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I NOÇÕES E AMBITO DO DIREITO COMERCIAL
CONCEITOS GERAIS
1. CONCEITO ECONÔMICO DE COMÉRCIO.
Nas palavras do professor Alfredo Rocco "o comércio é aquele ramo de
produção econômica que faz aumentar o valor dos produtos pela interposição
entre produtores e consumidores, a fim de facilitar a troca de
mercadorias.". Este conceito econômico não se ajusta perfeitamente ao
conceito jurídico de comércio e, portanto, é inadmissível,
contemporaneamente, entender o direito comercial como o direito do comércio
ou dos comerciantes, apenas.
2. CONCEITO JURIDICO DE COMÉRCIO.
As tentativas de se definir um conceito jurídico de comércio levaram
muitos juristas a identificar três elementos essenciais a esta
conceituação: mediação, fim lucrativo e profissionalidade (habitualidade ou
continuidade).
Entretanto, embora em um primeiro momento a idéia de lucro tenha
empolgado os juristas, atualmente sabemos que das muitas atividades
lucrativas escapam outros elementos deste conceito (ex mineração), e que
muitas atividades econômicas podem não ter fim lucrativos (estatais). Desse
modo, fica evidente que não há uma correspondência direta entre Direito
Comercial e Comércio, nem mesmo em seu sentido jurídico que segundo o
professor Ferrer Correia, citado por Requião, seria o conjunto das
atividades a que se aplica o Direito Comercial, em determinando tempo e
local, ressalvando que muitas das atividades não podem ser definidas como
comerciais.
3. DIREITO ECONOMICO E DIREITO COMERCIAL.
Apesar da posição de alguns juristas de que a expressão Direito
Comercial deveria ser substituída por Direito Econômico, Requião entende
que Direito Comercial e Direito Econômico tem âmbitos distintos e explica:
"O direito comercial tem um âmbito preciso e
definido, que se identifica modernamente como o direito das
empresas mercantis. O direito econômico - disciplinando o
mercado de capitais, a atuação financeira do Estado no
setor privado, os estímulos ao desenvolvimento econômico -
tem, como se vê, princípios próprios e âmbito bem
delineado" (REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial,
vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2006. p. 10).
FORMAÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO COMERCIAL
4. ORIGENS DO DIREITO COMERCIAL.
Embora se tenha registros de regras comerciais nas civilizações
antigas, como demonstra-nos os códigos de Manu (Índia) e Hamurabi
(mesopotâmia), podemos afirmar, com bases nas lições de Requião, que o
florescimento do Direito Comercial deu-se na Idade Média. Nem mesmo os
Romanos, para os quais a atividade comercial era degradante, formularam um
corpo de regras especializadas para regular as atividades mercantis.
5. O DIREITO COMERCIAL COMO DISCIPLINA HISTORICA DOS COMERCIANTES
(Conceito subjetivo).
Na Idade Média as corporações de mercadores começam a enriquecer-se,
organizar-se e a conquistar certos poderes políticos e autonomia em alguns
centros comerciais. O movimento histórico do ressurgimento urbano dar-se-
ia, sobretudo, tendo por base os mercados.
Nesta fase começa a se delinear o Direito Comercial. Os comerciantes,
diante da precariedade do Direito Comum, começam a criar entre si um
direito costumeiro, que era aplicado por cônsules, juízes designados a
dirimirem as disputas entre comerciantes.
Tem-se neste período um Direito Comercial com bases subjetivistas,
pois se centrava na figura do comerciante, que se caracterizou como um
direito corporativista, autônomo e especial, que naquele momento se
restringia aos membros matriculados em determinadas corporações.
Entretanto, uma vez que as atividades comerciais não ficam restritas
aos comerciantes, fazia-se necessário um Direito Comercial conceituado no
próprio comércio e não apenas na figura do comerciante. Iniciam-se, então,
as tentativas de se delinear um conceito objetivo fundados nos atos de
comércio.
6. O DIREITO COMERCIAL COMO DISCIPLINA DOS ATOS DE COMÉRCIO (Conceito
objetivo).
Com a mudança de conceito, o Direito Comercial se estende da figura
do comerciante a todos os atos de comércio, qualquer que fosse seu autor,
ou seja, independente de quem o praticasse.
O código de Savary, em 1673, é exemplo desta nova conceituação.
Em 1807, com o Código Napoleônico, o conceito objetivo é adotado de
maneira explicita, extinguindo-se os privilégios que as corporações
detinham e tendo a disciplina dos atos de comércio como bases do Direito
Comercial, a que estavam sujeitos todos os cidadãos.
Ainda que este novo foco, objetivo, tenha alargado o âmbito de
atuação do Direito Comercial. As frustradas tentativas de se definir um
conceito do que seriam os atos de comércio representava um verdadeiro
percalço à consolidação de tão importante ramo do Direito Privado.
7. O DIREITO COMERCIAL COMO O DIREITO DAS EMPRESAS (Conceito subjetivo
moderno).
Abandonando as tentativas de se definir atos de comércio, os juristas
modernos edificam o conceito de Direito Comercial no conceito de Empresa,
que se difere do conceito limitado expresso no código napoleônico, no qual
empresa era entendida como a repetição, em cadeia, dos atos de comércio.
O Código Comercial Alemão de 1897, ao definir em seu art. 343 que atos
de comércio são todos os atos de um comerciante que sejam relativos à sua
atividade comercial, restabelece e moderniza o antigo conceito
subjetivista, uma vez que a figura do comerciante e dos atos por ele
praticados adquirem importância em virtude do exercício organizado de uma
atividade, que se configura em Empresa. Desse modo, como bem sintetiza o
professor Ferrer Correia, citado por Rubens Requião, o Direito Comercial se
define "... como ordenamento destinado a estabelecer a disciplina jurídico-
privada das empresas" (COREEIA, Ferrer. apud. Rubens Requião. Curso de
Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2006. p. 16).
8. HISTÓRIA DO DIREITO COMERCIAL NO BRASIL.
Brasil-colônia as relações jurídicas pautavam-se pela legislação de
Portugal. Imperavam - as Ordenações Filipinas, sob a influência do
direito canônico e do direito romano.
Vinda da família Real - composição de um Direito de natureza e
finalidades mais econômicas do que propriamente comercial (abertura
dos portos, Real Junta de Comércio, Banco do Brasil, etc.)
Independência - continuam vigente as leis portuguesas e torna-se
possível a aplicação de legislação comercial estrangeira (lei da Boa
Razão)
1850 – Código Comercial Brasileiro (fonte, cod. Francês 1807, Cod.
Espanhol 1829 e Cod. Português 1833)
Regulamento 737, 1850 – cunho processual – enumera quais atos que
identificam a mercancia (teoria objetiva)
1875 – Extinção dos Tribunais de Comércio (Unificação)
República – Revisão da Lei de S.A. e Falências
Anos 60 – atualização dos códigos (idéia do código das obrigações)
AUTONOMIA DO DIREITO COMERCIAL
9. DICOTOMIA DO DIREITO PRIVADO
Desde a Roma antiga o Direito Civil se mostrava formal e pouco
dinâmico, incompatível com a versatilidade do comércio. Dessa maneira, foi
se formulando através das corporações, um direito próprio, compatível com
as necessidades mercantis. Destarte, a dicotomia Direito Comercial x
Direito Civil foi, sobretudo, uma necessidade social, uma decorrência
histórica.
10. A DEFECÇÃO E RETRATAÇÃO DE VIVANTE.
Cesare Vivante, considerado o maior comercialista dos tempos modernos,
foi veementemente contrario a esta divisão do Direito Privado. Alegava ele
que, entre outras coisas, a separação causava gravíssimos danos, como por
exemplo, submeter ao Direito Comercial pessoas não-comerciantes que
realizassem negócios com comerciantes; dizia também que autonomia era
prejudicial ao progresso científico jurídico. Contestou ainda o idéia
cosmopolita a que se pretende o Direito Comercial, o que para ele seria uma
ilusão.
Entretanto, em que pese suas severas críticas, Vivante, após incumbido
de elaborar o anteprojeto do código comercial italiano, reconhece que a
autonomia se justifica "pela diferença de método entre o direito civil e o
direito comercial: neste prevalece o método indutivo; naquele, o dedutivo."
(REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São
Paulo: Saraiva. 2006. p. 20), e se retrata do erro doutrinário cometido.
Obs. Método indutivo - é aquele que parte de questões particulares até
chegar a conclusões generalizadas. Método Dedutivo - parte das conclusões
gerais para explicar o particular.
11. A DICOTOMIA NO DIREITO BRASILEIRO.
No Direito Brasileiro, a luz da codificação, vê-se a tendência
unificadora. Porém, não se pode considerar extinto o Direito Comercial como
disciplina autônoma, cientifica e didática. Como bem lembra-nos o professor
Sylvio Marcondes, "... o direito comercial pode conviver com o direito
civil, em um código unificado,..." (MARCONDES, Sylvio. apud. Rubens
Requião. Curso de Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São Paulo:
Saraiva. 2006. p. 21)
Para o professor Alfredo Rocco, reforçando esta dicotomia, é
irrelevante que a matéria comercial seja tratada em um código único ou em
código autônomo, e afirma:
"Ora, que as normas concernentes ao comércio e
as concernentes à vida civil estejam contidas em um
ou em dois códigos não é coisa que tenha grande
importância sob o ponto de vista científico. O
direito comercial poderia permanecer um direito
autônomo e, portanto, a ciência comercial uma ciência
jurídica autônoma, ainda que as normas do direito
comercial estivessem contidas em um código único,
conjuntamente com as do direito civil das
obrigações". .(ROCCO, Alfredo. apud. Rubens Requião.
Curso de Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São
Paulo: Saraiva. 2006. p. 22).
12. TENTATIVAS DE UNIFICAÇÃO NO BRASIL.
Para Rubens Requião, as tentativas de unificação do Direito
Obrigacional no ordenamento brasileiro serão sempre ilusórias, haja vista
ter-se Falência como um instituto meramente mercantil, pois isso implica
numa classificação do empresário e das sociedades em comerciais e civis.
Assim, prega ele, uma unificação deve se iniciar com a extensão da Falência
aos não-comerciantes, dissipando a necessidade de classificação do
empresário, em comercial e civil.
MATÉRIA COMERCIAL
13. CONTEÚDO DA MATÉRIA COMERCIAL.
A matéria comercial não determina o conteúdo da Lei Comercial, mas o
contrário, a Lei determina o que seja matéria comercial. Assim, o conceito
de matéria comercial não é cientifico, mas empírico. Por exemplo, os
cheques muito embora sejam utilizados nas relações civis entre não-
comerciantes, constituem sempre, por força de lei, matéria comercial. Desse
modo,
"Além dos atos de comércio, considerados como tais os
praticados pelos comerciantes no exercício natural de sua
profissão, acrescidos daqueles que a lei assim considera
independente da pessoa que os pratica, a lei comercial
estabelece várias outras relações que não constituem atos,
como, por exemplo, as obrigações e prerrogativas dos
comerciantes, a forma de constituição e funcionamento das
sociedades comerciais, etc."(REQUIAO, Rubens. Curso de
Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva.
2006. p. 25)
FONTES DO DIREITO COMERCIAL
14. CONCEITO DE FONTES DO DIREITO COMERCIAL.
Fontes do direito comercial devem ser entendidas como o modo pelo
qual surgem as normas jurídicas de natureza comercial.
15. ÊXCLUSAO DO DIREITO CIVIL.
Ainda que pela falta de regra própria no Direito especial, o Direito
Civil seja aplicado nas relações comerciais, não se pode compreender que
seja ele uma fonte do Direito Comercial, uma vez que aquele é aplicado
neste como regra de um direito comum, geral; e não como regra comercial
(art. 121 do Código Comercial de 1850).
16. LEIS COMERCIAIS.
As Leis comerciais são as principais fontes do Direito Comercial.
Código Comercial de 1850 (lei 556, de 25 de junho de 1850)
Regulamento 737, de 1850 – regras de processo
Leis esparsas (Falências, S.A.)
Em que pese o formalismo de algumas leis, como as referentes á
Instituição dos Títulos de Créditos ou das Sociedades por Ações, que
aparentemente seriam antagônicas com o dinamismo do Direito Comercial, tais
solenidades assegura a rapidez de sua circulação (no caso dos títulos) e
protege e garante o interesse coletivo. Muito embora, ainda há em nossa
legislação uma acentuada burocracia que onera custos, cria restrições e
desestimula as atividades comerciais.
17. USOS COMERCIAIS.
Inicialmente um direito consuetudinário, o Direito Comercial mantém o
prestígio dos usos e costumes como fonte subsidiária de suas normas.
Para alguns autores existe certa diferença entre uso e costume, vendo
neste uma regra mais imperativa.
O uso surge espontaneamente e com o decorrer do tempo, passa do
individual para o geral. Caracteriza-se pela prática constante e
reconhecimento voluntário de uma comunidade, neste caso, comerciante.
Assim, exige-se uma prática uniforme, constante e por determinado tempo e,
como não poderia deixar de ser, que não se contraponha à lei.
A existência e vigência do uso devem ser provadas, se necessária, por
quem o invoca.
O ESPIRITO DO DIREITO COMERCIAL
18. AS CARACTERISTICAS DO DIREITO COMERCIAL.
São traços peculiares do Direito Comercial:
1. Cosmopolitismo
2. Individualismo
3. Onerosidade
4. Informalismo
5. Fragmentarismo
6. Solidariedade Presumida
- cosmopolitismo: Característica histórica que decorre da própria natureza
transnacional do comércio. É traço marcante desde o seu surgimento, desde a
criação dos institutos mercantis, do Direito Marítimo. Como afirma muitos
comercialistas, o comércio e a busca de lucro é universal e desconhece
fronteiras.
- individualismo: Emana da busca do lucro, que sempre se vincula ao
interesse individual. Dessa característica que decorre a liberdade do
contrato, ainda que modernamente este sofra restrições Estatais que visam
garantir o interesse coletivo.
- onerosidade: Também decorre da busca do lucro a qual se vincula a
atividade comercial. Assim é natural que as atividades comerciais, sejam,
em regra, onerosas.
- informalismo: está vinculada à técnica comercial, que buscando o
dinamismo, suprimiu, ao máximo, as exigência formais.
- fragmentarismo: O direito comercial é composto por um emaranhado
complexo de normas que muitas vezes deixam lacunas, não configurando,
portanto, um sistema jurídico completo.
- solidariedade presumida: A segurança dos negócios comerciais muito
importa ao Direito Comercial e a solidariedade das obrigações era implícita
no Direito Comercial desde os seus primórdios. No entanto, no direito
brasileiro, o art. 265 do Código Civil veda expressamente a presunção da
solidariedade: "art.265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou
da vontade das partes."
Assim, embora a solidariedade seja propulsora das relações
comerciais, gerando segurança e garantindo o crédito, não pode ser
presumida, no direito brasileiro, devendo ser expressa na lei ou nos
contratos
II DOS ATOS DE COMÉRCIO
19. INTERESSE DO ESTUDO DOS ATOS DE COMÉRCIO.
Embora no Brasil a competência jurisdicional não seja especializada
desde 1875, quando foram extintos os Tribunais de Comércio (decreto
imperial 2.662), o estudo dos atos de comércio ainda apresenta, mesmo que
reduzido, um interesse prático. Pois o reconhecimento do caráter comercial
de alguns atos realizados, definindo tais práticas como uma profissão
mercantil, leva a importantes decisões acerca dos direitos ou deveres que
lhe são devidos.
20. AS IMPRECISÕES DA TEORIA DOS ATOS DE. COMÉRCIO.
Apesar das incansáveis tentativas, os comercialistas não obtiveram
sucesso na conceituação de Atos de comércio.
21. TEORIA DE ALFREDO ROCCO.
Rocco buscou, ao invés de conceituar cientificamente atos de
comércio, indagar o critério fundamental, comum a todos os atos, utilizado
pelos diversos legisladores na seleção das práticas elencadas positivamente
como atos de comércio.
Nos seus estudos, Rocco identificou que o elemento comum presente em
todos os atos é "o conceito da troca indireta ou mediata, da interposição
na efetivação da troca" . (REQUIAO, Rubens. Curso de Direito Comercial,
vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2006. p. 33). Com essa definição,
Rocco afasta a essencialidade do lucro, ressalvando que embora quem, com
seu trabalho e capital, se arrisque a esta interposição, vise um ganho, o
lucro não é uma exigência do Direito Positivo.
Deste conceito, o ilustre professor deduz que os atos se classificam
em comerciais por natureza intrínseca (interposição) e atos comerciais por
conexão (atos de intermediação), e define: "É ato de comércio todo ato que
realiza ou facilita uma interposição na troca".(REQUIAO, Rubens. Curso de
Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2006. p. 34).
22. TEORIA DA MEDIAÇÃO E ESPECULAÇÃO.
Para o professor francês Gastón Lagarde, o intuito do lucro por si só
é insuficiente para a conceituação de atos de comércio, ao passo que a mera
interposição, sem viés lucrativo, também não configura uma prática
comercial, assim sendo, ele apregoa: "Dois elementos - especulação e
circulação - intervêm, portanto, um e outro, na definição do ato de
comércio" (LAGARDE, Gastón. apud. Rubens Requião. Curso de Direito
Comercial, vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2006. p. 34)
23. SISTEMAS LEGISLATIVOS.
Sem uma conceituação cientifica, dois sistemas legislativos se
sobressaíram em relação aos atos de comércio: sistema descritivo e sistema
enumerativo.
No sistema descritivo, a lei conceitua os atos de comércio de forma
generalizada, genérico (ex. Códigos Espanhóis e Português). No sistema
enumerativo, mais em voga, a lei enumera os atos que reputam comerciais.
Para alguns autores, como para Requião e Rocco, a enumeração expressa
na lei tem caráter exemplificativo, de modo que por extensão analógica,
podem ser considerados atos comerciais, atos não relacionados em lei.
Contrapondo-se aos que entendem que a enumeração seria taxativa
(limitativa), ou seja, esgotar-se-ia nos atos submetidos à lista legal.
24. OS ATOS DE COMÉRCIO NO DIREITO COMERCIAL BRASILEIRO.
O Código Comercial de 1850 abandonando a técnica enumerativa em razão
das imprecisões e controvérsias geradas por este sistema e adota um
critério marcadamente subjetivista, centrada na figura do comerciante (art.
4). Entretanto, considerando que o referido código conceitua o comerciante
à aquele que faça da mercancia profissão habitual, houve a necessidade de
esclarecer-se o que deveria ser entendido por mercancia, o que foi feito
através do art. 19 do Regulamento 737, de 1850, não fugindo assim, da
enumeração de atos de comércio (critério objetivo).
Dessa maneira, podemos concluir que o sistema adotado pelo Códgio de
1850 é subjetivo ao se assentar na figura do comerciante, mas uma vez que
este é conceituado em torno da prática de mercancia, descrita
enumerativamente no art. 19 do Regulamento 737, tem se também a adoção de
um critério objetivo.
Art. 19 do Regulamento nº. 737, de 1850:
"Considera-se mercancia:
1° a compra e venda ou troca de efeitos móveis ou semoventes,
para os vender por grosso ou a retalho, na mesma espécie ou
manufaturados, ou para alugar o seu uso;
§ 2° as operações de câmbio, banco e corretagem;
§ 3° as empresas de fábricas, de comissões, de depósito, de
expedição, consignação e transporte de mercadorias, de
espetáculos públicos;
§ 4'° os seguros, fretamentos, riscos, e quaisquer contratos
relativos ao comércio marítimo;
§ 5° a armação e expedição de navios".
25. CLASSIFICAÇÃO DOS ATOS DE COMÉRCIO.
Tem-se por atos de comércio subjetivos (ou relativos) aqueles cuja sua
concepção repousa na figura do comerciante, das atividade e/ou exercícios
relacionados à sua profissão. Ao passo que são classificados como objetivos
(ou absolutos), os atos comerciais definidos por lei (teoria dos atos de
comércio).
Há ainda atos classificados como mistos ou bifrontes.
26. A TEORIA DOS ATOS MISTOS NO DIREITO BRASILEIRO.
Atos mistos são atos bifrontes, que de um lado configuram um ato civil
e, de outro, uma lado comercial (ex. compra e venda entre não-comerciante e
comerciante).
Carvalho de Mendonça combate essa teoria, argumentando que a força
atrativa do Direito Comercial submete estes atos ao seu domínio, e seriam,
portanto, atos comerciais.
27. O BIFRONTISMO DA COMPRA E VENDA.
Para Otávio Mendes na compra e venda o elemento predominante é a
compra. Desse modo, se o comprador é não-comerciante o ato será civil.
Já Carvalho de Mendonça refuta esta idéia afirmando que o ato é único
e obedecendo este princípio da integridade do ato a compra e venda entre
pessoa não-comerciante a comerciante será sempre um ato é de comércio, haja
vista o viés mercantil da intervenção do comerciante.
28. CLASSIFICAÇÃO DOS ATOS DE COMÉRCIO PROPOSTA POR J. X. CARVALHO DE
MENDONÇA.
Com bases no Código Comercial e nas do Regulamento n° 737, de 1850,
Carvalho de Mendonça propõe a classificação dos atos em três categorias:
1. Atos de comércio por natureza ou profissionais – que seriam os atos
que enumerados no art. 19 do Regulamento 737.
2. Atos de comércio por dependência ou conexão – praticados em razão da
profissão do comerciante (promover, facilitar ou realizar o exercício)
3. Atos de comércio por força ou autoridade da lei – comerciais,
independente de quem os praticas, pois assim ordena a lei.
Opondo-se a esta classificação, Otávio Mendes sustenta que na realidade
estas se resumem a duas classes: atos objetivos e atos subjetivos, na qual
estariam as 02 primeiras categorias proposta por Carvalho de Mendonça.
III O EMPRESÁRIO COMERCIAL - PRIMEIRA PARTE
A EMPRESA
NOÇÃO ECONÔMICA E JURÍDICA DE EMPRESA
29. NOÇÃO ECONÓMICA DE EMPRESA.
Segundo Requião, citando o professor Giuseppe Ferri, as empresas são
"organismos econômicos, que se concretizam da organização dos fatores de
produção e que se propõem à satisfação das necessidades alheias,..."
(REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São
Paulo: Saraiva. 2006. p. 40). Para ele, a empresa se realiza em vista de um
intento especulativo de uma pessoa, o empresário (empresa = fruto da idéia
do empresário).
30. NOÇÃO JURÍDICA DE EMPRESA.
O conceito jurídico de empresa se assenta nesse conceito econômico. A
empresa é a expressão da atividade do empresário, cujo interesse jurídico,
de acordo com Giuseppe Ferri, assenta-se em quatro aspectos:
a) expressão da atividade do empresário.
b) idéia criadora
c) complexo de bens
d) relações com os dependentes
Ainda de acordo com Ferri, devemos entender que a "disciplina jurídica
da empresa é a disciplina da atividade do empresário, e a tutela jurídica
da empresa é a tutela jurídica dessa atividade" (REQUIÃO, Rubens. Curso de
Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2006. p. 42)
DESENVOLVIMENTO DO CONCEITO JURÍDICO DE EMPRESA
31. O CONCEITO DE EMPRESA NO DIREITO FRANCÊS.
Geralmente o conceito de empresa era desenvolvido em torno da prática
de atos de comércio em massa, Pois embora o código francês fizesse menção à
empresa, não a definia.
De acordo com Hamel e Lagarde, o direito comercial francês não
poderia, naquele estágio, ser definido como um direito de empresas.
Entretanto, ao destacar as atividades das pessoas no direito comercial em
forma de empresa, coloca esta em primeiro plano. E destacam ainda que as
definições de empresas são baseadas nas idéias de uma organização em vista
de uma produção econômica.
32. O CONCEITO DE EMPRESA NO DIREITO ITALIANO.
Para Vivante, "empresa é um organismo econômico que sob o seu próprio
risco recolhe e põe em atuação sistematicamente os elementos necessários
para obter um produto destinado à troca" (REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito
Comercial, vol. I. 26ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2006. p. 43). Segundo
ele, a combinação de fatores (natureza, capital e trabalho) e o risco são
requisitos indispensáveis a qualquer empresa.
Destacam-se assim, por esta conceituação, dois elementos: organização
e risco.
Ainda que o Código Italiano tenha se fundado sobre a idéia de empresa,
os legisladores não criaram um conceito para ela, cabendo aos juristas as
tentativas de uma definição jurídica de empresa. Para o prof. Salandra,
consistia apenas em uma "organização de pessoas sob a direção do
empresário". Já Giuseppe Valeri, explica-nos que devemos considerar
quatros elementos; a) organização; b) atividade econômica; c) fim
lucrativo; d) profissionalidade. Assim, teríamos, segundo ele, que empresa
consiste em uma organização da atividade econômica destinada à produção de
bens ou serviços, realizada profissionalmente.
Já Asquini, percebendo as dificuldades dos juristas na formulação de
um conceito unitário, propõe que empresa deve ser entendida a partir de
quatro diferentes perfis: a) subjetivo – focado na figura do empresário; b)
funcional – atividade empreendida; c) patrimonial – patrimônio posto em
função do exercício de uma atividade; d) corporativo – empresa como uma
instituição (organização de pessoas - empresários e colaboradores)
Contrapondo-se às formulações de Asquini, Ferrara argumenta que o uso
da palavra empresa com diferentes acepções, não nos permite atribuir outro
sentido jurídico, senão o de uma atividade econômica organizada.
33. O CONCEITO DE EMPRESA NO DIREITO BRASILEIRO.
Tal qual o código France de 1807, Regulamento n°. 737, ao incluir
empresas na enumeração dos atos de comércio, o fez no sentido restrito de
repetição de atos praticados a título profissional. Evidente que este
limitado conceito já não é compatível com a moderna doutrina acerca das
empresas.
Inspirado em Vivante, Carvalho de Mendonça, ressalvando não haver
distinções entre os conceitos econômicos e jurídicos, definiu empresas
como
"a organização técnico-econômica que se propõe a
produzir a combinação dos diversos elementos,
natureza, trabalho e capital, bens ou serviços
destinados à troca (venda), com esperança de
realização de lucros, correndo riscos por conta do
empresário, isto é, daquele que reúne, coordena e
dirige esses elementos sob sua responsabilidade"
(MENDONÇA, J. X. Carvalho de. apud. Rubens Requião.
Curso de Direito Comercial, vol. I. 26ª Edição. São
Paulo: Saraiva. 2006. p. 46)
Enfim, independente da conceituação científica, tem-se no art. 69 da
Lei n° 4.137, de 10 de setembro de 1962, que visa o coibir o abuso do poder
econômico, uma a formulação legal de empresa, posta pelo Direito Positivo,
que considera "empresa toda organização de natureza civil ou mercantil
destinada à exploração por pessoa física ou jurídica de qualquer atividade
com fins lucrativos"
Já o Código Civil de 2002, a exemplo do código italiano, se eximiu do
trabalho de conceituar empresa e a define em torno da figura do empresário
(art. 966 do CC/02)
34. A EMPRESA, UMA ABSTRAÇÃO.
A empresa, como entidade jurídica, é uma abstração. Uma organização
dos fatores de produção posta a funcionar pelo empresário. Caracteriza-se
pelo exercício da organização, é a atividade.
35. A EMPRESA COMO OBJET0 DE DIREITO.
Diferente do Direito francês, não se pode falar no direito pátrio, na
idéia de personificação da empresa, que como já visto, consiste numa
atividade organizada, é portanto, abstrata. Assim é inadmissível compreendê-
la como titular de Direitos, pois sendo uma abstração não pode ser sujeito
de direito, papel este que cabe ao empresário, não à empresa. Entretanto,
apesar da negação de alguns autores, Rubens Requião afirma que a atividade
exercida pelo empresário é tutelada juridicamente e desse modo é
perfeitamente cabível que empresa seja entendida como objeto de direito.
36. DISTINÇÃO ENTRE EMPRESA E SOCIEDADE.
Uma vez constituída, a sociedade comercial torna-se sujeito de
direito, assemelha-se, destarte, à figura do empresário, e não da empresa.
Pois a sociedade comercial surge no ímpeto de exercer uma atividade, não
como a própria atividade em si. Assim, temos que empresa e sociedade são
coisas distintas, podendo as duas coexistir ou mesmo haver uma e não a
outra.
36-A. ESPÉCIES DE EMPRESA.
São várias as espécies de empresas, a priori, dividem-se em dois
grandes grupos: as empresas comerciais e as empresas civis. Além dessas
temos ainda as empresas públicas.