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Direito Administrativo Marinela

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INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 Índice do Material A) Comentários à súmula vinculante nº 3 B) Razoabilidade e Moralidade: Princípios Concretizadores do Perfil Constitucional do Estado Social e Democrático de Direito C) Julgados correlatos A) Comentários à súmula vinculante nº 3 (SÚMULAS COMENTADAS) SÚMULA VINCULANTE Nº. 3 Texto de: Patrícia Donati de Almeida Publicado em: 23/07/2007 - 14:19 O STF, ao editar a Súmula de n.º 3 determinou a observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa também em sede de processo administrativo instaurado perante o TCU (Tribunal de Contas da União). O TEOR DA SÚMULA "Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade de ato de concessão de aposentadoria, reforma e pensão". NOTAS DA REDAÇÃO No exercício da competência que lhe foi atribuída pela EC 45/04 e regulamentada pela Lei 11.417/07, o STF já editou três súmulas vinculantes. Vejamos a de número três. A aludida súmula foi aprovada pelo Plenário do STF em 30/05/07 e entrou em vigor no dia 6 do mês seguinte. Tem como objeto a imprescindibilidade de se observar os princípios do contraditório e da ampla defesa também nos processos administrativos instaurados perante o Tribunal de Contas da União (TCU). A partir desse enunciado, evidencia-se que o TCU deverá respeitar o contraditório e a ampla defesa sempre que da sua decisão puder resultar prejuízo à parte, ou seja, quando importar na anulação ou revogação de ato que beneficie o interessado. No que se refere a essa primeira parte, não há qualquer observação a ser feita. Toda a problemática está na parte final da súmula e se relaciona com as exceções por ela previstas. Qual seria o entendimento do STF que fundamentou o afastamento desses princípios nas hipóteses de apreciação da legalidade de ato concessivo de aposentadoria, reforma ou pensão? A nossa Suprema Corte firmou-se no sentido de que em tais situações o TCU está apenas controlando a legalidade da concessão de certos benefícios. Em outras palavras, não há porque chamar a parte ao processo quando o órgão lhe reconhece um direito. Seria caso do chamado contraditório desnecessário. Segundo nosso ver, não há o que justifique tais ressalvas. O direito de defesa teve seu alcance ampliado pela CF/88 e o seu âmbito de proteção contempla todas as espécies de processo, judicial ou administrativo, seja na hipótese de conceder ou extinguir um benefício, ou seja, sempre que se atingir um direito. Fonte: http://www.wiki-iuspedia.com.br/article.php?story=20070723141957340 B) Razoabilidade e Moralidade: Princípios Concretizadores do Perfil Constitucional do Estado Social e Democrático de Direito Profª Weida Zancaner -1– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 Professora de Direito Administrativo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Assessora Jurídica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Ano I – n º. 9 – dezembro de 2001 – Salvador – BA – Brasil Antes de enfocarmos a razoabilidade e a probidade de forma sistemática, impende lembrar que desde os primórdios das civilizações o homem tem lutado contra o arbítrio. Herôdotos o pai da História, no ano de 445 ac, põe nas palavras de Otanes, um persa célebre, o seguinte discurso: "Em minha opinião o governo não deve caber a um único homem; isso nem é agradável nem é bom. (...). Como seria possível haver equilíbrio no governo de um homem só, se nele o governante pode fazer o que lhe apraz e não tem de prestar contas de seus atos? (...). O governo do povo, ao contrário, traz primeiro consigo o mais belo de todos os nomes: "igualdade perante a lei".1 As idéias de igualdade perante a lei e a necessidade de controle dos atos exercidos pelos detentores do poder foram se aperfeiçoando através dos séculos até eclodirem condensadas nas idéias de Rousseau e Montesquieu, que deram embasamento teórico à Revolução Francesa. Jean-Jaques Rousseau proclamava a superioridade da lei. A lei por ser geral e abstrata impede favoritismos e perseguições, além de ser a expressão da vontade geral. Já o barão de Montesquieu pregava: todo aquele que detém o poder tende a abusar dele. É necessário então que o Poder detenha o Poder. Isto é, cumpre que aquele que faz as leis não as execute nem julgue; que aquele que executa as leis nem as faça ou julgue e que aquele que julga nem as faça ou execute. Havia, como há, nesta concepção, uma ideologia protetora dos indivíduos contra o uso indevido do Poder. Destas idéias, é que surgiu a concepção do Estado de Direito que evolui para o Estado Social e Democrático de Direito. Sem embargo do exposto, no limiar do século XXI, os Estados substancialmente democráticos constituem pérolas raras em pântano de obscurantismo e miséria. Estados autoritários, travestidos de democráticos, ao reproduzirem "consagradas fórmulas vigentes nos países culturalmente mais evoluídos, adotam em seus regimes constitucionais instituições teoricamente aptas a engendrar resultados democráticos"2. Entretanto, essas instituições e os objetivos aos quais elas se preordenam permanecem cristalizados nas constituições desses Estados, sem jamais se concretizarem. Inúmeros fatores impedem a efetivação dos ideais democráticos albergados na maioria das cartas constitucionais dos Estados denominados formalmente democráticos e dos Estados em transição para a democracia3 Dentre eles, a razoabilidade e a moralidade exercem papel de relevo, como procuraremos demostrar. O Brasil é um Estado Social e Democrático de Direito, muito embora esteja consignado no artigo 1° da Lei Maior tão só que a "República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel, dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituí-se em Estado democrático de direito". O Brasil, por determinação constitucional, deve se constituir em Estado Social e Democrático de Direito, em razão do que dispõem entre outras, as normas contidas nos artigos 1°, III, 3°, I e III e IV, 5° LV, LXIX , LXXIII, LXXIV, LXXVI, 6°,7°, I, II,III, IV, VI, X, XI, XII; 23, 170, II, III, VII e VIII. O Estado Social é aquele que além dos direitos individuais assegura os direitos sociais, sendo obrigado a ações positivas para realizar o desenvolvimento e a justiça social, como bem observa Carlos Ari Sundfeld4 1 Herôdotos de Halicarnasso, História, pp.176-177, Universidade de Brasiília, in tradução do grego e notas de Mario da Gama Kuri, 1985. 2 Celso Antônio Bandeira de Mello, "Estado e Democracia", in Direito Eleitoral, p. 45, obra coletiva, Livraria Editora Del Rei, Belo Horizonte, 1996. 3 Sobre o tema versa Celso Antônio Bandeira de Mello, idem ibidem. 4 Fundamentos de Direito Público, p.53-57, Malheiros, 1992. -2– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 Ora bem, a razoabilidade e a moralidade são, segundo entendemos, essenciais à concreção e persistência do Estado de Direito ou do Estado Social e Democrático de Direito, entendido este como aprimoramento daquele e não como categoria distinta. Com efeito, o Estado Social e Democrático de Direito não pode ser concebido à margem dos princípios da razoabilidade e da moralidade, pois ambos são seus elementos caracterizadores. Assumem primordial importância quando da análise de um Estado em concreto e da efetivação do disposto em seu perfil constitucional, já que, sem o atendimento destes princípios não se realiza efetivamente a concepção teórica informadora deste tipo de Estado. A doutrina ao se pronunciar sobre o princípio da razoabilidade ora enfoca a necessidade de sua observância pelo Poder Legislativo, como critério para reconhecimento de eventual inconstitucionalidade da lei, ora o apresenta como condição de legitimidade dos atos administrativos, ora aponta sua importância para o Judiciário quando da aplicação da norma ao caso concreto. Isto demostra de forma cristalina que a razoabilidade é essencial ao sistema jurídico como um todo e que sua utilização é essencial à concretização do direito posto. A índole do Direito positivo, como nos ensina Recasens Siches5, não é permanecer no reino das idéias puras, válidas em si e por si com abstração de toda aplicação real a situações concretas da vida. A índole do Direito positivo é sua efetivação. Aliás, outra não é a lição de Miguel Reale quando grafa: "Poder-se-á dizer que o Direito nasce do fato e ao fato se destina, obedecendo sempre a certas medidas de valor consubstanciadas na norma6. A importância da "razoabilidade", como limite ao exercício legítimo da atividade legislativa foi encarecida por CARLOS ROBERTO DE SIQUEIRA CASTRO7: "A moderna teoria constitucional tende a exigir que as diferenciações normativas sejam razoáveis e racionais. Isto quer dizer que a norma classificatória não deve ser arbitrária, implausível ou caprichosa, devendo, ao revés, operar como meio idôneo, hábil e necessário ao atingimento de finalidades constitucionalmente válidas. Para tanto, há de existir uma indispensável relação de congruência entre a classificação em si e o fim a que ela se destina. Se tal relação de identidade entre meio e fim - "means-end relationship", segundo a nomenclatura norte-americana - da norma classificatória não se fizer presente, de modo que a distinção jurídica resulte leviana e injustificada, padecerá ela do vício da arbitrariedade, consistente na falta de "razoabilidade" e de "racionalidade", vez que nem mesmo ao legislador legítimo, como mandatário da soberania popular, é dado discriminar injustificadamente entre pessoas, bens e interesses na sociedade política. Esclareça-se que para o autor as expressões "distinguir", "classificar", "classificação", aplicadas à atividade legislativa, são equivalentes a "dispor", "estatuir", conforme se pode depreender quando diz: "Pode-se mesmo afirmar que legislar significa classificar. Classificam-se pessoas e bens segundo os mais diversos critérios fáticos para fins de se atribuir a cada conjunto da realidade efeitos jurídicos singulares e de toda espécie"8. Claro está que os direitos individuais e coletivos albergados na Constituição e cerne do Estado Social e Democrático de Direito não podem ser postergados pelo legislador infraconstitucional, nem pode este desnaturá-los editando leis que com eles conflitem quer frontalmente quer por via oblíqua, sob pena de afronta ao princípio da razoabilidade e, consequentemente ao princípio da legalidade. A importância do princípio da razoabilidade no âmbito da atuação do Poder Executivo ombreia-se à importância desse princípio quando do exercício das outras duas funções do Estado Para Celso Antônio, enuncia-se com o princípio da razoabilidade que a Administração, ao atuar no exercício da discrição, terá de obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosas das finalidades que presidiram a outorga 5 Nueva Filosofia de la Interpretacion del Derecho, p. 274, 2ª ed., Editorial Porrúa, S.A., Mexico, 1973. Lições Preliminares de Direito, p. 199, Saraiva, 4ª ed., 1977. 7 O Devido Processo Legal e a Razoabilidade das Leis na Nova Constituição do Brasil, p. 157, Editora Forense, 1989. 8 Idem, ibidem, p. 155. 6 -3– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 da competência exercida. Vale dizer: pretende se colocar em claro que não serão apenas inconvenientes, mas também ilegítimas --- e portanto jurisdicionalmente invalidáveis -- as condutas desarrazoadas, bizarras, incoerentes ou praticadas em desconsideração às situações e circunstâncias que seriam atendidas por quem tivesse atributos normais de prudência, sensatez e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada"9 (Curso de Direito Administrativo, p. 54, 4 ed. rev. E ampl., Malheiros Ed., SP., 1993). Em suma: um ato não é razoável quando não existiram os fatos em que se embasou; quando os fatos, embora existentes, não guardam relação lógica com a medida tomada; quando mesmo existente alguma relação lógica, não há adequada proporção entre uns e outros; quando se assentou em argumentos ou em premissas, explicitas ou implícitas que não autorizam do ponto de vista lógico, a conclusão deles extraída. Recaséns Siches, com propriedade, aponta a necessidade da observância do princípio da razoabilidade pelo Poder Judiciário. Os ensinamentos do mestre estão sintetizados de forma lapidar no seguinte trecho de sua monumental obra intitulada "Nueva Filosofia de la Interpretacion del Derecho": "O juiz, para averiguar qual a norma aplicável ao caso particular submetido à sua jurisdição, não deve deixar-se levar por meros nomes, por etiquetas ou conceitos classificatórios, mas, pelo contrário, tem que ver quais são as normas, pertencentes ao ordenamento jurídico positivo a ser aplicado no caso concreto, que ao dirimir o conflito estejam em consonância com os valores albergados e priorizados por este mesmo ordenamento"10. Em face do exposto, pode-se concluir, que o princípio da razoabilidade determina a coerência do sistema e que a falta de coerência, de racionalidade, de qualquer lei, ato administrativo ou decisão jurisdicional gera vício de legalidade, pois o Direito é feito por seres e para seres racionais, para ser aplicado em um determinado espaço e em uma determinada época. Através da análise da razoabilidade também se verifica se os vetores que informam um determinado sistema jurídico foram ou não obedecidos. A desobediência a esses vetores macula de ilegalidade o ato expedido quer em sede administrativa, legislativa ou jurisdicional. Portanto, a razoabilidade não se restringe apenas a mera análise para conferir se um ato, uma lei ou uma sentença foram editados, ou não, de forma coerente com as normas que os presidiram. O princípio da razoabilidade compreende, além da análise da coerência dos atos jurídicos, a verificação de se esses atos foram ou não editados com reverência a todos os princípios e normas componentes do sistema jurídico a que pertencem, isto é, se esses atos obedecem ao esquema de prioridades adotado pelo próprio sistema. Mister frisar que outro não pode ser o entendimento acerca do princípio da razoabilidade por todas aqueles que acatam os ensinamentos do mestre maior Geraldo Ataliba, em "República e Constituição", obra que constitui um verdadeiro hino à democracia, quando diz: "Mesmo no nível constitucional, há uma ordem que faz com que as regras tenham uma interpretação e eficácia condicionada pelos princípios. Estes se harmonizam, em função da hierarquia entre eles estabelecida, de modo a assegurar plena coerência interna ao sistema (a demonstração cabal disso está em J. M. Teran, Filosofia del Derecho, p. 146).11 E mais além: "Os princípios são as linhas mestras, os grandes nortes, as diretrizes magnas do sistema. Apontam os rumos a serem seguidos por toda sociedade e obrigatoriamente perseguidos pelos órgãos do governo (poderes constituídos). Eles expressam a substância última do querer popular, seus objetivos e desígnios, as linhas mestras da legislação, da administração e da jurisdição. Por estas não podem ser contrariados; têm que ser prestigiados até às últimas conseqüências. 9 Curso de Direito Administrativo, 8ª ed., rev. atual. e ampl., p. 63, Malheiros Editores, 1996. Op. cit. p. 236. 11 República e Constituição, p. 6, Editora Revista dos Tribunais, 1985. 10 -4– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 E demostra que mesmo as normas constitucionais não tem igual eficácia, mas pelo contrário, se estruturam de forma piramidal, como entende a Escola de Viena, liderada pelo incomparável Kelsen"12 Como remate, Geraldo Ataliba faz suas as palavras de Celso Antônio, publicista que primeiro alertou sobre a importância do tema para a fixação do Regime Jurídico Administrativo no Brasil, quando grafa: "Princípio é, pois, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, precisamente porque define à lógica da racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico".13 O princípio da razoabilidade propicia, portanto, a fiscalização da obediência a todos os demais princípios e regras albergadas pelo sistema. Assim, quando o aplicador da norma elege prioridades sem atentar para os vetores indicativos do sistema, está incorrendo em comportamento ilícito por desobediência ao princípio da razoabilidade. O princípio da razoabilidade transcende sua utilização e compreensão como "critério de aplicação" das normas jurídicas para a concreção do direito posto. Ele é mais do que mero critério para a verificação da correta aplicação das normas encartadas em um direito positivado. Ele deve ser alçado a "critério de intelecção" de todo e qualquer sistema jurídico que pretende se perenizar. Não a perenização estática, mas aquela que implica em movimento, atualização e em aperfeiçoamento das instituições democráticas, acompanhando o incessante ritmo da vida, "pois o direito é feito para vida e não a vida para o direito".14 Como critério de intelecção, o princípio da razoabilidade dá substância à lógica do sistema, coerência ao mesmo, isto é, torna uma massa imensa de normas jurídicas um todo coerente, com prioridades e finalidades definidas e passíveis de serem compreendidas e ordenadas. Assim, o princípio da razoabilidade deve ser usado em dois momentos distintos: na estática do direito, para a compreensão do sistema jurídico a ser objeto de análise, hipótese na qual se constitui em um critério de intelecção do direito e na dinâmica do direito, isto é quando de sua aplicação para assegurar que o perfil constitucional do Estado Social e Democrático de Direito esteja devidamente concretizado. Para aclarar o que dissemos através do exame de situações concretas, visualizemos algumas hipóteses em face do sistema constitucional brasileiro. Não pode ser considerada razoável política econômica recessiva, em razão do disposto no artigo 3°, III da Constituição que "in verbis" determina: "Art. 3 - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais". Se isso não bastasse, dispõe o artigo 170, inciso VII e VIII: "ART - 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego". Ora, qualquer administrador que tivesse alguma noção da importância dos princípios fundamentais do direito público ou algum acatamento aos ditames constitucionais, por certo detectaria de imediato a invalidade manifesta que eiva de forma insanável política econômica que prestigie as desigualdades sociais e regionais e que reduza a possibilidade de emprego, lançando a população na miséria e aviltando a dignidade do ser humano. Aliás, o princípio da razoabilidade basta para demonstrar que políticas recessivas não podem ser validadas pelo nosso sistema jurídico positivo. 12 13 14 idem, ibidem, pp. 6-7. idem, ibidem, p. 7 Miguel Reali, Filosofia do Direito, vol. II, p. 535, Saraiva, São Paulo, 1932. -5– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 Também é desarrazoada e ilegal, conforme dissemos, a eleição de prioridades, pelo administrador público e pelo legislador, sem a devida atenção aos vetores constitucionais. Na mesma falha incorre o magistrado que deixa de reconhecer as prioridades estabelecidas no direito positivo. Exemplificando: O disposto nos artigos 205 e inciso I do artigo 208 da Constituição Federal, "in verbis" determina: Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade... Art. 208 - O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de: I - ensino fundamental obrigatório e gratuito inclusive para os que a ele não tiverem acesso na idade própria. Ora, é claro que a construção de viadutos, elevados, prédios de grande beleza arquitetônica, são bem vindos e alguns cidadãos chegam a tirar excelente proveito dessas obras. Sem embargo, cumpriria indagar: a Constituição brasileira está a priorizar obras viárias ou a educação? A educação que é dever do Estado e direito dos cidadãos pode ser postergada? Pode ceder lugar a viadutos e túneis? A Lei Maior diz que não e, para tanto, basta o intérprete trazer em seu calço o mais belo dos princípios, aquele que dá coerência a todos os princípios, aquele que, inclusive, possibilita que se possa verificar a obediência aos demais princípios albergados pelo sistema, o princípio da razoabilidade. Também agridem o princípio da razoabilidade, certas políticas que se preocupam mais com questões de menor relevo do que com problemas cruciais que flagelam uma sociedade, em demonstração agressiva de um profundo descaso com os princípios jurídicos e com o povo, detentor último do poder político. A saúde, em razão do disposto no artigo 196 da Constituição Federal é direito de todos e dever do Estado. Fechando os olhos para questões como saúde e violência, o Estado mobiliza inúmeros agentes públicos para anotar placas de veículos com o fito de proteger o ser humano contra a poluição, como ocorre na cidade de São Paulo com o rodízio de carros. Esquecem nossos administradores, servos de nossa constituição, que no Brasil as pessoas morrem de fome, de falta de atendimento médico, da violência que grassa pelas ruas e não de poluição. Moralidade e legalidade Após a Constituição de 1988 o princípio da moralidade ganhou importância no direito pátrio e muitos doutrinadores começaram a versar sobre ele. Entretanto, é bom que se esclareça, que o princípio da moralidade jamais passou desapercebido pelos juristas15, mesmo quando ainda não era recepcionado pelo direito positivo. Em França, Henri Welter, seguidor das idéias de Hauriou, o grande sistematizador do conceito de moralidade administrativa, ao versar sobre o tema assim se manifesta: "Peut-on dire qu'une mesure administrative est entachée d'immoralité lorsqu'elle vise un but d'intérêt général irrégulier, certes, mais parfaitement louable. Ne sont immorales, au sens commun de ce mot, que les décisions qui tendent vers le mal et qui poursuivent des fins contraires aux règles de la morale commune. Mais ce n'est évidemment pas dans ce sens que nous prenons ici le mot "moralité". La moralité administrative que nous visons ne se confond pas avec la moralité commune; elle est constituée par les règles de la bonne administration, c'est-à-dire par l'ensemble des règles de but et de discipline déterminées non seulement par la distinction du bien et du mal, mais, d'une façon plus spéciale, par la mission générale de l'administratin et l'idée de la fonction administrative."16 A moralidade administrativa para Welter, e para seu mestre Hauriou, nada mais é do que a obediência às regras de boa administração, entendida esta locução não em seu sentido comum, mas enquanto interpretação finalística do sistema jurídico, tendo em vista a missão à qual a administração pública está afeta, e associada às idéias de função e de interesse público. O controle da moralidade administrativa, para esses juristas, bem examinado, coincide com o princípio da legalidade em sentido amplo, isto é, com uma interpretação finalística do direito, conforme podemos observar quando Welter leciona: 15 16 Sobre o tema Manoel de Oliveira Franco Sobrinho: Controle da Moralidade Administrativa, Saraiva, 1974. Contrôle Juridictionnel de la Moralité Administrative, p. 77, Librairie du Recueil Sirey, Paris, 1929. -6– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 "Tout ce qu'on peut soutenir, c'est qu'en agissant pour des fins étrangères au bien du service, l'agent administratif prend prétexte da la disposition légale pour sortir du cadre de l'ínstituion et commettre, em quelque sorte, un acte díndiscipline. Or, il faut bien admettre que pareille conduite ne s'apprécie nullement sur la seule base des prescriptions formelles édictées par le législateur qui, d'ailleurs - nous le rappelons une fois de plus - ne peut fournir, pour les solucions concrètes, que des directives bien vagues, mais sur le fondement de données administratives internes déduites de la nature fonctionelle des droits administratifs et de l' esprit, non pas dela loi, mais de l' instituition considérée en elle-même.17 No Brasil, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello pontifica sobre o tema ao tratar dos princípios gerais do direito: "Embora preexistam ao direito positivo de dado povo, e existam fora do direito escrito de certo país, se infiltram no ordenamento jurídico de dado momento histórico, como elemento vivificador da sua civilização e cultura, uma vez constituem sua essência. O direito de determinada fase histórica, condicionado pela sua civilização e cultura, se não confunde com as minúcias e peculiaridades da legislação e do costume de cada povo e de cada país, porém ilumina as suas normas. São as regras éticas que informam o direito positivo como mínimo de moralidade que circunda o preceito legal, latente na fórmula escrita e costumeira. Encerram normas jurídicas universais, expressão de proteção do gênero humano na realização do direito. E, para emprestar-se imagem de Carnelutti, podia-se dizer ser o álcool que conserva o vinho, lhe dá vitalidade, está dentro dele, mas com ele não se confunde".18 Generosamente, o Desembargador Bandeira de Mello alça o princípio da moralidade à posição que lhe é devida no Estado Democrático de Direito pois, certamente, ninguém poderia imaginar que em um Estado ditatorial tal princípio fosse respeitado ou pudesse fazer carreira. Após o advento da Constituição de 1988, vários juristas versaram sob o tema, João Féder, trilhando a mesma senda de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, também entende que o princípio da moralidade, por permear o sistema jurídico, encontra-se implícito no sistema19. A compreensão do princípio da moralidade como princípio autônomo parece-nos mais consentânea com as idéias que embasam o Estado Democrático de Direito. Ademais, a redução do princípio da moralidade ao da legalidade obstaculiza que o perfil constitucional do Estado Democrático de Direito se concretize em sua inteireza. É de bom alvitre, neste passo, estabelecer distinção conceitual entre moralidade administrativa e probidade administrativa. Os dois termos são usados pela Constituição Federal. O art. 37 dispõe que a Administração Pública de qualquer dos Poderes deverá obedecer, entre outros, o princípio da moralidade. Também este princípio se acha albergado no art. 5° LXXIII, da Constituição Federal quando trata do cabimento de Ação Popular para anulação de ato lesivo ao patrimônio público por infringência à moralidade administrativa. O art.14, § 9°, dispõe que lei complementar, com o fito de proteger a moralidade e a probidade administrativa, estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação. Por sua vez o art. 85, V, estabelece que são crimes de responsabilidade os atos do Presidente que atentem contra a Constituição, especialmente, entre outros, os que afrontem a probidade administrativa. O art. 37, § 4°, determina que os atos de improbidade administrativa dos servidores públicos acarretarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo das sanções legais cabíveis. Acertada a lição de José Afonso da Silva quando diz que a improbidade administrativa é uma forma de "imoralidade administrativa qualificada"20. 17 Op. cit., p. 73. Princípios Gerais de Direito Administrativo, p.360, vol. I, Forense, Rio de Janeiro, 1969. 19 Diz o Conselheiro Jõao Féder: "Quanto aos princípios gerais de direito, ainda que mereçam interpretações diferentes por diversas correntes, pode-se afirmar que são aqueles princípios que merecem ser respeitados ainda que ausentes no texto da lei". in O Estado e a Sobrevida da Corrupção, p.135, Tribunal de Contas do Estado do Paraná, 1994. 20 Op. cit., 563 18 -7– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 Consiste no dever do "funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício de suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira fornecer.21" Assim, a moralidade administrativa pode ser considerada gênero da qual a probidade é espécie e, como conseqüência, assiste razão a Marcelo Figueiredo quando diz que "dado agente pode violar a moralidade administrativa e nem por isso violará necessariamente a probidade, se na análise de sua conduta não houver a previsão legal tida por ato de improbidade"22. Serve de exemplo o hábito instituído por nossos governantes de levar parentes em viagens ao exterior, no exercício da função de Chefe de Estado, o que sem sombra de dúvida consiste em mordomia indevida. Mordomias indevidas, conforme leciona Lúcia Valle Figueiredo podem não constituir crime, por ausência de tipificação legal. Todavia, não devem ser toleradas por atentarem contra à ética da conduta administrativa23. A probidade administrativa é regulada a nível infraconstitucional pela lei n° 8429/92, que se refere a três tipos de atos de improbidade: 1) os atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito; 2) os atos de improbidade administrativa que causam dano ao erário; 3) os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da boa administração24. Ademais, quer a moralidade, quer a probidade, fazem parte integrante da análise da validade da conduta estatal, como nas licitações públicas25, nos contratos administrativos, na admissão de pessoal, na apuração de crimes de responsabilidade26, ou ainda quando da análise da economicidade dos atos na praticados pelos agentes públicos e tantos outros aspectos que permeiam a atividade, não apenas do poder executivo, mas também do judiciário e do legislativo. Sabe-se que o conceito de moralidade, símile ao que ocorre com o da razoabilidade, constitui conceito de experiência ou de valor. Esses conceitos, quando utilizados pelo direito, são denominados, pela Ciência Jurídica, conceitos jurídicos indeterminados. A indeterminação deste tipo de conceito não impede sua compreensão nem impede sua aplicação. Aliás, os conceitos jurídicos indeterminados ao invés de baralhar, promovem a comunicação jurídica. O conceito de moralidade deve ser sacado do próprio conceito de moralidade vigente em uma determinada sociedade em uma determinada época. Entretanto, é bom que se esclareça que este conceito não deve ter por parâmetro a conduta social das pessoas, mas o que elas entendem como moralmente correto, o que dizem ser correto como valor que exprime o consenso social e os valores albergados pelo sistema jurídico positivo. A compreensão que temos acerca do tema, nos induz a concluir que a moralidade é recepcionada pelo sistema jurídico positivo como um todo e não uma pontualização de tópicos onde deva ser tida como vigente. A moralidade ao ser absorvida pelo direito posto, se espraia por todo o sistema normativo, não se alocando, necessariamente, na norma "A" ou "B". Entretanto, muito embora permeie o sistema, é autônoma no sentido de que não pode ser objetivada puntualmente em cada uma das normas jurídicas, e, portanto, diluída simplesmente no mero enunciado do princípio da legalidade. 21 Marcelo Caetano, Manual de Direito administrativo, 1ª ed. brasileira, t. II, p. 684, Rio, Forense, 1970, conf. José Afonsa da Silva, op. cit., p. 563. 22 Probidade Administrativa, p. 20, Malheiros, 1995. 23 O Curso de Direito Administrativo, p. 48, Malheiros, 1994. 24 Juarez Freitas, Do Princípio da Probidade Administrativa e sua máxima efetivação, Revista de Informação Legislativa, n° 129, in separata, Senado Federal, 1996. 25 Antonio Roque Citadini, Comentários e Jurisprudência sobre a Lei de Licitações Públicas, p. 33, Max Limonad, São Paulo, leciona: "Infere-se, portanto, que a propidade administrativa está vinculada a padrões de moralidade que conduzem o procedimento licitatório, na relação entre Administração e licitantes, que se inobservados podem ensejar a anulação do ato". 26 Conforme noticia Maria Silvia Zanella de Pietro, Direito Administrativo, p. 70, Atlas, São Paulo, 1996: "A Lei n° 1.079, de 10-4-50, que define os crimes de responsabilidade, prevê, no artigo 9°, os crimes contra a probidade administrativa; em alguns deles, há ofensa direta à lei, como na hipótese de infringência às normas legais sobre provimento dos cargos públicos; em outros, isso não ocorre, como na hipótese de omissão ou retardamento doloso publicação de atos do Poder Executivo, na de responsabilização de subordinados por delitos funcionais e no de procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo". -8– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 O princípio da moralidade têm sua essência captada com precisão por Marçal Justen Filho quando se refere a este como um "princípio jurídico "em branco", o que significa que seu conteúdo não se exaure em comando concretos e definidos, explícita ou implicitamente previstos no Direito legislado. O princípio da moralidade pública contempla a determinação jurídica da observância de preceitos éticos produzidos pela sociedade, variáveis segundo as circunstâncias de cada caso"27. Em síntese, podemos dizer que o administrador afrontará o princípio da moralidade todas as vezes que agir visando interesses pessoais, com o fito de tirar proveito para si ou amigos, ou quando editar atos maliciosos ou desleais, ou ainda, atos caprichosos, atos exarados com o intuito de perseguir inimigos ou desafetos políticos, quando afrontar a probidade administrativa, quando agir com má-fé ou de maneira desleal. Mister ainda frisar, que os atos afrontosos ao princípio da moralidade são atos portadores de vício de desvio de poder, pois o agente usa sua competência para atingir finalidade alheia à própria do ato praticado e ( no mais das vezes) imbuído de um móvel considerado reprovável do ponto de vista moral. O princípio da moralidade encartada em inúmeros artigos da Constituição Federal, consiste, em ultima ratio, regra de civilidade essencial à sobrevivência das instituições democráticas. Esta posição, isto é, a compreensão do princípio da moralidade com um “plus” ao princípio da legalidade, inclusive enquanto autônomo em relação a este, é a aceitação de valores éticos e morais pelo sistema jurídico, valores que se espraiam por todo sistema porque ajudaram a compor o perfil constitucional do Estado adotado por uma determinada sociedade em uma determinada época. Referência Bibliográfica deste Artigo (ABNT: NBR-6023/2000): ZANCANER, Weida. Razoabilidade e moralidade: princípios concretizadores do perfil constitucional do estado social e democrático de direito. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, ano I, nº. 9, dezembro, 2001. Disponível em: . Acesso em: 08 de agosto de 2008. Publicação Impressa: Publicado originalmente no segundo volume da coletânea: Celso Antônio Bandeira de Mello (org.), Estudos em Homenagem a Geraldo Ataliba, vol. II, Direito Administrativo e Constitucional, São Paulo, Ed. Malheiros, 1997. Fonte: http://www.direitopublico.com.br/pdf_9/DIALOGO-JURIDICO-09-DEZEMBRO-2001-WEIDAZANCANER.pdf C) Julgados correlatos 1. RE 388359 / PE Relator: Min. Marco Aurélio Julgamento: 28/03/2007 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Parte(s) Recte.(S): HTM - Distribuidora de Melaço Ltda Adv.(A/S): Lirian Sousa Soares e Outro(a/s) Recdo.(a/s): União Adv.(a/s): PFN - Rosângela Maria Croccia Macedo Ementa RECURSO ADMINISTRATIVO - DEPÓSITO - § 2º DO ARTIGO 33 DO DECRETO Nº 70.235/72 - INCONSTITUCIONA-LIDADE. A garantia constitucional da ampla defesa afasta a exigência do depósito como pressuposto de admissibilidade de recurso administrativo. Decisão 27 O Princípio da Moraliadade Pública e o Direito Tributário, conferência proferida no IX Concresso Brasileiro de Direito Tributário, in Revista de Direito Tributário, vol. 67, p. 70, Malheiros Editores, 1996 -9– INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 A Turma decidiu remeter o presente recurso extraordinário a julgamento do Tribunal Pleno. Unânime. 1ª Turma, 26.08.2003. Decisão: Após o voto do Senhor Ministro Marco Aurélio, Relator, conhecendo e provendo o recurso extraordinário, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Nelson Jobim. Presidência do Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 02.10.2003. Decisão: Renovado o pedido de vista do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, justificadamente, nos termos do § 1º do artigo 1º da Resolução nº 278, de 15 de dezembro de 2003. Presidência do Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 28.04.2004. Decisão: Após o voto-vista do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, que acompanhava o Relator, conhecendo e dando provimento ao recurso, também manifestando-se nesse sentido os Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Eros Grau e Carlos Britto, e do voto do Senhor Ministro Sepúlveda Pertence, para conhecer e negar provimento ao recurso, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Cezar Peluso. Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Plenário, 20.04.2006. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu do recurso e, por maioria, deu-lhe provimento para declarar a inconstitucionalidade do § 2º do artigo 33 do Decreto nº 70.235/1972, na redação do artigo 32 da Medida Provisória nº 1.699-41/1998, vencido o Senhor Ministro Sepúlveda Pertence. Votou o Presidente. Licenciada a Senhora Ministra Ellen Gracie (Presidente). Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente). Plenário, 28.03.2007. Retificação de decisão: O Tribunal deliberou retificar a proclamação da assentada anterior para constar que, por unanimidade, conheceu do recurso e, por maioria, deu-lhe provimento para declarar a inconstitucionalidade do § 2º do artigo 33 do Decreto nº 70.235/1972, com a redação dada pelo artigo 32 da Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, originária da Medida Provisória nº 1.86351/1999 e reedições, vencido o Senhor Ministro Sepúlveda Pertence. Licenciada a Senhora Ministra Ellen Gracie (Presidente). Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente). Plenário, 02.04.2007. 2. RE 389383 / SP Relator: Min. Marco Aurélio Julgamento: 28/03/2007 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Parte(s) Recte.(s): Instituto Nacional do Seguro Social - INSS Adv.(a/s): Lucila Maria França Labinas Recdo.(a/s): Zanettini Barossi S/A Indústria e Comércio Adv.(a/s): Adalzino Modesto de Paula Júnior e Outro (a/s) Ementa RECURSO ADMINISTRATIVO - DEPÓSITO - §§ 1º E 2º DO ARTIGO 126 DA LEI Nº 8.213/1991 - INCONSTITUCIO-NALIDADE. A garantia constitucional da ampla defesa afasta a exigência do depósito como pressuposto de admissibilidade de recurso administrativo. Decisão A Turma decidiu remeter o presente recurso extraordinário a julgamento do Tribunal Pleno. Unânime. 1ª Turma, 26.08.2003. Decisão: Após o voto do Senhor Ministro Marco Aurélio, Relator, conhecendo e desprovendo o recurso extraordinário, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Nelson Jobim. Falou pelo recorrente a Dra. Carolina Delduque Sennes, Procuradora do INSS. Presidência do Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 02.10.2003. - 10 – INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 Decisão: Renovado o pedido de vista do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, justificadamente, nos termos do § 1º do artigo 1º da Resolução nº 278, de 15 de dezembro de 2003. Presidência do Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 28.04.2004. Decisão: Após o voto-vista do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, que acompanhava o Relator, conhecendo e negando provimento ao recurso, também manifestando-se nesse sentido os Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Eros Grau e Carlos Britto, e do voto do Senhor Ministro Sepúlveda Pertence, para conhecer e dar provimento ao recurso, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Cezar Peluso. Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Plenário, 20.04.2006. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu do recurso extraordinário, e, por maioria, negoulhe provimento, declarando a inconstitucionalidade dos § § 1º e 2º do artigo 126 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, com a redação da Medida Provisória nº 1.608-14/1998, convertida na Lei nº 9.639, de 25 de maio de 1998, vencido o Senhor Ministro Sepúlveda Pertence. Votou o Presidente. Licenciada a Senhora Ministra Ellen Gracie (Presidente). Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente). Plenário, 28.03.2007. Retificação de decisão: O Tribunal deliberou retificar a proclamação da assentada anterior para constar que, por unanimidade, conheceu do recurso e, por maioria, negou-lhe provimento, declarando a inconstitucionalidade dos §§ 1º e 2º do artigo 126 da Lei nº 8.213/1991, com as redações dadas pelo artigo 10 da Lei nº 9.639, de 25 de maio de 1998, originária da Medida Provisória nº 1.608-14/1998, vencido o Senhor Ministro Sepúlveda Pertence. Licenciada a Senhora Ministra Ellen Gracie (Presidente). Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente). Plenário, 02.04.2007. 3. INFORMATIVO Nº 345 TÍTULO: ADPF - Políticas Públicas - Intervenção Judicial - "Reserva do Possível" (Transcrições) PROCESSO: ADPF – 45 ARTIGO ADPF - Políticas Públicas - Intervenção Judicial - "Reserva do Possível" (Transcrições) ADPF 45 MC/DF* RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO EMENTA: ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA "RESERVA DO POSSÍVEL". NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO "MÍNIMO EXISTENCIAL". VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO). DECISÃO: Trata-se de argüição de descumprimento de preceito fundamental promovida contra veto, que, emanado do Senhor Presidente da República, incidiu sobre o § 2º do art. 55 (posteriormente renumerado para art. 59), de proposição legislativa que se converteu na Lei nº 10.707/2003 (LDO), destinada a fixar as diretrizes pertinentes à elaboração da lei orçamentária anual de 2004. O dispositivo vetado possui o seguinte conteúdo material: "§ 2º Para efeito do inciso II do caput deste artigo, consideram-se ações e serviços públicos de saúde a totalidade das dotações do Ministério da Saúde, deduzidos os encargos previdenciários da União, os serviços da dívida e a parcela das despesas do Ministério financiada com recursos do Fundo de Combate à Erradicação da Pobreza." O autor da presente ação constitucional sustenta que o veto presidencial importou em desrespeito a preceito fundamental decorrente da EC 29/2000, que foi promulgada para garantir recursos financeiros mínimos a serem aplicados nas ações e serviços públicos de saúde. Requisitei, ao Senhor Presidente da República, informações que por ele foram prestadas a fls. 93/144. Vale referir que o Senhor Presidente da República, logo após o veto parcial ora questionado nesta sede - 11 – INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 processual, veio a remeter, ao Congresso Nacional, projeto de lei, que, transformado na Lei nº 10.777/2003, restaurou, em sua integralidade, o § 2º do art. 59 da Lei nº 10.707/2003 (LDO), dele fazendo constar a mesma norma sobre a qual incidira o veto executivo. Em virtude da mencionada iniciativa presidencial, que deu causa à instauração do concernente processo legislativo, sobreveio a edição da já referida Lei nº 10.777, de 24/11/2003, cujo art. 1º - modificando a própria Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei nº 10.707/2003) - supriu a omissão motivadora do ajuizamento da presente ação constitucional. Com o advento da mencionada Lei nº 10.777/2003, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, editada para reger a elaboração da lei orçamentária de 2004, passou a ter, no ponto concernente à questionada omissão normativa, o seguinte conteúdo material: "Art. 1º O art. 59 da lei nº 10.707, de 30 de julho de 2003, passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos: 'Art.59............................................ § 3º Para os efeitos do inciso II do caput deste artigo, consideram-se ações e serviços públicos de saúde a totalidade das dotações do Ministério da Saúde, deduzidos os encargos previdenciários da União, os serviços da dívida e a parcela das despesas do Ministério financiada com recursos do Fundo de Combate à Erradicação da Pobreza. § 4º A demonstração da observância do limite mínimo previsto no § 3º deste artigo dar-se-á no encerramento do exercício financeiro de 2004.' (NR)." (grifei) Cabe registrar, por necessário, que a regra legal resultante da edição da Lei nº 10.777/2003, ora em pleno vigor, reproduz, essencialmente, em seu conteúdo, o preceito, que, constante do § 2º do art. 59 da Lei nº 10.707/2003 (LDO), veio a ser vetado pelo Senhor Presidente da República (fls. 23v.). Impende assinalar que a regra legal em questão que culminou por colmatar a própria omissão normativa alegadamente descumpridora de preceito fundamental - entrou em vigor em 2003, para orientar, ainda em tempo oportuno, a elaboração da lei orçamentária anual pertinente ao exercício financeiro de 2004. Conclui-se, desse modo, que o objetivo perseguido na presente sede processual foi inteiramente alcançado com a edição da Lei nº 10.777, de 24/11/2003, promulgada com a finalidade específica de conferir efetividade à EC 29/2000, concebida para garantir, em bases adequadas - e sempre em benefício da população deste País - recursos financeiros mínimos a serem necessariamente aplicados nas ações e serviços públicos de saúde. Não obstante a superveniência desse fato juridicamente relevante, capaz de fazer instaurar situação de prejudicialidade da presente argüição de descumprimento de preceito fundamental, não posso deixar de reconhecer que a ação constitucional em referência, considerado o contexto em exame, qualifica-se como instrumento idôneo e apto a viabilizar a concretização de políticas públicas, quando, previstas no texto da Carta Política, tal como sucede no caso (EC 29/2000), venham a ser descumpridas, total ou parcialmente, pelas instâncias governamentais destinatárias do comando inscrito na própria Constituição da República. Essa eminente atribuição conferida ao Supremo Tribunal Federal põe em evidência, de modo particularmente expressivo, a dimensão política da jurisdição constitucional conferida a esta Corte, que não pode demitir-se do gravíssimo encargo de tornar efetivos os direitos econômicos, sociais e culturais - que se identificam, enquanto direitos de segunda geração, com as liberdades positivas, reais ou concretas (RTJ 164/158-161, Rel. Min. CELSO DE MELLO) -, sob pena de o Poder Público, por violação positiva ou negativa da Constituição, comprometer, de modo inaceitável, a integridade da própria ordem constitucional: "DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO - MODALIDADES DE COMPORTAMENTOS INCONSTITUCIONAIS DO PODER PÚBLICO. - O desrespeito à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação estatal quanto mediante inércia governamental. A situação de inconstitucionalidade pode derivar de um comportamento ativo do Poder Público, que age ou edita normas em desacordo com o que dispõe a Constituição, ofendendo-lhe, assim, os preceitos e os princípios que nela se acham consignados. Essa conduta estatal, que importa em um facere (atuação positiva), gera a inconstitucionalidade por ação. - Se o Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis, abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse non facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público. ....................................................... - A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualificase como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o - 12 – INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental." (RTJ 185/794-796, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno) É certo que não se inclui, ordinariamente, no âmbito das funções institucionais do Poder Judiciário - e nas desta Suprema Corte, em especial - a atribuição de formular e de implementar políticas públicas (JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, "Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976", p. 207, item n. 05, 1987, Almedina, Coimbra), pois, nesse domínio, o encargo reside, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo. Tal incumbência, no entanto, embora em bases excepcionais, poderá atribuir-se ao Poder Judiciário, se e quando os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que sobre eles incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de direitos individuais e/ou coletivos impregnados de estatura constitucional, ainda que derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático. Cabe assinalar, presente esse contexto - consoante já proclamou esta Suprema Corte - que o caráter programático das regras inscritas no texto da Carta Política "não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado" (RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Não deixo de conferir, no entanto, assentadas tais premissas, significativo relevo ao tema pertinente à "reserva do possível" (STEPHEN HOLMES/CASS R. SUNSTEIN, "The Cost of Rights", 1999, Norton, New York), notadamente em sede de efetivação e implementação (sempre onerosas) dos direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais), cujo adimplemento, pelo Poder Público, impõe e exige, deste, prestações estatais positivas concretizadoras de tais prerrogativas individuais e/ou coletivas. É que a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais - além de caracterizar-se pela gradualidade de seu processo de concretização - depende, em grande medida, de um inescapável vínculo financeiro subordinado às possibilidades orçamentárias do Estado, de tal modo que, comprovada, objetivamente, a incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, desta não se poderá razoavelmente exigir, considerada a limitação material referida, a imediata efetivação do comando fundado no texto da Carta Política. Não se mostrará lícito, no entanto, ao Poder Público, em tal hipótese - mediante indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa - criar obstáculo artificial que revele o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência. Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade. Daí a correta ponderação de ANA PAULA DE BARCELLOS ("A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais", p. 245-246, 2002, Renovar): "Em resumo: a limitação de recursos existe e é uma contingência que não se pode ignorar. O intérprete deverá levá-la em conta ao afirmar que algum bem pode ser exigido judicialmente, assim como o magistrado, ao determinar seu fornecimento pelo Estado. Por outro lado, não se pode esquecer que a finalidade do Estado ao obter recursos, para, em seguida, gastá-los sob a forma de obras, prestação de serviços, ou qualquer outra política pública, é exatamente realizar os objetivos fundamentais da Constituição. A meta central das Constituições modernas, e da Carta de 1988 em particular, pode ser resumida, como já exposto, na promoção do bem-estar do homem, cujo ponto de partida está em assegurar as condições de sua própria dignidade, que inclui, além da proteção dos direitos individuais, condições materiais mínimas de existência. Ao apurar os elementos fundamentais dessa dignidade (o mínimo existencial), estar-se-ão estabelecendo exatamente os alvos prioritários dos gastos públicos. Apenas depois de atingi-los é que se poderá discutir, relativamente aos recursos remanescentes, em que outros projetos se deverá investir. O mínimo existencial, como se vê, associado ao estabelecimento de prioridades orçamentárias, é capaz de conviver produtivamente com a reserva do possível." (grifei) Vê-se, pois, que os condicionamentos impostos, pela cláusula da "reserva do possível", ao processo de concretização dos direitos de se- 13 – INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 gunda geração - de implantação sempre onerosa -, traduzem-se em um binômio que compreende, de um lado, (1) a razoabilidade da pretensão individual/social deduzida em face do Poder Público e, de outro, (2) a existência de disponibilidade financeira do Estado para tornar efetivas as prestações positivas dele reclamadas. Desnecessário acentuar-se, considerado o encargo governamental de tornar efetiva a aplicação dos direitos econômicos, sociais e culturais, que os elementos componentes do mencionado binômio (razoabilidade da pretensão + disponibilidade financeira do Estado) devem configurar-se de modo afirmativo e em situação de cumulativa ocorrência, pois, ausente qualquer desses elementos, descaracterizar-se-á a possibilidade estatal de realização prática de tais direitos. Não obstante a formulação e a execução de políticas públicas dependam de opções políticas a cargo daqueles que, por delegação popular, receberam investidura em mandato eletivo, cumpre reconhecer que não se revela absoluta, nesse domínio, a liberdade de conformação do legislador, nem a de atuação do Poder Executivo. É que, se tais Poderes do Estado agirem de modo irrazoável ou procederem com a clara intenção de neutralizar, comprometendo-a, a eficácia dos direitos sociais, econômicos e culturais, afetando, como decorrência causal de uma injustificável inércia estatal ou de um abusivo comportamento governamental, aquele núcleo intangível consubstanciador de um conjunto irredutível de condições mínimas necessárias a uma existência digna e essenciais à própria sobrevivência do indivíduo, aí, então, justificar-se-á, como precedentemente já enfatizado - e até mesmo por razões fundadas em um imperativo ético-jurídico -, a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, em ordem a viabilizar, a todos, o acesso aos bens cuja fruição lhes haja sido injustamente recusada pelo Estado. Extremamente pertinentes, a tal propósito, as observações de ANDREAS JOACHIM KRELL ("Direitos Sociais e Controle Judicial no Brasil e na Alemanha", p. 22-23, 2002, Fabris): "A constituição confere ao legislador uma margem substancial de autonomia na definição da forma e medida em que o direito social deve ser assegurado, o chamado 'livre espaço de conformação' (...). Num sistema político pluralista, as normas constitucionais sobre direitos sociais devem ser abertas para receber diversas concretizações consoante as alternativas periodicamente escolhidas pelo eleitorado. A apreciação dos fatores econômicos para uma tomada de decisão quanto às possibilidades e aos meios de efetivação desses direitos cabe, principalmente, aos governos e parlamentos. Em princípio, o Poder Judiciário não deve intervir em esfera reservada a outro Poder para substituí-lo em juízos de conveniência e oportunidade, querendo controlar as opções legislativas de organização e prestação, a não ser, excepcionalmente, quando haja uma violação evidente e arbitrária, pelo legislador, da incumbência constitucional. No entanto, parece-nos cada vez mais necessária a revisão do vetusto dogma da Separação dos Poderes em relação ao controle dos gastos públicos e da prestação dos serviços básicos no Estado Social, visto que os Poderes Legislativo e Executivo no Brasil se mostraram incapazes de garantir um cumprimento racional dos respectivos preceitos constitucionais. A eficácia dos Direitos Fundamentais Sociais a prestações materiais depende, naturalmente, dos recursos públicos disponíveis; normalmente, há uma delegação constitucional para o legislador concretizar o conteúdo desses direitos. Muitos autores entendem que seria ilegítima a conformação desse conteúdo pelo Poder Judiciário, por atentar contra o princípio da Separação dos Poderes (...). Muitos autores e juízes não aceitam, até hoje, uma obrigação do Estado de prover diretamente uma prestação a cada pessoa necessitada de alguma atividade de atendimento médico, ensino, de moradia ou alimentação. Nem a doutrina nem a jurisprudência têm percebido o alcance das normas constitucionais programáticas sobre direitos sociais, nem lhes dado aplicação adequada como princípios-condição da justiça social. A negação de qualquer tipo de obrigação a ser cumprida na base dos Direitos Fundamentais Sociais tem como conseqüência a renúncia de reconhecê-los como verdadeiros direitos. (...) Em geral, está crescendo o grupo daqueles que consideram os princípios constitucionais e as normas sobre direitos sociais como fonte de direitos e obrigações e admitem a intervenção do Judiciário em caso de omissões inconstitucionais." (grifei) Todas as considerações que venho de fazer justificam-se, plenamente, quanto à sua pertinência, em face da própria natureza constitucional da controvérsia jurídica ora suscitada nesta sede processual, consistente na impugnação a ato emanado do Senhor Presidente da República, de que poderia resultar grave comprometimento, na área da saúde pública, da execução de política governamental decorrente de decisão vinculante do Congresso Nacional, consubstanciada na Emenda Constitucional nº 29/2000. Ocorre, no entanto, como precedentemente já enfatizado no início desta decisão, que - 14 – INTENSIVO I Disciplina: Direito Administrativo Tema: Aula 03 Prof.: Fernanda Marinela Data: 08/08/2008 se registrou, na espécie, situação configuradora de prejudicialidade da presente argüição de descumprimento de preceito fundamental. A inviabilidade da presente argüição de descumprimento, em decorrência da razão ora mencionada, impõe uma observação final: no desempenho dos poderes processuais de que dispõe, assiste, ao Ministro-Relator, competência plena para exercer, monocraticamente, o controle das ações, pedidos ou recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, legitimando-se, em conseqüência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a praticar. Cumpre acentuar, por oportuno, que o Pleno do Supremo Tribunal Federal reconheceu a inteira validade constitucional da norma legal que inclui, na esfera de atribuições do Relator, a competência para negar trânsito, em decisão monocrática, a recursos, pedidos ou ações, quando incabíveis, estranhos à competência desta Corte, intempestivos, sem objeto ou que veiculem pretensão incompatível com a jurisprudência predominante do Tribunal (RTJ 139/53 - RTJ 168/174-175). Nem se alegue que esse preceito legal implicaria transgressão ao princípio da colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará preservado ante a possibilidade de submissão da decisão singular ao controle recursal dos órgãos colegiados no âmbito do Supremo Tribunal Federal, consoante esta Corte tem reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - AI 159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). Cabe enfatizar, por necessário, que esse entendimento jurisprudencial é também aplicável aos processos de controle normativo abstrato de constitucionalidade, qualquer que seja a sua modalidade (ADI 563/DF, Rel. Min. PAULO BROSSARD - ADI 593/GO, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - ADI 2.060/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO - ADI 2.207/AL, Rel. Min. CELSO DE MELLO - ADI 2.215/PE, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), eis que, tal como já assentou o Plenário do Supremo Tribunal Federal, o ordenamento positivo brasileiro "não subtrai, ao Relator da causa, o poder de efetuar - enquanto responsável pela ordenação e direção do processo (RISTF, art. 21, I) - o controle prévio dos requisitos formais da fiscalização normativa abstrata (...)" (RTJ 139/67, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, julgo prejudicada a presente argüição de descumprimento de preceito fundamental, em virtude da perda superveniente de seu objeto. Arquivem-se os presentes autos. Publique-se. Brasília, 29 de abril de 2004. Ministro CELSO DE MELLO Relator * decisão pendente de publicação - 15 –