma parte da radiação térmica transmitida pelo corpo. Para os corpos opacos, o coeciente de transmissão é nulo. Um corpo, para o qual r=0 e portanto a=1, é chamado corpo negro, um absorvedor perfeito de radiação. Corpos de quaisquer materiais, cuja superfície é pintada com uma tinta preta e fosca (como por exemplo fuligem) são boas aproximações de corpos negros. Experimentalmente, a realização mais próxima de um corpo negro, é obtida com um orifício pequeno, num corpo sólido qualquer, no qual há uma ampla cavidade interna, que se comunica com o exterior somente pelo orifício. O orifício se comporta como um absorvedor ideal de radiação térmica. Como se vê na gura 2.1, a radiação incidente nele entra na cavidade e é em parte absorvida pelas paredes da cavidade e parte reetida para outros pontos da cavidade e (especialmente se as paredes da cavidade tiverem um coeciente de absorção grande) apenas uma fração muito pequena escapa pelo orifício. compararmos a radiança RT Se da radiação emitida pelo orifício de um corpo negro a uma temperatura T, com a de qualquer outro corpo, na mesma temperatura, veremos que a radiança do corpo negro é sempre maior. Podemos denir o coeciente de emissão de radiação de um corpo, à temperatura T, pela razão da radiança desse corpo em relação à de um corpo negro, na mesma temperatura: e= RT RTcn Para superfícies em geral, em equilíbrio térmico, a taxa de absorção deve ser igual à de emissão. Desse modo, temos a=e para qualquer corpo. Como por denição um corpo negro, ele é também um emissor perfeito de radiação térmica (e a=1 para = 1). 2.1.1 Lei de Stefan-Boltzmann e Deslocamento de Wien Em 1879, Stefan, com base em dados experimentais, observou que a radiança de um corpo negro à temperatura T é proporcional a T elevado à quarta potência: RTcn = σT 4 Posteriormente Boltzmann demonstrou, aplicando as leis da termodinâmica à radiação eletromagnética (como num ciclo de Carnot), a validade da expressão acima, conhecida 30 2.1 A Radiação do Corpo Negro Figura 2.1: Corpo Negro construído como orifício numa cavidade metálica. como lei de Stefan-Boltzmann. A constante de Stefan-Boltzmann é Observando as curvas RT (λ) comprimento de onda para σ = 5.67·10−8 W/m2 K 4 . como as mostrada na gura 2.2, podemos vericar que o o qual λ é máximo, diminui à medida em que a temperatura em que a curva foi medida aumenta, obtendo-se a relação: λm T = cte. = 2.90 · 10−3 mK onde λm corresponde ao comprimento de onda onde é conhecida como a lei do deslocamento de Wien. RT (λ) têm a seguinte característica: RT (λ) é máximo. Esta relação Esta relação mostra que as curvas Se gracarmos várias curvas diferentes, não como função de T, mas em função do produto RT (λ) para temperatura λT , os valores de RT (λ) máximos para todas as curvas, estarão alinhados na mesma posição do eixo das abscissas, λT , correspondendo ao valor λm T . Os valores dos máximos serão obviamente diferentes, com valores maiores para temperaturas maiores. Entretanto, se gracarmos no eixo vertical RT (λ) , em função de λT , então todas as curvas se não o valor de RT (λ), mas o da razão T5 superpõem perfeitamente, conforme visto na gura abaixo. Este resultado mostra que RT (λ) a razão é uma função universal f (λT ). O fato de termos sempre o produto λT T5 na dependência de f , mostra que a curva R para qualquer temperatura, terá as mesmas propriedades para mesmos valores de λT , ou seja, para λ2 T2 . Isso quer dizer por exemplo max que se λ1 for o comprimento de onda para qual RT 1 tem o valor igual à metade de RT 1 , então se elevarmos o corpo negro à temperatura T2 , então RT 2 terá valor igual à metade max do novo valor máximo RT 2 , para o comprimento de onda λ2 , dado por λ2 T2 = λ1 T1 . (λT )5 RT (λ) = CT F (λT ) = C 5 F (λT ) = Cλ−5 f (λT ) λ 5 31 2 As Origens da Mecânica Quântica Figura 2.2: Distribuição espectral Figura 2.3: Vericação experimental da lei de deslocamento generalizada de Wien. 32 2.1 A Radiação do Corpo Negro Onde f (λT ) = (λT )5 F (λT ). Esta relação pode ser obtida a partir dos conceitos da termodinâmica e da mecânica estatística e é o máximo que se pode obter na explicação da radiação do corpo negro, com a física clássica. Como veremos a seguir, a tentativa de se obter f (λT ) com base na física clássica falha completamente. 2.1.2 Aplicações e Exemplos Figura 2.4: Espectro da radiação solar que atinge a Terra Figura 2.5: Radiação infravermelho emitida pelo corpo humano (direita). Na gura da esquerda a mesma cena registrada com luz visível. 33 2 As Origens da Mecânica Quântica Efeito estufa Uma aplicação bastante atual dos conceitos de corpo negro, corresponde ao cálculo (que faremos em primeira aproximação), da temperatura média na superfície da Terra e do efeito estufa causado pela atmosfera terrestre. Constituida majoritariamente de nitrogênio (N2) e oxigênio (O2), há também na atmosfera outros componentes em quantidades bem menores, como H2, O3 (ozônio), vapor d'água, CO2, NH4, etc. São essas moléculas tri-atômicas as principais responsáveis pelo efeito estufa. Os espectros da radiação solar incidente, da radiação emitida pela Terra e de absorção pela atmosfera terrestre são vistos na gura 2.6. Figura 2.6: (a) Espectro de emissão de corpo negro para o Sol (6000 K) e para a Terra (255 K), (b) fração de radiação absorvida enquanto passa da superfície até o topo, e c) a absorvida da tropopausa até o topo (Goody e Yung,  Atmospheric Radiation , Oxford Univ. Press, 1989). Vamos considerar a situação mais simples, com a atmosfera totalmente transparente, de modo que não há nenhum efeito estufa. Chamando de S a constante solar (radiação média que atinge o topo da atmosfera da Terra, por metro quadrado) e Te a temperatura média da Terra nessas condições, e considerando a Terra como um corpo negro, temos: S(1 − α) = σTe4 ⇒ Te − Onde α p 4 S(1 − α)/σ é o albedo terrestre, ou seja a fração da energia incidente que é reetida de volta para o espaço. Tomando S=340W/m2, e α = 0,3, obtem-se Te = 255K, ou seja -18C. Portanto, o efeito estufa causado pela atmosfera é fundamental para a vida no Planeta, elevando esta temperatura para cerca de +15C. Vamos agora considerar um modelo 34 2.1 A Radiação do Corpo Negro simples para a atmosfera, como sendo uma camada que é totalmente transparente para a radiação solar incidente (faixa do visível, também chamada de ondas curtas), mas que seja relativamente opaca para a radiação infravermelha. A radiação solar que atinge a superfície da Terra (S(1 − α) é absorvida pelo solo e reemitida, na forma de radiação de corpo negro à temperatura Ts (temperatura da superfície da Terra). Parte dessa energia é então absorvida pela atmosfera, que então terá uma temperatura de equilíbrio Ta. Considerando 4 também a atmosfera como um corpo negro, ela irradiará σTa ) tanto em direção ao solo quanto para o espaço. Chando o coeciente de absorção da atmosfera, temos as seguintes equações de balanço radiativo (ver gura 2.7):  Onde R = σTs4 . S(1 − α) = R(1 − ) + A (topo) S(1 − α) + A = R (superf´ıcie) Somando-se as duas equações, obtem-se: 2S(1 − α) = R(2 + ) Tomando S(1 − α) = σTe4 , 2σTe4 para  = 0 temos então: = σTs4 (2  + ) ⇒ Ts = 2 2− 1/4 Te temos a situação de atmosfera transparente e portanto Ts = Te . Se ima- ginarmos a atmosfera totalmente opaca para o infravermelho (baixas frequências), então teremos o efeito estufa máximo. Neste caso, a temperatura média da superfície da Terra será: Ts = 21/4 Te = 1,19Te = 303K Isso corresponde a 30C de temperatura média, muito acima dos 15C atuais. Para obtermos a temperatura média atual, devemos considerar um fator de absorção da atmosfera  ' 0,75). 35 2 As Origens da Mecânica Quântica Figura 2.7: Balanço energético Terra-Atmosfera Para uma estimativa mais realista da temperatura média da superfície (e parte inferior da atmosfera), deve-se considerar um grande número de camadas na atmosfera, fazendo-se o balanço energético em cada uma, bem com ter em conta outras formas de transferência de energia, como correntes na atmosfera, efeito de chuvas, etc. 2.1.3 A Lei de Rayleigh-Jeans No interior da cavidade de um corpo negro, temos uma certa distribuição espectral de radiação eletromagnética em equilíbrio termodinâmico com as paredes da cavidade. Essas ondas são produzidas por osciladores (p. ex. elétrons em agitação térmica) nas paredes da cavidade. Nas paredes de uma cavidade metálica há sempre elétrons e outras cargas elétricas em constante vibração devido a energia térmica, e portanto gerando essas ondas. Não precisamos saber como essas ondas são geradas, mas sabemos que devem ser geradas de alguma forma. Isso é o que também sabiam os físicos do século XIX, quando estudavam esse problema. As ondas na cavidade, para se manterem em equilíbrio, devem corresponder a ondas estacionárias. Como as ondas eletromagnéticas correspondem a campos elétricos oscilantes na direção perpendicular à direção de propagação, nas posições extremas (isto é nas paredes), essas ondas devem ter amplitude sempre nula, pois o campo elétrico paralelo à superfície de um metal não pode ser diferente, sendo sempre cancelado pela mobilidade das cargas elétricas nos metais. Vamos a seguir obter a função que descreve a densidade de 2 energia eletromagnética no interior de uma cavidade, ρT (λ) = d U/dV dλ. A Quantidade R(λ) corresponde à potência irradiada pela cavidade, por unidade de área e de comprimento 3 irr de onda: RT (λ) = d U /dAdλdt. Pode-se mostrar que R(λ) = 4c ρT (λ) . Usando a teoria cinética clássica, podemos calcular a função de distribuição de energia 36 2.1 A Radiação do Corpo Negro das ondas na cavidade. Para isso, devemos conhecer o número total de graus de liberdade das ondas na cavidade, ou seja o número de ondas por intervalo de freqüências entre ν e ν + dν ou comprimentos de onda entre λ e λ + dλ. Para obter esta função, vejamos antes um caso mais simples, unidimensional, como o da corda de um violão. A condição de ondas estacionárias numa corda de violão de comprimento L implica na amplitude nula das ondas nas extremidades de xação da corda. Portanto as ondas estacionárias poderão ter 2L comprimentos de onda λ1 = 2L, λ2 = L, λ3 = ,..., ou de um modo geral: λn = 2L . Como 3 n c 2L ν = c/λ, as freqüências possíveis correspondentes são dadas por ν = 2L n ou n = c ν . Figura 2.8: Modos de vibração de uma corda de violão No caso da radiação do corpo negro, estamos interessados principalmente na faixa de freqüências acima do infravermelho. Como os comprimentos de onda da radiação eletro−6 magnética nessa região são menores que 10 m, com cavidades de dimensões da ordem 4 de alguns cm, os n correspondentes são 10 ou maiores. Portanto, faz sentido, para esses valores, aproximar n por uma variável contínua e perguntarmos pelo número de ondas es- dn = N (ν)dν com freqüências entre ν e ν + dν . Da expressão acima para n em dν . Ou seja, temos uma densidade uniforme de ondas ν , temos: N (ν)dν = 2L c tacionárias função de por unidade de freqüência. No caso tridimensional da cavidade, devemos considerar uma onda propagando-se numa direção arbitrária, fazendo um ângulo x, β com a do eixo y e γ α com a direção do eixo com a do eixo z. Uma onda eletromagnética tri-dimensional como essa, tem seu campo elétrico dado pela relação: → − − − → → − → − E (→ r ,t) = Ex i + Ey j + Ez k onde Ex = Eox sin(2πx/λx ) sin(2πνt) e expressões semelhantes para Ey e Ez . Para uma cavidade cúbica de lado L, a condição para ondas estacionárias (componente de E paralelo à parede deve ser sempre nulo) é dada por: 2L/λx = nx , 2L/λy = ny e 2L/λz = nz , Conforme visto na gura bidimensional abaixo, as relações por: λ = λx cos α = λy cos β = λz cos γ , onde γ nx , ny , nz números inteiros. entre λ e λx , λy e nz são dadas com é o ângulo formado com a direção de propagação da onda, com o eixo z, não mostrado na gura. Portanto temos as equações: 37 2 As Origens da Mecânica Quântica 2L 2L 2L cos α = nx ; cos β = ny ; cos γ = nz λ λ λ Figura 2.9: Representação bi-dimensional de uma onda estacionária numa cavidade. elevando ao quadrado essas equações e somando, notando-se ainda que os ângulos acima 2 2 2 obedecem a relação cos α +cos β +cos γ = 1 (para o caso bi-dimensional vê-se facilmente 2 2 2 pois cos β = cos (π/2 − α) = sin α) temos então: n2x + n2y + n2z = ( Tomando agora ν = c/λ 2L 2 ) λ e substituindo na relação acima, temos: c ν= 2 r n2x n2y n2z + + L2 L2 L2 Portanto, o número de ondas de freqüência menores ou iguais a as combinações de nx ,ny ,nz ν corresponde a todas tais que o valor do membro direito da equação acima seja menor ou igual a ν . Para encontrar esse número, vamos colocar num gráco 3D, com eixos x = nLx , y = nLy e z = nLz pontos correspondentes a cada valor de nx ,ny ,nz (ver gura 2.10), lembrando que somente faz sentido valores positivos de nx ,ny ,nz (ou seja, um octante). 38 2.1 A Radiação do Corpo Negro Figura 2.10: Representação dos diferentes modos de ondas estacionárias na cavidade, com valor de ν≤ c 2 q n2x L2 + n2y L2 + n2z No presente caso, l1 L2 = l2 = l3 = L 1/L3 . Portanto a densidade de pontos (núρ = L3 . O volume correspondente qaos valores de O volume ocupado por cada ponto é igual a mero de pontos por unidade de volume é nx ,ny ,nz que fornecem freqüências menores que Portanto o número total n ν é V = 14 πr3 com 83 r= c 2 n2x L2 + n2y L2 + n2z . L2 é dado por:  ν 3 4 n = ρ × V = πL³ 3 c A fração (dn) de ondas com freqüência entre ν e ν +dν pode então ser obtida derivando-se a expressão acima: dn = N (ν)dν = 4πL3 2 ν dν c3 Para cada uma dessas freqüência, temos na verdade duas ondas independentes, com a direção do campo elétrico em duas direções perpendiculares. Portanto o número total de ondas estacionárias na cavidade é o dobro da quantidade obtida acima: N (ν)dν = 8πL3 2 ν dν c3 O teorema de eqüipartição de energia diz que cada grau de liberdade na expressão para 1 a energia de um sistema, corresponde a uma energia média kT . No caso de osciladores 2 e de ondas, a cada oscilador ou onda temos dois graus de liberdade (energias cinéticas e potencial elástica, ou energia no campo elétrico e no magnético no caso das ondas). 39 2 As Origens da Mecânica Quântica Portanto a energia média por onda estacionária será kT. Obtemos então o espectro de 3 densidade de energia por unidade de volume (= L ) e por unidade de freqüência das ondas na cavidade: ρT (ν)dν = 1 8πkT 2 kT N (ν)dν = ν dν V c3 Para obtermos a expressão em termos do comprimento de onda, (ρ(λ)dλ) devemos lem- ν1 e ν2 = ν1 +dν é o mesmo que o de ondas λ2 = λ1 + dλ. Como, se para um dado dν potemos então a relação dn = ρ(λ)dλ = −ρ(ν)dν . brar que o número de ondas com freqüência entre com comprimento de onda entre λ1 = c/ν1 dλ será negativo, dν = −(c/λ2 )dλ, temos nalmente: sitivo, o correspondente Ainda, como e ρT (λ)dλ = − 8πkT 2 8πkT 8πk ν dν = dλ = λT dλ c3 λ4 λ5 que é a lei de Rayleigh-Jeans para a radiação do corpo negro. que vamos para freqüências maiores do espectro (ultravioleta) enquanto que a curva experimental tende a zero. ρ(ν) Note que a medida cresce continuamente, Esta falha na previsão clássica cou conhecida como a catástrofe do ultravioleta. 2.1.4 A Teoria de Planck Para a Radiação do Corpo Negro No nal do século XIX, Max Planck procurava uma solução para o problema da radiação do corpo negro. Sabendo que o entendimento desse fenômeno era fundamental, concluiu que deveria haver alguma falha nas teorias, mas cujas origens não eram até então conhecidas. Por isso tentou, exaustivamente, qualquer solução para o problema, mesmo que para tal, tivesse que fazer hipóteses não muito justicáveis. Vamos tentar seguir um possível caminho desenvolvido por Planck, com base em nossas deduções anteriores para o caso das moléculas de gás. Na obtenção da energia média das partículas do gás, utilizamos inicialmente uma distribuição discreta de valores de velocidade (ou de energia) para as moléculas do gás e depois substituímos essa distribuição por outra contínua. Vamos voltar e reconsiderar esta hipótese, para o caso os osciladores harmônicos correspondentes à radiação em equilíbrio na cavidade do corpo negro. A distribuição de energias de Maxwell1 1 2 2 Boltzmann para osciladores harmônicos unidimensionais (E = mv + kx ) é dada por: 2 2 F (E)dE = Ae−E/kT dE. Considerando então que temos ni osciladores com energia Ei e tomando as energias discretas Ei em intervalos regulares, E0 = 0; E1 = ∆E; E2 = 2∆E e assim por diante e supondo ainda que a distribuição de Maxwell-Boltzmann seja válida, os ni seriam dados por: ni = no e−Ei /kT = no e−i∆E/kT Com base nessa hipótese, vamos calcular a energia média dos osciladores: P ni Ei 1 hEi = P = (no Eo + n1 E1 + n2 E2 + ...) = N ni 40 2.1 A Radiação do Corpo Negro 1 (0 + ∆Eno e−∆E/kT + 2∆Eno e−2∆E/kT + ...) N no ∆Ee−∆E/kT hEi = (1 + 2e−∆E/kT + 3e−2∆E/kT + ...) N hEi = observando que o termo entre parênteses na expressão acima pode ser escrito como 1 2x + 3x2 + ...) e que esta soma é igual a (1−x) 2 , temos: no ∆Ee−∆E/kT 1 2 N (1 − e−∆E/kT ) hEi = A soma N= N= X e portanto P ni pode ser também desenvolvida: ni = (no + no e−∆E/kT + no e−2∆E/kT + ...) = no (1 + x + x2 + ...) = N= (1 + no (1 − x) no . Substituindo este valor na expressão para , temos: 1−e−∆E/kT hEi = ∆Ee−∆E/kT (1 − e−∆E/kT ) 2 (1 − e−∆E/kT ) Veja que se tomarmos o limite para ∆E → 0 ∆E lim ∆E→0 e∆E/kT Aplicando agora o valor obtido para −1 ∆Ee−∆E/kT ∆E = ∆E/kT = −∆E/kT 1−e e −1 obtemos o resultado clássico, = hEi = kT : ∆E = kT ∆E/kT hEi na expressão de Rayleigh-Jeans para a distribuição de energias da radiação do corpo negro, obtemos: ρ(λ)dλ = 8π 8π ∆E 8π λ∆E hEi dλ = dλ = dλ λ4 λ4 e∆E/kT − 1 λ5 e∆E/kT − 1 Com base no resultado obtido utilizando o deslocamento de Wien generalizado, a exλ∆E deve ser portanto uma função f (λT ). Para que isso ocorra, temos duas e∆E/kT −1 possibilidades na escolha de ∆E . Por exemplo, ∆E = αT ou ∆E = β/λ. Com a primeira pressão possibilidade, a distribuição para a radiação do corpo negro ca: ρ(λ)dλ = 8π αλT dλ λ5 eα/k − 1 e com a segunda possibilidade: ρ(λ)dλ = 8π β dλ 5 β/λkT λ e −1 Notemos que com a escolha da primeira possibilidade para ∆E , continuamos a ter a catástrofe do ultra-violeta, mas escolhendo-se a segunda possibilidade, essa divergência para λ→0 não ocorre, pois: 41 2 As Origens da Mecânica Quântica C 1 e−γ/λ = lim =0 λ→0 λ5 eγ/λ − 1 λ→0 λ5 lim ρ(λ) descrevia perfeitamente os dados β tal que β = hc onde c é a velocidade Planck vericou ainda que a expressão obtida para experimentais, escolhendo-se o valor da constante −34 da luz e h = 6.23 · 10 Js = 4.14 · 10−15 eV s é hoje conhecida como a constante de Planck, considera como uma constante universal da natureza. Usando a relação mostrada c anteriormente, RT (λ) = ρT (λ), temos nalmente a expressão: 4 RT (λ) = 2π hc2 λ5 ehc/λkT − 1 ou, em termos de freqüências: RT (ν) = 2π 3 h ν hν/kT 2 c e −1 Max Planck apresentou estes resultados numa reunião da Sociedade Alemã de Física em 14 de dezembro de 1900. Esta data é considerada como a do nascimento da Mecânica Quântica. Devemos mencionar ainda um importante detalhe da teoria de Planck. De acordo com sua hipótese, um oscilador harmônico pode ter energias que são múltiplas de uma quantidade xa, hν : E = 0, hν, 2hν, ..., nhν, .... A emissão (e a absorção) de radiação pelo oscilador ocorre somente quando ele pula de um estado de energia para um outro vizinho. Passando do estado de energia nhν oscilador perde uma quantidade de energia radiação. Uma quantidade sando de um estado nhν hν para o imediatamente abaixo, hν (n − 1)hν , o que é emitida na forma de um pulso de de energia pode também ser absorvida pelo oscilador, pas- para o de energia (n + 1)hν . Essas idéias (principalmente a de absorção) não eram ainda muito claras quando Planck postulou sua teoria, uma vêz que ele não havia incluido a quantização da energia radiante (o fóton), que seria introduzida mais tarde, como veremos, por Albert Einstein. 2.1.5 O Calor Especíco dos Sólidos Um outro sistema em que a hipótese de Planck foi inicialmente aplicada, é o caso do calor especíco de sólidos. Como vimos, classicamente, considerando os átomos de um mol de um sólido como um conjunto de 3NA osciladores harmônicos, a capacidade caloríca a  dU volume constante será Cv = = 3R. Experimentalmente este é o valor obtido para dT v altos valores de T, mas Cv tende a zero, quando a temperatura absoluta tende a zero. Einstein, em 1908, usou o resultado de Planck para a energia média de um conjunto de osciladores, considerando os átomos do sólido como um conjunto de freqüência ν, sendo portanto a energia média por mol dada por: U = 3NA hEi = 42 3NA hν hν/kT e − 1 3NA osciladores de 2.2 O Efeito Fotoelétrico de onde se obtém: dU Cv = dT ou, substituindo  = hν kT 2 (ehν/kT − v No limite para altas temperaturas, 2 −1 = e e portanto, ehν/kT 2 1) =  hν 2 hν/kT e kT 2 (ehν/kT − 1) 3NA k NA k = R, Cv = hν/kT  3NA hν Cv = 3R, hν 2 hν/kT e kT 2 (ehν/kT − 1)  3R ehν/kT → 1 hν 1 1+ + kT 2  hν kT 2 e !2 + ... − 1  = hν kT 2   1 hν 1+ + ... 2 kT conforme previsto. Analogamente é fácil vericar que o resultado tende a zero para T tendendo para zero. Para cada sólido, deve ser encontrado o valor da freqüência ν dos osciladores (que dependem da força de mola da ligação entre os átomos em cada caso. Este valor pode ser denido em termos da chamada temperatura de Einstein TE = hν/k . Na gura 2.6, vemos o resultado previsto pela equação acima, comparado com dados experimentais. Embora qualitativamente correto, há ainda pequenas discrepâncias com relação aos resultados experimentais. Somente em 1912, P. Debye, considerando as moléculas vibrando não todas numa mesma freqüência, mas como um sistema de osciladores acoplados de diferentes freqüências, conseguiu obter o resultado correto para este problema. 2.2 O Efeito Fotoelétrico Por volta de 1887, H. Hertz realizava a série de experimentos com os quais demonstrou a existência das ondas eletromagnéticas. Para isso utilizou um circuito ressonante tipo bobina-capacitor, convenientemente acoplado a um par de pontas metálicas colocadas a uma pequena distância uma da outra. Induzindo um pulso de tensão no sistema, ondas eletromagnéticas eram emitidas pelo sistema e uma faisca entre as pontas era produzida. A uma certa distância desse sistema, um outro sistema análogo, funcionava como receptor das ondas hertzianas. No receptor, a energia eletromagnética capturada pelo sistema era utilizada para produzir a faisca nas correspondentes pontas. Hertz media a intensidade do sinal recebido afastando controladamente as pontas do receptor, até que estas não produzissem mais faiscas, para uma dada condição do gerador. Analisando cuidadosamente o problema, vericou que podia obter faiscas com distâncias maiores entre as pontas, se deixasse a luz produzida pelas pontas do gerador atingir as do receptor. Utilizando vários obstáculos colocados entre as pontas dos dois aparelhos, como papelão, vidro e quartzo, observou que o vidro, diferentemente do quartzo, afetava a distância máxima e concluiu, corretamente, que o efeito era causado pela incidência, nas pontas do receptor, de luz 43 2 As Origens da Mecânica Quântica Figura 2.11: Teoria de Einstein para o calor especíco de sólidos 44 2.2 O Efeito Fotoelétrico ultravioleta produzida na descarga do transmissor. Este fenômeno é conhecido como efeito fotoelétrico : a luz ultravioleta (ou radiações mais energéticas como raios X e raios gama) incidindo num metal faz com que elétrons sejam ejetados da superfície metálica. É interessante notar a ironia desta descoberta, pois ao mesmo tempo que demonstrava a existência das ondas eletromagnéticas, a observação deste fenômeno secundário levaria, muitos anos depois, ao desenvolvimento da teoria corpuscular da luz, desenvolvida por Einstein em 1905 exatamente para explicar este fenômeno. Figura 2.12: Fotocélula como a usada por Lenard para o estudo do efeito fotoelétrico. Mais tarde, por volta de 1900, numa série de experimentos realizados independentemente por Lenard e por Merrit e Stewart, as propriedades gerais deste fenômeno foram estabelecidas. Utilizando um instrumento semelhante ao visto na gura 2.7, foi demonstrado serem emitidas partículas do catodo, com mesma razão e/m dos raios catódicos. Todos os eletrodos são mantidos em vácuo e cuidados especiais devem ser tomados com a qualidade da superfície do catodo (chamado de fotocatodo), pois em geral, a oxidação ou contaminação da superfície deste reduz consideravelmente o efeito. Iluminando-se o catodo C com luz introduzida pela janela de quartzo Q pode-se então coletar os elétrons emitidos pelo catodo, no anodo A. Mantendo-se uma diferença de potencial sucientemente grande entre o anodo (+) e o catodo (-), observa-se que a chamada corrente fotoelétrica é proporcional à intensidade de luz incidente no catodo. Diminuindo-se a tensão, à partir de um certo valor, a corrente começa a diminuir. Para polarização reversa (catodo + e anodo -), a corrente continua a diminuir com o aumento da tensão, permanecendo nula para valores de tensão reversa maiores que um dado valor também que o valor de Vo Vo , como visto na gura abaixo. Observa-se é proporcional à freqüência da luz incidente. Outra observa- ção corresponde à da existência de um limiar de freqüências para a ocorrência do efeito. Mesmo com polarização direta dos eletrodos, a corrente fotoelétrica permanece nula para luz incidente de freqüência abaixo de um certo valor νo , independente da intensidade da luz incidente. Outra característica do fenômeno é que não há nenhum intervalo de tempo entre a incidência da luz e o aparecimento da corrente fotoelétrica. Sabendo-se que são emitidos elétrons da superfície metálica, pode-se então associar o potencial reverso emitidos. Vo Vo para o qual cessa a corrente com a energia máxima dos elétrons é chamado potencial de freamento e a energia máxima dos elétrons emitidos é dada por: 45 2 As Origens da Mecânica Quântica Figura 2.13: Curvas características de IxV, para diferentes intensidades de luz, de mesmo comprimento de onda. Ecm = eVo Classicamente, podemos considerar o elétron atômico recebendo energia através do campo elétrico oscilante da onda eletromagnética, como num oscilador harmonico forçado. A lu2 minosidade da onda estando uniformemente distribuída e sendo igual a I (W/m ) e cada 2 elétron recebe uma energia Iπa por segundo, onde a é a dimensão do sistema oscilante, tipicamente o raio atômico. Portanto qualquer que seja a freqüência da onda eletromagnética, o elétron deveria receber a mesma energia, desde que elas tivessem a mesma intensidade. Por outro lado, mesmo para luz de baixa intensidade, a energia cedida pela onda poderia ser armazenada pelo elétron oscilante durante um intervalo de tempo ∆t, até que esta fosse maior que a energia de ligação do elétron ao metal, e então este seria ejetado. Por exemplo, sabendo-se que para o potássio (K), a energia de ligação do elétron ao metal é de cerca de 2.1 eV = 3.4 · 10−19 J . Fazendo-se incidir numa placa de K luz de intensidade de 1 W/m2 , e −10 considerando o raio atômico a ∼ 10 m o elétron receberá energia a uma taxa dada por: R = πa2 · 1 = 3.14 · 10−19 J/s portanto, para arrancar o elétron, seria necessãrio esperar um intervalo de tempo ∆t = 3.4 · 10−19 ∼ = 10 s 3.14 · 10−20 Em 1905, Albert Einstein, utilizando, de uma forma mais geral, as idéias de Planck para a energia dos osciladores na cavidade do corpo negro, conseguiu explicar as propriedades observadas no efeito fotoelétrico. Planck, em sua demonstração, se restringiu à quantização da energia para o caso dos osciladores (elétrons) nas paredes da cavidade. As ondas no 46 2.2 O Efeito Fotoelétrico interior da cavidade (produzida pelos elétrons oscilando) eram quantizadas em decorrência disso. Einstein, ao invés disso, considerou que a própria energia radiante era quantizada, sendo portanto constituída de corpúsculos cada um portanto uma quantidade xa de energia. Os fenômenos usuais não permitiriam observar essa característica devido ao enorme número de fótons normalmente associado à energia radiante (assim como um líquido aparenta ser um uido contínuo e não formado por elementos discretos). É interessante notar, que antes da descoberta da difração da luz, Newton desenvolveu um modelo corpuscular para a luz, que no entanto não corresponde às idéias de Einstein, principalmente porque seu modelo não previa a difração da luz, fenômeno tipicamente ondulatório). Para explicar a difração e a interferência, Einstein supôs que as partículas de luz (fótons) não se movem como partículas usuais, mas que se propagam com intensidades médias dada pela amplitude da onda eletromagnética associada, dada pelo modelo ondulatório. O caráter corpuscular seria manifestado apenas no processo de interação da radiação eletromagnética com a matéria (na emissão e absorção). Seguindo as idéias de Planck, associou à radiação de freqüência ν, fótons de energia E = hν . A intensidade de luz é agora dada pelo número de fótons emitidos por unidade de tempo. Supôs também, que no efeito fotoelétrico, um único fóton interage com um elétron, sendo completamente absorvido por este, que após a interação terá uma energia cinética: Eco = hν Após receber esta energia pela interação com o fóton, o elétron deve ainda perder alguma energia até escapar da superfície do metal. A energia cinética do elétron ejetado do metal será portanto: Ec = Eco − w = hν − w onde w é o trabalho realizado para arrancar o elétron do metal. Esta energia depende das condições em que a interação se deu. Aqueles que, após a interação não perdem nenhuma energia extra, mas somente a energia necessária para vencer a barreira de potencial existente na superfície dos metais, conhecida como função de trabalho, wo , terão energia cinética máxima. Portanto a energia cinética máxima dos elétron emitidos será dada por: Ecm = hν − wo Isso explica perfeitamente a existência de um limiar de freqüências (hν > wo ) para a emissão dos fotoelétrons e também que a energia dos elétrons emitidos não esteja relacionada à intensidade da luz incidente, mas sim que a corrente elétrica (número de elétrons emitidos) seja proporcional à intensidade de luz (número de fótons absorvidos). Em 1914, R. Millikan realizou uma série de medidas com grande precisão, do potencial de freamento Vo em função da freqüência da luz incidente e obteve a conrmação da teoria de Einstein, determinando a constante de Planck. Em 1921 Einstein recebeu o prêmio Nobel pelo desenvolvimento da teoria para o efeito fotoelétrico. As idéias originais de Planck se mostravam ser de aplicação mais geral e a Mecânica Quântica começava seu desenvolvimento. 47 2 As Origens da Mecânica Quântica A questão a respeito do tipo de elétron que interage com o fóton é outra questão que não tem explicação clássica. Sabe-se que os condutores são muito mais ecientes na produção de fotoelétrons que os materiais isolantes, que praticamente não têm elétrons ejetados, a não ser com a irradiação por fótons de maiores energias, como os raios-X. Como num condutor tem-se os elétrons ligados aos átomos e os chamados elétrons de condução, que são livres dentro do metal, espera-se que sejam esses os envolvidos no efeito fotoelétrico (a teoria clássica da condução elétrica em metais foi desenvolvida por Lorentz e outros, logo após a descoberta dos elétrons). Entretanto, pode-se vericar facilmente que na colisão de um elétron livre com um fóton, não pode haver simultaneamente a conservação de energia e momento. O momento linear de um fóton pode ser obtido com base na equação 2 2 2 2 4 relativística que relaciona energia e momento E = p c + mo c , que para partículas sem massa de repouso, como o fóton, se reduz a E = pc. Supondo por exemplo que a energia se √ 2 conserva, E = hν = pe /2me . Mas pf = E/c = hν/c 6= pe = 2me hν . Para que a interação entre o fóton e um elétron possa ocorrer, este último deve estar ligado a um terceiro corpo, de massa muito maior (como por exemplo um átomo), de modo que possa receber a quantidade de movimento necessária para haver a conservação, sem no entanto carregar muita energia, de modo que com boa aproximação tem-se ainda Ee = hν . Outro ponto que diculta a interpretação de que são os elétrons livres (ou metálicos) os responsáveis pela interação, é que esses elétrons, formando uma espécie de gás no interior do metal (gás de elétrons livres) deveriam ter energia cinética distribuída de acordo com a distribuição 3 de Maxwell. Portanto após a colisão, e energia total do elétron seria em média hν + kT , 2 de modo que a energia média dos elétrons emitidos deveria depender da temperatura. Efeitos da temperatura na energia cinética desses elétrons pode ser observados no caso da chamada emissão termoelétrica, bastante estudado na época. O efeito pode ser entendido qualitativamente como uma evaporação dos elétrons mais energéticos, que têm de vencer a barreira de potencial da superfície metálica (função de trabalho) para serem emitidos. A corrente termoelétrica como função da temperatura é dada pela equação de Richardson: I = AT 2 e−wt /kT onde wt é o trabalho realizado pelo elétron para sair do metal. Evidências de que os fotoelétrons são de mesma origem são obtidas da constatação que os valores medidos para a função de trabalho de metais pelo efeito termoelétrico e pelo fotoelétrico são iguais (wt wo ). = Embora para temperaturas próximas à ambiente ou menores, a energia térmica média é pequena (∼ 0.04 eV) e portanto seu efeito na energia dos elétrons ejetados dicilmente seria notado. Millikan e Winchester estudaram cuidadosamente a dependência do potencial de freamento com a temperatura, não observando nenhum efeito, mesmo a temperaturas bem mais altas, quando a energia térmica chega a cerca de 0.2 eV. A atribuição dos elétrons atômicos como sendo os responsáveis pelos fotoelétrons emitidos traz outras diculdades ainda maiores na interpretação do efeito. A solução para o problema só pode ser obtida mais tarde, quando por volta de 1928 Sommerfeld introduziu uma nova teoria para a condução elétrica em metais, baseada na distribuição quântica de energia dos elétrons de condução (distribuição de Fermi-Dirac), 48 2.2 O Efeito Fotoelétrico Figura 2.14: Comparação entre as distribuições de Maxwell-Boltzmann e a de Fermi-Dirac para elétrons de condução em metais. 49 2 As Origens da Mecânica Quântica ao invés da distribuição maxwelliana. De acordo com a mecânica quântica, partículas como o elétron, próton, etc., chamadas férmions, não podem compartilhar um mesmo estado de energia. A gura 2.9 mostra a diferença entre as distribuições clássicas e as correspondentes quânticas, para várias temperaturas diferentes. Contrário à distribuição clássica, na quântica há apenas uma pequena alteração na distribuição dos elétrons com energia próximas à energia máxima, chamada energia de Fermi. Neste caso, a barreira de potencial na superfície do metal tem energia Eb = EF + w onde w é a função de trabalho denida anteriormente. Portanto se um fóton interage com um elétron com energia próxima e EF ele escapa com energia máxima. Se um elétron mais interno é o que recebeu a interação, a energia de escape será menor. Os efeitos da temperatura, conforme visto na gura, são muito pequenos para serem medidos com a técnica utilizada por Millikan. Entretanto, eles fazem com que a corrente de fotoelétrons, medida como função da tensão de freamento caia assintoticamente a zero, tornando mais difícil a determinação de Vo . Na teoria quântica da condução, esses elétrons não são considerados livres, mas ligados ao metal como um todo. Portanto é a massa metálica total que recebe a quantidade faltante de momento, necessária para sua conservação. 2.3 Exercícios 1. Mostre que a lei de radiação de Planck se reduz à lei de Wien para pequenos comprimentos de onda e a lei de Rayleigh-Jeans para os grandes. (Sugestão: Expanda o termo exponencial em série de potências para obter a segunda destas leis.) Dado que: ρ(λ) = 8πhc 1 (Lei de W ien) λ5 ehc/λkT 2. Mostre que a densidade de energia total na radiação de corpo negro sobre toda a faixa ∞ é idêntica na forma à lei de Stefan-Boltzmann para radiação −8 2 4 total. Sabendo que a constante de Stefan-Boltzmann é σ = 5,67 · 10 W/m K , 4 obtenha a constante de Planck. Dado que : RT = σT - lei de Stefan-Boltzmann R ∞ x3 dx π4 (sugestão: = 15 ). 0 ex −1 de freqüências de 0 a 3. Uma massa de 10g está pendurada em um elástico com uma constante elástica de 25 N/m. Assuma que este oscilador é quantizado justamente como os osciladores de radiação. a) Qual a energia mínima que pode ser fornecida a esta massa? b) Se a massa em repouso absorve a energia da parte a), qual a amplitude resultante? c) Quantos quanta de energia precisam ser absorvidos para se obter uma amplitude de −33 10 cm? Resp.: a) E = 5,3 · 10 J ; b) A= 2 · 10−17 m; c) ∼ 2,5 · 1031 quanta. 4. Quando uma certa superfície fotoelétrica é iluminada com luz de diferentes comprimentos de onda, os seguintes potenciais de corte são observados: λ(A) Vc (V ) 50 3660 4050 4360 4920 5460 5790 1,48 1,15 0,93 0,62 0,36 0,24 2.3 Exercícios Faça um gráco de freqüência por potencial de corte (νxVc ). Determine a) a freqüência de corte, b) o comprimento de onda de corte, c) a função trabalho do material, e d) determinar o valor da constante de Planck h ( o valor de e sendo conhecido). Resp.: a) Hz; b) =6450 Å; c) 1,92 eV; d) . 5. O que vai mudar no potencial de corte de emissão de fotoelétrons em uma superfície se o comprimento de onda da luz incidente é reduzido de 4000Å para 3980Å? (Assuma que o decréscimo no comprimento de onda pode ser considerado um diferencial). 6. Radiação de comprimento de onda 2000 Å incide sobre uma superfície de alumínio, cuja função de trabalho é 4.2 eV. a) Qual a energia cinética máxima do fotoelétron emitido? b) Qual o potencial de corte? c) Qual o comprimento de onda limite para o 2 alumínio? d) Se a intensidade da luz incidente é de 2 W/m , qual é o número médio de fótons por unidade de tempo e por unidade de área qua atinge a superfície? 7. A função de trabalho do potássio é 2,24 eV. Se potássio metálico é iluminado com luz de comprimento de onda 350 nm, encontre: a) a energia cinética máxima dos fotoelétrons e b) o comprimento de onda de corte. Resp.: a) 1,3 eV b) 554 nm 8. Quando césio metálico é iluminado com luz de comprimento de onda 300 nm, os fotoelétrons emitidos têm energia cinética máxima 2,23 eV. Encontre a) a função de trabalho do césio e b) o potencial de freamento se a luz incidente tem comprimento de onda 400 nm. Resp.: a) 1,91 eV b) 1,20 V 9. Luz de comprimento de onda 500 nm incide sobre uma superfície metálica. Se o potencial de freamento para o efeito fotoelétrico é 0,45V, encontre a) a energia cinética máxima dos elétrons emitidos b) a função de trabalho e c) o comprimento de onda de corte. Resp.: a) 0,45 eV b) 2,03 eV c) 612 nm 10. Qual a freqüência de corte para o efeito fotoelétrico em lítio (φ=2,9 eV)? Qual o potencial de freamento se o comprimento de onda da luz incidente for 400 nm? 11. Qual o comprimento de onda máximo da luz incidente capaz de produzir efeito fotoelétrico na prata (φ=4.7eV)? Qual será a energia cinética máxima dos fotoelétrons se comprimento de onda é reduzido à metade? Resp.: 264 nm; 4,7 eV 12. Um laser de 2 mW (λ=530 nm) incide sobre um fotocatodo de césio (φ=1.9 eV). −5 Assumindo uma eciência de 10 para a produção de fotoelétrons (1 elétron emitido 5 para cada 10 fótons incidentes), qual a corrente fotoelétrica? 13. O Sol e as estrelas se comportam, com boa aproximação, como corpos negros. a) Sabendo-se que o espectro de energia de radiação emitido pelo Sol tem um máximo para λ = 5100 Å, calcule a temperatura na superfície do Sol. b) Para a estrela polar, λ = 3500 Å. Qual a temperatura na superfície desta esse máximo se encontra em estrela? 51 2 As Origens da Mecânica Quântica 14. a) Supondo que a temperatura da superfície do sol é de 5700K, use a lei de StefanBoltzmann para determinar a massa de repouso perdida por segundo pelo sol sob a 9 forma de radiação. Considere o diâmetro do sol como sendo 1,4 · 10 m. b) Que fração da massa do sol é perdida por ano sob forma de energia eletromagnética? Considere 30 a massa de repouso do sol sendo 2,0 · 10 kg . λmax T = 0.201hc/k , resolvendo a equação hc/λkT = x e mostre que a equação citada leva a 15. Obtenha a lei do deslocamento de Wien, dρ(λ)/dλ = 0. e−x + x/5 = 1. (Sugestão: faça Mostre então que x=4.965 é a solução). 16. Supondo que uma lâmpada incandescente pode ser aproximada por um corpo negro à temperatura de 3000K, calcule a fração da energia irradiada pelo lamento que se encontra na faixa visível (entre 4000 e 6000 Å) (sugestão: aproxime a integral da radiança pela área de um trapézio). 17. Uma massa de 2 kg está ligada a uma mola sem massa de constante de força k=25 N/m. A mola é esticada 0,40m da posição de equilíbrio e então solta. a) Encontre a energia total e a freqüência de oscilação de acordo com a física clássica. b) Assumindo a quantização da energia, determine o número quântico n para o sistema. Resp.: a) E tot = 2,0 J; ν = 0,56Hz b) 5,4x1033 18. a) Use a lei de Stefan para calcular a energia total irradiada por unidade de área de um lamento de tungstênio à temperatura de 3000K (suponha que o tungstênio é um radiador ideal). b) Qual a área supercial do lamento de tungstênio de uma lâmpada incandescente de 75W} (suponha que a perda de calor do lamento se dá somente por radiação). 19. Uma lâmpada de vapor de sódio tem potência 10W. Usando 589 nm como o comprimento de onda médio da fonte, calcule o número de fótons emitido por segundo. 19 Resp.: 3,0x10 /s 20. Calcule λmax para a radiação de corpo negro para a) hélio líquido (4.2 K), b) tem- peratura ambiente (300 K) e forno de fundição de aço ( 2500 K). Resp.: a) 0,69 nm b) 9,89 µm c)1,16 µm 21. Calcular a temperatura de um corpo negro se a distribuição espectral tem maximo −14 para: a) raios gama λ = 10 m. b) raios-X, 1 nm. c) luz vermelha, 670 nm. d) ondas de TV, 1m. e) ondas de AM, 200 m. 22. A temperatura de um corpo negro é aumentada de 900 K para 1900 K. Por qual fator aumenta a potência total irradiada por unidade de área? Resp.: 19,9 23. O lamento de tungstênio de uma lâmpada incandescente típica opera à temperatura de 3000 K. Em que comprimento de onda a intensidade da radiação emitida é máxima? Resp.: 966 nm 52 2.3 Exercícios 24. Use um computador para calcular a lei de radiação de Plank para T=3000 K, a temperatura típica do lamento de tungstênio de uma lâmpada incandescente. Graque o intensidade da radiação em função do comprimento de onda. a) Qual a fração da potência é irradiada na região visível? b) qual a razão entre a intensidade a 400 e 700 nm e a do máximo de emissão? 25. Em qual comprimento de onda a radiação emitida pelo corpo humano é máxima? Resp.: 9,35 µm 26. Uma estação de rádio FM de freqüência 107.7 MHz têm potência de 50.000 W. Qual o número de fótons emitidos por segundo? 27. Quantos fótons por segundo estão contidos num feixe de radiação eletromagnética de potência total 150W se a fonte é: a) uma estação de rádio AM de 1100 kHz, 29 18 b) raios-X de 8 nm e c) raios gama de 4 MeV? Resp.: a) 2,06x10 b) 6,05x10 c) 14 2,34x10 53 2 As Origens da Mecânica Quântica 54 3 Interação de Fótons com a Matéria 3.1 Introdução No capítulo 2, vimos um processo de absorção de fótons pela matéria, o efeito fotoelétrico. Além desse, outros dois processos de interação devem ainda ser descritos: o espalhamento elástico de fótons (espalhamento Compton) e a criação de um par elétron-pósitron pela radiação eletromagnética. Nenhum desses efeitos pode ser previsto pela teoria clássica da radiação eletromagnética. A observação do espalhamento Compton só foi possível após a descoberta dos raios X e do enorme interesse em seu estudo que se seguiu após a descoberta. Vamos então ver inicialmente, as propriedades e características dos raios X. 3.2 Raios X Na tarde de 8 de novembro de 1895, o alemão Wilheim K. Roentgen fazia experiências com um tubo de raios catódicos. Tendo envolvido o tubo com cartolina preta, acidentalmente observou que uma folha de papel embebido em cianeto de bário-platina cava uorescente quando colocado próximo ao tubo de raios catódicos. A uorescência era observada mesmo com o papel colocado até cerca de 2 metros de distância do tubo. Após alguns experimentos, Roentgen rapidamente se convenceu que a uorescência se originava no ponto do tubo onde os raios catódicos atingiam o vidro. Convencido da importância de sua descoberta, Roentgen procedeu a um estudo detalhado das propriedades desses raios, que por serem de natureza desconhecida, denominou-os raios X. Ele observou as seguintes propriedades, entre outras, da nova radiação descoberta: ˆ Todas as substâncias são mais ou menos transparentes aos raios X. Conseguia observar a uorescência mesmo quando um livro de 1000 páginas, madeira de 2 a 3 cm ou 15 mm de alumínio era interposto entre o tubo e a tela uorescente. Se a mão é colocada entre o tubo de descarga e a tela uorescente, uma sombra escura dos ossos é visível dentro de uma sombra mais clara da mão, reportou textualmente Roentgen. A importância desta descoberta pode ser medida pelo fato de que, apenas três meses após a descoberta dos raios X, esses já estavam sendo utilizados em um hospital em Viena, no auxílio de tratamento de fraturas. ˆ Muitas outras substâncias, além do cianeto de bário-platina, como o fósforo, compostos de cálcio, sal de rocha, etc., eram uorescente sob a ação dos raios X. Chapas e lmes fotográcos também se mostraram sensíveis aos raios X, providenciando um método bastante ecaz no estudo dessa radiação. 55 3 Interação de Fótons com a Matéria ˆ Raio-X não são nem reetidos nem refratados e portanto raios X não podem ser focalizados por lentes. Essa constatação, embora não seja verdadeira, se mostra uma boa aproximação para a maioria dos casos, dado o pequeno comprimento de onda dos raios X (∼ 0.1 nm, comparado com ∼ 500 nm para a luz visível). A difração de raios X só pode ser observada por volta de 1912, após os trabalhos de Laue e Bragg entre outros. A lei de Bragg para a refração de raios X por cristais, nλ = 2d sin(θ), tem sido usada em espectrômetros para essa radiação. ˆ Não são deetidos por campos magnéticos ou elétricos e se propagam em linha reta. ˆ Raios X descarregam corpos eletrizados, tanto positiva quanto negativamente. Essa característica está relacionada com a capacidade dos raios X ionizarem o ar, tornandoo portanto condutor e agindo assim para descarregar objetos eletrizados. ˆ Um aparelho de descarga com um catodo constituído de uma chapa de alumínio côncava e tendo como anodo uma folha de platina, colocada no centro de curvatura o do catodo e inclinada a 45 em relação ao eixo é o mais eciente produtor de raios X. Essa maneira de produzir raios X, descrita por Roentgen foi utilizada posteriormente em praticamente todos os tubos de raios X, até cerca de 1913, quando W.C. Coolidge introduziu os tubos com catodo de tungstênio aquecido, que produzia uma enorme quantidade de elétrons, por efeito termoiônico. Essa é a forma utilizada até hoje na produção de raios X. Figura 3.1: Diagrama esquemático de um tubo de raios X moderno. Nos usados por Roentgen o catodo não era aquecido. Os raios X são produzidos na desaceleração brusca dos elétrons, ao penetrarem num sólido. De acordo com a eletrodinâmica, uma carga acelerada irradia e ao penetrar na matéria, um elétron acaba perdendo rapidamente sua energia cinética em sucessivas colisões 56 3.2 Raios X com os núcleos dos átomos, emitindo portanto radiação a cada colisão. A radiação ele- tromagnética emitida nesse processo tem o nome genérico de radiação de bremsstrahlung, termo germânico para radiação (strahlung) de freamento (brems). Do ponto de vista quântico, um fóton é emitido após cada colisão, no que pode ser interpretado como o inverso do efeito fotoelétrico. No efeito fotoelétrico, um fóton é absorvido e sua energia transferida para um elétron e um átomo. Aqui um elétron cede parte de sua energia para criar um fóton, o núcleo recebendo uma pequena parte da energia, mas atuando para garantir a 0 conservação do momento linear. Se a energia inicial do elétron é Eo e E é a energia após a colisão, a energia do fóton emitido será: hν = Eo − E 0 Os espectros de raios X emitidos por um anodo de tungstênio quando bombardeado por elétrons de energias de 50, 40, 30 e 20 keV são vistos na gura 3.2. Uma característica desses espectros é a existência de um limiar de comprimentos de onda, abaixo do qual não há emissão de radiação. O valor do limiar é inversamente proporcional à energia dos elétrons incidentes. O limiar corresponde ao caso onde o elétron perde toda sua energia numa única colisão. Nesse caso, o fóton emitido tem a máxima energia possível, hν = Eo , correspondente ao comprimento de onde λmin = hc Eo Figura 3.2: Espectro de raios X emitidos por uma ampola com várias tensões catodo-anodo Raios X podem ainda ser emitidos no processo de perda e posterior captura de elétrons por átomos e íons, principalmente no caso de elementos com número atômico elevado. Esses raios X têm comprimento de onda bem denido e são característicos de cada material. Mais 57 3 Interação de Fótons com a Matéria adiante, na discussão dos modelos atômicos, veremos em mais detalhes esse tipo de raios X. A difração de raios X por cristais, desde a sua descoberta, tem sido utilizada tanto para a caracterização dos cristais como para e espectroscopia de raios X. O processo de difração de Bragg ocorre na reexão das ondas de raios X por planos cristalinos consecutivos e paralelos. Como visto na gura 3.3, sendo d a separação entre dois planos cristalinos e ϕ o ângulo de incidência da radiação X, as frentes de onda 1 e 2 mostradas na gura estarão em fase se tivermos a relação: nλ = 2d sin ϕ Figura 3.3: Ilustração da difração de Bragg: Interferência construtiva da radiação reetida por dois planos consecutivos de átomos num cristal. 58 3.3 O Espalhamento Compton de Raios X onde n é um inteiro. Esta é a chamada relação de Bragg. Em geral, no uso do processo de difração num espectrômetro para determinação do comprimento de onda da radiação, utiliza-se em geral o primeiro máximo de interferência (n =1). 3.3 O Espalhamento Compton de Raios X Em 1918, Arthur H. Compton iniciou uma série de experimentos visando o estudo do espalhamento de raios X. Esses experimentos o levaram a descobrir, em 1922, um importante efeito, hoje conhecido como efeito Compton, que não tem explicação dentro da teoria clássica da radiação eletromagnética. Ao fazer incidir raios X de comprimento de onda bem denido (como os proveniente da emissão de raios X característico por materiais como o molibidênio usado por Compton) sobre um alvo sólido (grate), como mostra a gura 3.4, Compton observou que o espectro dos raios X espalhados num dado ângulo apresenta dois componentes: um com comprimento de onda igual ao da radiação incidente, e o outro de comprimento de onda maior, cujo valor depende do ângulo de espalhamento, conforme 0 visto na gura 3.5. A diferença ∆λ = λ − λ é chamada deslocamento Compton. Figura 3.4: Diagrama do experimento de Compton. A radiação monocromática primária é produzida pelos raios X característicos do molibidênio. De acordo com o eletromagnetismo clássico, uma onda eletromagnética de freqüência ν ao atingir os elétrons do material do alvo, faz com que estes passem a oscilar na mesma freqüência da radiação, irradiando portanto uma nova onda eletromagnética (em todas as direções) de freqüência igual à da radiação incidente. Portanto, apenas o componente de mesmo comprimento de onda da radiação incidente, é esperado, do ponto de vista clássico. A explicação para o pico deslocado foi feita posteriormente pelo próprio Compton (e independentemente por Debye), tratando o problema como sendo o espalhamento elástico do fóton por um elétron atômico. Mesmo a teoria eletromagnética clássica prevê uma quantidade de movimento associado à radiação eletromagnética, p = E/c, onde p é a o 59 3 Interação de Fótons com a Matéria momento linear da onda por unidade de volume e E a densidade de energia. Do ponto de vista quântico, fótons de energia hν se propagam com a velocidade da luz e portanto, da expressão relativística para a energia, mo c2 E=q 2 1 − vc2 podemos concluir que para que a energia possa ter um valor nito, a massa de repouso do fóton deve ser nula. Portanto, na expressão relativística para a relação entre energia e 2 2 2 2 4 momento, E = p c + mo c , a expressão correspondente para um fóton de energia hν será p = E/c ou p = hν/c = h/λ. Figura 3.5: Espectro de raios X observados por Compton, para vários ângulos de espalhamento Consideremos agora o espalhamento elástico de um fóton de energia p = h/λ por um elétron livre em repouso. Após o E 0 = hc/λ0 e momento p0 = h/λ0 , propagando numa E = hc/λ e momento espalhamento, o fóton terá energia direção fazendo um ângulo direção de incidência. O elétron, depois da colisão terá energia cinética numa direção que faz um ângulo ϕ com a e momento pe , em relação à direção do fóton incidente. Aplicando as leis de conservação de momento e energia temos as seguintes relações: p = p0 cos θ + pe cos ϕ 60 Ec θ 3.3 O Espalhamento Compton de Raios X p0 sin θ = pe sin ϕ E + mo c2 = E 0 + Ec + mo c2 Tomando o quadrado das equações de conservação do momento e somando-as de modo a eliminar ϕ, temos: (p − p0 cos θ)2 + p02 sin2 θ = p2e ou p2 − 2pp0 cos θ + p02 = p2e Da expressão de conservação de energia, temos para e energia cinética do elétron após a 0 0 colisão Ec = E − E = (p − p )c. Usando agora a expressões relativísticas que relacionam a energia com o momento do elétron:  E = Ec + mo c2 E 2 = p2 c2 + m2o c4 temos a seguinte relação: p2e Substituindo agora pe Ec2 = 2 + 2Ec mo c da expressão acima na relação para os momentos obtida anterior- mente, temos: p2 − 2pp0 cos θ + p02 = Ec02 + 2Ec mo c2 Substituindo agora a expressão para e energia cinética do elétron em termos dos momentos do fóton, temos: p2 − 2pp0 cos θ + p02 = (p − p0 )2 + 2(p − p0 )mo c simplicando a expressão acima, obtém-se: mo c(p − p0 ) = pp0 (1 − cos θ) e portanto: 1 1 1 − = (1 − cos θ) 0 p p mo c multiplicando a expressão acima por h e usando h/p = λ, temos: ∆λ = λ0 − λ = λc (1 − cos θ) 61 3 Interação de Fótons com a Matéria onde λc = h/mo c = 0.0243A é chamado comprimento de onda Compton para o elétron. Do resultado acima, vemos que o deslocamento Compton gulo de espalhamento θ, ∆λ depende somente do ân- sendo o mesmo para qualquer comprimento de onda da radiação incidente. No espectro da radiação espalhada mostrado na gura 3.5, temos ainda o pico correspondente ao comprimento de onda igual ao da radiação incidente. Este pico tem as características de dois processos diferentes. Num deles temos o espalhamento descrito por J.J. Thomson com base na eletrodinâmica clássica, e por este motivo, este tipo de espalhamento é hoje chamado espalhamento Thomson. O outro processo é chamado espalhamento Rayleigh, em homenagem ao seu descobridor. A explicação quântica para esses fenômenos é entretanto apenas uma variação do espalhamento Compton. No espalhamento Compton usual, o elétron espalhador está livre, ou fracamente ligado ao átomo (tipicamente a energia de ligação dos elétrons mais externos dos átomos é da ordem de alguns eV, milhares de vezes menor que a energia de um fóton de raio-X, sendo arrancado do átomo no processo de colisão. No caso do espalhamento Rayleigh a colisão se dá com um elétron das camadas mais internas do átomo, quando a energia de ligação deste pode ser muito maior, e após a colisão com o fóton, o elétron continua ligado ao átomo. Nesses casos, podemos considerar que o fóton foi espalhado pelo átomo como um todo, de modo que na expressão para o deslocamento ∆λ temos que usar agora o parâmetro λc para o átomo e não mais para o elé- tron. Como a massa do átomo é milhares de vezes maior que a do elétron, o deslocamento Compton ∆λ nesses casos é desprezível. No chamado espalhamento Thomson, o fóton é espalhado após uma colisão diretamente com o núcleo atômico. Do ponto de vista de energia, o resultado é idêntico ao caso do espalhamento Rayleigh, uma vez que a massa do núcleo é aproximadamente igual à massa do átomo como um todo. A distribuição angular da radiação espalhada no entanto é diferente para cada caso. Também, devido à enorme diferença de tamanho entre um átomo e seu núcleo, o espalhamento Thomson é muito menos provável que o Rayleigh. Para fótons de energia mais baixa que os raios X (como ultravioleta e luz visível) o espalhamento Compton vai cando cada vez mais improvável, sendo mesmo impossível para as energias mais baixas, pois não há energia suciente para arrancar o elétron do átomo. Uma outra consideração deve ser feita, com respeito à interpretação de Compton para este efeito. Sendo o fóton uma entidade elementar, é difícil explicar como ele pode mudar de comprimento de onda numa colisão. A interpretação correta, de acordo com a teoria quântica atual, é que houve inicialmente a absorção do fóton pelo elétron na colisão. Posteriormente há a emissão de um outro fóton, de comprimento maior que o absorvido, de acordo com a equação de Compton. 3.4 Produção e Aniquilação de Pares A equação básica da mecânica quântica, a equação de onda de Schroedinger é uma equação não relativística. Corresponde ao caso em que a energia total de uma partícula é dada pela relação: 62 3.4 Produção e Aniquilação de Pares p2 +V =E 2m onde o primeiro termo corresponde à energia cinética e V à energia potencial da partícula. Alguns anos depois de Schroedinger ter apresentado sua equação, Dirac desenvolveu a equação correspondente relativística, para descrever o movimento de um elétron. Como a energia relativística de uma partícula, na ausência de potenciais externos é dada por E 2 = p2 c2 + m2o c4 , a cara da equação de Dirac será algo como: p ± p2 c2 + m2o c4 + V = E No caso de uma partícula lívre, com momento nulo, a uma partícula com energia (massa) negativa. p E = − m2o c4 = −mo c2 corresponde Se o momento for não nulo, teremos energias ainda mais negativas. Embora normalmente, nos cálculos relativísticos ignoramos a solução com energia negativa, Dirac observou que não havia razão para ignorar essa solução. Assim previu a existência de elétrons com energia negativa. Como o menor valor para o momento de uma partícula é zero, a equação acima diz que só pode haver elétrons 2 2 com energia E ≥ mo c ou E ≤ −mo c , como mostra a gura 3.6. Um elétron usual, com energia positiva, tendo disponível um estado possível de energia mais baixa (energia negativa), migraria para aquele estado, emitindo a diferença de energias na forma de um fóton. Assim, todos os elétrons disponíveis iriam para esses tais estados negativos e o nosso mundo não seria possível. Dirac postulou então que a natureza é de tal forma que todos os estados de energia negativa estão ocupados. Deste modo, não há como os elétrons de nosso mundo passar para os estados de energia negativa, conhecidos como o mar de Dirac. Podese mostrar que esse mar de partículas com energia negativa (isto é, com massa negativa) não interage com nosso mundo usual, não podendo portanto ser observado. Dirac previu ainda a ocorrência de um fenômeno bastante interessante. Um fóton de alta energia (um raio γ ), tendo energia maior que a abertura entre as duas faixas de energias > 2mo c2 = 1022 keV ) poderia ceder toda sua energia permitidas para os elétrons (∆E para um elétron de energia negativa (como no efeito fotoelétrico) de modo que agora este elétron teria energia positiva e seria observado como um elétron normal em nosso mundo. Já no mar de elétrons com energia negativa, sobraria um lugar vago, um buraco. Pode-se mostrar que num mar de elétrons com energia negativa, um buraco se comporta como uma partícula de massa positiva (igual a do elétron), e com carga oposta à do elétron. Este buraco é então visto em nosso mundo como uma partícula similar ao elétron, mas com carga oposta e é chamado de pósitron ou anti-elétron. Do ponto de vista observacional, o fenômeno é visto como a criação de um par partícula-antipartícula por um fóton de alta energia, e daí o nome criação de pares. A validade dessas suposições de Dirac foi conrmada experimentalmente alguns anos mais tarde, quando em 1932 Anderson descobriu o pósitron em traços deixados por essas partículas em fotograas tiradas com câmaras de Wilson (câmara de bolhas), como a mostrada na gura 3.7. Nessa câmara, há um campo magnético aplicado na direção perpendicular ao plano da fotograa, de modo que o pósitron e o elétron, tendo cargas 63 3 Interação de Fótons com a Matéria Figura 3.6: Diagrama mostrando as faixas de energia permitidas para os elétrons e a criação de um par elétron-pósitron opostas, fazem um movimento espiralado em direções opostas. As espirais têm raio de- crescente devido a perda de velocidades das partículas, por colisões com outros elétrons no material. É interessante notar que no mesmo ano em que Anderson publicou suas observações (1933), dois outros artigos foram também publicados, conrmando as observações de Anderson e a origem dessas partículas. Esses dois outros artigos tinham a participação de Giuseppe Occhialini, um físico italiano que logo depois viria para São Paulo, a convite de Gleb Wataghin, para dar início ao Departamento de Física da recém fundada Universidade de São Paulo (ver p. ex. Chadwich, Blackett and Occhialini - Nature vol 131, pg. 473 -1933). Pode-se também facilmente vericar que, analogamente ao que ocorre no efeito fotoelétrico, a interação de absorção do fóton por um elétron com energia negativa também não permite a conservação do momento linear. Deste modo, a criação de pares só pode ocorrer nas proximidades de uma partícula pesada, como o núcleo atômico, que então recebe a parte restante do momento inicial do fóton. O pósitron portanto não passa, segundo Dirac, da ausência, um buraco no mar de elétrons de energia negativa. Há muitas outras situações em que um buraco se com- porta como uma partícula. Por exemplo, bolhas de gás no interior de um líquido. Uma situação bem conhecida ocorre em materiais semicondutores, com os quais são produzidos os elementos básicos dos componentes eletrônicos atuais. Nesses elementos, os elétrons normalmente estão ocupando a chamada banda de valência, correspondendo aos estados eletrônicos ligados aos átomos do cristal (ou ao cristal como um todo). Deste modo, estes elétrons não têm mobilidade e não podem conduzir eletricidade. à temperatura zero, todos esses estados estão normalmente ocupados por elétrons e o material se comporta como um isolante. À medida que a temperatura aumenta, alguns desses elétrons ganham energia térmica suciente para passar a ocupar uma outra faixa de energias maiores, chamada banda de condução. Entre a faixa de valência e a de condução há uma região de energias em que 64 3.4 Produção e Aniquilação de Pares não há nenhum estado possível, numa situação muito similar à do processo de criação de pares. Nos semicondutores, quando um elétron é promovido para a banda de condução, o buraco na banda de valência se comporta como uma partícula positiva, com mobilidade dentro do cristal, conduzindo portanto corrente elétrica. Figura 3.7: Fotograa estereoscópica de câmara de bolhas, mostrando a criação de um par elétron-pósitron. Na câmara, há um campo magnético perpendicular ao plano da fotograa. Elétron e pósitron fazem portanto trajetórias espiraladas em direções opostas. No caso da produção de pares, a promoção de um elétron de energia negativa para energias positivas, com a absorção de um fóton, cria portanto um par elétron-pósitron. Como vimos, um elétron de energia positiva pode vir a ocupar este estado vazio, cedendo a diferença de energia na forma de fótons. Considerando o buraco como um pósitron, podemos então descrever o processo como a colisão entre essas duas partículas. Após a colisão, desaparecem o elétron e o pósitron de modo que podemos falar num processo de aniquilação do par. pósitron se atraem. Sendo partículas de mesma massa e cargas opostas, elétron e Se a colisão não é exatamente frontal, como ocorre na maioria dos casos, há uma quantidade de momento angular relativo às duas partículas, que passam a orbitar uma em relação à outra, formando um sistema binário. Isto tem semelhança com o átomo, somente que aqui não há um núcleo de massa muito maior. Esta semelhança faz com que este sistema seja considerado um átomo exótico, chamado positrônio. Como num átomo comum, em que um elétron em camadas atômicas de energia (ou momento angular) elevada, perde energia passando para órbitas mais baixas, emitindo fótons a cada passagem, o positrônio também vai perdendo momento angular, o pósitron cada vez mais perto do elétron, até que se aniquilam mutuamente (o elétron ocupa o buraco!) emitindo 65 3 Interação de Fótons com a Matéria em geral dois ou três fótons, dois sendo muito mais provável. A emissão de um único fóton é possível, no caso em que o pósitron colide com um elétron fortemente ligado a um átomo, mas o processo é muito raro. Emissão de mais de três fótons também é possível, mas são processos igualmente improváveis). Esse processo ocorre muito rapidamente, o −10 positrônio durando em média cerca de 10 s. No caso de emissão de dois fótons, por exemplo, a energia total dos fótons deve ser de 1022 keV, supondo que o positrônio se encontra em repouso, como normalmente se encontra, no momento da aniquilação. Para que haja também a conservação do momento, é necessário que os fótons tenham a mesma energia (e portanto mesmo momento), tendo portanto cada um 511 keV, sendo emitidos em direções opostas. 3.5 Absorção de Fótons Pela Matéria Um feixe de fótons, após atravessar uma determinada espessura de matéria terá sua intensidade diminuída pela remoção de uma parte desses fótons do feixe, por um dos três tipos de interação anteriormente descritos. Para fótons de baixas energias, como luz visível, em geral bastam espessuras bastante pequenas (fração de mm) para que praticamente todos os fótons tenham interagido, ocorrendo portanto a absorção total da radiação. Para fótons de energias mais altas, como raios X ou raios γ , uma boa fração dos fótons incidentes pode atravessar espessuras relativamente grandes (vários cm) sem sofrer nenhum tipo de interação. Para um feixe de fótons com uma dada energia (monocromáticos), com intensidade inicial Io , o número de fótons absorvidos dI deve ser proporcional ao número de fótons numa espessura I e à espessura dx dx, do material absorvedor pois a absorção de um fóton numa dada posição depende apenas da probabilidade de interação por um dos três efeitos e não do que aconteceu anteriormente com os outros fótons. Portanto, chamando o coeciente de proporcionalidade (coeciente de absorção linear) de µ, temos a relação: dI = −Iµdx Figura 3.8: Atenuação de um feixe de fótons por um absorvedor. 66 3.6 Exercícios o sinal negativo indicando que há um decréscimo no número de fótons. Após atravessar uma espessura inicial Io x de um absorvedor, a intensidade I de um feixe de fótons de intensidade será então dada por: I(x) = Io e−µx Como a absorção é causada por um dos três processos de interação, o coeciente de absorção pode ser decomposto em três termos: µ = µE + µC + µP sendo cada componente proporcional à probabilidade de ocorrência de cada um dos processos. Mais comumente, utiliza-se nos cálculos o chamado coeciente de absorção de massa, denido como a razão Io exp(−(µ/ρ)ρx)). µ/ρ, onde ρ é a densidade do absorvedor (e I(x) = Na gura 3.9 vemos a dependência dos três termos do coeciente de absorção de massa do alumínio, com a energia dos fótons incidentes. Note que para energias baixas, o processo de absorção por efeito fotoelétrico é dominante e que a partir de ∼50 keV o espalhamento Compton passa a dominar. A criação de pares, que só ocorre para energias acima de 1.022 MeV é dominante apenas para fótons com energias acima de 20 MeV. Essas faixas de predominância dependem do material. A probabilidade de ocorrência 5 de efeito fotoelétrico, por exemplo, numa dada energia de fóton aumenta com Z , onde Z é o número atômico do absorvedor. Para o chumbo, por exemplo, o espalhamento Compton só passa a dominar para fótons de energia maior que cerca de 500 keV. Um outro detalhe sobre a absorção é que no espalhamento Compton não temos propriamente a absorção do fóton, pois um outro fóton é emitido após o espalhamento. Entretanto, como a emissão do segundo fóton será em geral em direção diferente da direção do feixe de fótons, ele é removido do feixe, diminuindo portanto sua intensidade. Caso semelhante ocorre com a criação de pares, quando logo a seguir, com a aniquilação do par outros fótons são também emitidos. 3.6 Exercícios 1. O comprimento de onda mínimo no espectro contínuo de raios X emitidos por um tubo de TV é de 0.124 nm. Qual a tensão de aceleração dos elétrons nesse tubo? R: 10 kV. 2. Um fóton de energia inicial de 100 keV que se move no sentido positivo do eixo o x, colide com um elétron livre em repouso. O fóton é espalhado de um ângulo de 90 , indo no sentido positivo do eixo y. Ache os componentes do momento do elétron. px = 0,33.10−3 eV.s/m; py = 0,28.10−3 eV.s/m; ϕ = 40◦ . R: ∆E/E , a variação relativa da energia do fóton no espalhamento Compton, (hν /mo c2 )(1 − cos θ). 3. Mostre que 0 é igual a 4. Qual a energia cinética máxima possível, bem como o momento de um elétron envolvido no processo Compton em termos da energia do foton incidente 2 2 2 2 repouso do elétron mo c ? R: Ee = mo c + hν[1 − mo c /(mo c + 2hν)] hν e da energia de 67 3 Interação de Fótons com a Matéria Figura 3.9: Variação do coeciente de absorção de massa para cada tipo de interação com a energia do fóton. 68 3.6 Exercícios 5.- Determine a variação máxima do comprimento de onda no espalhamento Compton por prótons. 6.- Considere um feixe de raios X, com λ = 1.00Å, e também um feixe de raios γ vindo 137 −2 Cs, com λ = 1.88 · 10 Å. Se a radiação espalhada pelos elétrons livres ◦ é observada a 90 do feixe incidente: a) Qaul o deslocamento Compton em cada caso? b) de uma fonte de Que energia cinética é cedida ao elétron em cada caso? c) Que percentagem da energia do fóton incidente é perdida na colisão em cada caso? 7.- Raios X com λ = 0.71Å ejetam fotoelétrons de uma folha de ouro. Os elétrons descrevem circulos de raio r em uma região onde há um campo de indução magnética B. A −4 experiência mostra que rB ≤ 1,88 · 10 tesla·m. Ache: a) a energia cinética máxima dos fotoelétrons. b) o trabalho realizado ao remover o elétron da folha de ouro. R: a) 3keV b) 14.5 keV. 8.- Um raio γ cria um par elétron pósitron. Mostre diretamente que, sem a presença de um terceiro corpo para absorver uma parte do do momento, a energia e o momento não podem se conservar simultaneamente. (Sugestão: suponha que a energia seja conservada e mostre que isto implica em momentos diferentes antes e depois da interação). 9.- Suponha que um par elétron pósitron é criado por um fóton que tem a energia limite (2mo c2 ) para que o processo ocorra. a) Calcule o momento transferido a um núcleo no processo. b) suponha que o núcleo é o de um átomo de chumbo e calcule a energia cinética do núcleo atingido. É razoável desprezarmos essa energia, comparada com a energia limite, como feito acima? 10.- O coeciente de absorção de massa para fótons de energia 1 MeV é igual a 0.06 cm2 /g tanto para o Al quanto para o Pb. Calcule a espessura de um absorvedor de Al e a de um de Pb, capaz de reduzir a intensidade de um feixe de fótons dessa energia, para 5% 3 3 de seu valor inicial. (dado: ρ(Al) = 2.7 g/cm , ρ(Pb)=11 g/cm ). a) 19cm b) 4.5 cm 11.- Sob condições ideais, o olho humano registra um estímulo visual a 5500 Å se mais de 100 fótons forem absorvidos por segundo. A que potência isso corresponde? 12.- Obtenha a relação: cot θ hν ) tan ϕ = (1 + 2 mo c2 entre as direções de movimento do fóton espalhado e do elétron envolvidos no efeito Compton. 13.- Raios-X de comprimento de onda 0,200 nm são espalhados por um bloco de carbono. o em relação à dos raios incidentes, encontre a) o Se a radiação espalhada é detectada a 90 deslocamento Compton ∆λ e b) a energia cinética do elétron em recuo. a) 0,00243 nm b) 74,4 eV 14.- Raios-X com comprimento de onda 0,040 nm sofrem espalhamento Compton. a) o o o o o o Encontre o comprimento de onda dos fótons espalhados a 30 , 60 , 90 , 120 , 150 e 210 . b)Encontre a energia da partícula espalhada correspondente. c) Qual dos ângulos de espalhamentos dá ao elétron a maior energia de recuo? a) 0,0403, 0,0412, 0,0436, 0,0445, 0,0448, 0,0445 nm b) 231, 905, 1760, 2570, 3140, 3330, 3140 eV 69 3 Interação de Fótons com a Matéria o c) t = 180 15.- Mostre que a razão entre o comprimento de onda Compton λC = h/mc e o compri- mento de onda de de Broglie para um elétron relativístico é dada por:  1/2 E λC = −1 λ mc2 16.- Raios gama (fótons de alta energia de origem nuclear) de energia 1,02 MeV são espalhados por elétrons inicialmente em repouso. θ = φ, encontre a) o ângulo o a) θ =41,5 b) 0,679 MeV de espalhamento θ Se o espalhamento é simétrico, isto é e b) a energia dos fótons espalhados. o 17.- Um fóton de energia inicial 0,1 MeV sofre espalhamento Compton em ângulo de 60 . Encontre a) a energia do fóton espalhado b) a energia de recuo do elétron e c) o ângulo de recuo do elétron. 4 o a) 9,11x10 eV b) 8,90 keV c) 55,4 18.- Um núcleo excitado de ferro (A=57) decai para o estado fundamental pela emissão de um fóton. A energia disponível para a transição (diferença de energia entre o estado excitado e o fundamental) é de 14,4 keV. a) qual a redução da energia do fóton, do valor máximo possível (14,4 keV), devido a energia de recuo do núcleo? b) Qual o comprimento de onda do fóton emitido? −3 a) 1,95x10 eV b) 0,0861 nm 19.- Numa colisão Compton com um elétron, um fóton de luz violeta (4000A) é retro o espalhado em ângulo de 180 . a) Quanta energia (eV) é transferida ao elétron nessa colisão? b) Compare o resultado com a energia adquirida pelo elétron ao sofrer efeito fotoelétrico com um fóton de mesmo comprimento de onda. c) Poderia a luz violeta ejetar elétrons de um metal por espalhamento Compton? −5 a) 3,77x10 eV b) 3,10 eV c) Não pois a energia máxima (θ =180) é insuciente. 20.- Uma partícula misteriosa entra na região entre as placas de deexão de um aparêlho de Thomson, como mostrado na gura. O ângulo de deexão θ é determinado como 0,2 rd (para baixo) para essa partícula quando V=2000 V, comprimento das placas 10 cm e distância entre as placas 2 cm. Se um campo magnético perpendicular de magnitude 4,57x10−2 T é aplicado simultaneamente com o campo elétrico, a partícula passa entre as placas sem deexão. a) Encontre q/m para essa partícula. b) Identique a partícula. c) Encontre a velocidade horizontal com que a partícula entrou na região entre as placas. d) Deve-se usar mecânica relativística para este problema? 7 a) 9,58x10 C/kg b) prótons 21.- Qual o comprimento de onda mínimo produzido por um aparêlho de raios-X operando a um potencial de 30 kV? 0,0413 nm 22.- O acelerador linear de Stanford pode acelerar elétrons até 50 GeV. Qual o menor comprimento de onda que pode ser produzido por bremsstrahlung? São esses fótons ainda chamados raios-X? 70 3.6 Exercícios 23.- Um tubo de TV opera a 20 kV. Qual o λmin para os raios-X produzidos na colisão desses elétrons com o fósforo da tela? 0,0620 nm 24.- Calcular ∆λ/λ do espalhamento Compton para luz verde (λ=530 nm). Poderia esse efeito ser facilmente observado? 25.- Se um fóton de 6 keV é espalhado por um próton em repouso, qual a variação no ◦ comprimento de onda do fóton espalhado a 90 ? 26.- Um raio gama de 700 keV de energia é espalhado por um elétron. Encontre a energia ◦ do fóton espalhado a 110 , a energia do elétron espalhado e o ângulo de recuo do elétron. 27.- Qual a energia de um fóton necessária para produzi um par próton-antiproton? 28.- Qual o comprimento de onda mínimo de um foton capaz de produzir elétrons com energia de 30 keV em um espalhamento Compton? 29.- Mostre que a energia cinética máxima do elétron em recuo em um espalhamento Compton é dada por: cin Emax = hν 1 2hν mc2 2hν + mc 2 71 3 Interação de Fótons com a Matéria 72 4 O Átomo de Bohr 4.1 Espectros Atômicos e Séries Espectrais A partir de 1880, o estudo dos espectros da radiação visível emitida por chamas e posteriormente por descargas produzidas em gases ou em vapores metálicos tomou um grande impulso. Os espectros atômicos, tanto na região visível, quanto na do infravermelho e do ultravioleta, têm enorme importância ainda nos dias atuais, principalmente por sua aplicação em processos de análise de composição de materiais, composição da matéria estelar, etc., dada a enorme precisão com que se pode determinar os comprimentos de onda da radiação emitida pelos átomos. Contrário à radiação térmica emitida por corpos aquecidos (radiação do corpo negro) que é contínua, o espectro de emissão dos átomos é discreto, ou seja, apenas alguns comprimentos de onda estão presente. Nos espectrômetros normalmente a luz produzida pela descarga no gás é colimada por uma fenda estreita antes de passar por um prisma ou rede de difração, para então ser registrada num lme fotográco, como o visto na gura 4.1. Por isso espectro discreto é também chamado espectro de raias ou de linhas Figura 4.1: Diagrama esquemático de um espectrômetro. Em geral é empregado uma rede de difração ao invés do prisma. 73 4 O Átomo de Bohr Embora os espectros observados sejam relativamente complexos, com um número muito grande de raias, elas podem em muitos casos ser classicadas em grupos, de acordo com suas características principais. No espectro do hidrogênio, por exemplo, o mais simples de todos, dado que o hidrogênio é também o átomo mais simples, duas séries eram conhecidas. Uma na faixa do visível e ultravioleta próximo e outra, observada posteriormente, na região do ultravioleta (hoje são conhecidas cinco séries distintas no espectro do hidrogênio, as outras três na região do infravermelho). Nos espectros dos materiais alcalinos, como o sódio, as raias mais intensas eram classicadas em três séries: a nítida (sharp), a principal e a difusa (s, p e d). Logo que essas regularidades foram identicadas, iniciou-se uma busca para a origem dessa ordem. Em 1885, Balmer descobriu que as raias da série do visível do átomo de hidrogênio podiam ser previstas por uma série numérica simples: λ=B onde B = 3645.6Å n2 n2 − 4 é uma constante (limite da série). O acordo dessas previsões com os dados experimentais é impressionante. Para as quatro primeiras raias a diferença entre o valor previsto e dados experimentais disponíveis na época é de cerca de 1/10000, chegando a a cerca de 1/1000 para a 9 raia, já no ultravioleta. Figura 4.2: Espectro na região visível e ultravioleta próximo, para o átomo de hidrogênio. Esta série de raias é conhecida como série de Balmer. Balmer corretamente previu que a sua série seria um caso particular de uma expressão mais geral, que pudesse explicar outras séries conhecidas. Alguns anos depois, em 1890, 74 4.2 O Espalhamento Rutherford Rydberg nalmente encontrou a formulação geral. A expressão encontrada por Rydberg pode ser visualizada da expressão de Balmer, se expressarmos esta, não em termos do comprimento de onda λ, mas em termos de seu inverso, o número de onda k : 1 1 n2 − 4 4 k= = = 2 λ B n B onde RH = 4/B  1 1 − 2 4 n   = RH 1 1 − 2 2 2 n  é chamada constante de Rydberg para o hidrogênio. A expressão geral obtida por Rydberg é:  k=R 1 1 2 − (m − a) (n − b)2  por exemplo, para as três primeiras séries do hidrogênio, temos:   1 1 k = RH − n = 2,3,4,... s´ erie de Lyman (m = 1) 12 n2   1 1 − n = 3,4,5,... s´ erie de Balmer (m = 2) k = RH 22 n2   1 1 − n = 4,5,6,... s´ erie de P aschen (m = 3) k = RH 32 n2 A constante de Rydberg varia ligeiramente de elemento para elemento, principalmente entre os elementos mais leves. A diferença entre é no entanto muito pequena (∼ 1.2m−1 . 0.05%). RH e o R para os átomos muitos pesados O valor atualmente aceito para RH é 10967757.6 ± Para os átomos dos elementos alcalinos como Li, Na, K, as constantes a e b são não nulas (são conhecidas como defeito quântico ). 4.2 O Espalhamento Rutherford Como vimos na seção anterior, até o nal da primeira década do século XX, uma quantidade enorme de informações sobre a estrutura da matéria havia sido acumulada, principalmente com base em medidas de espectroscopia e no espalhamento de raios-X. Embora se soubesse que os átomos fossem constituídos de elétrons (cuja massa, sabia-se, é muito menor que a dos átomos) e por uma massa de carga positiva, a organização desses elementos na estrutura atômica era desconhecida. O primeiro modelo para a estrutura do átomo foi proposta por J.J. Thomson, e cou conhecido como o modelo do pudim de ameixas. −10 Neste modelo, os elétrons (ameixas do pudim) se distribuíam no volume atômico (∼ 10 m de raio) constituído por uma distribuição uniforme de carga positiva ocupando todo o volume atômico e contendo praticamente toda a massa do átomo (o pudim). Os elétrons ocupariam posições de equilíbrio nessa massa de carga positiva e poderiam eventualmente ser colocados em vibração, quando emitiriam radiação característica dos átomos. No caso 75 4 O Átomo de Bohr de átomos com um só elétron, ele ocuparia o centro do átomo na situação de equilíbrio. Numa esfera com distribuição uniforme de carga positiva a força resultante num elétron é sempre voltada para o centro, sendo proporcional à distância do elétron ao centro. Esse elétron pode então fazer um movimento harmônico simples, com freqüência dada pela relação entre a constante de força e sua massa. Se zermos os cálculos vamos obter uma freqüência característica para o átomo de um elétron (átomo de hidrogênio) próxima aos valores típicos dos espectros atômicos, mas somente uma freqüência é possível, e o modelo não consegue explicar as inúmeras raias presentes no espectro do átomo de hidrogênio. Diculdades ainda maiores para o modelo apareceram por volta de 1909, quando Geiger e Marsden, que trabalhavam com Ernest Rutherford na Universidade de Manchester, na Inglaterra, apresentaram os resultados de suas medidas para o espalhamento de partículas α por átomos de ouro. Esses resultados eram incompatíveis com as previsões do modelo de Thomson, como veremos a seguir. A interpretação dada por Rutherford alguns anos depois para esses dados, introduziu o chamado átomo nucleado e a base para o desenvolvimento da teoria atômica e nuclear da matéria. Átomos radioativos, como o tório, rádio, amerício, etc. emitem partículas de dois tipos, que na época que foram descobertas, foram chamadas de em que Geiger e Marsden faziam suas medidas se sabia alta energia e que as α α e β por Rutherford. Já na época que as partículas β são elétrons de são átomos de hélio duplamente ionizados. Nas experiências reali- zadas por Geiger e Marsden, alunos de Rutherford, eles faziam incidir um feixe colimado, de pequeno diâmetro, de partículas α em uma folha na de ouro (∼ 1 µm de espessura) e observavam as partículas espalhadas em função do ângulo de espalhamento. Tendo em vista a enorme massa das partículas α em relação à massa dos elétrons, a colisão dessas partículas com os elétrons não deve causar grandes deexões na direção inicial da partícula α. No caso das cargas positivas, como no modelo de Thomson, a deexão máxima pode ser facilmente estimada. Tomando a partícula α como uma carga puntiforme, a força elétrica devido à carga positiva do átomo de Au é dada por: F (r) = k1 r para r ≤ R F (r) = k2 /r2 para r > R onde R é o raio atômico. para r=R: A força máxima agindo na partícula é portanto o valor de F Fm = k1 R = k2 /R2 = (Qq/4πo )/R2 . Fazendo-se a aproximação em que a força máxima atua sobre a partícula durante um intervalo de tempo da ordem de grandeza do tempo de trânsito da partícula partícula α α pelo átomo (∆t a variação do momento da pode ser obtida calculando-se o impulso desta força: ∆p = F .∆t = Supondo-se ainda que Qq 2 4πo Rv −→ ∆p é perpendicular à direção do momento inicial, podemos estimar o ângulo máximo de espalhamento: 76 ∼ 2R/v ), 4.2 O Espalhamento Rutherford ∆p 2Qq 79 · 2 · e2 = tan θmax ∼ = = p 4πo M v 2 R 4πo Eα R Em unidades convenientes, α de cerca de θmax ∼ 0.025o . e2 /4πo = 1.44 · 10−9 eV m de modo que para uma partícula tan θmax ≈ 4.5.10−4 ou 5 MeV, como as emitidas pelos actinídeos, temos Espalhamentos com ângulos muito maiores que este podem ser obtidos por uma sucessão de colisões. Supondo que os átomos numa folha de Au se distribuam mais ou menos aleatóriamente, uma partícula α vai sofrer colisões ora em uma direção ora em outra, mais ou menos como no passeio ao acaso que vimos no estudo do movimento browniano. Da mesma maneira como obtivemos o resultado de que a distância quadrática média do bêbado 2 2 em relação à porta do bar é dada por h∆x i = N l onde l é o tamanho do passo, no caso do espalhamento de partículas α, depois de N colisões cada uma com passo θ o valor quadrático médio do ângulo resultante será: Onde θ Θ2 = N θ2 pode ser aproximado por exemplo pelo valor estimado acima, obtendo-se, para p Θrms = hΘ2 i ∼ 1o . O processo espessuras de Au típicas usadas por Geiger e Marsden, de colisões múltiplas não favorece a ocorrência de eventos com grandes ângulos de espalhamento total. Usando os princípios da mecânica estatística, Rutherford pode deduzir que, com base no modelo atômico de Thomson, o número de partículas ângulo maior ou igual a Θ, α espalhadas em um após atravessar uma folha de matéria é dado por: 2 2 N (Θ) = No e−Θ /hΘ i Os dados experimentais de Geiger e Marsden mostravam que embora os valores obtidos para o ângulo médio de espalhamento fossem consistentes com os esperados pelo modelo de Thomson, eles observavam um número muito grande de partículas espalhadas em ângulos o grandes. Para espalhamento com Θ ≥ 90 , por exemplo, eles mediram cerca de uma partícula espalhada para cada 8000 partículas incidente, enquanto que a fração prevista 2 pelo modelo de Thomson era N/No = exp[−(90/1) ] ∼ = 10−3500 . Em 1911, com base nesses resultados, Rutherford apresentou um novo modelo para o átomo, no qual a carga positiva −14 estava concentrada num pequeno volume, de diâmetro de cerca de 10 m, ou seja, cerca de dez mil vezes menor que o átomo. Demonstrou também a expressão para a distribuição angular das partículas espalhadas, que foi plenamente comprovada em experimentos mais detalhados realizados posteriormente por Geiger e Marsden. Ernest Rutherford, um neozelandês que quando jovem foi à Inglaterra com uma bolsa para aperfeiçoamento de seus estudos, no Laboratório Cavendish. Posteriormente obteve uma posição na Universidade McGill em Montreal no Canadá (1898-1907), onde desenvolveu os trabalhos sobre o decaimento radioativo e a química das substâncias radioativas, que lhe deram o prêmio Nóbel de química, pois embora sendo físico, as atividades de pesquisa relacionadas com a radioatividade eram em geral atividades típicas de química. Só depois é 77 4 O Átomo de Bohr que retornou à Inglaterra, na Universidade de Manchester onde desenvolveu os experimentos que o levaram, em 1911 a descobrir a estrutura nuclear para o átomo. Posteriormente retornou a Cambridge e ao Laboratório Cavendish, onde foi o diretor por muitos anos. Figura 4.3: Trajetória da partícula α espalhada por um núcleo puntiforme de massa innita e carga Ze. A gura 4.3 mostra a trajetória de uma partícula α, de massa M e carga ze, espalhada por um núcleo de Au de carga Ze, que tendo massa muito maior que a da partícula α vamos considerar que permaneça em repouso durante o processo de colisão. A distância b entre os centros das duas partículas é chamada parâmetro de impacto e o ângulo de espalhamento (θ ) pode ser expresso em termos desse parâmetro. Uma vez que a força agindo entre as partículas é central, o momento angular do sistema formado pelos dois núcleos se conserva na colisão. Portanto, sendo b e v o parâmetro de impacto e a velocidade antes da colisão e b' e v' os correspondentes após a colisão, temos: L = M vb = M v 0 b0 Supondo a colisão elástica e desprezando a energia cinética adquirida pelo núcleo de Au, 1 1 2 02 0 temos que M v = M v ou v = v e portanto o parâmetro de impacto também não é 2 2 alterado pela colisão. A trajetória descrita pela partícula é uma hipérbole, o que pode ser deduzido utilizando-se as equações básicas da mecânica clássica (para a dedução completa, 78 4.2 O Espalhamento Rutherford ver p. ex. o apêndice D do Eisberg-Resnick). Em termos das coordenadas polares da partícula α, r e ϕ a trajetória é descrita pela equação: 1 1 D = sin ϕ + 2 (cos ϕ − 1) r b 2b onde D é a distância de maior aproximação, numa colisão frontal (θ = 180o ) e pode ser facilmente obtida igualando-se a energia cinética inicial à energia potencial, uma vez que na distância de menor aproximação a partícula α inverte a direção do movimento, estando portanto com velocidade nula: D= onde ze é a carga da partícula α 1 zZe2 4πo M v 2 /2 e Ze a do núcleo do átomo de Au. θ é obtido ϕ = π − θ: parâmetro de impacto b e o ângulo de espalhamento fazendo-se r→∞ e usando-se a relação assintótica b= onde foi usada a relação A relação entre o da expressão da trajetória D 1 − cos ϕ D 1 + cos θ D θ = = cot 2 sin ϕ 2 sin θ 2 2 sin θ = tan 2θ (1 + cos θ). Figura 4.4: Representação pictorial de um feixe de partículas incidindo numa folha de Au 2 de 1cm de área, mostrando as regiões em que o parâmetro de impacto tem valor entre b e b+db. 79 4 O Átomo de Bohr Para calcularmos o número de partículas entre θ e θ + dθ podemos utilizar a relação acima e calcular o correspondente número entre de partículas com parâmetro de impacto entre b e b+db. Na gura 4.4 vemos esquematicamente um pedaço de folha de Au, de 1 cm2 de área, mostrando os núcleos dos átomos representados por pontos, bem como as áreas correspondentes ao parâmetro de impacto entre b e b+db. Supondo que o uxo de partículas α é uniforme nessa área, a fração de partículas α com parâmetro de impacto entre b e b+db é basicamente dada pela razão entre a soma das áreas dos anéis mostrados na gura (N 2πbdb) e a área total da folha. Sendo ρ a densidade do Au (número de átomos cm3 ) e t a espessura da folha, esta fração será dada por: por f = ρt2πbdb Esta fração corresponde à probabilidade de se ter uma partícula α com parâmetro de impacto entre b e b+db: P (b)db = f = ρt2πbdb Da expressão para b em função do ângulo de espalhamento, obtém-se: db D d θ D 1 = cot = − θ θ 2 d( 2 ) 2 2 sin2 d( 2 ) θ 2 de onde se obtém: bdb = − D2 cos 2θ D2 sin θ dθ = − dθ 8 sin3 2θ 16 sin4 2θ (na última passagem foi utilizada a relação 2 sin 2θ cos 2θ = sin θ). Notando-se que, da relação entre o parâmetro de impacto e o ângulo de espalhamento, quando b aumenta θ diminui (ver gura 4.5), temos que a relação entre a probabilidade de colisão com parâmetro de impacto b e b+db e o espalhamento entre θ P (θ)dθ = e θ + dθ α P (θ)dθ = −P (b)db e portanto temos: π sin θ ρtD2 4 θ dθ 8 sin 2 Substituindo-se o valor de D e fazendo-se total de partículas é N (θ)dθ = No P (θ)dθ, onde No é o número incidindo na folha espalhadora, temos nalmente a expressão para a distribuição angular das partículas para o espalhamento Rutherford:  N (θ)dθ = 1 4πo 2  zZe2 2M v 2 2 No ρt2π sin θ dθ sin4 2θ A expressão para o espalhamento Rutherford, bem como outras semelhantes que ocorrem na física nuclear, são geralmente expressas em termos do que se chama seção de choque, ou área efetiva de colisão, denida pela expressão: dN = 80 dσ IndΩ dΩ 4.2 O Espalhamento Rutherford dσ dΩ, dΩ a seção de choque diferencial, I = No a intensidade do feixe de partículas e n = ρt o número de 2 centros espalhadores (núcleos) por cm . A denição do ângulo sólido dΩ pode ser visto na onde dN = N (θ)dθ é o número de partículas espalhadas no ângulo sólido gura 4.5 . Figura 4.5: Diagrama mostrando a relação entre o parâmetro de impacto b e o ângulo de espalhamento θ. A região sombreada corresponde ao ângulo sólido dΩ = 2π sin θdθ. Como dΩ = 2π sin θdθ e da expressão para  dN = 1 4πo 2  N (θ), zZe2 2M v 2 temos: 2 In dΩ sin4 2θ de onde se obtém a expressão para a seção de choque para o espalhamento Rutherford: dσ = dΩ  1 4πo 2  zZe2 2M v 2 2 1 sin4 θ 2 Na gura 4.6 vemos resultados experimentais para o espalhamento de partículas α em Au, publicados em 1913 por Geiger e Marsden, comprovando a descrição de Rutherford para o átomo. O ano de 1911, quando foi publicado o artigo de Rutherford (Phil. Mag. vol. 21, p. 669) é considerado o de nascimento da física nuclear. O modelo de Rutherford, embora resolvesse o problema apresentado pelas medidas de espalhamento de partículas α, introduzia um outro. De acordo com a física clássica, não há como manter a estabilidade do átomo nessas condições. No caso de átomo com um só elétron, como o de hidrogênio, a condição do elétron orbitando em torno do núcleo, 81 4 O Átomo de Bohr Figura 4.6: Resultados experimentais obtidos por Geiger e Marsden comparados com a previsão de Rutherford (curva sólida). embora podendo ser estável do ponto de vista mecânico, tendo o elétron uma aceleração (centrípeta), ele deveria irradiar energia continuamente, de acordo com a teoria clássica do −12 eletromagnetismo, terminando por colapsar no núcleo, após cerca de 10 s. 4.3 O Modelo de Bohr para o átomo de Hidrogênio No outono de 1911, Niels Bohr foi à Inglaterra para uma visita cientíca, inicialmente ao Laboratório Cavendish (com J.J. Thomson) e posteriormente à Universidade de Manchester onde trabalhou com Rutherford e seu grupo. Embora sendo um teórico, Bohr acompanhou de perto os trabalhos de Geiger e Marsden bem como o desenvolvimento do modelo do átomo nuclear proposto por Rutherford. Cerca de dois anos depois, Bohr apresentou um modelo para o átomo de hidrogênio, que incorporava as idéias de Rutherford, as originadas dos trabalhos de Planck para o corpo negro e as de Einstein para o efeito fotoelétrico: a quantização da energia de sistemas mecânicos (osciladores) e da radiação eletromagnética. Introduzindo idéias revolucionárias em relação à física clássica, Bohr conseguiu desenvolver um modelo simples que garantia as características observadas no modelo de Rutherford, dava estabilidade ao átomo e previa as séries espectrais observadas para o átomo de hidrogênio, determinando portanto a origem das séries empíricas de Balmer e Rydberg. A fundamentação do chamado modelo de Bohr pode ser expressa em termos dos postulados 82 4.3 O Modelo de Bohr para o átomo de Hidrogênio de Bohr: 1. No átomo, o elétron se move em órbitas circulares, cujo movimento é descrito em termos das leis gerais da mecânica e da eletrostática, com a limitação de que apenas algumas órbitas são possíveis, sendo essas determinadas pela imposição de que o momento angular do elétron deve ser um múltiplo inteiro de h/2π . 2. Enquanto descreve o movimento acelerado em sua órbita, o elétron não irradia ener- gia como prevê a teoria eletromagnética clássica. 3. O elétron pode saltar de uma órbita para outra. Se ele pula espontaneamente de uma órbita em que sua energia total é Ei para uma outra de energia menor Ef , a energia perdida é emitida na forma de radiação, cuja freqüência é dada pela relação ν = (Ei − Ef )/h. O modelo de Bohr tem aplicação somente no caso de átomos com um só elétron, como o átomo de hidrogênio ou átomos ionizados de outros elementos, no qual somente um elétron permanece ligado ao núcleo. Consideremos então um átomo constituído de um núcleo de carga Ze e massa M ao qual permanece ligado um único elétron de carga -e e massa m, girando ao redor do núcleo em uma órbita circular. Sendo v sua velocidade orbital, a condição de equilíbrio é obtida igualando-se a força eletrostática com o produto da massa do elétron por sua aceleração centrípeta: 1 Ze2 v2 = m 4πo r2 r De acordo com o primeiro postulado de Bohr, temos ainda que os raios possíveis para essas órbitas devem ser determinados impondo-se a condição de quantização do momento angular para o elétron: h = n~ 2π por 2π é chamado mvr = n onde ~, a constante de Planck dividida h cortado. Substituindo v obtido da equação acima na equação de equilíbrio de forças, temos: n 2 ~2 1 Ze2 = 4πo r mr2 de forma que os raios das órbitas são dados por: r= 4πo n2 ~2 mZe2 e as velocidades orbitais podem ser então obtidas da expressão: v= n~ n~Ze2 Ze2 = = mr 4πo n2 ~2 4πo n~ 83 4 O Átomo de Bohr A energia total de um elétron numa órbita é dada pela soma da energia cinética e da 1 1 2 2 2 potencial eletrostática. Como Ec = mv = Ze /4πo r e Ep = −Ze /4πo r , temos: 2 2 E = Ec + Ep = − 1 Ze2 2 4πo r substituindo agora a expressão para o raio das órbitas obtida acima, temos nalmente a expressão para a energia dos elétrons em função de n : En = − mZ 2 e4 1 (4πo )2 2~2 n2 Figura 4.7: Diagrama de níveis de energia para o átomo de hidrogênio para diferentes números n, de acordo com o modelo de Bohr. De acordo com o terceiro postulado de Bohr, a energia emitida na forma de radiação (fóton) quando o elétron passa de uma órbita de energia mais baixa Em En para uma outra de energia é dada por: hν = En − Em de onde se pode obter a expressão para o número de onda 84 k = ν/c: 4.4 A Experiência de Franck-Hertz  k= 1 4πo 2 me4 2 Z 4π~3 c  1 1 − 2 2 m n  = R∞ Z 2  1 1 − 2 2 m n  onde  R∞ = 1 4πo 2 me4 4π~3 c é a constante de Rydberg para um átomo de massa innita. Levando-se em conta a massa nita do átomo pode-se vericar que a expressão para o número de onda acima se altera substituindo-se R∞ por: R = R∞ M m+M Com os valores das constantes físicas disponíveis na época, Bohr pode vericar que sua previsão estava em bom acordo com o valor experimental da constante de Rydberg. Com os valores atualmente aceitos das constantes fundamentais, a constante R calculada com o modelo de Bohr reproduz o valor atual da constante R dentro de 1 parte em 100000! O raio do átomo de hidrogênio pode ser obtido tomando-se o n para o estado de menor energia: ao = O valor de ao , 4πo ~2 ' 0.53A me2 chamado raio de Bohr, está em muito bom acordo com as estimativas para o diâmetro atômico ∼ 1A que haviam na época. Átomos alcalinos como o Li e o Na, podem ter seus primeiros níveis de energia dados pelo modelo de Bohr em forma aproximada (intruduzindo-se os tais defeitos quânticos, como mostrado na fórmula de Rydberg). A razão para isso só pode ser entendida com o desenvolvimento posterior da teoria quântica. Esses átomos têm sua estrutura denida com apenas 1 elétron após camadas atômicas fechadas para os elétrons mais internos. Numa primeira aproximação, esses elétrons mais internos, que são rigidamente ligados, podem ser incluídos num núcleo com carga total igual a 1e (Z prótons + Z-1 elétrons) e o último elétron se move em órbitas parecidas com a do elétron do átomo de hidrogênio. 4.4 A Experiência de Franck-Hertz Embora o modelo atômico de Bohr tivesse um sucesso muito grande, dado a exatidão de suas previsões para os espectros atômicos, não havia outra indicação de que realmente os estados de energia do átomo eram quantizados. Em uma experiência muito simples, realizada em 1914 por James Franck e Gustav Hertz, o modelo de Bohr, ou mais precisamente a quantização dos estados de energia do átomo foi comprovada por um processo puramente mecânico - o espalhamento inelástico de elétrons por átomos de mercúrio. A importância 85 4 O Átomo de Bohr desta comprovação foi demonstrada com o prêmio Nobel atribuído a Franck e Hertz alguns anos depois (1925). Num depoimento dado por J. Franck no início dos anos 60 (na biblioteca do IFUSP há um vídeo com a demonstração do experimento de Franck-Hertz onde há também este depoimento), ele menciona que quando realizavam o experimento não sabiam ainda do modelo proposto por Bohr alguns meses antes. A motivação do experimento era determinar a energia de ionização do átomo e não vericar a quantização dos níveis de energia. A montagem experimental para o experimento de Franck-Hertz utilizada hoje em dia nos laboratórios didáticos é vista esquematicamente na gura 4.8. Elétrons são emitidos pelo catodo aquecido C com energia cinética muito baixa. aplicandose uma diferença de potencial Vo entre o catodo e a grade G, o elétron é acelerado, tendo sua energia cinética aumentada progressivamente até atingir o valor eVo nas proximidades da grade. Entre a grade e a placa coletora P aplica-se uma pequena diferença de potencial retardadora ∆V , de modo que os elétrons devam ter, ao ultrapassar a grade G, uma energia cinética mínima (= potencial acelerador Vo , e∆V ) para poder chegar à placa P. Para pequenos valores do a corrente de elétrons que chegam na placa coletora, medida pelo amperímetro I é pequena. Isso é devido ao fato de que uma nuvem de elétrons lentos se forma nas proximidades do catodo, pelos próprios elétrons emitidos. Essa distribuição de carga negativa gera um potencial elétrico que impede que outros elétrons sejam ejetados do catodo. Ao se aumentar Vo , elétrons da parte externa da nuvem são acelerados em direção à grade, diminuindo assim o tamanho da nevem e permitindo que mais elétrons sejam emitidos do catodo, de modo que a corrente medida na placa cresce à medida em que Vo aumenta. Figura 4.8: Diagrama esquemático do equipamento utilizado na experiência de FranckHertz A realização da experiência se faz com a introdução de uma gota de mercúrio no interior do tubo, no qual se faz vácuo. Aquecendo-se o tubo a temperaturas de ∼ 150 C, uma pequena fração do mercúrio ca em forma de vapor, preenchendo todo o volume do tubo. Os elétrons agora, entre o catodo e a grade, passam a colidir com os átomos de mercúrio ao longo do caminho. 86 No caso de colisões elásticas, sendo o átomo de mercúrio muito 4.4 A Experiência de Franck-Hertz mais pesado que o elétron, praticamente não há perda de energia dos elétrons nas colisões, não afetando portanto o número de elétrons que chegam por segundo à placa. Entretanto, na presença de vapor de mercúrio, ao se aumentar o potencial acelerador para um valor ligeiramente maior que 4.9 V, observa-se que a corrente cai bruscamente. A interpretação para esse fato é que os elétrons, ao atingirem a energia um pouco acima de 4.9 eV (o que ocorre nas proximidades da grade, para Vo ∼ 4.9V ) colidem inelasticamente com os átomos de mercúrio, cedendo praticamente toda sua energia cinética. Portanto não têm energia suciente para atravessar a região de potencial freador e atingir a placa coletora. A conclusão inicial de Franck e Hertz é que o átomo estava sendo ionizado. Aumentandose ainda mais o potencial acelerador Vo , os elétrons continuariam a ionizar os átomos de mercúrio, mas agora sobraria energia cinética suciente para atravessar a região de potencial retardador e conseguiriam portanto chegar ao anodo. Portanto a corrente I voltaria a aumentar. A surpresa foi descobrir que essa não era a energia de ionização do mercúrio, mas sim a de excitação do átomo de mercúrio. Realmente, a diferença de energia de 4.9 eV corresponde à entre o estado fundamental (estado de menor energia) e o próximo estado de energia (primeiro estado excitado) do Hg. Elétrons com energia menor que 4.9 eV não podem fazer colisões inelásticas pois não há um estado disponível para o átomo absorver essa quantidade de energia. No espectro do átomo de mercúrio, há inúmeras raias, mas a mais intensa, fonte principal da luz emitida pelas lâmpadas modernas de Hg, tem comprimento de onda de 2530 A, bem conhecido na época. Utilizando-se a relação de Einstein, E = hc/λ = 4.9 eV para esta raia do Hg. Franck e Hertz colocaram ainda o tubo com vapor de Hg, com potencial acelerador Vo = 4.9 V num espectrômetro e observaram que o espectro continha somente uma raia, a de 2530 A. A relação entre os estados de energia quantizados e as raias dos espectros atômicos estava denitivamente comprovada. Na experiência de Franck-Hertz, se aumentarmos mais a tensão, como vimos a corrente recomeça a subir. Entretanto, quando Vo ∼ 10V , ela começa a cair novamente. Os elétrons, saindo do catodo, ganham, em algum ponto entre o catodo e a grade, energia maior que 4.9 eV, suciente para poder fazer uma colisão inelástica, transferindo 4.9 eV de sua energia para o átomo de Hg. Continuam então sendo acelerados e quanto chegam às proximidades da grade, têm novamente energia cinética ligeiramente superior a 4.9 eV e colidindo novamente inelasticamente, a energia restante não é suciente para atravessar a barreira de potencial, e a corrente cai novamente. Isso se repete cada vez que a tensão de aceleração é ligeiramente maior que um múltiplo de 4.9 V, conforme visto na gura 5.9. Há dois fatos curiosos sobre a experiência de Franck-Hertz. Nos tubos de Franck-Hertz modernos, fabricados comercialmente para uso em laboratórios didáticos, as dimensões do tubo são bem menores que as do tubo original, construído por Franck e Hertz. Nestes, a pressão de operação do vapor de Hg é bem maior que a do tubo original. Nessa condição de pressão, a probabilidade de colisão elástica de elétrons lentos com átomos de Hg é enorme e o gás se torna opaco para esses elétrons, com energia ∼. 0.5 eV. Com isso, elétrons com baixa energia próximos à grade, não conseguem chegar à placa, mesmo que a diferença de potencial entre G e P seja aceleradora. Esse fato sobre as colisões elásticas, desconhecido na época, poderiam ter causado muitos problemas para Franck e Hertz comprovarem o 87 4 O Átomo de Bohr Figura 4.9: Curva experimental de corrente x tensão de aceleração no experimento de Franck-Hertz (dados obtidos no Laboratório de Estrutura da Matéria do IFUSP) 88 4.5 Regras de Quantização de Wilson-Sommerfeld funcionamento do método (ver D.R.A. McMahon - Am. J. Phys. 51, 1086 (1983)). Outra curiosidade se relaciona com observações feitas pelos alunos da disciplina Laboratório de Estrutura da Matéria II do IFUSP em 1988, quando este que escreve era professor da disciplina. Neste ano, as medidas de IxV, antes feitas manualmente, foram automatizadas, introduzindo-se um gracador eletromecânico. Isso deu uma signicativa melhoria na qualidade (precisão) dos dados experimentais e pudemos observar que a diferença de tensão entre os picos, como os da gura 4.9 não era constante, mas aumentava, à medida em que a tensão de aceleração aumentava. Passamos a coletar dados de todas as equipes, para se obter valores médios com bom signicado estatístico. Estava convencido que o efeito era devido a erro sistemático introduzido pela inércia mecânica da pena do gracador. Logo a seguir, passamos a utilizar uma placa de digitalização acoplada um micro computador (Apple II - os primeiros a surgir na USP) e o efeito continuou, embora não houvesse mais o problema de inércia do sistema mecânico. Para satisfação de todos, no mesmo mês quem que observamos este efeito, foi publicado um artigo (G.F. Hanne - Am. J. Phys. 51, 810 (1988)) onde era previsto teoricamente a ocorrência de um efeito semelhante ao que observávamos. Uma explicação mais detalhada para este efeito será dada no Lab. de Estrutura da Matéria. 4.5 Regras de Quantização de Wilson-Sommerfeld O impressionante acordo entre as previsões do modelo de Bohr e os resultados experimentais determinaram o imediato sucesso do mesmo. Entretanto, do ponto de vista de uma estrutura organizada do conhecimento como se conhecia com a mecânica e o eletromagnetismo, a situação da chamada física quântica era bastante caótica. Planck havia postulado a quantização da energia de um oscilador (E do momento angular L = nh/2π , = nhν ), Bohr agora introduzia a fazendo com que as energias das órbitas atômicas fossem também quantizadas, mas com uma relação diferente daquela encontrada por Planck. Uma ordenação parcial desse conjunto de novas idéias aparentemente desconexas foi introduzida em 1916, por Wilson e Sommerfeld. Então foi enunciada o postulado que cou conhecido como a regra de quantização de Wilson-Sommerfeld : Para qualquer sistema físico com movimento periódico, sendo coordenada de posição q, p o momento associado à tem-se a relação: I pdq = nq h A integral acima já era conhecida da mecânica e é chamada integral de ação ou simplesmente ação. harmônico ou ϕ As variáveis q e p são por exemplo e L, x e px , no caso de um oscilador no caso de uma partícula descrevendo um movimento circular. Ve- jamos por exemplo, o caso de um oscilador harmônico de uma massa m sob ação de uma força F = −kx. A equação do movimento é dada pela aplicação da segunda lei de Newton: d2 x m 2 = −kx dt 89 4 O Átomo de Bohr Cuja solução x(t) é dada por: x(t) = Asen(wt + ϕ) p onde A é a amplitude do movimento, w = k/m = 2πν a freqüência angular e que depende das condições iniciais. Por simplicidade vamos fazer ϕ=0 ϕ uma fase no que segue. A velocidade da massa m é dada por: vx = e portanto, px = mvx = mAw cos wt. dx = Aw cos wt dt A ação correspondente pode ser então calculada pela expressão: I I px dx = 2 (mAw cos wt)Aw cos wtdt = mA w observando que a energia do oscilador é dada por de onde dθ = wdt, 2 I cos2 wtdt E = 12 kA2 = 12 mw2 A2 e fazendo θ = wt, temos: I mw2 A2 pdx = w Z 2π cos2 θdθ = 0 2E π w utilizando então a regra de Wilson-Sommerfeld, temos 2πE = nh ⇒ E = nhν, w que é a relação de Planck. Analogamente podemos obter a relação de Bohr. Um elétron descrevendo um movimento circular e uniforme como no modelo de Bohr tem momento angular constante A coordenada associada a esse momento é o ângulo de rotação I I Ldϕ = L dϕ = 2πL = nh ⇒ L = n L = mvr. ϕ: h = n~ 2π Essas regras de quantização propiciaram por exemplo a obtenção, pelo próprio Sommerfeld, da chamada constante de estrutura na para os espectros atômicos. Espectros atômicos de alta resolução mostravam que algumas linhas eram na verdade duplas ou triplas, detalhes que são conhecidos como estrutura na dos espectros. Sommerfeld admitiu a possibilidade de órbitas elípticas de diferentes excentricidades. Utilizando expressões relativísticas, uma vez que em órbitas de alta excentricidades os elétrons têm velocidades muito maiores ao passar próximo ao núcleo, Sommerfeld obteve para a chamada constante de estrutura na: α= (Nota: 1 e2 ∼ 1 = 4πo ~c 137 Recentemente, observações de detalhes de espectros atômicos produzidos por galáxias distantes, mostraram uma constante de estrutura na ligeiramente diferente da 90 4.5 Regras de Quantização de Wilson-Sommerfeld que conhecemos, indicando que as constantes fundamentais, como o , e, h, c, podem variar no tempo. Esses resultados precisam ainda ser conrmados). Embora a regra de quantização de Wilson-Sommerfeld fosse ainda muito limitada (só é válida para sistemas com movimento periódico), foi um avanço na compreensão dos sistemas físicos de pequenas dimensões. Elas também não explicavam a razão da falha de parte da teoria clássica ou o sucesso de outras partes (por que, por exemplo no modelo de Bohr a lei de forças de Coulomb era válida, enquanto que as de radiação não o eram?). Uma relação entre os resultados clássicos e os da teoria quântica foi ainda introduzida por Bohr, por volta de 1923, segundo a qual As previsões da teoria quântica devem corresponder aos resultados das teorias clássicas no limite de grandes números quânticos, conhecido como Princípio de Correspondência. Vejamos por exemplo o caso do átomo de hidrogênio. A freqüência de radiação clássica para o elétron em movimento circular é igual à sua freqüência de rotação νo = v/2πr. Das expressões que obtivemos anteriormente para v= v e r, temos: 1 e2 n 2 ~2 ; e r = 4πo 4πo n~ me2 de onde se obtém: νo = me4 1 2 (4πo ) 2π~3 n3 A freqüência prevista pela teoria quântica é dada pela diferença de energia entre os estados En e En−1 : me4 ν=− (4πo )2 2~2 h  me4 = (4πo )2 4π~3 Para n  1 (lim n → ∞) 1 1 − 2 n (n − 1)2  2n − 1 2 n (n − 1)2  =  essa expressão ca: ν= me4 1 2 (4πo ) 2π~3 n3 como no caso clássico. O conjunto de conhecimentos sobre a teoria quântica desde os postulados de Planck até o princípio de correspondência de Bohr é o que chamamos hoje de a Velha Mecânica Quântica. Veremos no próximo capítulo como as novas idéias introduzidas por Luis De Broglie desencadearam o desenvolvimento de uma teoria completa, a Mecânica Quântica ou Mecânica Ondulatória. 91 4 O Átomo de Bohr 4.6 Exercícios 1.- Um feixe no de partículas α de energia 4.8 MeV incide normalmente num alvo de −4 6 Cu de 10 cm de espessura. A intensidade do feixe é de 10 partículas por segundo e 3 a densidade do Cu é 8.9 g/cm . Quantas cintilações por segundo serão produzidas pelas partículas espalhadas numa tela uorescente de 2x2 mm, colocada a 5 cm do centro do o alvo e numa direção fazendo um ângulo de 60 com a do feixe incidente? (Este foi um dos casos estudados por Geiger e Marsden). 2.- Uma bola de raio desprezível colide elasticamente com uma esfera rígida de raio R, sofrendo uma deexão de ângulo θ com a direção de incidência. Sabe-se que em relação à normal no ponto de colisão, o ângulo de incidência é igual ao de emergência. a) Mostre que o parâmetro de impacto b e ângulo de espalhamento estão relacionados por b) Qual a seção de choque para espalhamento em ângulos maiores que θ? b = R cos(θ/2). c) Qual a seção de choque total? 3.- Mostre que o número de partículas espalhadas em um ângulo Θ ou maior no espa- lhamento Rutherford é dado por:  N (Θ) = 1 4πεo 2  πIρt zZe2 M v2 2 cot2 (Θ/2) 4.- A fração de prótons com 6 MeV espalhados por uma folha de Au, cuja densidade é 3 o −5 19.3 g/cm , em ângulos maiores que 60 é igual a 2 · 10 . Calcule a espessura da folha de Au, usando os resultados do problema anterior. 5.- Usando a fórmula de Bohr, calcule os três maiores comprimentos de onda da série de Balmer. Entre que limites de comprimento de onda está a série de Balmer? 6.- Calcule o menor comprimento de onda da série de Lyman e o da série de Paschen. 7.- Utilizando o modelo de Bohr para o átomo de hidrogênio, mostre que durante a transição do estado n para o estado n-1, a freqüência da luz emitida é dada por:  ν= 2π 2 mke4 ~3  2n − 1 n2 (n − 1)2 8.- À partir do resultado acima, mostre que quando n tende ao innito, a expressão 3 varia com 1/n e se reduz à freqüência clássica emitida (sugestão: obtenha classicamente a freqüência de revolução do elétron numa órbita circular). 9.- Mostre que no estado fundamental do átomo de hidrogênio, a velocidade do elétron 2 pode ser escrita como v = αc onde α = (1/4πεo )e /~c ' 1/137 é a constante de estrutura na. 10.- Usando o modelo de Bohr, calcule a energia necessária para remover o elétron restante em um átomo de He ionizado. 11.- Mostre que a freqüência de revolução de um elétron no modelo de Bohr para o átomo ν = 2|E|/hn, onde E é a energia total do elétron. α com energia cinética 13,9 MeV ou maior, incidindo em 4 obdecem a lei de Rutherford (∼ 1/ sin θ/2). Estime o tamanho do de hidrogênio é dada por 12.- Observa-se que partículas folhas de cobre não 92 4.6 Exercícios núcleo de Cu à partir dessa observação, supondo que o núcleo de Cu permanece xo na −15 colisão com as partículas α. 6x10 m 13.- Calcule os comprimentos de onda das três primeiras raias da série de Lyman do átomo de hidrogênio. + 14.- a) Construa o diagrama de níveis de energia para o íon He (Z=2). b) Qual a + energia de ionização para o He ? 2 a) En = −54,4/n eV b) 54,4 eV + 2+ 3+ 15.- Qual o raio da primeira órbita de Bohr para a) He , b) Li e c) Be ? rHe+ = 0,0265 nm, rLi2+ = 0,0177 nm, rBe3+ = 0,0132 nm 16.- a) Calcule o maior e menor comprimento de onda para a série de Paschen. b) Determine as energias dos fótons correspondentes. a) λmax = 1874 nm λmin =820 nm b) Emin =0,663 eV Emax = 1,52 eV 17.- Um átomo de hidrogênio está em seu estado fundamental (n=1). Usando o modelo de Bohr para o átomo, calcule a) o raio da orbita, b) o momento linear do elétron, c)o momento angular do elétron d) a energia cinética, e) a energia potencial e f ) a energia total. a) 0,0529 eV b) 1,99x10−24 kg.m/s c) 1,05x10−34 kg.m2/s= ~ d) 13,6 eV e) -27,2 eV f ) -13,6 eV 18.- Um elétron inicialmente no estado n=3 de um átomo de massa M com 1 elétron em repouso, faz transição para o estado fundamental n=1. a) Mostre que a velocidade de recuo do átomo devida à emissão do fóton é dada aproximadamente por v=8hR/9M, onde R é a constante de Rydeberg. b) Calcule a porcentagem da energia de transição 3->1 que é carregada núcleo de deutério em recuo. −8 b) 3,2x10 % 19.- Um elétron com energia menor que 100 eV colide frontalmente (e elasticamente) com um átomo de Hg em repouso. a) Se o elétron inverte sua direção de movimento, mostre que o elétron perde apenas uma pequena fração de sua energia cinética inicial, dada por: ∆Ec /Ec = 4M/[m(1 + M/m)2 ] onde m é a massa do elétron, M a do Hg. b) Usando os valores conhecidos de m e M, mostre que ∆Ec /Ec ∼ 4m/M . 20.- Calcule o parâmetro de impacto para o espalhamento de uma partícula ◦ ◦ MeV) por ouro em um ãngulo de a) 1 e b) 90 . −12 −14 a) 1,69 · 10 m b) 1,48 · 10 m 21.- Um feixe de partículas α α (E=7,7 de 8 MeV é espalhado por uma folha na de ouro. Qual a α espalhadas a 1◦ e o número das espalhadas em ãngulo razão entre o número de partículas ◦ maior que 2 ? 22.- Para alvos de alumínio (Z=13) e ouro (Z=79), qual a razão de partículas α espa- lhadas em um ângulo qualquer, para um dado número de partículas incidentes? 36,2 α de 5,5 MeV em uma folha na 10000 partículas α são espalhadas em um ângulo α serão espalhadas em ângulo maior que 90◦? b) 23.- Em um experimento feito espalhando-se partículas de ouro, estudantes encontraram que ◦ maior que 50 . a) quantas partículas ◦ ◦ quantas serão espalhadas entre 70 e 80 ? 93 4 O Átomo de Bohr a) 2170 b) 1347 24.- Estudantes querem fazer um experimento usando uma fonte muito forte de partículas α de 5,5 MeV que serão espalhadas por uma folha na de ouro. Eles querem conseguir ◦ uma taxa de de 1 partícula/s a 50 , mas o detector que utilizam é limitado a uma taxa máxima de 2000 partícula/s. O detetor empregado subentende um pequeno ângulo sólido. ◦ O sistema de medidas poderá ser empregado para medir a taxa a 6 sem modicação? 25.- Os raios nucleares do alumínio e ouro são aproximadamente r=3,6 fm e 7,0 fm respectivamente. Os raios do próton e da partícula a) Que energia de partícula α α são respectivamente 1,3 fm e 2,6 fm. seria necessário para que as superfícies nucleares se toquem em uma colisão frontal? b) Qual a energia no caso de prótons? ( calcular para alumínio e ouro) a) Al: 6,04 MeV, Au: 23,7 MeV b) Al: 3,82 MeV, Au: 13,7 MeV 26.- Calcule a velocidade e a aceleração radial para um elétron no átomo de hidrogênio. ++ Faça o mesmo para um átomo de Li . 27.- Calcule o momento angular em kg.m/s para a órbita eletrônica de menor energia no átomo de hidrogênio. 28.- Use os valores conhecidos de o , h, m, e e calcule as seguintes quantidades (com 4 2 2 algarismos signicativos): hc, e /4πo (em eV.nm), mc (keV), ao (em nm) e Eo (em eV). −2 1239,8 eV.nm, 1,4400 eV.nm, 511,00 keV 5,2918x10 nm, 13,606 eV 29.- Um átomo de hidrogênio em um estado excitado absorve um fóton de comprimento de onda 434 nm. Qual o estado inicial e nal do átomo? n=2 e n=5 30.- Qual é a energia de ligação calculada para o elétron no estado fundamental do a) + +++ deutério? b) He ? c) Be ? a) 13,6 eV b)54,4 eV c) 218 eV 31.- Um átomo de hidrogênio existe em um estado excitado por um intervalo de tempo 10−8 s. Quantas revoluções faz o elétron no estado n=3 antes de decair? da ordem de 6 2,44x10 32.- Um átomo muônico consiste de um múon (mc 2 = 106 MeV, carga = -e) no lugar do elétron. Para o múon no átomo de hidrogênio, calcule: a) o menor raio. b) A energia de ligação do estado fundamental. c) O comprimento de onda limite para as três primeiras séries espectrais. −13 a) 2,84x10 m b) 2535 eV c) 0,49 nm, 1,96 nm, 4,40 nm 94 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria 5.1 Postulados de de Broglie Louis-Victor Pierre Raymond de Broglie (1892-1987) foi um príncipe francês com formação básica em história. Por volta de 1911, incentivado principalmente por discussões com seu irmão Maurice - físico - a respeito das novas idéias emergentes na física, como as de Plank e de Einstein para o fóton, Louis de Broglie iniciou seus estudos em física. Logo o teve que interromper, por causa da I Guerra Mundial, quando serviu, de 1914 a 1918 na divisão de telegraa do exército francês. Após a guerra reiniciou seus estudos e em 1924 apresentou sua tese para obtenção do título de Doutor, intitulada Pesquisas sobre a Teoria dos Quanta, onde introduziu idéias ainda mais fantásticas para as propriedades dos sistemas microscópicos. Essas novas idéias foram fundamentais para o desenvolvimento, dois anos depois, de uma teoria mais formal, chamada mecânica ondulatória ou mecânica quântica. A hipótese básica de de Broglie se relaciona com uma simetria que poderia estar implícita nas propriedades de dualidade introduzidas por Planck e principalmente por Einstein para a radiação eletromagnética. Neste caso, a luz, que apresenta propriedades claras de ondas (produzindo fenômenos como difração e interferência) tinha também propriedades que só poderiam ser interpretadas se ela fosse tratada como um conjunto de corpúsculos, os fótons. As relações entre as propriedades ondulatórias da luz (freqüência, comprimento de onda) com as de corpúsculos (energia, momento linear) são dadas pelas relações bem conhecidas, introduzidas por Einstein: E = hν; p = h λ Louis de Broglie postulou que por uma questão de simetria, a matéria, que tem características básicas de corpúsculos, deveria também apresentar, em certas circunstâncias, características ondulatórias. As relações que permitem obter a freqüência e o comprimento de onda associados a uma partícula são dadas pelas chamadas relações de de Broglie: ν= E h ; λ= h p De Broglie utilizou, nas aplicações dessas formulas, expressões relativísticas para a energia e o momento da partícula. Aqui entretanto, utilizaremos expressões clássicas, o que 95 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria não altera o espírito das conclusões. Embora não existisse, até o momento da apresentação dessas idéias, nenhuma evidência de comportamento ondulatório da matéria, as idéias de de Broglie tiveram rápida divulgação pelos novos e inéditos conceitos introduzidos. Em seu trabalho original, de Broglie, apresentando evidências de suas idéias, aplicou os conceitos acima no modelo de Bohr para o átomo de hidrogênio. Notou que a condição de Bohr para a quantização do momento angular, utilizada agora com as novas idéias, correspondiam à condição de ondas estacionárias para as órbitas eletrônicas: mvr = n~ = 2πr = usando p = h/λ e S = 2πr nh 2π nh nh = mv p para o perímetro da órbita, temos a relação: nλ = S que é a condição para uma onda estacioária, como visto na gura 5.1. Figura 5.1: Visualização do elétron como uma onda estacionária, no átomo de hidrogênio. Utilizando as relações de de Broglie, podemos calcular o comprimento de onda associado a um elétron com energia E. Supondo a energia não muito grande, de modo que não precisamos utilizar as relações relativísticas, temos: λ= Para E=100 eV, por exemplo, temos h h =√ p 2mE λ = 1.2Å. Vemos portanto que elétrons de baixa energia têm comprimento de onda parecidos com o de raios-X típicos. Isso sugere que as 96 5.1 Postulados de de Broglie propriedades ondulatórias dos elétrons possam ser observadas em situações semelhantes àquelas em que os efeitos de difração e interferência foram observados com uso de raios-X, ou seja em cristais. Alguns anos depois, em 1927, essas idéias foram conrmadas em experimentos realizados independentemente por Davisson e Germer nos Estados Unidos e por G. Thomson na Escócia. Fazendo um feixe de elétrons acelerados incidir num mono cristal como visto na gura 5.2, observa-se uma distribuição angular dos elétrons espalhados. Essa distribuição, mostrada na gura 5.2, só pode ser interpretada se pensarmos num processo de difração de Bragg, como a observada para raios-X (ver gura 3.3). Figura 5.2: Diagrama esquemático do equipamento utilizado por Davisson e Germer para estudo da difração de um feixe de elétrons por um cristal. Outro processo de difração já utilizado na época com raios-X, a chamada difração de Debye-Scherrer, onde um feixe de raios-X incide numa folha na de um material policristalino. Observa-se então a imagem formada pela difração em um lme fotográco colocado em ângulos dianteiros, conforme se vê na gura 5.3. A mesma experiência pode ser repetida utilizando-se um feixe de elétrons ao invés de raios-X, observando-se o mesmo tipo de padrão, conforme visto na gura 5.3. Experimento semelhante foi realizado por George P. Thomson, que juntamente com Clinton J. Davisson recebeu o prêmio Nobel de física em 1937, por essas descobertas (interessante notar que o pai de G. Thomson, J.J. Thomson, havia ganho o prêmio Nobel de 1906 por ter descoberto o elétron, caracterizado como uma partícula, enquanto que o lho o ganhou por mostrar que o elétron é uma onda!). Posteriormente foram realizados outros experimentos, com feixes, de prótons, nêutrons e mesmo átomos, todos apresentando o mesmo fenômeno de difração, mostrando que as relações de de Broglie são universais. 97 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria Figura 5.3: Difração de um feixe de elétrons por uma folha na de Au (direita) comparado com a difração produzida por raios-X (esquerda). 98 5.2 Propriedades Gerais das Ondas 5.2 Propriedades Gerais das Ondas Antes de prosseguir com as conseqüências dos postulados de de Broglie, vamos recordar algumas propriedades gerais das ondas, que serão de grande utilidade no desenvolvimento posterior da teoria quântica. Ondas são entidades bastante conhecidas de todos. Talvez a imagem mais familiar seja a das ondas produzidas após se lançar uma pedra num lago de águas calmas. A propagação de um pulso em uma corda esticada é um outro exemplo onde podemos visualizar algumas características das ondas. Outros tipos de ondas são menos evidentes do ponto de vista sensorial, como as ondas sonoras e as eletromagnéticas. Uma característica fundamental das ondas é que elas podem transportar energia de um ponto a outro, sem que haja no entanto transporte de matéria. Ondas eletromagnéticas, por exemplo, não necessitam nem de um meio material para sua propagação, como é o caso dos outros tipos de onda mencionados acima. Uma onda (vamos nos limitar a descrever ondas em uma dimensão) é descrita por uma função chamada função de onda, Ψ(x,t), que é solução da equação de onda : ∂2Ψ 1 ∂2Ψ = ∂x2 v 2 ∂t2 onde v é chamada velocidade de fase da onda. A equação acima pode ser obtida aplicandose as leis de Newton a um segmento de corda esticado no qual se produziu um pulso (v = p T /µ onde T é a tensão na corda e µ a densidade linear). Analogamente, utilizando- se as leis dos gases juntamente com a segunda lei de Newton, obtém-se equação idêntica para as ondas sonoras (ondas de pressão) em um meio gasoso (com γ = cp /cv ). acima, com v= p γRT /M , onde À partir das equações de Maxwell também se obtém equação como a mostrada v = c/n onde √ c = 1/ µo o é a velocidade da luz no vácuo e n o índice de refração do meio. Pode-se mostrar que qualquer função que dependa de x e t somente pela combinação x ± vt é sempre uma solução da equação de onda. f (x + vt) = f (ϕ). Temos as seguintes relações: Consideremos para isso uma função ∂f df ∂ϕ df ∂f df ∂ϕ df = = ; = =v ∂x dϕ ∂x dϕ ∂t dϕ ∂t dϕ e para as derivadas segundas:   ∂2f d ∂f ∂ϕ d2 f = = ∂x2 dϕ ∂x ∂x dϕ2   2 ∂2f d ∂f ∂ϕ 2d f = = v ∂t2 dϕ ∂t ∂t dϕ2 e portanto, 1 ∂2f d2 f ∂2f = = v 2 ∂t2 dϕ2 ∂x2 99 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria Figura 5.4: Pulso de onda em uma corda esticada. A gura 5.4 mostra um pulso em uma corda em dois instantes de tempo consecutivos, t=0s e t=1s. A função de onda descrevendo o pulso e dada por: f (x,t) = Ae−k 2 (x−vt)2 = 1.0e−(x−5t) 2 Portanto, em t=0 a curva corresponde a uma gaussiana centrada em x=0 e em t=1 a uma outra de mesmas características, mas com centróide em x=5 m. claramente, que uma função de Portanto, vê-se x−vt corresponde a uma onda propagando-se para a direita. x + vt corresponde a uma Analogamente pode-se vericar que uma função com argumento onda se propagando para a esquerda. Uma solução simples e muito importante para a equação de onda é a chamada onda harmônica: Ψ(x,t) = A cos k(x − vt) ou A sin k(x − vt) onde k = 2π/λ é o número de onda e kv = ω . Expressões equivalentes são: t x Ψ(x,t) = A cos(kx − ωt) = A cos 2π( − ) λ T onde kv = ω é a freqüência angular e T = 2π/ω = 1/ν é o período da onda. Muitas vezes, por facilidade de cálculo, se descreve uma onda harmônica, também chamada onda plana, pela função exponencial complexa: Ψ(x,t) = Ae±i(kx−ωt) 100 5.2 Propriedades Gerais das Ondas Embora esta função não possa ser uma solução física para ondas por ser uma função complexa, soluções reais podem ser obtidas tomando-se a parte real ou a parte imaginária da função, bem como combinações lineares, utilizando-se as relações: eiθ = cos θ + i sin θ cos θ = eiθ + e−iθ eiθ − e−iθ ; sin θ = 2 2i Ondas harmônicas são coisas um tanto articiais, pois se estendem por todo o espaço e todo o tempo. Entretanto, em muitos casos podemos descrever uma onda pela função harmônica em um intervalo nito de espaço e tempo e por outras funções fora desse intervalo. As ondas harmônicas têm ainda grande importância na descrição do movimento ondulatório, uma vez que qualquer tipo de onda pode ser sempre escrita em termos da soma de diferentes ondas harmônicas (o que é conhecido como análise de Fourier). Uma propriedade muito importante da equação de onda é ser uma equação linear (ou seja todos os termos que contém a função de onda estão elevados à potência 1). Com Ψ1 e Ψ2 são soluções da equação de onda então uma combinação linear Ψ(x,t) = AΨ1 (x,t) + BΨ2 (x,t) também é uma solução. Esta característica é também chamada isso, se princípio de superposição de ondas e é o que garante que a análise de Fourier seja possível. Um caso interessante corresponde à superposição de duas ondas harmônicas com mesma freqüência, amplitude e fase, mas se propagando em direções opostas: Ψ1 = A sin(kx − ωt) Ψ2 = A sin(kx + ωt) Figura 5.5: Ondas estacionárias em uma corda de comprimento L. Lembrando que sin(a ± b) = sin a cos b ± cos a sin b, temos: 101 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria Ψ(x,t) = Ψ1 + Ψ2 = A(sin(kx − ωt) + sin(kx + ωt)) e portanto temos para a onda resultante: Ψ(x,t) = 2A sin kx cos ωt O resultado, o produto de uma função somente de x por outra somente de t, não é uma onda que se propaga nem para esquerda nem para a direita, correspondendo a uma onda estacionária. Na gura 5.5 vemos exemplos de ondas estacionárias em uma corda. Como a corda está xa em ambas as extremidades, a amplitude de onda deve ser sempre nula nesses pontos em qualquer instante de tempo. Portanto, fazendo sin kx = 0 para x= 0 e x=L, temos a condição para ondas estacionárias na corda:∆ kL = nπ ou L = n λ 2 Um outro caso simples de superposição de ondas corresponde à de duas ondas harmônicas de freqüências ligeiramente diferentes, mesma amplitude e fase, e caminhando no mesmo sentido: Ψ1 = A cos(k1 x − ω1 t); Ψ2 = A cos(k2 x − ω2 t) observando-se que temos a seguinte identidade: k1 + k2 k2 − k1 ∆k − =k− 2 2 2 e expressões semelhantes, para k2 , ω1 e ω2 . Aplicando estas relações na expressão para 1 1 função de onda temos (usando a relação cos a + cos b = 2 cos (a + b) tanh cos (a − b)): 2 2 k1 = Ψ(x,t) = Ψ1 + Ψ2 = 2A cos a  1 (∆kx − ∆ωt) cos kx − ωt 2 A forma de onda resultante é vista na gura 5.6. Uma onda de número de onda e 1 freqüência k, ω tem amplitude 2A cos ((∆kx − ∆ωt)), e é vista como um envoltório na 2 gura, correspondendo a uma amplitude modulada. O envoltório, ou modulação tem uma velocidade dada por: 1 1 ∆ω 1 (∆kx − ∆ωt) = ∆k(x − t) = ∆k(x − vg t) 2 2 ∆k 2 onde vg = ∆ω/∆k é chamada velocidade de grupo. Tomando agora o limite de k2 → k1 e w2 → w1 , a superposição agora corresponde a uma onda harmônica e a velocidade de grupo é vg = dω/dk. Pode-se mostrar que em qualquer tipo de onda, a energia é transportada com a velocidade de grupo. Em muitos casos, a velocidade de fase, vf = ω/k é constante, não dependendo do número de onda. Nesses casos, dω/dk = ω/k e a velocidade de fase é igual à velocidade de grupo. Quando uma onda se propaga em um meio onde a velocidade de fase depende do comprimento de onda da radiação, o meio é chamado dispersivo e a 102 5.2 Propriedades Gerais das Ondas velocidade de grupo é diferente da de fase. No caso das ondas de matéria de de Broglie, 2 com E = hν = ~ω e p = h/λ = ~k e usando a relação E = p /2m, temos para a velocidade de fase: vf = ω ~k p v = = = k 2m 2m 2 Portanto a velocidade de fase não corresponde à velocidade da partícula. Entretanto, a velocidade de grupo é dada por: dω d ~k 2 ~k p = ( )= = =v dk dk 2m m m o que corresponde, portanto à velocidade da partícula. Figura 5.6: Superposição de duas ondas harmônicas, com comprimento de onda e freqüências ligeiramente diferentes Para descrever uma partícula localizada no espaço, devemos construir, por superposição, um pacote de ondas, cuja amplitude seja não nula apenas numa pequena região do espaço, como no caso de um pulso em uma corda. O exemplo anterior, com a superposição de apenas duas ondas, está longe de satisfazer às condições acima, mas mostra que se obteve alguma localização. Podemos dizer que temos algo localizado a cada meio comprimento de onda da envoltória. A incerteza ∆x nesta localização corresponde à distância entre dois nulos consecutivos do envoltório. Para um dado instante de tempo, a distância entre dois nulos consecutivos será: 1 1 (∆kx2 − ∆ωt) − (∆kx1 − ∆ωt) = π 2 2 ou ∆k(x2 − x1 ) = ∆k∆x = 2π 103 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria De maneira análoga, podemos pensar na localização temporal como o intervalo de tempo entre dois nulos consecutivos do envoltório, para um dado valor de x, obtendo-se: ∆ω∆t = 2π Essas relações mostram que quanto mais conseguirmos localizar a partícula no espaço (menor o ∆x), maior será o intervalo de números de onda (ou comprimentos de onda) utilizados para a construção do pacote. De maneira análoga, a relação entre as freqüências e o tempo. Para construir um pacote de ondas realmente localizado, como o pulso gaussiano da gura 5.3, devemos somar um número innito de ondas, com números de onda variando continuamente. O procedimento matemático utilizado para isso é chamado transformada de Fourier, ou análise de Fourier. Por exemplo, se a função que descreve o pulso é (para um dado instante de tempo): −(x−xo )2 /2σx2 f (x) = Fo e Z = A(k)e−ikx dk pode-se mostrar que na superposição deve ser usado um conjunto de ondas harmônicas cujos números de onda variam continuamente e cada uma tem amplitude (A(k)) também dada por uma função gaussiana: A(k) = Ao e−(k−ko ) 2 /2σ 2 k Quanto mais localizado for o pacote (menor o valor de σx ), mais ampla será a distribuição de k utilizada (σk será grande), conforme visto na gura 5.7. Da análise de Fourier, pode-se obter a seguinte relação entre os sigmas: σx σk = 1 2 (note que esta relação é análoga à que encontramos entre ∆x e ∆k para o caso simples que estudamos). Utilizando ainda a análise de Fourier, pode-se mostrar que para qualquer outra forma do pacote (triangular, retangular, trapezoidal, etc.), o produto da largura espacial do pacote pela largura da distribuição de números de onda utilizada é sempre maior que aquela obtida para o pacote gaussiano. Chamando de ∆x e ∆k as larguras do pacote e da distribuição de k utilizada temos então, de uma maneira geral: e analogamente para ω ∆x∆k ≥ 1 2 ∆ω∆t ≥ 1 2 e t: Na óptica, essas relações são chamadas relações de dispersão. 104 5.2 Propriedades Gerais das Ondas Figura 5.7: Relação entre a largura ∆x de um pacote de ondas e a correspondente largura da distribuição de números de onda ∆k utilizado na construção do pacote. 105 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria 5.3 O Princípio de Incerteza Vimos na seção anterior que, das propriedades usuais das ondas, tentar localizar uma onda no espaço ou no tempo, implica em termos uma distribuição larga em valores de número de onda e de freqüências, respectivamente (relações de dispersão). Com a teoria de de Broglie vemos uma característica muito interessante do comportamento das partículas. Multiplicando as relações acima por ~, temos: ∆x∆p ≥ ~ 2 ∆E∆t ≥ ~ 2 Essas relações são conhecidas na mecânica quântica como o princípio de incerteza e foram enunciados pela primeira vez em 1927 pelo físico alemão Werner Heisenberg. Elas representam uma limitação teórica à precisão com que podemos determinar simultaneamente a posição e o momento de uma partícula, ou a energia e o tempo. Quanto mais precisamente determinamos a posição, por exemplo, mais incerto será o momento da partícula. Como vimos acima, este princípio se origina do comportamento ondulatório das partículas. Vista de uma outra maneira, essas relações estão ligadas ao fato de que não podemos observar uma partícula sem interferir na mesma. Por exemplo, quando olhamos um pequeno objeto no microscópio, devemos iluminá-lo. A colisão dos fótons com o objeto altera portanto o momento do objeto (espalhamento Compton). Sabemos ainda que se quisermos observar um objeto muito pequeno, devemos utilizar luz de comprimento de onda muito menor que as dimensões do objeto, caso contrário a difração será apreciável e a imagem não terá uma boa denição. Portanto, quanto menor o objeto, maior a interferência ao se determinar a posição, e não há como diminuir arbitrariamente essa interferência. Vamos tentar observar (hipoteticamente) um elétron num microscópio, iluminando-o com um único fóton. Num microscópio em que a abertura angular da objetiva é utilizada tem comprimento de onda λ, θ e a luz pode-se mostrar que devido a difração, a menor distância que pode ser determinada é ∆x = Podemos considerar este elétron. 5.8. ∆x λ 2 sin θ como sendo a incerteza na determinação da posição do Suponha o fóton incidindo na horizontal, como mostra o diagrama da gura Após o espalhamento Compton, iremos observar o fóton se ele for espalhado em qualquer ângulo, dentro do campo de visão θ do microscópio (na ocular, o fóton chegará no ponto focal e não saberemos que direção tomou). Sendo p o momento do fóton espalhado (e aproximadamente igual ao do fóton incidente, se a energia do fóton não for muito grande), o componente horizontal de p poderá ter qualquer valor entre 0 e p sin θ. Assim, o componente x do momento transferido ao elétron terá uma incerteza da mesma ordem (a incerteza pode ser maior, se o momento do elétron antes de interagir com o fóton, já tiver alguma incerteza). Portanto: 106 5.4 Interferência Em um Sistema de Duas Fendas Figura 5.8: Diagrama esquemático de um microscópico onde tenta-se observar um elétron iluminado por um único fóton. ∆p∆x ≥ λ h h sin θ = λ 2 sin θ 2 Esta análise mostra que o princípio de incerteza é uma imposição intrínseca da natureza e não uma limitação imposta pela nossa incapacidade de medir coisas como a posição do elétron. 5.4 Interferência Em um Sistema de Duas Fendas O sistema de duas fendas é muito bem conhecido da física ondulatória tradicional. Vamos considerar um sistema simples, com ondas em um tanque de água. Um pequeno objeto (fonte de ondas) é balançado periodicamente para cima e para baixo, produzindo ondas circulares na superfície do tanque. A uma certa distância da fonte, temos na água uma parede com duas fendas verticais (duas portas). A seguir, as ondas que passam pelas duas fendas (produzindo por difração duas novas fontes de ondas circulares) são absorvidas num anteparo, evitando a produção de outras ondas por reexões. Próximo ao anteparo absorvedor temos um medidor de intensidade de onda, cuja indicação é proporcional ao quadrado da amplitude das oscilações em uma dada posição. O detector pode ser deslocado ao longo da posição vertical da gura, de modo que podemos medir a intensidade das ondas como função da posição x. Deslocando-se então o detector, percebemos que a intensidade varia continuamente com a posição, tendo vários pontos de máximo e de mínimo, conforme visto na curva I12 da parte c) da gura 5.9. Essa é a gura típica para a interferência 107 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria das ondas originadas das fendas 1 e 2 da parede no tanque. Se obstruirmos uma das fendas e medirmos a nova distribuição de intensidades, vamos observar um padrão diferente, I1 ou I2 na parte b) da gura, correspondentes ao fechamento das I12 claramente não corresponde I1 e I2 , sendo característico de um fenômeno ondulatório. Ondas representado pelas curvas fendas 2 e 1 respectivamente. O padrão de interferência à soma dos padrões originadas nas fendas 1 e 2 que chegam em fase numa dada posição do medidor se somam (interferência construtiva) produzindo um máximo e nas posições em que chegam com oposição de fase interferem destrutivamente, produzindo um mínimo de intensidade. Figura 5.9: Interferêcia: ondas de água em um tanque. Agora vamos imaginar um experimento semelhante, onde elétrons produzidos em um canhão eletrônico são acelerados em direção a uma placa metálica com duas fendas, como mostrado na gura 5.10. Após as fendas, como no caso do tanque com água, temos aqui um detector de elétrons, podendo ser, por exemplo, um contador Geiger. Esse detector pode estar conectado a um sistema ligado a um alto-falante, produzindo um som (um clique), cada vez que um elétron é detectado. Suponhamos que a intensidade do feixe de elétrons produzido seja pequena o suciente para que haja, em média, um intervalo de tempo relativamente grande entre um elétron e o consecutivo no feixe (maior que ~ 1 s). A primeira coisa que observamos é que numa dada posição do detector, ouve-se uma sucessão de cliques mais ou menos aleatoreamente distribuidos no tempo. Entretanto, se contarmos o número de cliques num intervalo de tempo relativamente longo (dezenas de minutos), o número médio de cliques por unidade de tempo será constante. Também, se colocarmos dois detectores em duas posições diferentes, nunca se ouvirá dois cliques simultâneos (exceto, cliques que chegam muito próximos em tempo e que nosso sistema auditivo não consegue separar, mas que poderiam ser separados com um sistema eletrônico mais sensível). Vericamos ainda que os sinais nos detectores ocorrem em grãos. Todos os cliques são exatamente idênticos, de mesmo tamanho. Como no experimento com ondas no tanque d'agua, podemos perguntar agora - qual a distribuição de intensidade (número/unidade de tempo) de elétrons como função da posição 108 5.4 Interferência Em um Sistema de Duas Fendas ao longo do eixo x? O resultado é a curva P12 mostrado na parte c) da gura 5.10. Um padrão completamente análogo àquele produzido no experimento com ondas na água! Figura 5.10: Experimento da gura 5.9 é repedido com feixe de elétrons. Ora, se o elétron é uma partícula, ele passa ou pela fenda 1 ou pela 2. como vimos, sempre chega um elétron inteiro no Geiger, e não uma fração de elétron. Para vericar por qual fenda passou o elétron, podemos, por exemplo, colocar uma fonte de luz atrás das fendas, de modo que ao passar por uma das fendas, o elétron espalha luz e vericamos então um clarão luminoso próximo à fenda 1 ou à fenda 2, dependendo da fenda por qual passou o elétron. Poderiamos agora contar os cliques no detector como função de x em duas tabelas: uma quando o clarão indicar que o elétron passou pela fenda 1 e a outra, quando vier da fenda 2. Esta experiência permite ainda vericar que o clarão vem sempre apenas de uma das fendas, nunca das duas simultaneamente. Os resultados dessas medidas 0 0 correspondem às curvas P1 e P2 da gura 5.11, correpondentes a elétrons que passaram 0 0 0 pela fenda 1 e 2 respectivamente. A curva P12 = P1 + P2 corresponde à condição do elétron passando pela fenda 1 ou pela fenda 2. Concluimos então que quando observamos os elétrons, o resultado (a distribuição de posições ao longo de x) é diferente daquele obtido quando não observamos os elétrons nas proximidades das fendas. A observação perturba o movimento dos elétrons. De um modo diferente, esses resultados indicam que quando não observamos, os elétrons se propagam como uma onda, desde o canhão de elétrons até o detector, produzindo o padrão típico de interferência. Quando observamos, vemos um comportamento de partícula, com o elétron passando por uma dada fenda, mas nesse caso, o fenômeno de interferência não é observado. Os elétrons são ainda observados no detetor Geiger como partículas. Esta característica, vista também com os fótons, indica uma característica dualistica onda/partícula para os elétrons bem como para todas as partículas e corpos. Em sistemas macroscópicos, as propriedades ondulatórias não são observadas pois os comprimentos de onda correspondentes são muito menores que o tamanho de uma partícula como o próton e os fenômenos de difração e interferência não podem ser observados. 109 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria Figura 5.11: Identicação da fenda pela qual passou o elétron. 5.5 Aplicações do Princípio de Incerteza Vejamos alguns casos simples onde podemos utilizar o princípio de incerteza para obter algumas propriedades básicas de sistemas físicos. Tomemos por exemplo um oscilador harmônico onde uma partícula de massa m se move sob a ação de uma força ω = A freqüência de oscilação será p k/m. F = −kx. Planck já havia postulado que a energia do oscilador deve ser um múltiplo de uma quantidade xa, hν : E = nhν = n~ω , n = 0,1,2,.... A energia mínima que o oscilador pode ter é portanto 0. Vejamos entretanto o que diz o princípio de incerteza. A energia total do oscilador é: E = Ec + Ep = p2 1 + kx2 2m 2 A energia total do oscilador é constante e portanto temos que E =< E >. Aplicando o valor médio na expressão acima, temos: < E >= < p2 > 1 + k < x2 > 2m 2 Tanto o valor médio da posição quanto o do momento são nulos para o movimento harmônico, pois a partícula executa um movimento em que a posição e a velocidade assumem valores simétricos em relação ao ponto central de valor zero. Portanto, ∆p2 =< (p − hpi)2 >=< p2 > −2 < p > hpi + hpi2 =< p2 > − hpi2 =< p2 > substituindo esta igualdade na equação para a energia do oscilador, temos: ∆p2 1 + k∆x2 2m 2 incerteza, temos ∆p ≥ ~/2∆x. E= utilizando agora o princípio de acima temos: 110 Substituindo na equação 5.5 Aplicações do Princípio de Incerteza ~2 1 + k∆x2 2 8m∆x 2 Nota-se que nesta expressão E cresce quando ∆x atinge valores muito pequenos (devido à contribuição do primeiro termo e cresce também quando ∆x atinge valores muito grandes, devido ao segundo termo da expressão. Portanto deve haver um valor de ∆x para o qual a E≥ energia é mínima. Este valor pode ser obtido derivando-se a expressão acima e igualando-a 2 a zero. Fazendo a substituição z = ∆x , temos: dE d = dz dz  1 ~2 + kz 8mz 2  =− ~2 1 + k=0 2 8mz 2 Portanto: z2 = ~2 ~2 = 4mk 4m2 ω 2 Substituindo o valor de z na expressão para E, temos: Emin = ~ω ~ω 1 + = ~w 4 4 2 Portanto a expressão correta para a energia do oscilador deve ser: 1 E = (n + )~ω 2 Esta é a expressão correta para e energia do oscilador harmônico de acordo com a 1 mecânica quântica. A quantidade ~ω é chamada energia de ponto zero do oscilador. O 2 oscilador não pode ter energia mínima zero, pois se tivesse, a posição e o momento do oscilador seriam conhecidos com precisão simultaneamente, contrariando o princípio de incerteza. Num átomo, podemos considerar que a incerteza na posição do elétron é da ordem de grandeza do raio atômico (sabemos que o elétrom está em algum lugar no volume atômico). A energia do elétron a uma distância r do núcleo é dada por: E= k = 1/4πo . Utilizando o princípio ∆x = r, p2 ≥ ~2 /r2 e portanto: onde e com p2 e2 −k 2m r E≥ de incerteza e novamente como ∆p2 =< p2 >, ~2 e2 − k 2mr2 r A energia mínima pode ser obtida derivando-se a expressão acima com respeito a r e igualando o resultado a zero: dE ~2 e2 =− 3 +k 2 =0 dr mr r 111 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria de onde se obtém: r= ~2 = ao = 0.52A kme2 portanto reproduzindo corretamente o raio de Bohr. Substituindo este valor na expressão para a energia, temos: Emin = − k 2 e4 m = −13.6eV 2~2 novamente o valor correto da energia total do elétron na primeira órbita de Bohr. Note que embora os resultados estejam corretos, o conceito de órbita bem denida perde sentido. O elétron está localizado em qualquer ponto dentro de um volume de raio igual ao raio de Bohr, mas sua posição correta não pode ser conhecida. Um terceiro caso interessante corresponde ao movimento de uma partícula livre. Su- ponha que no instante t =0 determinamos a posição de uma partícula com uma incerteza ∆xo . Com isso, a incerteza no momento da partícula após esta medida será ∆p = m∆v ≥ ~ ∆xo Num instante posterior t, a posição da partícula não poderá ser conhecida com precisão melhor que: ∆x = ∆xo + ∆vt ≥ ∆xo + ~ t m∆xo portanto, quanto mais precisa for a determinação da posição da partícula em t=0, menos precisa será o conhecimento da posição em tempos futuros! 5.6 Exercícios 1.- Calcule o comprimento de onda de de Broglie para: a) elétron com energia cinética de 50eV. b) elétron relativístico com energia total de 20 MeV. c) nêutron em equilíbrio térmico com o meio a T = 500K (nêutron térmico) d) partícula alfa com energia cinética de 60 −6 MeV e) Grão de poeira de 1 · 10 g em equilíbrio térmico à temperatura ambiente (300K). f ) bolinha de 1g com velocidade 1mm/s. Para cada uma dessas situações, diga com que sistemas as partículas devem interagir para mostrar seu caráter ondulatório. 2.- Um microscópio eletrônico usa ondas de de Broglie para "ver" objetos muito pequenos (dimensões da ordem de ângstrons). Qual a diferença de potencial acelerador que deve ser utilizada para acelerar elétrons, à partir do repouso, de modo a obter um comprimento de onda de 0,5A? 3.- Um próton tem seu movimento connado em uma caixa unidimensional de largura 0,2 · 10−9 m (0,2 nm). a) Encontre a energia mais baixa possível para o próton. b) qual a energia mais baixa para um elétron na mesma caixa? c) como você explica a diferença entre os resultados encontrados em a) e b)? 112 5.6 Exercícios 4.- Calcule o comprimento de onda de um elétron com energia cinética de 13,6 eV. Qual a razão entre este comprimento de onda e o raio da primeira órbita de Bohr para o átomo de hidrogênio? 5.- O elétron de um átomo de hidrogênio move-se do estado fundamental (n=1) para o −8 estado n=2 e aí permanece por 10 s antes de decair de volta para o estado fundamental. Calcule a largura natural do estado n=2 (ou seja a incerteza na energia desse estado). Compare seu resultado com o valor da energia desse estado, calculada com o modelo de Bohr (-3,39 eV). 6.-Mostre que o comprimento de onda de de Broglie de uma partícula de carga e, massa de repouso mo , acelerada a partir do repouso e adquirindo velocidades relativísiticas é dada como uma função do potencial acelerador V como: h λ= √ 2mo eV  eV 1+ 2mo c2 −1/2 7.- A distância entre planos no cristal de cloreto de potássio é de 3,1 A. Compare o ângulo de reexão de Bragg de primeira ordem, por esses planos, de elétrons com energia cinética de 40 keV com o de fótons com energia 40 keV. 8.- A vida média de um estado excitado em um núcleo é normalmente de cerca de 10−12 s. Qual a incerteza na energia do fóton emitido na de-excitação desse estado? 9.- Um garoto, do alto de uma escada de altura H está jogando bolas de gude de massa m em uma fenda existente no solo. Para atingi-la ele utiliza um equipamento que tem a maior precisão possível. a) Mostre que todas as bolas de gude vão deixar de atingir a fenda 1/2 por uma distância em média da ordem de (2~/m) (2H/g)1/4 onde g é a aceleração da gravidade. b) Usando valores rezoáveis para H e m, calcule esta distância. 10.- Determine o comprimento de onda de de Broglie para uma partícula de massa m e energia cinética T. Faça o calculo para a) uma partícula não relativística e b) para uma partícula relativística. a) √ h/ 2mEc b) p hc/ Ec2 + 2Ec mc2 11.- O Acelerador Linear de Stanford pode acelerar elétrons até uma energia de 50 GeV. Qual o comprimento de onda de de Broglie para esses elétrons? A que fração do diâmetro −15 do próton (d ∼ 2 · 10 m) isso corresponde? 12.- Em um experimento de espalhamento de elétrons, um máximo de reexão é enφ=32◦ para um cristal com distância interatômica de 0.23 nm. Qual o contrado para espaçamento entre os planos cristalinos responsável pelo espalhamento? Supondo que essa seja a difração em primeira ordem, qual o comprimento de onda, momentum, energia cinética e energia total dos elétrons incidentes? d = 0,063 nm; λ = 0,122 nm; p = 10,2 keV/c; E = 511 keV; Ec = 102eV 13.- Um feixe de nêutrons térmicos (EC = 0.025 eV) é espalhado por um cristal com espaçamento entre planos atômicos de 0.45 nm. Qual o ângulo para o pico de Bragg de primeira ordem? 14.- Qual a razão ∆v/v , onde ∆v é a incerteza na velocidade a) de um elétron e b) um próton connado em uma caixa unidimensional de largura 2 nm? 113 5 Propriedades Ondulatórias da Matéria ∆L∆θ ≥ ~ onde θ 2 é a posição angular e L o momento angular da partícula. Para que incerteza no momento 15.- Mostre que o princípio de incerteza pode ser expresso na forma angular a posição da partícula será totalmente indeterminada? ~/4π 16.- Qual a largura de banda ∆ω de um amplicador para radar, que amplica um pulso de largura 2 µs? 2,5x105 rd/s 17.- Encontre a incerteza mínima na velocidade de uma bactéria de massa supondo que conhecemos sua posição com incerteza de 1 3 × 10−15 kg, µm, ou seja, seu próprio tamanho. 18.- Um átomo em um estado excitado de 4,7 eV emite um fóton e termina no estado −13 fundamental. A vida média do estado excitado é de 10 s. a) Qual é a largura espectral da linha correspondente (em unidades do comprimento de onda)? −3 a) 3,3x10 eV b) 0,18 nm 19.- Calcule o comprimento de onda de de Broglie de uma partícula α emitida por um 241 núcleo de Am. Poderia essa partícula existir dentro do núcleo de amerício (diâmetro −14 ≈ 1,6 × 10 m)? 114 6 A Equação de Schroedinger 6.1 A Equação de Ondas Quântica Em 1920, Erwin Schroedinger, um físico austríaco, transferiu-se de Stuttgart para a Universidade de Zurich, ocupando a posição que pertencera a Von Laue e onde permaneceu até o nal de 1926. De acordo com um depoimento de um antecessor seu em Zurich, Peter Debye, no nal de 1925, encontrando-se os dois em um colóquio, conversaram a respeito da teoria de de Broglie. Ambos argumentaram que não a haviam compreendido bem. Debye então convidou Schroedinger para que apresentasse um seminário sobre o assunto, o que foi realmente realizado alguns meses depois. Poucos meses após este seminário Schroedinger publicou os trabalhos com sua formulação da mecânica quântica, que é a utilizada até hoje. Um pouco antes, Heisenberg havia proposto uma mecânica matricial, que incluía as conseqüências do princípio de incerteza. Posteriormente cou provado que a formulação matricial de Heisenberg era totalmente equivalente à mecânica ondulatória de Schroedinger. A equação de onda de Schroedinger, por ser uma equação básica da mecânica, não pode ser deduzida, assim como não se deduz a segunda lei de Newton. Podemos no entanto buscar alguns argumentos de plausibilidade para a equação. Vejamos por exemplo a equação de ondas usual, no caso de ondas eletromagnéticas. Escrita em termos do campo elétrico, esta equação, para uma onda se propagando no vácuo é dada por: ∂2ε 1 ∂2ε = ∂x2 c2 ∂t2 tomando como solução uma onda harmônica ε = εo cos(kx−ωt) e substituindo esta solução na equação de ondas, temos: k2 = usando agora as relações de Einstein ω = E/~ ω2 c2 e k = p/~ na expressão acima, temos: E 2 = p2 c2 ou E = pc que é a relação entre energia e momento para o fóton! No caso do movimento de partículas podemos procurar por exemplo uma equação de ondas que seja equivalente à relação energia - momento para uma partícula de massa m : No caso não relativístico temos: p2 E= +V 2m 115 6 A Equação de Schroedinger Usando agora as relações de de Broglie, E = ~ω e p = ~k e substituindo-as na expressão acima, obtém-se: ~ω = ~2 k 2 +V 2m Note-se que nesta equação, k aparece ao quadrado, como na equação de ondas tradicional, sugerindo um termo proporcional à derivada segunda da função de onda em relação a x. Já o termo em ω , diferentemente do caso das ondas eletromagnética, aparece com potência um, o que corresponderia a uma derivada primeira em relação ao tempo. Além disso, há no caso de partículas, um outro termo, correspondente à energia potencial V, onde não há nem k nem ω não havendo portanto nenhuma derivada envolvida. A equação que corresponde à expressão acima e que é consistente com as idéias anteriores de de Broglie, Bohr, Einstein, etc. foi obtida por Schroedinger como: − ~2 ∂ 2 Ψ(x,t) ∂Ψ(x,t) + V (x)Ψ(x,t) = i~ 2 2m ∂x ∂t Podemos tentar vericar essa equação num caso simples, como por exemplo o de uma p = ~k e energia E = ~ω . Facilmente vericamos que funções como A sin(kx − ωt) ou A cos(kx − ωt) não são soluções da equação de Schroedinger. Entretanto, a função complexa A exp[i(kx − ωt)] é solução. partícula livre, onde V=0, com momento − − ∂Aei(kx−ωt) ~2 ∂ 2 Aei(kx−ωt) = i~ 2m ∂x2 ∂t ~2 k 2 i(kx−ωt) Ae = i~(iω)Aei(kx−ωt) 2m e portanto, ~2 k 2 = ~ω 2m A equação pode também facilmente vericada para o caso de um potencial V constante. Nos casos em que o potencial depende de x, como o do oscilador harmônico, a solução pode ser muito mais complicada. Vimos no caso da partícula livre que a função de onda obtida como solução da equação de Schroedinger é complexa. Portanto, não pode ser uma quantidade mensurável, como a amplitude de oscilação de uma corda ou do campo elétrico, como nas ondas tradicionais. A interpretação do signicado físico da função de onda solução da equação de Schroedinger foi enunciada ainda em 1926 por Max Born. De acordo com Born, os acontecimentos (eventos) previstos pela mecânica quântica são de natureza probabilística. Um processo mecânico é acompanhado por um processo ondulatório, a onda sendo dada pela solução da equação de Schroedinger. (O curso dos eventos é determinado pelas leis das probabilidades; para um estado no espaço, corresponde uma probabilidade denida, que é dada pela onda de de Broglie associada ao estado. Um processo mecânico é portanto acompanhado por um 116 6.2 Operadores Quânticos processo ondulatório, a onda guia, descrita pela equação de Schroedinger, o signicado da qual é que a mesma dá a probabilidade de um dado curso do processo mecânico. Se por exemplo a amplitude da onda guia for nula em um certo ponto do espaço, isso signica que a probabilidade de se encontrar o elétron neste ponto é desprezível). O signicado da função de onda é que o seu módulo quadrado é proporcional à probabilidade de se encontrar a partícula em uma dada posição entre x e x+dx no instante t. Mais especicamente, num dado instante de tempo t, a probabilidade de se encontrar a partícula entre x e x+dx é dada por: P (x)dx = |Ψ(x,t)|2 dx = Ψ∗ (x,t)Ψ(x,t)dx onde Ψ∗ (x,t) Ψ(x,t), operação que corresponde a trocar o para Ψ(x,t). O produto de qualquer número é o complexo conjugado de número imaginário i por -i na expressão complexo por seu conjugado é sempre um número real. ∗ Portanto, se Ψ Ψ corresponde a uma densidade de probabilidade, esse produto deve obedecer à condição de normalização: Z +∞ Ψ∗ (x,t)Ψ(x,t)dx = 1 −∞ 6.2 Operadores Quânticos De modo análogo ao que vimos com as distribuições de probabilidades clássicas no início deste curso, podemos utilizar a distribuição de probabilidades dada pela função de onda quântica para obter valores médios de quantidades físicas. Por exemplo, o valor médio da posição de uma partícula cujo movimento é descrito pela função de onda Z +∞ < x >= Z +∞ ∗ xP (x)dx = −∞ Ψ∗ Ψ será: +∞ xΨ Ψdx = −∞ note que como em geral o produto Z Ψ(x,t) Ψ∗ xΨdx −∞ depende do tempo, também teremos < x(t) >. Para qualquer função de x, temos também: Z +∞ Ψ∗ f (x)Ψdx < f (x) >= −∞ O valor médio de uma grandeza em mecânica quântica é normalmente chamado valor esperado, pois é o valor que se espera obter (com maior probabilidade) numa medida daquela grandeza. Para outras grandezas, a situação é análoga, embora apareçam certas diculdades, devido ao princípio de incerteza. Para o valor médio do momento, temos por exemplo: Z +∞ < p >= Ψ∗ pΨdx −∞ 117 6 A Equação de Schroedinger Para poder calcular a integral acima, devemos obter uma expressão para o momento em termos da variável de integração, x. Entretanto, sabemos não ser possível relacionar diretamente p com x como uma função p(x), pois, pelo princípio de incerteza, não há como determinar precisamente (e simultaneamente) as duas quantidades. Para vermos como podemos obter o valor médio acima, tomemos por exemplo a onda plana que obtivemos no caso da partícula livre: Ψ(x,t) = Aei(kx−ωt) onde sabemos que o momento é constante (< p >= p = ~k ). Tomando a derivada primeira em relação a x da função acima, temos: ∂Ψ p = ikAei(kx−ωt) = ikΨ = i Ψ ∂x ~ ou −i~ A quantidade ∂Ψ = pΨ ∂x −i~∂/dx é chamada um operador diferencial. Este operador em particular tem a propriedade de quando aplicado a uma função de onda, ter o mesmo efeito de se multiplicar a mesma função de onda pelo momento linear p. Note que este operador é uma função da variável x, sendo portanto a relação que procurávamos. O operador acima é o operador momento linear e o valor esperado do momento é então calculado como: Z +∞ Ψ∗ − i~ < p >= −∞ ∂ Ψdx ∂x Esta relação, embora tenha sido aqui demonstrada apenas no caso de uma partícula livre, é no entanto válida em qualquer situação. De maneira análoga, podemos também notar que i~∂/∂t é o operador para a energia total, uma vez que i~ ∂ (Ae−i(kx−ωt) ) = −i2 ~ωAe−i(kx−ωt) = EAe−i(kx−ωt) ∂t Outros operadores quânticos serão vistos no decorrer do curso. Com as denições acima, podemos ver a razão da ordem de por exemplo utilizamos na graa da expressão para os valores médios. Ψ∗ pΨ que Embora no caso do operador posição esta ordem não seja relevante, dado o caráter diferencial de grande parte dos operadores quânticos, eles correspondem a operações não comutativas e facilmente podemos ver por exemplo que Ψ∗ (−i~ ∂ ∂ )Ψ 6= −i~ (Ψ∗ Ψ) ∂x ∂x No caso da onda plana que vimos acima, temos resultados triviais na aplicação, tanto do operador momento linear pb = −i~∂/∂x quanto do operador de energia total b = i~∂/∂t. E Isso devido ao fato de as ondas planas corresponderem à situação de uma partícula com 118 6.2 Operadores Quânticos momento e energia bem denidos, de modo que < p >= p < E >= E. e Tomemos agora um caso mais interessante e realista, como o de uma partícula livre dentro de uma caixa. No caso unidimensional, a partícula está connada a se mover entre duas paredes rígidas localizadas em x = −a/2 e x = +a/2. Como veremos mais tarde, a função de onda para a situação de menor energia desta partícula é dada por: Ψ(x,t) = A cos πx −i E t a a e ~ para − < x < a 2 2 e zero fora desse intervalo. A constante de normalização é dada por: +∞ Z ∗ Ψ Ψdx = A 2 Z −∞ ou A= p 2/a. +a/2 πx a cos dx = A2 a π 2 −a/2 +π/2 Z cos2 θdθ = A2 −π/2 a 2 Para o valor médio da posição da partícula, devemos esperar um valor nulo, pois classicamente a partícula tem igual probabilidade de estar à esquerda ou à direita da origem das ordenadas: Z +∞ < x >= ∗ Ψ xΨdx = A −∞ 2 Z +a/2 πx dx = 0 a x cos2 −a/2 uma vez que o integrando é uma função ímpar de x, e a integral é sobre um intervalo simétrico em relação à origem. Situação análoga ocorre com o momento linear: < p >= A 2 Z +a/2 −a/2 ∂ πx π πx (−i~ ) cos dx = A2 i~ cos a ∂x a a Z +a/2 cos −a/2 πx πx sin dx = 0 a a Entretanto, podemos vericar que o módulo do momento linear não é nulo. Podemos facilmente obter o operador para o quadrado do momento linear: ∂2 pb2 = pbpb = −~2 2 ∂x e portanto, 2 Z +∞ < p >= −∞  2 ∂2 2 π Ψdx = −~ Ψ −~ A2 ∂x2 a ∗ 2 Portanto a energia cinética média é Z +a/2 −a/2 cos2  π 2 πx dx = ~2 a a Ec = ~2 π 2 /2ma2 . 6.2.1 Álgebra de Operadores Em geral, os operadores da mecânica quântica obedecem a uma álgebra não comutativa. Por exemplo, xˆpˆΦ 6= pˆxˆΦ: xˆpˆΦ = x(−i~ d dΦ )Φ = −i~x e dx dx 119 6 A Equação de Schroedinger d dΦ )xΦ = −i~Φ − i~x = −i~Φ + xˆpˆΦ dx dx portanto, (ˆ pxˆ − xˆpˆ)Φ = −i~Φ, ou (ˆ pxˆ − xˆpˆ) = −i~. A relação (ˆ pxˆ − xˆpˆ) é chamada comutador de p ˆ e xˆ ou relação de comutação entre pˆ e xˆ e é representada pelo simbolo [ˆ p,ˆ x] = pˆxˆ − xˆpˆ. Se para dois operadores a ˆ e ˆb, [ˆ a,ˆb] = 0, ou seja os dois operadores pˆxˆΦ = (−i~ comutam, então os valores das grandezas associadas a esses operadores podem ser medidas simultaneamentes com exatidão. Por exemplo, ˆ =0 [ˆ p,E] e portanto o momento linear e a energia total de uma partícula podem ser determinadas simultaneamente. Já a posição e o momento linear não podem ser obtidos simultaneamente, pois seus operadores não comutam. 6.3 Equação de Schroedinger Independente do Tempo A maior parte dos casos que estudaremos com a utilização da equação de Schroedinger correspondem à situação de ondas estacionárias. São casos como esse o átomo de hidrogênio, o oscilador harmônico, partícula em uma caixa, como visto acima, e etc. De um modo geral, nesses casos, e em todos os casos em que o potencial V não depende explicitamente do tempo, pode-se utilizar a chamada técnica de separação de variáveis na solução da equação de Schroedinger. Fatorando-se a solução da equação num produto de dois termos, em que um contém a dependência em x e o outro a em t, temos: Ψ(x,t) = Φ(x)ϕ(t) Substituindo esta expansão na equação de Schroedinger, temos:   ∂ϕ(t) ~2 ∂ 2 Φ(x) + Φ(x)ϕ(t)V (x) = i~Φ(x) ϕ(t) − 2 2m ∂x ∂t Φ(x)ϕ(t), temos:   1 ∂ϕ(t) 1 ~2 ∂ 2 Φ(x) + V (x) = i~ − 2 Φ(x) 2m ∂x ϕ(t) ∂t dividindo a equação pelo produto Notamos que o primeiro membro, que depende somente de x, deve ser sempre igual ao segundo membro, que depende somente de t. A única situação em que isso pode ocorrer é se ambos os membros forem iguais a uma constante S, chamada constante de separação. Para o segundo membro temos portanto: i~ ∂ϕ(t) = Sϕ(t) ∂t cuja solução é facilmente encontrada: S ϕ(t) = Ae−i ~ t 120 6.4 Aspectos Qualitativos das Soluções da Equação de Schroedinger Comparando o ϕ(t) encontrado acima com a parte temporal da função de onda que obti- vemos nos casos anteriores, vemos que a constante S é identicada como a energia total E da partícula. Portanto, para o outro membro da equação, correspondente à parte espacial, temos: ~2 d2 Φ − + V (x)Φ(x) = EΦ(x) 2m dx2 Esta é a chamada equação de Schroedinger independente do tempo. Note que não há necessidade do uso de derivadas parciais, uma vez que a equação só contém a dependência espacial da função. Uma série de condições podem ser imposta às soluções da equação de Schroedinger para que tenham sentido físico. Essas condições estão ligadas à interpretação estatística da função de onda. Assim, ao resolvermos o problema do oscilador harmônico ou do átomo de hidrogênio, não podemos aceitar uma solução da equação de Schroedinger em que Ψ(x) seja ∞ quando x → ∞ pois sabemos que a partícula tem seu movimento limitado a uma região nita do espaço. Do mesmo modo, devemos impor condições de continuidade e unicidade da função de onda, caso contrário não teríamos como obter a probabilidade de encontrar a partícula nos pontos de descontinuidade ou onde a função tivesse multiplos valores. Outra razão se relaciona ao fato de que se a função for descontínua, sua derivada será innita nos pontos de descontinuidade, fazendo com que o momento linear neste ponto seja intito. Condições semelhantes devem ainda ser impostas à derivada da função de onda. Lembrando que a derivada segunda se relaciona com a energia cinética, descontinuidades na derivada primeira corresponderiam a pontos com energia cinética innita. Resumindose, as condições a serem impostas às funções de onda, soluções da equação de Schroedinger, são: ˆ Φ(x) e dΦ/dx devem ser nitas ˆ Φ(x) e dΦ/dx devem ser unívocas ˆ Φ(x) e dΦ/dx devem ser contínuas Além disso, limx→±∞ Φ(x) = 0 pois a probabilidade de se encontrar a partícula no innito deve ser nula. 6.4 Aspectos Qualitativos das Soluções da Equação de Schroedinger Uma análise qualitativa da equação de Schroedinger permite obter as características gerais das funções de onda que são soluções para um dado problema. Escrevendo-se a equação de Schroedinger independente do tempo como: d2 Ψ 2m = 2 [V (x) − E] Ψ 2 dx ~ 121 6 A Equação de Schroedinger vemos que a concavidade da função de onda, dada pelo sinal de sua derivada segunda, é proporcional ao produto da própria função de onda por em que V (x) > E , [V (x) − E]. Portanto, nas regiões a derivada segunda tem o mesmo sinal da função de onda e então a concavidade é voltada para cima (côncava) se se a função de onda é negativa. Ψ é positiva e voltada para baixo (convexa) Nas regiões em que V (x) < E a situação é a oposta. tomemos por exemplo, o caso de uma partícula sob a ação do potencial visto na gura 6.1a, quando a energia total é E, como mostrado na gura. Temos então o eixo x dividido 0 00 0 00 em três regiões, delimitadas por x e x . Na região x < x < x , se Ψ > 0 teremos a função 0 00 de onda com concavidade para baixo e vice versa. Nas regiões x < x e x > x o oposto, conforme mostrado esquematicamente na gura 6.1b. Tendo ainda em consideração as condições sobre o comportamento da função de onda para x → ±∞, possiveis soluções para este problema são mostradas na gura 6.1c. Figura 6.1: Aspectos qualitativos das soluções da eq. de Schroedinger: a) Potencial e energia total. b) Concavidade da função de onda nas 3 regiões. c) Possíveis soluções. Da gura 6.1, correspondente à situação E>V, pode-se notar que quanto maior for o número de oscilações da função de onda, maior deve ser sua derivada segunda e portanto maior a energia correspondente. O Estado fundamental (de menor energia) corresponde sempre à função que não muda de sinal, sendo portanto a de menor derivada segunda. 122 7 Aplicações da Equação de Schroedinger 7.1 Partícula Livre A equação de Schroedinger para uma partícula livre é obtida fazendo-se V (x) = 0 para todo o espaço: 2mE d2 −~2 d2 2 2 Ψ(x) = EΨ(x) ou Ψ(x) = −k Ψ(x), k = 2m dx2 dx2 ~2 Soluções para esta equação são bem conhecidas: Ψ(x) = cos kx, sin kx, ou e±ikx A solução geral corresponde a uma combinação linear de duas soluções, por exemplo: Ψ(x) = Aeikx + Be−ikx A solução da equação de Schroedinger dependente do tempo será portanto: Ψ(x,t) = Aei(kx−ωt) + Be−i(kx+ωt) ei(kx−ωt) O termo sentido oposto. descreve uma onda viajando no sentido de x positivo e Ondas desse tipo são chamadas ondas planas. e−i(kx+ωt) no Portanto uma partícula livre com momento linear positivo será representada pela função acima fazendo-se B=0. O valor esperado para a medida do momento dessa partícula é dado por: Z +∞ < p >= −∞ ∗ Ψ pbΨdx = Z +∞ ∗ −i(kx−ωt) Ae −∞ ∂ (−i~ )Aei(kx−ωt) dx = ~k ∂x Z +∞ Ψ∗ Ψdx = ~k −∞ pois sendo a função de onda normalizada, a última integral acima deve ser igual a 1. Portanto: √ < p >= ~k = ~ 2mE √ = 2mE ~ como esperado. Fazendo-se cálculo análogo para a função correspondente à partícula caminhando no sentido de x negativos (A=0), obtém-se √ < p >= − 2mE . Com relação ao 123 7 Aplicações da Equação de Schroedinger valor esperado para a posição da partícula, note que |Ψ|2 = Ψ∗ Ψ = A∗ A = cte.. Por- tanto a probabilidade de encontrar a partícula em qualquer intervalo x, x+dx é a mesma, conforme previsto pelo princípio de incerteza. A normalização da função de onda de uma R +∞ ∗ partícula livre traz alguma diculdade formal, uma vez que Ψ Ψdx = ∞. Do ponto −∞ de vista operacional, isso pode ser contornado, pois todo cálculo pode sempre ser realizado com a normalização explícita, fazendo-se uma razão de integrais, onde a constante de normalização A é cancelada. No caso do momento linear que vimos acima, teríamos, por exemplo: R ∗ R ∗ Ψ pbΨdx Ψ Ψdx < p >= R ∗ = ~k R ∗ = ~k Ψ Ψdx Ψ Ψdx Partícula livre no espaço todo é uma situação idealizada que nunca ocorre. Um próton acelerado pelo Pelletron, por exemplo, corresponde a uma partícula livre desde a saída do acelerador, até o coletor de feixe (copo de Faraday) na câmara, no nal da canalização em alto vácuo, ou seja, uma distância da ordem de 30 m. Para distâncias dessa ordem, a incerteza no momento do próton devido às limitações do princípio de incerteza é desprezível e a função de onda da partícula pode ser aproximada por uma onda plana. Uma partícula livre para qual a incerteza na posição não é muito grande pode ser descrita por um pacote de ondas (superposição de muitas ondas planas). Entretanto, as diculdades matemáticas para se tratar funções desse tipo são muito grandes e além disso, como já vimos, à medida que o tempo passa, aumenta a incerteza na posição da partícula devido à incerteza em sua velocidade e o pacote continuamente se alarga. 7.2 Potencial Degrau Vejamos agora outra situação bastante simples, como a de uma bola de bilhar em uma mesa. Em toda a extensão da mesa, a bola está sujeita a um potencial constante (nulo), mas na borda ela encontra repentinamente um potencial maior. Imaginando que a bola consiga subir a barreira (uma rampa, como na gura 7.1b), ela precisa ter uma energia cinética maior que mgh, onde m é a massa da bola e h a altura da rampa, para passar a se mover no nível mais alto. Esquematicamente, isso pode ser representado pelo potencial degrau (imaginando que o nível mais alto continue indenidamente): Vamos chamar de I a região onde o potencial é nulo (x<0 na mesa) e de II a região em que o potencial é maior (x>0 sobre a rampa). 7.2.1 Caso E < V0: x<0: − ~2 d2 Φ d2 Φ 2mE = EΦ ou = −k12 Φ; k12 = 2 2 2m dx dx ~2 ~2 d2 Φ d2 Φ 2m(V0 − E) + V0 Φ = EΦ ou 2 = k22 Φ; k22 = x>0: − 2 2m dx dx ~2 124 7.2 Potencial Degrau Figura 7.1: Potencial degrau e o equivalente físico gravitacional (rampa) solução: x < 0 : Φ1 (x) = Aeik1 x + Be−ik1 x x > 0 : Φ2 (x) = Ce−k2 x + Dek2 x Impondo agora as condições para que a solução da equação de Schroedinger tenha signicado físico: Φ(x), dΦ devem ser f initas dx dΦ Φ(x), dx devem ser continuas Φ(x), dΦ devem ser un´ivocas dx com isso devemos impor D=0 para que a função seja bem comportada no innito. Para a continuidade da função devemos impor, em x=0: Φ1 (0) = Φ2 (0) ⇒ A + B = C dΦ1 dx dΦ2 dx |x=0 = Aik1 eik1 x − Bik1 e−ik1 x |x=0 = ik1 (A − B) |x=0 = −Ck2 e−k2 x |x=0 = −Ck2  (+) : C(1 + i A+B =C A − B = iC kk12 k2 C k2 ) = 2A ⇒ A = (1 + i ) k1 2 k1 125 7 Aplicações da Equação de Schroedinger k2 C k2 ) = 2B ⇒ B = (1 − i ) k1 2 k1 i ( h C (1 + i kk12 )eik1 x + (1 − i kk21 )e−ik1 x x ≤ 0 2 Φ(x) = Ce−k2 x x ≥ 0 (−) : C(1 − i Na região x<0, a solução da equação de Schroedinger dependente do tempo pode ser escrita como: Ψ(x,t) = Φ(x)e−iωt = Aei(k1 x−ωt) + Be−i(k1 x+ωt) onde o primeiro termo corresponde à onda incidente (caminhando da esquerda para a direita) e o segundo à onda reetida (direita para a esquerda). No caso de partículas livres como este, a interpretação do módulo quadrado da função de onda é mais claramente associado a um feixe paralelo e de densidade uniforme de partículas de mesma energia. Ψ∗ Ψdx corresponde neste caso ao número de partículas (ou à fração das partículas) entre x e x+dx. O uxo de partículas na direção da onda, ou seja o número de partículas Ψ∗ Ψ pela que atravessa uma certa posição por unidade de tempo é dado pelo produto de velocidade das partículas. O Coeciente de reexão é portanto dado por: R= uma vez que vr = vi . B∗B vr Ψ∗r Ψr = vi Ψ∗i Ψi A∗ A encontra-se R=1, em pleno acordo com a previsão da mecânica clássica. Ψ∗ Ψ = C ∗ Ce−2k2 x . C, k1 e k2 , Para x > 0, Substituindo-se os valores de A e B em termos de Nesta região, temos E < V e portanto a energia cinética seria ne- gativa. Classicamente esta é uma região proibida para as partículas. Do ponto de vista quântico, pode-se encontrar a partícula nesta região, sendo cada vez menos provável encontrar a partícula quanto maior o valor de x. A penetração da partícula na região proibida (por intervalos de tempo muito pequenos) é possível devido o princípio de incerteza. Durante um pequeno intervalo de tempo, a energia pode não se conservar. A profundidade da penetração também é muito pequena e pode ser caracterizada pela distância em que a probabilidade cai para cerca da metade de seu valor em x=0, correspondendo a uma penetração da ordem de p 1/k2 = ~/ 2m(Vo − E). É fácil vericar que a solução geral (incluindo a parte temporal da função de onda), corresponde a uma onda estacionária. Para isso, vamos escrever a solução para x ≤ 0 em k ik x termos de senos e cossenos, substituindo e 1 = cos k1 x+i sin k1 x e chamando α = (1+i 2 ): k1 Φ(x) = C [α(cos k1 x + i sin k1 x) + α∗ (cos k1 x − i sin k1 x)] = 2 = C cos k1 x − C k2 sin k1 x k1 A função de onda completa é obtida multiplicando-se a função acima pela parte temporal −iωt e , com ω = E/~: 126 7.2 Potencial Degrau Figura 7.2:   k2 Ψ(x,t) = C cos k1 x − sin k1 x e−iωt k1 Note que temos o produto de uma função que depende somente do tempo por outra que depende somente da posição, correspondendo portanto a uma onda estacionária. A 2 densidade de probabilidade de encontrar a partícula no espaço (|Ψ(x,t)| ) não depende do tempo:  k2 |Ψ(x,t)| = |Φ(x)| = C C cos k1 x − sin k1 x k1 2 2 ∗ O gráco da densidade de probabilidade, incluindo a região 2 x>0 é visto na gura 7.2. 7.2.2 Caso E > V0 x < 0 : Φ1 (x) = Aeik1 x + Be−ik1 x k12 = x > 0 : Φ2 (x) = Ceik2 x + De−ik2 x k22 = 2mE ~2 2m(E − V0 ) ~2 Considerando a situação inicial de uma partícula (ou feixe de partículas) vindo da esquerda (−∞) para a direita, temos condições de continuidade D = 0, pois não há partículas vindo de Φ e sua derivada em x =0, temos: de +∞. Aplicando as 127 7 Aplicações da Equação de Schroedinger Φ1 (0) = Φ2 (0) ⇒ A + B = C dΦ1 k2 2 | = dΦ | ⇒ (A − B) = C k1 dx x=0 dx x=0 (+) : A = C k2 C k2 (1 + ) (−) B = (1 − ) 2 k1 2 k1 As funções de onda são: C (1 + kk21 )eik1 x 2 ik2 x  Ψ(x) = Fazendo + C2 (1 − para x > 0 Ce C = F k12k+k1 2 onde k2 −ik1 x )e k1 para x < 0 F é uma constante arbitrária e incluindo a parte temporal da função de onda, temos:  Ψ(x,t) = 2 −i(k1 x+ωt) F ei(k1 x−ωt) + F kk11 −k e para x < 0 +k2 2k1 i(k2 x−ωt) para x > 0 F k1 +k2 e O primeiro termo da função para x<0 corresponde portanto à onda (uxo) incidente e o segundo à onda reetida, este sem equivalente clássico. O coeciente de reexão é dado por: R= vB ∗ B (k1 − k2 )2 = vA∗ A (k1 + k2 )2 Para x>0 só há, obviamente a onda transmitida, pois não há nada que possa reetir as partículas transmitidas. O coeciente de transmissão é denido como: v2 C ∗ C v2 T = = v 1 A∗ A v1 sendo v1 2 2k1 k1 + k2 v2 a das partículas  a velocidade das partículas incidentes e v1 = ~k1 p2 ~k2 p1 = ; v2 = = m m m m T = k2 (2k1 )2 4k1 k2 = k1 (k1 + k2 )2 (k1 + k2 )2 transmitidas: portanto Note que: T +R= 4k1 k2 (k1 − k2 )2 + =1 (k1 + k2 )2 (k1 + k2 )2 Os coecientes de reexão e transmissão podem ainda ser escritos em termos de  1− R=1−T = 1+ 128 q 1− Vo E 2  para E > 1 Vo 1 − VEo q E e Vo : 7.3 Barreira de Potencial e R = 1 − T = 1 para E ≤1 Vo Note também que a reexão ocorre da mesma maneira quando a partícula vem de uma região com potencial constante e cai numa região de potencial menor (ou nulo). O fenômeno de reexão descrito acima é devido basicamente à passagem abrupta da partícula de um potencial para outro. Este tipo de reexão já era conhecido na óptica, quando a luz passa, perpendicularmente entre dois meios com diferentes índices de refração. 7.3 Barreira de Potencial Este é um dos problemas simples para o qual podemos resolver analiticamente e cuja solução traz em evidência fenomenos muito interessantes, com aplicações em muitos problemas físicos, como o tunelamento quântico, também conhecido como penetração de barreira. Consideremos uma partícula, vindo de x = −∞ em direção à barreira de potencial vista na gura 7.3, denida por:  V (x) = Vo para 0 < x < a 0 para x f ora deste intervalo Figura 7.3: Barreira de potencial de altura Vo 7.3.1 Caso E > Vo Consideremos agora o caso de uma barreira de potencial, ou seja a partícula se move sob ação de um potencial nulo, exceto numa pequena região, entre x=0 e x=a, onde o potencial é constante e igual a Vo . Denindo como I, II e III as regiões x < 0, 0 ≤ x ≤ a e x > a, 129 7 Aplicações da Equação de Schroedinger respectivamente, as soluções da equação de Schroedinger independente do tempo nessas regiões são:   Φ1 (x) = Aeik1 x + Be−ik1 x (x < 0) Φ3 (x) = Ceik1 x + De−ik1 x (x > a)  Φ2 (x) = F eik2 x + Ge−ik2 x (0 < x < a) Não há ondas vindo de  +∞ → 0 e portanto D = 0 A + B = F + G (Φ1 (0) = Φ2 (0)) (a) 1 2 k1 (A − B) = k2 (F − G) ( dΦ | = dΦ |) dx 0 dx o  F eik2 a + Ge−ik2 a = Ceik1 a (b) k2 (F eik2 a − Ge−ik2 a ) = k1 Ceik1 a de( a): 2A = F (1 + k2 k2 ) + G(1 − ) k1 k1 2B = F (1 − k2 k2 ) + G(1 + ) k1 k1 de (b): 2F eik2 a = Ceik1 a (1 + k1 k1 ) ou 2F = Cei(k1 −k2 )a (1 + ) k2 k2 2Ge−ik2 a = Ceik1 a (1 − 2A = k1 k1 ) 2G = Cei(k1 +k2 )a (1 − ) k2 k2 C i(k1 −k2 )a k1 k2 C k1 k2 e (1 + )(1 + ) + ei(k1 +k2 )a (1 − )(1 − ) 2 k2 k1 2 k2 k1 =  C ei(k1 −k2 )a (k1 + k2 )2 − ei(k1 +k2 )a (k1 − k2 )2 = 2k1 k2 =  Ceik1 a −ik2 a e (k1 + k2 )2 − eik2 a (k1 − k2 )2 2k1 k2  (k1 + k2 )2 − e2ik2 a (k1 − k2 )2 A eik1 a e−ik2 a = (k1 + k2 )2 − e2ik2 a (k1 − k2 )2 = C 4k1 k2 4k1 k2 e−ik1 a e−ik2 a  Coeciente de Transmissão (velocidades são as mesmas antes e depois da barreira): ∗C T = CA∗ A A∗ A [(k1 + k2 )2 − (k1 − k2 )2 e2ik2 a ][(k1 + k2 )2 − (k1 − k2 )2 e−2ik2 a ] = = C ∗C 16k12 k22 130 7.3 Barreira de Potencial = (k1 + k2 )4 − (k1 + k2 )2 (k1 − k2 )2 (e2ik2 a + e−2ik2 a ) + (k1 − k2 )4 = 16k12 k22 = fazendo (k1 + k2 )4 + 4(k12 − k22 )2 sin2 k2 a − 2(k12 − k22 )2 + (k1 − k2 )4 = 16k12 k22 ks = k1 + k2 e kd = k1 − k2 , temos: A∗ A ks4 − 2ks2 kd2 + kd4 + 4(k12 − k22 )2 sin2 k2 a (ks2 − kd2 )2 + 4(k12 − k22 )2 sin2 k2 a = = = C ∗C 16k12 k22 16k12 k22 = 16k12 k22 + 4( 2mE − 2mE + ~2 ~2 2 2 16k1 k2 =1+ o 2 ( 2mV ) sin2 k2 a ~2 2m(E−Vo ) 4 2mE ~2 ~2 2mVo 2 ) ~2 =1+ sin2 k2 a = sin2 k2 a 4 VEo ( VEo − 1) Portanto, " #−1 sin2 k2 a C ∗C T = ∗ = 1+ E E AA 4 Vo ( Vo − 1) 7.3.2 Caso E < Vo Neste caso, classicamente toda partícula será reetida ao bater na barreira. As funções de onda para as regiões I e III são idênticas às do caso anterior, sendo que na região II a solução da equação de Schroedinger será: Ψ2 (x) = F ek2 x + Ge−k2 x , k2 = p 2m(Vo − E)/~ Novamente, como não há inicialmente onda vindo de +∞, temos D=0. O procedimento algébrico para a obtenção dos coecientes das funções de onda é análogo ao do caso anterior, trocando-se ik2 do primeiro caso por k2 . O coeciente de transmissão será dado por: #−1 " #−1 " C ∗ Cv3 sinh2 k2 a (ek2 a − e−k2 a )2 = 1+ E T = ∗ = 1+ A Av1 16 VEo (1 − VEo ) 4 Vo (1 − VEo ) se k2 a>>1, a expressão acima pode ser aproximada por: E E (1 − )e−2k2 a Vo Vo ∗ probabilidade Ψ Ψ T ' 16 A gura 7.4 mostra a densidade de para as três regiões. Na região I, a superposição da onda incidente com a reetida, de mesmo comprimento de onda, resulta num padrão de onda estacionária. Na região II temos uma exponencial decrescente 131 7 Aplicações da Equação de Schroedinger e nalmente a onda transmitida, sendo uma onda plana, corresponderá a uma densidade de probabilidade constante nesta região. Este resultado mostra que uma pequena parcela das partículas incidentes, consegue atravessar a barreira. Novamente isso é uma consequência do princípio de incerteza, que permite que a conservação de energia seja violada por um intervalo de tempo muito pequeno, enquanto a partícula atravessa a barreira. Figura 7.4: Densidade de probabilidade - barreira de potencial, E a/2 Na região dentro do poço, a solução geral da eq. de Schroedinger independente do tempo é a mesma que a encontrada anteriormente em situações análogas: √ Ψ(x) = A sin kx + B cos kx onde k = Para as regiões 2mE ~ x > a/2 e x < −a/2 onde o potencial é innito, a função de onda deve ser identicamente nula. Aplicando a condição de continuidade da função de onda nos pontos ±a/2, temos: + B cos ka = 0 (em x = a2 ) A sin ka 2 2 A sin − ka + B cos − ka = 0 (em x = − a2 ) 2 2 Somando e subtraindo as duas equações acima, obtemos as relações: 2B cos ka =0 2 ka 2A sin 2 = 0 É fácil notar que não há nenhum valor de k que satisfaça simultaneamente as duas condições acima. No entanto, podemos escolher uma das constantes A ou B iguais a zero, e impor, no termo com a constante não nula, a condição de que o seno ou cosseno se anule: A = 0 e cos ka =0 ⇒ 2 ka B = 0 e sin 2 = 0 ⇒ ka 2 ka 2 = n π2 , n = 1,3,5... = nπ, n = 1,2,3,.. Portanto temos: Como para ambos kn = n πa , n = 1,3,5,... com Ψn (x) = Bn cos kn x kn = n πa , n = 2,4,6,... com Ψn (x) = An sin kn x √ os casos temos a relação k = 2mE/~, temos para as energias possíveis da partícula na caixa: 134 a seguinte expressão 7.4 Partícula em Uma Caixa (Poço Quadrado) En = k 2 ~2 π 2 ~2 n 2 , n = 1,2,3,... = 2m 2ma2 7.4.2 Poço Finito Uma situação mais realista corresponde ao poço de potencial de altura nita  V (x) = Vo : Vo para x ≤ −a/2 ou x ≥ a/2 0 para − a/2 < x < a/2 Elétrons no metal estão em uma condição semelhante a essa. As partículas no núcleo atômico também podem, em primeira aproximação ser descritas por um conjunto de partí- Vo . Vamos considerar aqui somente o caso de partículas dentro do poço, ou seja para E < Vo (partículas ligadas). Vamos também numerar as regiões x ≤ a/2, −a/2 < x < a/2 e x ≥ a/2 como I, II e III. A solução da culas num poço de potencial quadrado de altura equação se Schroedinger na região II é a mesma do caso anterior: √ Ψ2 (x) = C sin k2 x + D cos k2 x com k2 = 2mE ~ Nas regiões I e III, temos para a equação de Schroedinger: − ~2 d2 Ψ(x) = −(Vo − E)Ψ(x) 2m dx2 ou d2 Ψ 2m(Vo − E) = Ψ = k2Ψ 2 dx ~2 onde k1 = k3 = p 2m(Vo − E)/~. A solução geral dessa equação corresponde a exponenci- ais reais: Ψ(x) = A0 ekx + B 0 e−kx de modo que nas três regiões, as soluções são:  ao I  Ψ1 (x) = Ae−kx + Bekx regi˜ Ψ2 (x) = C sin k2 x + D cos k2 x regi˜ ao II  −kx kx Ψ3 (x) = Ee + F e regi˜ ao III Agora, aplicando as condições sobre o comportamento da função de onda para x → ±∞, devemos impor A=F=0. Para encontrar os valores das quatro constantes restantes, devemo então impor as condições de continuidade da função de onda e sua derivada, nos pontos x = ±a/2: Continuidade de Ψ em x = ±a/2: 135 7 Aplicações da Equação de Schroedinger Figura 7.6: Soluções para o poço quadrado nito: n=1, 2, 3  Be−k1 a/2 = −C sin k22a + D cos k22a (I) Ee−k1 a/2 = C sin k22a + D cos k22a Continuidade das derivadas em  x = ±a/2: Bk1 e−k1 a/2 = k2 C cos k22a + k2 D sin k22a (II) −k1 Ee−k1 a/2 = k2 C cos k22a − k2 D sin k22a Somando e subtraindo as relações de (I): (B + E)e−k1 a/2 = 2D cos k22a (1) (B − E)e−k1 a/2 = −2C sin k22a (2) Somando e subtraindo as relações de (II): (B − E)k1 e−k1 a/2 = 2k2 C cos k22a (3) (B + E)k1 e−k1 a/2 = 2k2 D sin k22a (4) Relações entre k1 e k2 podem ser obtidas dividindo-se as equações acima (4 ÷ 1 e 3 ÷ 2). Entretanto, para fazer isso, devemos garantir que o denominador não seja nulo. No primeiro caso, impondo B + E 6= 0 e D 6= 0, temos: k2 tan 136 k2 a = k1 (i) 2 7.5 O Oscilador Harmônico no outro caso, se B − E 6= 0 e C 6= 0, k2 cot temos: k2 a = −k1 (ii) 2 As duas condições não podem ser satisfeitas simultaneamente. Isso pode ser vericado somando-se as duas expressões acima, que resulta em: k2 a k2 a + cot )=0 2 2 tan k2 a/2, temos a relação tan2 k2 a/2 = −1, k2 (tan Multiplicando a relação acima por o que é impossível, visto que o argumento da tangente é real. Portanto devemos impor B-E=C=0 e obter a primeira das relações acima, ou impor B+E=D=0 e obter a segunda das relações mostradas acima. No primeiro caso, substituindo as relações entre os coecientes nas expressões (I) e (II), obtemos para as funções de onda:   D cos k22a ek1 a/2 ek1 x para x < − a2 D cos k2 x para − a2 < x < a2 Ψp (x) =  D cos k22a ek1 a/2 e−k1 x para x > a2 k1 e k2 na relação (i), temos: ! r r 2 2 p mEa mEa tan = m(Vo − E)a2 /2~2 2~2 2~2 p a expressão acima por e denindo  = mEa2 /2~2 , 2 r mVo a2 − 2  tan  = 2~2 Substituindo as expressões para multiplicando a temos: Na exressão acima, não há como isolar e obter analiticamente o valor de q p() =  tan  e q() = valores possíveis de  podem denido as funções são acima, os mVo a2 2~2 − 2 . Entretanto, como o segundo membro da expres- ser visualizados gracando-se as duas funções e determinando-se os pontos de intersecção, conrme visto na gura 7.7. As soluções para os três valores mais baixos de E são vistas na gura 7.6 . vericar ainda que para estados com E  Vo , Pode-se os valores de E se aproximam daqueles que encontramos para o poço innito. De maneira análoga procede-se para encontrar as soluções do segundo tipo. Neste caso, a equação a ser resolvida será: − cot  = p mVo a2 /2~2 − 2 7.5 O Oscilador Harmônico O caso mais realista que podemos resolver analiticamente neste curso corresponde ao do oscilador harmônico. O oscilador harmônico tem grande importância na física, pois muitos 137 7 Aplicações da Equação de Schroedinger Figura 7.7: Solução gráca para a equação p() = q() problemas de sistemas ligados em equilíbrio, como moléculas, átomos ou moléculas em uma rede cristalina, e mesmo partículas no núcleo atômico, podem, para pequenos deslocamentos da posição de equilíbrio (pequenas energias de excitação) ser descritos por um potencial do tipo: dV 1 = −Kx V (x) = Kx2 ; F = − 2 dx O potencial mostrado na gura 7.8 é típico da ligação de moléculas di-atômicas, como N2 . O2 ou Classicamente sabemos que uma partícula de massa m sob ação desse potencial, para pequenos deslocamentos em relação á posição de equilíbrio, executa movimento harmônico, descrito pela equação: m K d2 x 2 = −Kx; ω = dt2 m Cuja solução é: x(t) = A cos(ωt + ϕ) A amplitude da vibração é 1 1 1 E = Kx2 + mv 2 = KA2 2 2 2 p xo = 2E/K onde E é a energia total do sistema e pode ter qualquer valor. No caso quântico, temos que resolver a equação: ~2 d2 Φ(x) 1 + Kx2 Φ(x) = EΦ(x) 2m dx2 2   d2 Φ 2mE m2 ω 2 2 K + − x Φ = 0; ω 2 = 2 2 2 dx ~ ~ m − 138 7.5 O Oscilador Harmônico Figura 7.8: Potencial sentido por um átomo, numa molécula di-atômica denindo β = 2mE/~2 mudança de variável: e α = mω/~: u= √ d2 Φ + (β − α2 x2 )Φ = 0 dx2 αx: dΦ dΦ du √ dΦ d2 Φ d = = = α ; 2 dx du dx du dx du  dΦ dx  du d2 Φ =α 2 dx du e portanto a equação de Schroedinger ca: α d2 Φ d2 Φ β 2 + (β − αu + ( − u2 )Φ = 0 )Φ = 0 ou 2 2 du du α Para encontrar a solução desta equação, antes vamos tentar descobrir o comportamento assintótico de Φ para grandes valores de u. Neste caso, podemos escrever a equação acima como: podemos facilmente d2 Φa d2 Φa 2 − u = u 2 Φa Φ = 0 ou a du2 du2 vericar que a solução assintótica Φa (u) é Φa (u) = Ae−u 2 /2 + Beu dada por: 2 /2 139 7 Aplicações da Equação de Schroedinger calculando as derivadas: dΦa 2 2 = −Aue−u /2 + Bueu /2 du e d2 Φa 2 2 2 2 2 2 = Au2 e−u /2 − Ae−u /2 + Bu2 eu /2 + Beu /2 = (u2 − 1)Ae−u /2 + (u2 + 1)Beu /2 2 du o que para grandes valores de u se reduz a: d2 Φa 2 2 = u2 (Ae−u /2 + Beu /2 ) = u2 Φa 2 du Para que esta solução seja uma solução sicamente aceitável para a equação de Schroedinger, ela não pode divergir para u → ±∞ e portanto devemos escolher B = 0. A solução da equação de Schoedinger para qualquer valor de u, pode então ser fatorada como: Φ(u) = Ae−u onde H(u) 2 /2 H(u) deve ser uma função que varie lentamente para u → ±∞, ou seja: cresça mais 2 eu /2 de modo que no produto acima, para grandes valores de u prevaleça lentamente que o comportamento assintótico que foi obtido. Calculemos agora a derivada segunda desta função, para obtermos então a equação para H(u): dΦ dH 2 2 = −Aue−u /2 H(u) + Ae−u /2 du du 2 d2 Φ −u2 /2 2 −u2 /2 −u2 /2 dH −u2 /2 dH −u2 /2 d H = −Ae H(u) + Au e H(u) − Aue = − Aue + Ae du2 du du du2   dH d2 H −u2 /2 2 = Ae −H + u H − 2u + du du2 substituindo na equação de Schoedinger, temos: −u2 /2 Ae  dH d2 H −H + u H − 2u + du du2 2   +  β 2 2 − u Ae−u /2 H = 0 α ou d2 H dH + − 2u 2 du du Como sabemos que a solução H(u)   β −1 H =0 α deve ser uma função bem comportada, ela pode sempre ser escrita na forma de uma série de potências. como: 140 Denindo a expansão de H(u) 7.5 O Oscilador Harmônico H(u) = ∞ X al ul = a0 + a1 u + a2 u2 + ... l=0 as derivadas de H(u) podem então ser escritas como: ∞ dH X = lal ul−1 = a1 + 2a2 u + 3a3 u2 + ... du l=0 ∞ d2 H X = l(l − 1)al ul−2 = 2 · 1a2 + 3 · 2a3 u + 4 · 3a4 u2 + ... 2 du l=0 Substituindo na equação para X H(u), l(l − 1)al ul−2 − 2u temos: X lal ul−1 + ( X β − 1) al ul = 0 α ou ∞ X l(l − 1)al u l−2 + ∞  X β α l=0 l=0  − 2l − 1 al ul = 0 na primeira somatória, os dois primeiros termos são nulos. Podemos redenir os índices trocando l →l+2 de modo que a equação acima ca: ∞ X l (l + 2)(l + 1)al+2 u + ∞  X β l=0 l=0 α  − 2l − 1 al ul = 0 ou ∞  X l=0  β (l + 2)(l + 1)al+2 + ( − 2l − 1)al ul = 0 α para que esta expressão seja nula para qualquer valor de u, devemos impor que os l coecientes de u sejam nulos e então obtemos a seguinte relação entre os al : al+2 = − com esta expressão, dado a1 a0 β α − (2l + 1) al (l + 1)(l + 2) podemos calcular todos os outros coecientes pares. Dado podemos calcular todos os ímpares. A solução H(u) pode então ser dividida em duas séries distintas: Hp (u) = a0 (1 + a2 2 a4 4 u + u + ...) a0 a0 Hi (u) = a1 u(1 + a3 2 a5 4 u + u + ...) a1 a1 e 141 7 Aplicações da Equação de Schroedinger Com H(u) = Hp (u) + Hi (u). Resta então vericar se o comportamento da série obtida, para grandes valores de u, respeita as condições necessárias. comportamento das razões al+2 /al Para isso, veriquemos o para grandes valores de l: β − (2l + 1) al+2 2 = lim α = l→∞ al l→∞ (l + 1)(l + 2) l lim esta razão de coecientes, para grandes valores de l, é idêntica à mesma razão na expansão u2 em série de potências da função e : 2 eu = 1 + u2 + u4 u6 ul+2 ul + + ... + l + l+2 + ... 2! 3! ( 2 )! ( 2 )! portanto, a razão entre dois coecientes consecutivos, al+2 ( l )! ( l )! al+2 = l 2 = l 2 l = al ( 2 + 1)! ( 2 + 1)( 2 )! l 2 e al é: 1 +1 que para grandes valores de l é idêntica à razão que obtivemos para os coecientes das funções Hp e Hi . Embora para pequenos valores de l os coecientes sejam diferentes, quando queremos comparar o comportamento dessas funções para grandes valores de u, os termos com pequenas potências de u (pequenos valores de l ) não são importantes e u2 portanto, vericamos que para grandes valores de u, H(u) ∼ e . Portanto, lim Ae−u u→∞ 2 /2 H(u) = Ae−u 2 /2 2 2 (a0 eu + a1 ueu ) = a0 Aeu 2 /2 + a1 Aueu 2 /2 e portanto será divergente, contrário à condição imposta inicialmente para H. A menos que para um dado valor de l, por exemplo l=n, o coeciente al+2 para uma das séries se anule e portanto todos os outros com l maior. Supondo que esta condição se dê para um l par, Hp (u) a1 = 0 a outra série Hi (u) será nula, e o Φ(u) será obedecido. De modo análogo, se al+2 se anular zermos a0 = 0. Para que um dado coeciente al+2 se anule será agora um polinômio e se zermos comportamento assintótico para para um valor ímpar de l e para l=n, devemos impor a condição: substituindo as β − (2n + 1) = 0 ou β = (2n + 1)α α expressões para α e β na exressão acima, obtém-se: mω 2mE = (2n + 1) ~2 ~ ou 1 En = (n + )~ω, n = 0,1,2,3,... 2 que corresponde à quantização da energia para o oscilador harmônico. ondas correspondentes são: 142 As funções de 7.5 O Oscilador Harmônico Figura 7.9: Funções de Onda do Oscilador Harmônico n=0: n=1: n=2: n=3: n=4: n=5: 2 Φn (u) = A0 e−u /2 2 Φ1 (u) = A1 2ue−u /2 2 Φ2 (u) = A2 (4u2 − 2)e−u /2 2 Φ3 (u) = A3 (8u3 − 12u)e−u /2 2 Φ4 (u) = A4 (16u4 − 48u2 + 12)e−u /2 2 Φ5 (u) = A5 (32u5 − 160u3 + 120u)e−u /2 Note que para n par, a função Φ(u) é uma função par e para n ímpar, Φ(u) é uma função ímpar. As funções H(u) , mostradas entre parênteses nas expressões acima, são conhecidas como polinômios de Hermite. Os polômios de Hermite podem ser otidos da relação: Hn (u) = (−1)n eu 2 dn −u2 e dun Os coecientes de normalização das funções de onda são dados por:  mω 1/4 r 1 An = π~ 2n n! 7.5.1 Espectro Vibração-Rotação Molecular Uma molécula diatômica, como a de HBr pode vibrar e também girar em torno de um eixo perpendicular ao denido pelos centros dos átomos da molécula. As energias de rotação de uma molécula diatômica são dadas por: 143 7 Aplicações da Equação de Schroedinger Figura 7.10: Possíveis transições em moléculas diatômicas Ej = J2 j(j + 1)~2 = 2I 2I Onde j é o número quântico associado ao momento angular de rotação J e I o momento de inércia. Note que um rotor, ao passar de um estado com número quântico j, para outro hν = Ej − Ej−1 = 2j~2 /2I . A diferença de energia com j-1, emite um fóton com energia de fótons emitidos de estados com j consecutivos é portanto constante. No caso de HBr, 1 1 as energias de vibração são dadas por (n + )~ω = (n + )0,316 eV. As transições de um 2 2 estado a outro são governadas por uma regra de seleção (ligada à conservação de momento angular, mas que não discutiremos aqui), dada por ∇j = ±1. Nas vibrações de uma molécula di-atômica, o momento angular é sempre nulo. Portanto transições de um estado n para n-1 ou qualquer outro estado de energia mais baixa são proibidas, pois correspondem a ∇j = 0. Com isso as possíveis transições, envolvendo o estado fundamental (energia de ponto zero) e as rotações à partir desse estado, o primeiro estado vibracional (n=1) e as rotações desse estados são vistas na gura 7.10: O espectro da radiação (infra-vermelho) emitido por uma molécula diatômica é portanto como mostrado na gura 7.11. 144 7.5 O Oscilador Harmônico Figura 7.11: Espectro vibração-rotação molecular 7.5.2 Operadores de Criação e Aniquilação de Fonons Na física de sólidos, o termo fonon é usado para denominar o quantum de energia vibracional. Assim como hν é a energia do fóton, o quantum de energia eletromagnética, a ~ω . Denimos os operadores b aeb a+ chamados operadores energia do fonon de vibração é de destruição (aniquilação) e criação de fonons como: r b a= + b a = i mω (b x+ pb) 2~ mω r mω i (b x− pb) 2~ mω é fácil vericar as relações: b aΦn = onde Φn √ nΦn−1 ; b a+ Φn = √ n + 1Φn+1 são as funções de onda do oscilador harmônico. Por exemplo: r b aΦ1 = mω i (b x+ pb)Φ1 = 2~ mω r √ α 1 d 2 (x + )A1 2 αxe−αx /2 = 2 α dx √ √ 1 2 2 2 = A1 α 2(x2 + − x2 )e−αx /2 = A1 2e−αx /2 = A0 e−αx /2 α + b a Φ0 = r mω i (b x− pb)Φ0 = 2~ mω r α 1 d 2 (x − )A0 e−αx /2 = 2 α dx 145 7 Aplicações da Equação de Schroedinger r = √ 2 √ α 2 2 2 A0 (x + x)e−αx /2 = A0 √ αxe−αx /2 = A1 2 αxe−αx /2 2 2 outra relação importante, envolvendo esses operadores: √ b a+b aΦ n = b a+ nΦn−1 = nΦn Esse operador ˆ =b N a+b a , é chamado número de fonons, pois aplicado à função de onda de um dado estado do oscilador, obtem-se o número de fonons desse estado. A equação de Schoedinger para o oscilador harmônico pode ser escrita como: ~2 d2 1 + Kx2 )Φn = En Φn 2m dx2 2 b = Tb + Vb = (− ~2 d22 + 1 Kx2 ), Hamiltoniano H 2m dx 2 (− Denindo o operador a equação ca: b n = En Φ HΦ em termos dos operadores b a é escrita como (lembrando que b a+ a equação de En = (n + 12 )~ω ): e Schoedinger para o oscilador harmônico 1 1 ˆ Φn = ~ω(b ~ω N a+b a + )Φn = (n + )~ω = En Φn 2 2 A formulação quântica em termos de operadores de criação e aniquilação, também chamada de segunda quantização, é muito utilizada na solução de problemas complexos. 7.6 Caixa Cúbica: Equação de Schroedinger em 3 Dimensões Vimos que a Equação de Schroedinger pode ser escrita na forma: b Tb + Vb Φ = EΦ onde Tˆ é o operador energia cinética, Vˆ o operador energia potencial e Eˆ o operador energia total. Em três dimensões, utilizando-se coordenadas cartesianas, a energia cinética de uma partícula é dada pela expressão: T = 1 2 (p + p2y + p2z ) 2m x e portanto o operador quântico correspondente será: ~2 ∂ 2 ∂2 ∂2 Tb = − ( 2 + 2 + 2) 2m ∂x ∂y ∂z e a equação de Schroedinger em três dimensões será então: 146 7.6 Caixa Cúbica: Equação de Schroedinger em 3 Dimensões − ~2 ∂ 2 ∂2 ∂2 ∂ ( 2 + 2 + 2 )Ψ(x,y,z,t) + V (x,y,z)Ψ(x,y,z,t) = i~ Ψ(x,y,z,t) 2m ∂x ∂y ∂z ∂t Facilmente podemos vericar que também aqui, se V não depende explicitamente de t, podemos separar a solução na forma: Ψ(x,y,z,t) = Φ(x,y,z)ϕ(t) onde Φ(x,y,z) − é a solução da equação de Schroedinger independente do tempo: ∂2 ∂2 ~2 ∂ 2 ( 2 + 2 + 2 )Φ(x,y,z) + V (x,y,z)Φ(x,y,z) = EΦ(x,y,z) 2m ∂x ∂y ∂z Consideremos agora um caso simples, o de uma partícula dentro de uma caixa cúbica, denida pelo potencial:  0 para 0 < x < L    0 para 0 < y < L V (x,y,z) =  0 para 0 < z < L   ∞ f ora da caixa Aqui também facilmente se verica que como V não depende explicitamente de x,y,z podemos obter a soluções da equação na forma de um produto de funções, cada uma correspondendo a uma dimensão espacial. Uma solução possível para este problema é dado pela função de onda: Φ(x,y,z) = A sin k1 x sin k2 x sin k3 x Substituindo-se esta função na equação de Schroedinger encontra-se para a energia da partícula: E= ~2 2 (k1 + k22 + k32 ) 2m Aplicando-se a condição de continuidade da função de onda nas regiões dentro e fora da caixa, observa-se que as constantes números inteiros. Em termos dos En1 n2 n3 = ki ni , devem obedecer a relação: ki = ni π/L onde ni são a energia da partícula será então: ~2 π 2 2 (n + n22 + n23 ) ni = 1,2,3,... 2mL2 1 A energia da partícula na caixa é quantizada e caracterizada por um conjunto de três números inteiros, correspondentes à condição de continuidade da função de onda nas três direções espaciais. n2 = n3 = 1, O estado fundamental (menor energia) corresponde portanto a n1 = com a energia dada por: E111 3~2 π 2 = 2mL2 147 7 Aplicações da Equação de Schroedinger O primeiro estado excitado será aquele em que 2 dos n têm valor 1 e um deles assume 2 2 2 o valor 2, com a energia tomando o valor 3π ~ /mL . Existem três estados com essa mesma energia, descritos pelas funções de onda Φ2,1,1 , Φ1,2,1 e Φ1,1,2 . Quando há mais de uma função de onda para descrever um mesmo nível de energia, dizemos que esse estado é degenerado. No caso acima temos um estado com degenerescência tripla. A degenerescência reete uma simetria do problema. Considerando por exemplo uma caixa sem simetria cúbica, ou seja com lados desiguais L1 , L2 , L3 , a solução da equação de Schroedinger com aplicação das condições de continuidade da função de onda será: Φn1 n2 n3 (x,y,z) = A sin n1 π n2 π n3 π x sin y sin z L1 L2 L3 e a energia da partícula será dada por: En1 n2 n3 e portanto E112 6= E121 6= E112 , ~2 π 2 = 2m  n22 n23 n21 + + L21 L22 L23  não havendo portanto estados degenerados, ou seja, a quebra da simetria do problema removeu a degenerescência. 7.7 Exercícios 1.- Uma partícula está sujeita ao potencial de um oscilador harmônico, cuja função de onda é dada por: Ψ(x) = Ae−mωx 2 /2~ (a) Seria a quantidade de movimento uma constante neste estado? Se sua resposta for positiva, determine o valor da quantidade de movimento. Se for negativa, determine o valor médio da quantidade de movimento. O que seria obtido em medidas da quantidade de movimento da partícula neste estado? (b) É a energia mecânica conservada neste estado? Se sua resposta for positiva, determine o valor da energia. Se for negativa, determine o valor médio da energia. Que você obteria numa medida da energia da partícula neste estado? 2 c) Calcule < x > e < x > para essa partícula. d) Calcule a incerteza na medida da posição da partícula, denida como o desvio padrão. e) Repita o cálculo de c) e d) para o momento da partícula e verique se o princípio de incerteza é obedecido neste caso. 2) A função de onda para uma partícula connada numa caixa de largura a é dada por:  e−iEt/~ − a/2 < x < a/2 A sin 2πx a 0 x < −a/2 ou x > a/2 a) Verique que esta função é uma solução da equação de Schroedinger. b) Determine o valor da energia total E neste estado. 148 7.7 Exercícios 3.- Repita o cálculo do potencial degrau realizado em classe, para a condição E>Vo, considerando agora a função:  V (x) = Vo para x < 0 0 para x ≥ 0 Calcule os coecientes de transmissão e reexão e compare-os com os obtidos em classe. 4.- Mostre que o problema de uma partícula passando por um poço de potencial (V para x < 0, V = −Vo 0 ≤ x ≤ a e V = 0 para x > a), altura Vo nas mesmas condições. para barreira de potencial de com E>0 =0 é equivalente ao da 5.- Uma reação de fusão importante na produção de energia solar envolve a captura de um próton por um núcleo de carbono, que tem carga seis vezes maior que a do próton e −15 um raio r ∼ 2 · 10 m. a) Faça uma estimativa do potencial coulombiano V que atua sobre o próton se ele estiver na superfície do núcleo. b) O próton incide sobre o núcleo devido seu movimento térmico. Podemos realisticamente supor que sua energia total não 7 seja muito maior que 10kT, onde T ∼ 10 K é a temperatura no interior do sol. Calcule sua energia total nessas condições e compare com a altura da barreira calculada no ítem anterior. c) Calcule a probabilidade de que o próton possa penetrar em uma barreira retangular equivalente, de altura V e se estendendo de r a 2r, o ponto em que a barreira cai para V/2. 6.- Um átomo do gás nobre kripton exerce um potencial atrativo sobre um elétron não ligado que varia muito bruscamente. Devido a isto, é uma aproximação razoavel descrever −10 o potencial como um poço quadrado atrativo de raio igual a 4 · 10 m, o raio do átomo. As experiências mostram que um elétron com energia cinética de 0,7 eV nas regiões fora do átomo pode atravessá-lo sem sofrer praticamente reexão nenhuma. O fenomeno é chamado efeito Ramsauer. Use essa informação para determinar a profundidade (Vo ) do poço quadrado. 7.- Uma partícula connada numa caixa de paredes impenetráveis e largura L está num estado cuja função de onda Ψ(x,t) é dada pela combinação linear: Ψ(x,t) = c1 Ψ1 (x,t) + c2 Ψ2 (x,t) Ψ1 e Ψ2 são as auto-funções de energia normalizadas para o estado fundamental (energia E1 ) e para o primeiro estado excitado (energia E2 ) respectivamente e c1 e c2 são onde constantes. (a) Mostre que esta função de onda pode representar um estado quântico porque obedece a equação de Schrödinger dependente do tempo. (b) Encontre o valor dessas constantes que normalizam a função de onda (c) Seria a função de onda Ψ(x,t) um auto-estado de energia? Ψ(x,t). Se sua resposta for positiva, determine o valor da energia; se for negativa, determine a energia média deste estado em função das auto-energias E1 e E2 . Em qualquer caso justique sua resposta. Ψ∗ Ψ. O termo dependente do tempo repre- (d) Determine a densidade de probabilidade senta uma oscilação. Obtenha a freqüência dessa oscilação e tente interpretá-la. 149 7 Aplicações da Equação de Schroedinger 8) Um próton e unm dêuteron (mesma carga do próton, massa duas vezes maior) tentam −14 penetrar em uma barreira de potencial de altura 10 MeV e largura 10 m. As duas partículas têm energia de 3 MeV. a) Use argumentos qualitativos para prever qual das partículas tem maior probabilidade de consegui-lo. b) Calcule quantitativamente a probabilidade de sucesso para cada uma das partículas. 9) Aplique a condição de normalização para mostrar que a constante multiplicativa para a autofunção com n=3 do poço de potencial quadrado innito é B3 = p 2/a. 10) Uma bola de bilhar, de massa m=0.2 kg e energia E é jogada na direção de uma rampa inclinada, de altura H=10 cm. Para E=1.001*mgH, calcule qual a probabilidade da bola não conseguir subir a rampa. 11) Um dos estados excitados do átomo de hidrogênio tem função de onda dada por: Ψ(r,θ,ϕ) = Ar2 e−r/3a sin θ cos θe−iϕ onde A é uma constante e o sistema de coordenadas é o esférico. a) Qual a expressão para o componente na direção z do momento angular nesse sistema? b) Utilizando o resultado do ítem a), qual o componente z do momento angular para o átomo de higrogênio no estado descrito pela função de onda acima? 12) No caso da barreira de potencial com E>Vo, como desenvolvido nas notas de aula: a) Mostre que se B=0, o coeciente de transmissão será igual a 1. b) Mostre que nesse caso, a densidade de probabilidade para se encontrar a partícula na região 0Vo) 14) A constante da força restauradora C para vibrações interatômica em uma molécula 3 2 diatômica típica é de aproximadamente 10 J/m . Use esse valor para fazer uma estimativa da energia de ponto zero das vibrações moleculares. 15) (a) Faça uma estimativa da diferença em energia entre o estado fundamental e o primeiro estado excitado da molécula vibrando considerada no problema anterior. (b) A partir dessa estimativa, determine a energia do fóton emitido por vibrações da distribuição de cargas quando o sistema faz uma transição entre o primeiro estado excitado e o estado fundamental. (c) Determine também a freqüência do fóton e compare com a freqüência de oscilação clássica do sistema. (d) Em que região do espectro está a radiação emitida? 16.- No instante t=0, um sistema é descrito pela seguinte função de onda normalizada: r Ψ(x,0) = onde Φ0 , Φ1 e Φ3 1 Φ0 (x) + 5 r 1 Φ2 (x) + cΦ3 (x) 2 são as autofunções normalizadas do oscilador harmônico. Calcular o valor numérico de c ? Qual o valor esperado da energia se é efetuada a medida dessa no instante t=0? 150 7.7 Exercícios En = (n + 1/2)~ω corresponde à p amplitude de um oscilador clássico An = (2n + 1)~/mω . 18.- Encontre a constante de normalização (A0 ) para o estado fundamental do oscilador 17.- Mostre que um oscilador harmônico com energia harmônico. 19.- Calcule a probabilidade de um oscilador harmônico no estado fundamental ser encontrado fora da região clássica. 20.- Um elétron está contido numa caixa de paredes rígidas de largura 0.1 nm. a) Desenhe os níveis de energia até n=4. b) Encontre os comprimentos de onda de todos os possíveis fótons que poderiam ser emitidos até que o elétron passe do estado n=4 para o n=1. 21.- Um elétron está preso em um poço de potencial innito de 0.3 nm de largura. a) Se o elétron está no estado fundamental, qual a probabilidade de encontrá-lo a menos de 0.1 nm do lado esquerdo da parede? Repita os cálculos para um elétron no estado n=99. As respostas são consistentes com o princípio de correspondência? 22.- Se o potencial V é independente do tempo, mostre que o valor esperado de x é independente do tempo. 23.- Determine o valor médio de n=1,5,20 e 100. Ψ2n (x) dentro de um poço de potencial innito para Compare esses resultados com a probabilidade clássica de encontrar a partícula dentro da caixa. 1/L (independente de n, em acordo com a previsão clássica) −15 24.- Considere um poço de potencial nito de largura 3 × 10 m que contém uma 2 partícula de massa m= 2GeV/c . Quão profundo deve ser esse potencial para conter três níveis de energia? (Exceto pelos valores exatos das energias, esta é a situação aproximada de um núcleo de deutério). 25.- Uma possível solução para o oscilador harmônico simples é: Ψn = A(2αx − 1)e−αx 2 /2 onde A é uma constante. Qual o valor da energia En desse estado? 26.- Mostre que a energia de um oscilador harmônico simples no estado n=1 é 3~ω/2 −αx2 /2 substituindo a função de onda Ψ1 = Axe diretamente na equação de Schroedinger. 27.- Uma molécula H2 pode ser aproximada por um oscilador harmônico simples com 3 constante de mola k= 1,1 × 10 N/m. Encontre a) os níveis de energia e b) os possíveis comprimentos de onda de fótons emitidos quando a molécula H2 decai do terceiro estado excitado, terminando no estado fundamental. a) En = (n + 1/2)0.755eV b) 1640 nm; 822 nm; 549 nm 28.- a) Calcule a probabilidade de transmissão de uma partícula α de energia E = 5 MeV através da barreira coulombiana de um núcleo pesado, que pode ser aproximada por −14 uma barreira quadrada de altura V0 = 15MeV e largura L = 1,3 × 10 m. Calcule essa probabilidade b) dobrando a altura da barreira e c) usando a altura original mas dobrando a largura da barreira. Compare os três resultados. 29.- Considere uma partícula de energia E aprisionada num poço de potencial como mostrado na gura abaixo. Desenhe esquematicamente as funções de onda para os três estados de mais baixa energia da partícula. Explique o esquema obtido. 151 7 Aplicações da Equação de Schroedinger 30.- Quando uma partícula de energia E se aproxima de uma barreira de potencial de altura V0 com EV0 , mostre que o coeciente de reexão pode ser aproximado por R = [(V0 sin(kL))/2E]2 . 31.- Para uma região onde o potencial é V=0, a função de onda de uma partícula é dada por p 2/α sin(3πx/α). Calcule a energia da partícula. 32.- Considere um poço semi-innito no qual V=∞ para x < 0, V=0 para 0≤x≤L e V=V0 para x > L. a) Mostre que as funções de onda possíveis são A sin kx dentro do poço p p −k x e Be 2 para x > L, onde 2mE/~2 e k2 = 2m(V0 − E)/~2 . b) Mostre que a aplicação das condições de contorno resultam na relação k2 tg(ka) = −k . 33.- A função de onda para o estado n=2 do oscilador harmônico é A(1 − 2αx2 )e−αx 2 /2 . a) Mostre que o nível de energia correspondente é 5~ω/2, substituindo a função de onda 2 diretamente na equação de Schroedinger. b) Encontre e . < x >= 0; < x2 >= 5/2α 34.- Uma partícula está aprisionada entre x= 0 e L dentro de um poço de potencial innito. Sua função de onda é uma superposição do estado fundamental e primeiro estado excitado. A função de onda é dada por: √ 3 1 Ψ2 (x) Ψ(x) = Ψ1 (x) + 2 2 Mostre que esta função de onda está normalizada. 35.- Considere uma partícula de massa m dentro de uma caixa quadrada bi-dimensional de lado L, alinhada com os eixos x e y. Mostre que as funções de onda e níveis de energia da partícula são dados por: Ψ(x,y) = 152 nx πx ny πy ~π 2 2 (n2 + n2y ) sin sin ; E= L L L 2mL2 x 8 Bibliograa A seguir, referências básicas usadas na preparação dessas notas de aula, mais ou menos na ordem que foram utilizadas no texto. Provavelmente estou me esquecendo de algumas. Muito também foi obtido na internet. Alguns desse sítios estão relacionados nas páginas da disciplina. Outros, podem fácilmente ser encontrados com os motores de busca da rede. ˆ Física Moderna - P.A. Tipler Ed. Guanabara ˆ Física Básica II - H. M. Nussenzveig (Ed. Edgard Blücher, 1990) ˆ Física Quântica - Eisberg e Resnick - Ed. Campus (1979) ˆ Introduction to Modern Physics, F. K. Richmyer (Ed. McGraw-Hill, 1928-1934) ˆ Modern Physics - S.T. Thornton, A. Rex (Ed. Saunders College, 2000) ˆ Modern Physics - Serway, Moses, Moyer (Ed. Saunders College, 1997) ˆ Física - vol. 3 - P.A. Tipler (Ed. LTC, 1999) 153 8 Bibliograa 154 9 Apêndice Constantes Físicas - 1 k = 1,381 · 10−23 J/K NA = 6,023 · 1023 /mol me = 9,109 · 10−31 kg mp = 1,672 · 10−27 kg mn = 1,675 · 10−27 kg h = 6,626 · 10−34 Js ~ = 1,055 · 10−34 Js hc = 12,41 · 10−7 eV m 1/4πo = 8,988 · 109 Jm/C 2 1eV = 1,602 · 10−19 J k = 8,617 · 10−5 eV /K e = 1,602 · 10−19 C me = 0,5110 M eV /c2 mp = 938,3 M eV /c2 mn = 939,6 M eV /c2 h = 4,136 · 10−15 eV s ~ = 0,6583 · 10−15 eV s ~c = 1,975 · 10−7 eV m c = 2,998 · 108 m/s σ = 5,67 · 10−8 W/m2 K 4 155 9 Apêndice Constantes Físicas -2 Velocidade da luz no vácuo Constante de Planck Constante magnética Constante elétrica Constante gravitacional Carga elementar Massa do elétron Comprimento de onda Compton Massa do próton Massa do nêutron Massa do dêuteron Massa da partícula α Constante de Rydberg Raio de Bohr Constante de Avogadro Constante de Boltzmann Constante molar dos gases Constante de Stefan-Boltzmann Raio do Sol Raio da Terra Distância Sol-Terra 156 c = 3,00×108 m/s h = 6,63×10−34 J s = 4,14×10−15 eV s hc = 2,00×10−25 J m = 1,24×10−6 eV m µ0 = 4π×10−7 N/A2 = 12,6×10−7 N/A2 1 0 = = 8,85×10−12 F/m µ0 c 2 1 = 8,99×109 m/F 4π0 G = 6,67×10−11 N m2 /kg2 e = 1,60×10−19 C 1 eV = 1,60×10−19 J me = 9,11×10−31 kg = 511 keV/c2 λC = 2,43×10−12 m mp = 1,673×10−27 kg = 938 MeV/c2 mn = 1,675×10−27 kg = 940 MeV/c2 md = 3,344×10−27 kg = 1.876 MeV/c2 mα = 6,645×10−27 kg = 3.727 MeV/c2 R∞ = 1,10×107 m−1 R∞ hc = 13,6 eV a0 = 5,29×10−11 m NA = 6,02×1023 mol−1 kB = 1,38×10−23 J/K R = 8,31 J mol−1 K−1 σ = 5,67×10−8 W m−2 K−4 = 6,96×108 m = 6,37×106 m = 1,496×1011 m Massa do Sol Massa da Terra = 1,99×1030 kg = 5,98×1024 kg Constantes numéricas π∼ = 3,142 e∼ = 2,718 1/e ∼ = 0,368 ∼ log10 e = 0,434 √ cos(30◦ ) = 3/2 ∼ = 0,866 ◦ sen(30 ) = 1/2 ln 2 ∼ = 0,693 ln 3 ∼ = 1,099 ln 5 ∼ = 1,609 ∼ ln 10 = 2,303 Eletromagnetismo Equações de Maxwell I ∂ E·d~` + ∂t Z ∇×E + B·dS = 0 ∂B =0 ∂t I ∇·B = 0 B·dS = 0 I I Z ∇·D = ρ D·dS = Q = ρdV Z Z d ~ H·d` − D·dS = I = J·dS dt ∇×H − ∂D =J ∂t Outras relações D = 0 E + P = E I P·dS = −QP ∇·P = −ρP Z V = − E·d~` E = −∇V B = ∇×A dE = 1 dQ ˆer 4π0 r2 dV = 1 dQ 4π0 r J = σE 1  1 2 (D·E + B·H) = E 2 + B 2 2 2µ ∂2E (ρ = 0, J = 0) ⇒ ∇2 E = µ 2 ∂t 1 Q2 UC = 2C u= B = µ0 (H + M) = µH I M·d~` = IM ∇×M = JM Id~`׈er 4πr2 Z µ0 JdV A= 4π r dH = F = q(E + v×B) ∇·J + dF = Id~`×B ∂ρ =0 ∂t S = E×H 1 UL = LI 2 2 157 9 Apêndice Relatividade 1 γ=p 1 − V 2 /c2 t0 = γ t − V x/c2  E = mc2 = γm0 c2 = m0 c2 + K vx − V 1 − V vx /c2 vy = γ (1 − V vx /c2 ) vz = γ (1 − V vx /c2 ) = γ (E⊥ + V × B)   V = γ B⊥ − 2 × E c x0 = γ (x − V t) vx0 = y0 = y vy0 z0 = z vz0 E0k = Ek E0⊥ B0k = Bk p E = (pc)2 + (m0 c2 )2 B0⊥ Resultados matemáticos úteis Z ∞ 2n −αx2 x e −∞ 1.3.5...(2n+1)  π  21 dx = (2n+1)2n αn α Z du = ln(1 − 1/u) u(u − 1) Z   √ dz 2 + a2 = ln z + z (a2 + z 2 )1/2 ∞ X q k = 1/(1 − q), (q < 1) k=0 eiθ = cos θ + i sen θ cos θ = eiθ + e−iθ 2 sen θ = eiθ − e−iθ 2i Harmônicos Esféricos r Y0,0 Y2,0 158 r r 1 3 3 = Y1,0 = cos θ Y1,±1 = ∓ sin θe±iφ 4π 4π 8π r r r  5 15 15 = 3 cos2 θ − 1 Y2,±1 = ∓ sin θ cos θe±iφ Y2,±2 = ∓ sin2 θe±2iφ 16π 8π 32π Cálculo Vetorial Coordenadas cartesianas ∂Ax ∂Ay ∂Az + + ∂x ∂y ∂z       ∂Ax ∂Az ∂Ay ∂Ax ∂Az ∂Ay − ˆex + − ˆey + − ˆez ∇×A = ∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y ∂f ∂f ∂f ∂2f ∂2f ∂2f + + ∇f = ˆex + ˆey + ˆez ∇2 f = ∂x ∂y ∂z ∂x2 ∂y 2 ∂z 2 ∇·A = Coordenadas cilíndricas 1 ∂(rAr ) 1 ∂Aϕ ∂Az + + r ∂r r ∂ϕ ∂z       1 ∂Az ∂Aϕ ∂Ar ∂Az 1 ∂(rAϕ ) 1 ∂Ar − ˆer + − ˆeϕ + − ˆez ∇×A = r ∂ϕ ∂z ∂z ∂r r ∂r r ∂ϕ   1 ∂f ∂f 1 ∂ ∂2f ∂f 1 ∂2f ∂f 2 ∇f = ˆer + ˆeϕ + ˆez ∇f= r + 2 2+ 2 ∂r r ∂ϕ ∂z r ∂r ∂r r ∂ϕ ∂z ∇·A = Coordenadas esféricas 1 ∂(r2 Ar ) 1 ∂(sen θAθ ) 1 ∂(Aϕ ) + + 2 r ∂r r sen θ ∂θ r sen θ ∂ϕ   1 ∂(sen θAϕ ) 1 ∂Aθ ∇×A = − ˆer r sin θ ∂θ r sen θ ∂ϕ     1 ∂(rAθ ) 1 ∂Ar 1 ∂Ar 1 ∂(rAϕ ) − ˆeθ + − ˆeϕ + r sen θ ∂ϕ r ∂r r ∂r r ∂θ 1 ∂f 1 ∂f ∂f ˆeθ + ˆeϕ ∇f = ˆer + ∂r r ∂θ r sen θ ∂ϕ     1 ∂ 1 ∂ ∂f 1 ∂2f 2 2 ∂f ∇f= 2 r + 2 sen θ + 2 r ∂r ∂r r sen θ ∂θ ∂θ r sen2 θ ∂ϕ2 ∇·A = Teoremas do Cálculo Vetorial I Z A·dS = I (∇·A) dV A·d~` = Z (∇×A) ·dS 159