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CÉLULA A COMBUSTÍVEL POR ÓXIDO DE ZIRCÔNIO
Marcelo M. Kamada
Universidade Federal do Paraná
Centro Politécnico – Jd. das Américas – 81531-990 – Curitiba – PR - Brasil
e-mail:
[email protected]
Resumo. As células a combustível surgem como uma fonte alternativa de
energia. Pesquisas estão sendo feitas no momento pra aprimorá-las. Serão
apresentados conceitos do zircônio e das células a combustível. Existem
quatro tipos de células a combustível, mas haverá enfoque no grupo dos
óxidos sólidos (SOFC), onde é utilizado o óxido de zircônio, o qual fornece
energia elétrica e térmica através de processos por altas temperaturas.
Palavras chave: células a combustível, óxido de zircônio, energia.
Introdução
Será apresentada a célula a combustível, uma fonte alternativa de
obtenção de energia. Terá o conhecimento do funcionamento, dos tipos de
células e suas características, do histórico e do desenvolvimento no
Brasil.
Também haverá uma explicação sobre o óxido de zircônio e o próprio
zircônio, um elemento não muito conhecido, mas que é uma parte fundamental
(o eletrólito) no grupo dos óxidos sólidos, um tipo de célula a
combustível.
Desenvolvimento
Elemento Zircônio
O elemento Zircônio (do francês zircon, zircão), é um metal duro, de
cor branca com tom acinzentada brilhante e resistente a corrosões. Possui
símbolo "Zr", número atômico 40, massa atômica 91u e integra o grupo 4B da
tabela periódica.
Figura 1 - Aparência do elemento Zircônio
Pode entrar em combustão espontaneamente em contato com a atmosfera.
O ar reage antes com o nitrogênio que com o oxigênio, especialmente em
altas temperaturas. É um metal resistente a meios ácidos.
Não é encontrado puro na natureza, mas pode ser obtido através de
minerais, principalmente do silicato de zircônio (ZrSiO4) e do badeleyita
(ZrO2). Ambos são facilmente encontrados em reservas na Austrália, Brasil,
Índia, Rússia e Estados Unidos.
O metal é obtido principalmente de uma cloração redutiva, através de
um processo denominado Kroll.
Óxido de Zircônio
O óxido de zircônio tem aplicações na fabricação de utensílios de
laboratório, os quais suportam mudanças bruscas de temperaturas, nos
revestimentos de fornos e como material refratário em indústrias cerâmicas
e de vidro. Também é empregado em trocadores de calor, tubos de vácuo e
filamentos de lâmpadas.
O óxido de zircônio se usa em joalherias. É uma gema artificial
denominada zirconita, a qual imita a aparência do diamante verdadeiro.
A zircônia (pó) pode ser obtida através de processos com óxido de
ítrio, através de oito etapas. São elas:
1a Etapa: Pesagem e ataque químico. O concentrado OTR (óxido de ítrio e
terras raras) foi misturado com HCl, e aquecido ( 100°C) para a formação de
cloretos.
2a Etapa: Preparo de uma solução aquosa com concentração de 20% (em massa)
em cloretos (TR,Y)Cl3 e ZrOCl2.8H2O.
3a Etapa: Co-precipitação. Ocorreu a precipitação da zircônia hidratada.
Utilizou-se hidróxido de amônia (NH4OH) como agente precipitante.
4a Etapa: Lavagem. Após a precipitação iniciou-se uma série de cinco
lavagens com água destilada, seguidas de cinco com álcool etílico
objetivando, principalmente, a retirada dos íons Cl-. A separação da
precipitação é feita através de centrifugação. Mais três lavagens com
álcool isopropílico para retirar indícios de água.
5a Etapa: Secagem. Usa-se um roto-evaporador em vácuo a 50 °C.
6a Etapa: Calcinação. Utiliza forno resistivo em 400ºC durante meia hora.
7a Etapa: Tratamento térmico. Utiliza forno resistivo em 1400 °C, por 3
horas.
8a Etapa: Caracterização. Realiza-se análise química através de
espectrometria de emissão atômica via plasma indutivamente acoplado
(ICP/AES). Como produto obtém o pó seco de zircônia, e assim, poder formar
eletrólitos sólidos.
Células a Combustível
As células a combustível (CaC) são baterias, as quais convertem
energia química diretamente em energia elétrica e térmica. Elas possuem uma
operação contínua devido à alimentação constante de um combustível.
A conversão ocorre por meio de duas reações químicas parciais em dois
eletrodos separados por um eletrólito: a oxidação (H2) de um combustível no
ânodo e a redução de um oxidante (O2) no cátodo.
Na célula a combustível ocorre a formação de água e a produção de
água, além da liberação de elétrons livres, que podem gerar trabalho
elétrico. Os prótons gerados na reação anódica são conduzidos pelo
eletrólito até o cátodo, onde se ligam aos ânions oxigênio O2 -, formando
água.
Figura 2 – Tabela comparativa entre a tecnologia adotada para obtenção de
energia.
Estrutura
A membrana polimérica de uma célula a combustível possui espessura
entre 12 e 210 µm, sendo o principal elemento responsável pela
condutibilidade de prótons, oferece também uma barreira adequada a mistura
do gás do combustível e do reagente.
Os eletrodos do anodo e do catodo de uma célula a combustível tipo
PEM possuem espessuras entre 250 e 450 µm. Seu material é composto por um
condutor elétrico poroso, que possui a função de realizar a difusão gasosa
do hidrogênio e oxigênio.
A camada difusora é pequena espessura, localizada entre o catalisador
e as placas bipolares. Tem como funções: Encaminhamento do gás do reagente
diretamente ao catalisador, retirada da água da célula a combustível,
conexão elétrica entre o catalisador e a placa bipolar e condução do calor
gerado nas reações químicas.
Condução
Ocorre a inserção do gás hidrogênio (H2) no ânodo da CaC e o mesmo
entra em contato com o catalisador e com a membrana (eletrólito), ocorre a
separação de sua molécula, gerando íons de (H+) e dois elétrons livres, no
qual os íons atravessam a membrana. E os elétrons passam pelo condutor de
um circuito externo, onde executam trabalho útil na carga. Pelo cátodo da
CaC é inserido o gás oxigênio (O2), que no mesmo processo do hidrogênio, é
quebrado em íons de oxigênio (O-), porém absorve um elétron, gerando uma
diferença de potencial entre os dois pólos da célula. Os íons de
hidrogênio, que passaram pela membrana, combinam com os íons de oxigênio,
gerando como resultado final o subproduto água.
Figura 3 – Ilustração do diagrama esquemático de uma célula a combustível.
Rendimento
Diferentemente dos motores de combustão, os quais têm sua eficiência
teórica (máxima) determinada pelo ciclo de Carnot, a eficiência teórica das
células de combustível é dada pelo quociente entre a energia livre da
reação ((G) e a entalpia da reação ((H), segundo a equação: n = (G / (H
Figura 4 – Dependência do rendimento teórico com a temperatura da conversão
eletroquímica do hidrogênio no ciclo de Carnot e do metano na eficiência da
CaC.
Princípio de Funcionamento
A seguir será descrito o funcionamento de uma célula a combustível por
óxido sólido.
São como baterias de funcionamento contínuo. Produz corrente contínua
pela combustão eletroquímica a frio de um combustível gasoso (H2).
O H2 é oxidado a prótons num eletrodo de difusão gasosa, liberando
elétrons. Já o O2 é reduzido. Esse processo é descrito pelas reações:
H2 = 2 H+ + 2 e- O²- = ½ O2 + 2 e-
No eletrodo oposto, também por difusão gasosa, tem-se a reação,
considerando a membrana trocadora de prótons.
2 H+ + ½ O2 = H2O + 2 e-
E a reação global fica:
H2 + ½ O2 = H2O
Figura 5 – Diagrama esquemático do funcionamento e das reações das células
a combustível de óxidos sólidos, utilizando eletrólitos condutores de íons
de oxigênio.
Histórico
O conceito de células a combustível existe há mais de 150 anos. É
atribuída a paternidade da "célula a combustível" ao Sir William Grove,
através de experimentos sobre a eletrólise da água.
A primeira célula a combustível bem sucedida aconteceu devido às
descobertas do engenheiro Francis Bacon, em 1932. Mas problemas técnicos
adiaram a sua realização até 1959.
No final dos anos 50, a NASA precisou pensar em geradores de
eletricidade para missões espaciais. O projeto Apollo e as missões
espaciais Shuttle, fizeram uso das células a combustível.
Tipos de Células a Combustível
São conhecidos 5 tipos de células a combustível, são eles:
PEMFC (proton exchange membran fuel cell – célula a combustível com
membrana para troca de próton). Tem como eletrólito o polímero (próton) e
sua faixa de temperatura é de 20ºC a 120ºC. Suas vantagens: alta densidade
de potência, operação flexível, mobilidade. Suas desvantagens: custo da
membrana e catalisador, contaminação do catalisador com monóxido de
carbono. Suas aplicações: veículos automotores, espaçonaves, unidades
estacionárias.
PAFC (phosphoric acid fuel cell – célula a combustível de ácido
fosfórico). Tem como eletrólito o próton e sua faixa de temperatura é de
160oC a 220oC. Seu maior desenvolvimento tecnológico é a tolerância ao CO
(monóxido de carbono). Suas desvantagens: controle de porosidade do
eletrodo, eficiência limitada pela corrosão. Suas aplicações: unidades
estacionárias, geração de calor.
MCFC (Molten carbonate fuel cell – célula a combustível de carbonato).
Tem como eletrólito os carbonatos fundidos e sua faixa de temperatura é de
550oC a 660oC. Suas vantagens: tolerância ao monóxido e ao dióxido de
carbono e utilizar eletrodos de níquel. Suas desvantagens: corrosão do
cátodo, interface trifásica de difícil controle. Suas aplicações: unidades
estacionárias, co-geração de eletricidade e calor.
AFC (alcalline fuel cell – célula a combustível de alcalinos). Tem
como eletrólito o óxido de potássio (KOH) e sua faixa de temperatura é de
60ºC a 90ºC. Sua vantagem: a alta eficiência, por volta dos 83%. Suas
desvantagens: sensibilidade ao dióxido de carbono (CO2), utilização de
gases ultra puros, inviabilizando a reforma do combustível. Suas
aplicações: espaçonaves e aplicações militares.
E finalmente o tipo mais relevante desse trabalho:
SOFC (solid oxid fuel cell – célula de combustível de óxido sólido).
Tem como eletrólito a zircônia (ânion oxigênio) e sua faixa de temperatura
é de 800oC a 900oC. Suas vantagens: Alta eficiência (cinética favorável).
Suas desvantagens: problemas de materiais, expansão térmica (altas
temperaturas). Suas aplicações: unidades estacionárias, co-geração de
eletricidade e calor.
Células de Alta Temperatura de Operação
Dois tipos de células a combustível são representantes desse grupo:
MCFC e a SOFC.
Tem como benefícios a facilidade de gerenciamento do eletrólito (SOFC)
e a não necessidade do uso de metais nobres como catalisadores. Também
possuem maiores valores de eficiência teórica de conversão, e têm uma alta
capacidade de co-produção eletricidade/calor.
A elevada temperatura de operação favorece a cinética das reações nos
eletrodos e permite a reforma do combustível (por exemplo: gás natural ou
hidrocarbonetos) no próprio corpo da célula.
Sistemas energéticos baseados em células combustíveis cerâmicas (SOFC)
podem ser de operações simples e mais eficientes que os demais tipos.
Outra característica relevante é o fato de que todos os seus
componentes são sólidos, podendo-se utilizar processos de fabricação em
camadas finas e compactas, com configurações flexíveis, aumentando desta
forma o desempenho deste tipo de célula em particular.
As altas temperaturas proporcionam às células de óxido sólido a
capacidade de co-geração de eletricidade e calor para movimentar turbinas
industriais, sistemas de calefação e para esquentar, por exemplo, caldeiras
industriais e caseiras.
As células de óxido sólido podem ser construídas para altas potências,
no nível de megawatts, inclusive para ajustar o desnível provocado por
grandes indústrias nas horas de pico de demanda de energia elétrica,
impedindo a variação brusca que acontece principalmente no final da tarde,
quando o uso é maior. A própria indústria automobilística estuda a
utilização desse tipo de célula para ocupar o lugar das baterias e para
suprir de energia os equipamentos de ar-condicionado.
Células a Combustível no Brasil
Em meados de 1998 iniciou-se no IPEN/CNEN-SP um projeto institucional
de caráter acadêmico e tecnológico em células combustíveis, segmentado em
dois grupos: PEMFC, com a colaboração da Universidade Técnica de Darmstadt,
na Alemanha e SOFC, destinado ao Departamento de Engenharia e Ciência dos
Materiais do IPEN-SP, com colaboração do Riso National Laboratory, na
Dinamarca.
Em 2001, projeto entre ONU e governo brasileiro (Ministério de Minas e
Energia) na criação da "Estratégia Ambiental para Energia: Ônibus com
Célula a Combustível a Hidrogênio para o Brasil". Esse projeto visa à
implantação da tecnologia de células a combustível em um sistema de
transporte coletivo, com objetivo de ser não poluente e econômico.
Por enquanto a utilização das células a combustível no Brasil está em
fase de testes e pesquisas.
Conclusão
As células a combustível se apresentam como uma excelente fonte
alternativa de energia.
A atual situação energética global demonstra a dependência pela
energia elétrica, evidenciando a importância do uso racional da energia e
da redução de poluentes em sua produção.
A utilização de hidrogênio como fonte de geração de energia elétrica
nas células a combustível proporciona um aproveitamento inesgotável e
produz energia elétrica sem poluição. Mas há alguns empecilhos na
manipulação do H2: o fato dele ser inflamável, exigindo grandes sistemas de
conteção, a obtenção do mesmo, podendo recorrer a meios poluentes, e seu
armazenamento, pois o hidrogênio ocupa grande espaço e rende pouco.
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