Transcript
Espaço
Colisão de partículas pode de fato criar buracos negros, dizem físicos
Agostinho Rosa - 26/01/2010
Uma simulação feita em computador mostra conclusivamente, pela primeira
vez, que uma colisão de partículas realmente pode gerar um buraco negro.
[Imagem: Princeton Physics Department]
LHC e os buracos negros
Você certamente ouviu falar da controvérsia: físicos previram que o LHC
(Large Hadron Collider - Grande Colisor de Hádrons), o gigantesco colisor
de partículas construído na fronteira entre a França e a Suíça, poderia
criar buracos negros microscópicos.
Mas há físicos e físicos. Alguns deles - na verdade, a imensa maioria deles
- afirmam que isto seria uma descoberta fantástica - mas muito improvável
de acontecer.
Os outros físicos, ou os poucos físicos restantes, que não compartilham do
entusiasmo dos seus colegas, temem que esses buracos negros possam devorar
a Terra. Entraram na Justiça e até fizeram uma petição às Nações Unidas
para parar o LHC, mas não conseguiram convencer ninguém.
Isto porque os argumentos contra esses catastrofistas são sólidos.
Segundo a maioria dos cientistas, a destruição da Terra pelos buracos
negros do LHC seria impossível porque, se esses diminutos buracos negros
surgirem de fato, eles decairão rapidamente em partículas ordinárias, não
durando mais do que um nano-nano-nanossegundo.
Nada científico até então
O que é curioso, porém, é que ninguém até hoje jamais havia demonstrado
cientificamente que uma colisão de partículas pode criar um buraco negro,
por mais improvável que isto seja.
Observe que, neste ponto, a comunidade dos físicos e os físicos dissidentes
concordam: os dois grupos consideram válida a suposição de que os buracos
negros microscópicos podem ser criados. A diferença está em que uns acham
que isto seria entusiasmante e os outros acham que seria perigoso.
Mas ninguém provara isso até agora, e tudo não passava de uma suposição.
Isso agora mudou.
Colisão de partículas pode gerar um buraco negro
Matthew Choptuik, da Universidade da Columbia Britânica, no Canadá, e Frans
Pretorius, da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, usaram uma
simulação feita em computador para mostrar conclusivamente, pela primeira
vez, que uma colisão de partículas realmente pode gerar um buraco negro.
Instantâneos das novas simulações que mostram que duas partículas que
colidem podem de fato criar um buraco negro, o círculo negro no último
quadro. [Imagem: Frans Pretorius/Princeton]
Utilizando centenas de computadores, Choptuik e Pretorius calcularam as
interações gravitacionais entre as partículas que colidem (eles utilizaram
sólitons) e descobriram que um buraco negro irá se formar se duas
partículas colidirem com uma energia total de cerca de um terço da energia
de Planck.
Esta comprovação não muda em nada a discussão sobre o eventual fim do mundo
causado por buracos negros que engoliriam a Terra. Ninguém passa a ter mais
razão ou menos razão porque os dois grupos já partiam do pressuposto de que
havia a possibilidade de geração dos buracos negros.
Mas a descoberta tem implicações importantes para os trabalhos do LHC e
abre inclusive a possibilidade de que sejam descobertas novas dimensões do
Universo.
Como se forma um buraco negro
O elemento essencial para o nascimento de um buraco negro é a compressão de
uma quantidade suficiente de massa ou de energia em um volume
suficientemente pequeno, como acontece quando uma estrela muito grande
colapsa sobre si mesma.
Duas partículas podem criar um minúsculo buraco negro exatamente desta
mesma forma, desde que elas colidam com uma energia acima de um limite
fundamental chamado energia de Planck. [Imagem: Princeton Physics
Department]
Segundo a Teoria da Relatividade Geral de Einstein, a massa e a energia
deformam o espaço e o tempo - considerados por ele como sendo uma entidade
única, o espaçotempo - para criar o efeito que percebemos como sendo a
força da gravidade.
Se uma massa ou energia grandes o suficiente forem comprimidas em um espaço
pequeno o suficiente, essa deformação do espaçotempo se torna descomunal,
gerando uma gravidade tão forte que nem mesmo a luz consegue escapar dela.
O objeto compactado torna-se assim um buraco negro.
E os buracos negros do LHC?
O que a simulação computadorizada de Choptuik e Pretorius demonstrou é que
duas partículas podem criar um minúsculo buraco negro exatamente desta
mesma forma, desde que elas colidam com uma energia acima de um limite
fundamental chamado energia de Planck.
Isto significa que o LHC vai produzir buracos negros?
Não necessariamente.
Isto porque, segundo os físicos, a energia de Planck é um quintilhão de
vezes maior do que a energia máxima que o LHC conseguirá atingir.
Mas há possibilidades.
Alguns teóricos preveem a existência de dimensões extras no Universo. Mesmo
sendo minúsculas, essas dimensões extras, se existirem, podem efetivamente
baixar a energia de Planck por um fator gigantesco, tornando a criação dos
buracos negros microscópicos uma possibilidade alcançável pelas colisões
que acontecerão dentro do LHC.
Dimensões extras do Universo
Em vez de algum tipo de apocalipse, poderemos ver o fim do mundo como o
concebemos até hoje, e ver nascer um novo mundo repleto de novas dimensões,
de novos horizontes e de novas possibilidades de descobertas. [Imagem:
Princeton Physics Department]
Ou seja, se, em vez de ser tridimensional como nossos sentidos nos dizem, o
espaço realmente tiver mais dimensões, o LHC poderá de fato produzir
buracos negros.
Segundo as hipóteses que defendem a existência dessas dimensões extras,
elas também são microscópicas e devem estar curvadas em loops pequenos
demais para serem detectados, exceto por uma colisão de partículas de alta
energia.
Isso, contudo, não dá qualquer reforço aos argumentos dos catastrofistas:
se existirem as dimensões extras, e se a energia do LHC for suficiente para
atiçar seus efeitos, e se esses efeitos baixarem a energia de Planck, e se
os buracos negros microscópicos forem formados, ainda assim, afirmam os
físicos, eles deverão decair em alguns nano-nano-nanossegundos.
Ou seja, talvez o mundo possa mesmo acabar, não de fato, mas como uma
metáfora - em vez de algum tipo de apocalipse, poderemos ver o fim do mundo
como o concebemos até hoje, e ver nascer uma nova concepção de mundo,
repleta de novas dimensões, de novos horizontes e de novas possibilidades
de descobertas. Seria mesmo entusiasmante.
Bibliografia:
Ultra Relativistic Particle Collisions
Matthew W. Choptuik, Frans Pretorius
Physical Review Letters
http://arxiv.org/PS_cache/arxiv/pdf/0908/0908.1780v1.pdf