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Campo Eletromagnético

Livro de electromagnetismo II

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ˆ LUC´ILIA BRITO • MANUEL FIOLHAIS • CONSTANC ¸ A PROVIDENCIA CAMPO ´ ELECTROMAGNETICO CAP´ITULO 1 ˜ INTRODUC ¸ AO ´ A par da Mecˆanica e da Termodinˆamica, o Electromagnetismo (incluindo a Optica) constitui um ramo da F´ısica Cl´assica. Desenvolveu-se, como disciplina independente, a partir do s´eculo xviii, embora s´o tenha ficado estabelecido como corpo coerente de doutrina no s´eculo xix. Fica a dever-se a Maxwell a formula¸c˜ ao sint´etica das leis que regem os fen´omenos electromagn´eticos, o que ´e reconhecido como um dos feitos mais admir´aveis da hist´oria da F´ısica. A este respeito recordem-se as seguintes palavras de Feynman retiradas das suas famosas Lectures on Physics: Vista a Hist´ oria do Homem daqui a muito tempo, digamos daqui a dez mil anos, n˜ ao restam muitas d´ uvidas sobre o facto de maior significado no s´eculo xix — a descoberta de Maxwell das leis do Electromagnetismo. A Guerra Civil na Am´erica ser´ a reduzida a uma mera quest˜ ao provinciana comparada com aquela descoberta cient´ıfica que data da mesma d´ecada. Seria fastidioso referir o impacte que o Electromagnetismo teve e continua a ter no desenvolvimento das sociedades, referindo os in´ umeros aspectos onde a sua importˆancia ´e manifesta. Basta, t˜ao-s´o, mencionar que este ramo da F´ısica est´a na base de todo o sistema de telecomunica¸c˜oes que se tornou de capital importˆancia em todos os sectores da vida moderna. 1.1 ´ O ELECTROMAGNETISMO CLASSICO E A F´ISICA MODERNA Referimo-nos habitualmente `a teoria de Maxwell como sendo o Electromagnetismo Cl´assico. Mas, apesar de “cl´assica”, tal teoria continha o g´ermen do que se designa habitualmente por F´ısica Moderna. Desde logo, a teoria de Maxwell representou um primeiro passo no sentido da unifica¸c˜ ao das for¸cas fundamentais da natureza. Tal unifica¸c˜ ao ´e um dos t´opicos da fronteira do conhecimento cient´ıfico neste virar de s´eculo. 2 • ´tico Campo electromagne Na verdade, os f´ısicos procuram hoje entender as interac¸c˜ oes fundamentais entre part´ıculas elementares com base numa u ´nica for¸ca, a qual, em regimes diferentes de energia, pode assumir formas diversificadas. Para energias relativamente baixas, correspondentes `as situa¸c˜ oes em que desenvolvemos as nossas vidas, distinguem-se quatro for¸cas fundamentais: a for¸ca electromagn´etica, que se exerce entre quaisquer duas part´ıculas com carga el´ectrica; a for¸ca fraca, que se manifesta ao n´ıvel dos constituintes dos n´ ucleos at´omicos e que ´e respons´avel, entre outros processos, pela desintegra¸c˜ao β; a for¸ca forte (a mais intensa das for¸cas fundamentais), que governa a interac¸c˜ao entre quarks, embora, mais prosaicamente, ela seja habitualmente referida como a for¸ca respons´avel pela estabilidade do agregado nuclear; e a for¸ca gravitacional, de todos bem conhecida, `a qual est˜ao sujeitas todas as part´ıculas. As for¸cas el´ectrica, fraca e forte, hoje “unificadas” numa for¸ca u ´nica, formam, conjuntamente com as part´ıculas elementares (seis quarks e seis lept˜oes), o chamado modelo-padr˜ao da F´ısica de Part´ıculas. A unifica¸c˜ao significa que as for¸cas, tal como as conhecemos, s˜ao diferentes manifesta¸c˜ oes de uma for¸ca mais fundamental, manifesta¸c˜ oes essas determinadas por factores de circunstˆancia como seja, por exemplo, a temperatura da mat´eria. Para temperaturas muit´ıssimo elevadas, superiores a 1027 K, n˜ao se distinguiria entre a for¸ca electromagn´etica, a for¸ca fraca e a for¸ca forte, pois teriam todas a mesma intensidade. ´ justamente um mero factor circunstancial que separa, de facto, a Electricidade do MagE netismo. Para melhor se entender esta afirma¸c˜ ao, suponhamos que uma carga el´ectrica est´a em repouso num determinado referencial, criando um campo el´ectrico. Se essa carga estiver em movimento, produz-se uma corrente que, por sua vez, ´e a fonte de um campo magn´etico. Assim, o car´acter do campo produzido (el´ectrico ou magn´etico) depende apenas de a carga estar em repouso ou em movimento e, portanto, do referencial de onde o sistema est´a a ser observado. Serve este exemplo para mostrar que a distin¸c˜ ao entre campos el´ectricos e magn´eticos ´e meramente formal. O Electromagnetismo Cl´assico ´e a teoria unificada de fen´omenos aparentemente t˜ao diversos como os el´ectricos e os magn´eticos. Para temperaturas da ordem de 1015 K e superiores desaparece a distin¸c˜ao entre o campo electromagn´etico e o campo fraco e a interac¸c˜ ao resultante designa-se por electro-fraca. No laborat´orio, embora em regi˜oes do espa¸co muito localizadas e apenas por per´ıodos de tempo muito curtos, j´a se consegue obter essas temperaturas, que ocorreram nos primeiros instantes do Universo. Por seu lado, as temperaturas para as quais as interac¸c˜oes forte e electro-fraca se tornariam indistingu´ıveis n˜ao s˜ao actualmente alcan¸c´aveis. Quanto `a unifica¸c˜ ao “final” da interac¸c˜ ao gravitacional com as outras, subsistem, mesmo em aspectos te´oricos, problemas muito s´erios — n˜ao se sabe ainda, em definitivo, qual ´e a “simetria” subjacente `a interac¸c˜ ao u ´nica. Em resumo, o Electromagnetismo Cl´assico, ao revelar-se como uma teoria unificadora de duas for¸cas diferentes, foi precursor das ideias desenvolvidas neste s´eculo sobre a unifica¸c˜ ao das for¸cas fundamentais da natureza. Al´em disso, o Electromagnetismo Cl´assico revelou aspectos f´ısico-matem´ aticos que levaram `a formula¸c˜ao de uma nova mecˆanica — a Mecˆanica Relativista — no alvor do nosso s´eculo. A quest˜ao era bem simples: enquanto as leis da Mecˆanica Cl´assica ficavam invariantes sob transforma¸c˜oes de Galileu, o mesmo n˜ao acontecia com as equa¸c˜ oes de Maxwell. N˜ao fossem as sucessivas e brilhantes comprova¸c˜ oes experimentais das leis do electromagnetismo, culminando com a produ¸c˜ao e a recep¸c˜ ao das ondas hertzianas, n˜ao seria dif´ıcil admitir a possibilidade de, pelo menos, se tentar reformular a teoria, procurando lev´a-la a uma formula¸c˜ao que fosse invariante quanto a transforma¸c˜ oes de Galileu. Contudo, os factos experimentais e (porque n˜ao admiti-lo?) a beleza das pr´oprias equa¸c˜ oes de Maxwell acabariam por impor uma reforma da Mecˆanica, ciˆencia j´a ent˜ ao secular e que ˜o Introduc ¸a • 3 tantas e t˜ao boas provas tinha dado e continuava a dar. Verificava-se que as equa¸c˜ oes do Electromagnetismo Cl´assico, ou mais precisamente, a equa¸c˜ ao de propaga¸c˜ ao de uma onda electromagn´etica, ficava invariante perante uma classe de transforma¸c˜ oes esp´acio-temporais conhecidas por transforma¸c˜oes de Lorentz. Seria afinal esta simetria que haveria de ser incorporada nas leis da Mecˆanica (para al´em das simetrias de transla¸c˜ ao e de rota¸c˜ ao), dando origem `a Teoria da Relatividade. At´e agora fal´amos de dois aspectos altamente merit´orios do Electromagnetismo Cl´assico que tiveram grande repercuss˜ao na F´ısica Moderna. Falemos tamb´em daqueles aspectos que, sendo negativos do ponto de vista do confronto com os factos experimentais, acabariam por ser cruciais para o desenvolvimento da F´ısica do nosso s´eculo. Assim, o Electromagnetismo Cl´assico revelou-se inadequado quando se pretendeu explicar o espectro de um corpo negro. De facto, a teoria cl´assica previa intensidades da radia¸c˜ ao electromagn´etica irremediavelmente crescentes para pequenos comprimentos de onda (o que ficou conhecido por “cat´astrofe do ultra-violeta”). Tal d´ebˆ acle viria a ser resolvida por Planck, que usou o conceito de quantum — quantidade m´ınima de energia de radia¸c˜ ao electromagn´etica de determinada frequˆencia —, o que permitiu explicar cabalmente o espectro de radia¸c˜ ao do corpo negro. A plausibilidade de uma tal teoria “quˆantica” era ent˜ ao, como ´e evidente, puramente fenomenol´ogica. Numa outra situa¸c˜ao de interac¸c˜ao da radia¸c˜ ao com a mat´eria — o efeito fotoel´ectrico — voltaria a verificar-se a impossibilidade da sua explica¸c˜ ao `a luz do Electromagnetismo Cl´assico. Foi Einstein quem avan¸cou com a explica¸c˜ ao do fen´omeno, utilizando a mesma ideia de quantum proposta por Planck, para concluir que, independentemente da intensidade da fonte de luz, se a sua frequˆencia n˜ao fosse igual ou superior a um certo valor que dependia do metal que se estava a usar na experiˆencia, nunca poderia haver emiss˜ao de electr˜oes por parte deste. O quantum ficava definitivamente a pertencer `a linguagem da F´ısica Moderna, tornando-se num dos seus mais fecundos conceitos. Uma outra dificuldade (embora, esta, aparente) com o Electromagnetismo Cl´assico surgiu quando, tamb´em no in´ıcio do s´eculo xx, se tornou necess´ario conceber modelos para a estrutura do ´atomo. J. J. Thomson propˆos um modelo engenhoso segundo o qual o ´atomo seria uma esfera com uma distribui¸c˜ ao uniforme de carga positiva, estando as part´ıculas de carga negativa — os electr˜oes — dispostas em circunferˆencias no seu interior. Os electr˜oes estariam igualmente espa¸cados e as circunferˆencias podiam ser mesmo em n´ umero superior a um. Aplicando a Mecˆanica e a Electrodinˆamica Cl´assica, este modelo era capaz de explicar algumas riscas dos espectros de emiss˜ao dos ´atomos, podendo mesmo ser considerado a teoria cl´assica do ´atomo. O modelo revelou-se, por´em, totalmente incapaz de explicar os resultados da c´elebre experiˆencia de Rutherford de dispers˜ao de part´ıculas α e β, pelo que teve de ser abandonado. Mas o modelo at´omico de Rutherford e o modelo, mais quantitativo, de Bohr eram absolutamente incompat´ıveis com as leis de Maxwell! Os electr˜oes, descrevendo ´orbitas circulares em torno do n´ ucleo, perderiam energia, pois radiavam constantemente e acabariam por cair nele. O grande sucesso do modelo planet´ario de Bohr na explica¸c˜ ao dos espectros dos ´atomos hidrogen´oides seria um primeiro passo para se encontrar a explica¸c˜ ao da estabilidade at´omica (n˜ao pondo afinal em causa a lei de Coulomb), no contexto de uma nova mecˆanica — a Mecˆanica Quˆantica, formulada na d´ecada de 20. No final dessa mesma d´ecada, Dirac desenvolveu uma teoria quˆantica relativista para o electr˜ao. A interac¸c˜ ao da luz com a mat´eria ou, dito de outra maneira, a interac¸c˜ao da luz com a nuvem electr´onica que rodeava os n´ ucleos at´omicos, deveria ser tratada no quadro da nova teoria quˆantica. Essa teoria — a Electrodinˆamica Quˆantica (em inglˆes QED, de Quantum Electrodynamics) — come¸cou de facto a ser desenvolvida nos u ´ltimos anos da d´ecada de 20 mas os resultados revelaram-se insatisfat´orios. Diz Feynman no seu livro QED — a Estranha Teoria da Luz e da Mat´eria a respeito desta situa¸c˜ ao: 4 • ´tico Campo electromagne [...] Se se calculasse algo aproximadamente, [a teoria] daria uma resposta razo´ avel; se se tentasse calcular a mesma coisa mas com mais rigor, verificava-se que a correc¸c˜ ao que se pensava ser pequena (o n´ umero seguinte numa s´erie convergente, por exemplo) era, de facto, muito grande — na realidade era infinita —, de maneira que resultou que, na pr´ atica, n˜ ao se podia calcular nada para al´em de uma certa precis˜ ao. A situa¸c˜ao viria a ficar esclarecida depois dos trabalhos de Schwinger, Tomonaga e do pr´oprio Feynman, que inventaram o m´etodo de calcular propriedades f´ısicas no quadro da teoria quˆantica relativista da luz em interac¸c˜ ao com a mat´eria. Claro que n˜ao cabe aqui fazer mais do que esta breve alus˜ao `a QED, que ´e, sessenta anos depois da sua formula¸c˜ ao, a teoria f´ısica com comprova¸c˜ao experimental mais rigorosa: h´a quantidades para as quais o valor ` previsto pela QED concorda em mais de dez d´ıgitos com o respectivo valor experimental. A luz dessa teoria, a interac¸c˜ao entre duas cargas el´ectricas ´e vista como o resultado da permuta de fot˜oes — as part´ıculas (ou quanta) de campo. Os fot˜oes s´o interagem com as cargas el´ectricas, podendo ser por estas emitidos e absorvidos, mas n˜ao interagem directamente consigo mesmos. Teorias algo parecidas com a QED, embora formuladas em espa¸cos mais gerais e abstractos, e tendo subjacentes outras classes de simetria, est˜ao na base do modelo-padr˜ao da F´ısica de Part´ıculas a que j´a fizemos referˆencia anteriormente. Por exemplo, a for¸ca forte, tamb´em chamada for¸ca de cor, tem muitas analogias com a for¸ca electromagn´etica, embora a teoria daquela seja mais complexa por envolver cargas de trˆes tipos (cores) e as part´ıculas de campo (glu˜oes) poderem interagir consigo mesmas. Na QED h´a um s´o tipo de part´ıculas de campo (fot˜oes), ao passo que na QCD (do inglˆes Quantum Chromodynamics) as part´ıculas de campo s˜ao de oito tipos diferentes. Existem, pois, oito campos “cromo-el´ectricos” e oito campos “cromo-magn´eticos”, mas muitos dos conceitos da Electrodinˆamica Quˆantica aplicam-se, mutatis mutantis, na Cromodinˆamica Quˆantica. Aprender electromagnetismo significa tamb´em adquirir as bases necess´arias `a abordagem de outras teorias f´ısicas, na realidade mais complexas, mas que fazem uso de um conjunto de conceitos que s˜ao origin´arios do Electromagnetismo. 1.2 ESTRUTURA CONCEPTUAL DO LIVRO No Electromagnetismo Cl´assico, um dos problemas fundamentais que importa considerar ´e o da determina¸c˜ao de campos el´ectricos e magn´eticos a partir de distribui¸c˜ oes de cargas e de correntes conhecidas. A presente obra pressup˜oe que o leitor conhe¸ca os m´etodos e t´ecnicas b´asicas de determina¸c˜ao dos campos a partir das suas fontes (cargas e correntes) no vazio. No entanto, e no sentido de procurar tornar a leitura mais c´omoda, evitando ao m´aximo a necessidade de remeter o leitor para outras obras, inclu´ımos um cap´ıtulo de revis˜ao destes assuntos. Assim, no Cap´ıtulo 2 apresenta-se, de uma forma necessariamente breve, o conjunto de conceitos e leis b´asicas do Electromagnetismo. Esses conceitos e leis s˜ao, por vezes, apresentados sem qualquer dedu¸c˜ao (como a lei de Gauss ou a for¸ca de Lorentz), embora sejam ilustrados com exemplos, que se apresentam ao longo do texto, e com problemas resolvidos, que se apresentam no final do cap´ıtulo. Tamb´em nos cap´ıtulos seguintes se inclui sempre um conjunto de problemas resolvidos que ajudam a uma melhor compreens˜ao de todo o formalismo. Um dos objectivos do Cap´ıtulo 2 ´e obter as equa¸c˜ oes de Maxwell no vazio. O electromagnetismo em meios materiais ´e um assunto cujo tratamento fica para mais tarde. Os cap´ıtulos 3 a 6 referem-se exclusivamente `a electrost´atica. No Cap´ıtulo 3 come¸ca-se por obter a energia de uma distribui¸c˜ ao de cargas est´aticas. Esta energia ´e aqui apresentada ˜o Introduc ¸a • 5 como o trabalho que um agente externo tem de realizar para construir essa distribui¸c˜ ao a partir de uma situa¸c˜ao inicial em que as cargas est˜ao infinitamente afastadas. Na sequˆencia deste estudo, aborda-se o problema das for¸cas em condutores carregados em equil´ıbrio electrost´atico. O Cap´ıtulo 4 ´e dedicado ao desenvolvimento em multipolos do potencial escalar. Para facilitar a abordagem do assunto estuda-se primeiro o dipolo e o quadrupolo linear, focando as caracter´ısticas do potencial e do campo el´ectrico produzidos por estes sistemas. Apresentamse alguns exemplos que ilustram a utilidade do desenvolvimento multipolar. Trata-se tamb´em a quest˜ao da energia de interac¸c˜ao de uma distribui¸c˜ ao de cargas (com ou sem caracter´ısticas multipolares bem definidas) com um campo externo. O Cap´ıtulo 5 ´e dedicado ao estudo do campo electrost´atico em meios diel´ectricos. A apresenta¸c˜ao ´e feita com bastante pormenor, pois um formalismo idˆentico ´e aplicado, embora com algumas modifica¸c˜oes, ao estudo dos campos magn´eticos em meios magn´eticos (Cap´ıtulo 8). Introduzem-se os conceitos de polariza¸c˜ ao e de campo deslocamento el´ectrico, classificamse os diel´ectricos e determina-se a energia armazenada no campo electrost´atico quando h´a meios diel´ectricos. Consideram-se depois as for¸cas sobre diel´ectricos e obtˆem-se campos el´ectricos em cavidades no interior de diel´ectricos. Por fim, analisam-se as caracter´ısticas das constantes diel´ectricas de substˆancias como gases e l´ıquidos apolares e polares. No Cap´ıtulo 6 estuda-se a equa¸c˜ ao de Laplace. Apresenta-se o m´etodo das imagens e deduzem-se v´arias solu¸c˜oes particulares dessa equa¸c˜ ao em coordenadas cartesianas, cil´ındricas e esf´ericas. Ilustram-se as t´ecnicas apresentadas com v´arios exemplos com distribui¸c˜ oes de cargas no vazio, `a superf´ıcie de condutores e em diel´ectricos. Os cap´ıtulos 7 e 8 s˜ao dedicados ao magnetismo. No Cap´ıtulo 7 estuda-se a energia armazenada no campo magn´etico e faz-se o desenvolvimento em multipolos do potencial vector (seguindo, de perto, o procedimento utilizado no Cap´ıtulo 4). No Cap´ıtulo 8 trata-se a quest˜ao do magnetismo em meios materiais. A propaga¸c˜ao do campo electromagn´etico no vazio e em meios materiais ´e o assunto abordado no Cap´ıtulo 9. No que diz respeito aos meios materiais, estuda-se a propaga¸c˜ ao em meios diel´ectricos e magn´eticos e tamb´em em meios condutores. Obtˆem-se as leis da reflex˜ao e da refrac¸c˜ao e estuda-se ainda a propaga¸c˜ ao do campo electromagn´etico em guias de ondas. O Cap´ıtulo 10 ´e dedicado ao Electromagnetismo e `a Teoria da Relatividade. No sentido de facilitar a leitura, faz-se uma breve introdu¸c˜ ao a aspectos da cinem´atica e da dinˆamica relativista e ao c´alculo tensorial no espa¸co de Minkowski. Constr´oi-se o tensor do campo electromagn´etico e apresentam-se as equa¸c˜ oes de Maxwell na sua forma covariante. Finalmente, o Cap´ıtulo 11 ´e uma introdu¸c˜ ao `a teoria cl´assica da radia¸c˜ ao. Apresentam-se os potenciais retardados e estuda-se a radia¸c˜ ao dipolar e quadrupolar el´ectrica. Nos Apˆendices apresentam-se os teoremas de Gauss e de Stokes e tratam-se alguns aspectos do c´alculo vectorial, que s˜ao de grande utilidade no desenvolvimento do formalismo pr´oprio das mat´erias abordadas. CAP´ITULO 2 ˜ EQUAC ¸ OES DE MAXWELL Neste cap´ıtulo faz-se uma revis˜ao das leis b´asicas da electricidade e do magnetismo, chegando-se `as equa¸c˜oes de Maxwell. Recorda-se, no caso da electrost´atica, a lei de Coulomb e a lei de Gauss. No caso do magnetismo revˆeem-se as leis de Biot-Savart, de Laplace, de Amp`ere e de Faraday e Lenz. S˜ao apresentados alguns exemplos de movimentos de part´ıculas carregadas em campos el´ectricos e magn´eticos para ilustrar a for¸ca de Lorentz. Por fim, obtˆem-se as equa¸c˜ oes de propaga¸c˜ao no vazio dos potenciais escalar e vector e dos campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica. 2.1 ´ CAMPOS ELECTROSTATICOS A lei de Coulomb, obtida experimentalmente na segunda metade do s´eculo xviii, descreve a for¸ca que uma carga el´ectrica pontual, q, exerce numa outra, q 0 , quando est˜ao separadas por uma distˆancia a: 1 qq 0 ˆ, F = a (2.1) 4π²0 a2 ˆ ´e o vector unit´ario com a direc¸c˜ onde a ao e o sentido de a (Figura 2.1). A constante ²0 designa-se por permitividade do v´ acuo e tem o valor ²0 = 8, 8542 × 10−12 F/m, pelo que, no SI 1 = 9 × 109 N m2 C−2 . 4π²0 ´ um facto experimental que, se q for uma carga est´atica, a for¸ca exercida sobre q 0 ´e dada E pela express˜ao (2.1), qualquer que seja a velocidade desta carga. No caso de a carga q estar em movimento, a for¸ca que esta exerce sobre a carga q 0 j´ a n˜ao ´e dada simplesmente pela lei de Coulomb. 8 • ´tico Campo electromagne q ' a F P q Figura 2.1. For¸ ca que a carga q exerce na carga q 0 (as cargas tˆ em o mesmo sinal). A for¸ ca que q 0 exerce sobre q ´ e de grandeza igual mas de sentido oposto. ´ muito u E ´til introduzir o conceito de campo el´ectrico, E , que ´e a for¸ca por unidade de carga. Em P (Figura 2.1) o campo el´ectrico ´e dado por F E= q0 1 q ˆ. a 4π²0 a2 = (2.2) No SI o campo el´ectrico exprime-se em N C−1 ou, o que ´e equivalente, em V m−1 . No caso de um n´ umero arbitr´ario de cargas, aplica-se o princ´ıpio de sobreposi¸c˜ ao. De acordo com este princ´ıpio, o campo el´ectrico resultante em P ´e a soma vectorial dos campos criados individualmente por cada carga el´ectrica. Se num volume v existir uma distribui¸c˜ao cont´ınua de cargas, descrita por uma densidade ρ(r 0 ), da aplica¸c˜ ao do princ´ıpio de sobreposi¸c˜ao resulta o campo electrost´atico (ver Figura 2.2) E= S z v Z 1 4π²0 v ˆ ρ(r 0 ) a dv. 2 a a P ' d v P d E r' r x y Figura 2.2. Distribui¸ c˜ ao cont´ınua de cargas no volume v. O campo elementar dE ´ e produzido pela carga elementar dq = ρ(r 0 ) dv. Fazemos uma chamada de aten¸c˜ao para a nota¸c˜ ao que estamos a utilizar e que manteremos ao longo do livro. Assim, o vector r , cujas componentes cartesianas no sistema de referˆencia ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 9 ortonormado S s˜ao (x, y, z), ´e o vector posicional do ponto P onde se pretende calcular o campo (ou outra grandeza como, por exemplo, o potencial). O vector r 0 indica, relativamente `a origem do mesmo referencial, a posi¸c˜ ao do ponto P0 onde se localiza a fonte do campo. As coordenadas cartesianas desse ponto s˜ao (x0 , y 0 , z 0 ). Note-se que (x, y, z) e (x0 , y 0 , z 0 ) s˜ao coordenadas independentes. O vector a = r − r0 (2.3) indica a localiza¸c˜ao do ponto P relativamente a P0 e ´e uma fun¸c˜ ao dos dois conjuntos de coordenadas. As fontes do campo distribuem-se num volume v, sendo o elemento de volume nesse dom´ınio designado por dv. Em coordenadas cartesianas esse elemento infinitesimal de volume escreve-se dv = dx0 dy 0 dz 0 . P r q 2 2 P r r q ' P 1 F 1 Figura 2.3. Carga q 0 a deslocar-se de P1 para P2 . O trabalho da for¸ ca el´ ectrica ´ e independente da traject´ oria. Consideremos agora a Figura 2.3. O trabalho realizado pela for¸ca el´ectrica que q exerce sobre q 0 quando esta u ´ltima se desloca de P1 para P2 ´e dado por Z WP1 →P2 = P1 P2 Z F · dl = q 0 P1 P2 E · dl , tendo-se utilizado a defini¸c˜ao de campo el´ectrico para escrever a u ´ltima igualdade. Como o campo electrost´atico ´e conservativo, o integral na express˜ao anterior n˜ao depende do percurso entre P1 e P2 . O trabalho WP1 →P2 ´e sim´etrico da varia¸c˜ ao da energia potencial: WP1 →P2 = − [U (r2 ) − U (r1 )] . (2.4) O trabalho realizado pela for¸ca externa quando a carga se desloca com velocidade de m´odulo constante de P1 para P2 ´e o sim´etrico de (2.4). Esse trabalho exterior iguala a varia¸c˜ ao da energia do sistema, ∆U : ∆U = −WP1 →P2 = U (r2 ) − U (r1 ) = q 0 [V (r2 ) − V (r1 )]. (2.5) Introduziu-se nesta express˜ao a fun¸c˜ ao V (r ), que ´e o potencial no ponto P, `a distˆancia r de q. Em geral, a diferen¸ca de potencial entre dois pontos P1 e P2 ´e dada por Z V (r1 ) − V (r2 ) = P1 P2 E · dl . (2.6) 10 • ´tico Campo electromagne Para se conhecer o potencial num ponto (digamos P2 ), ´e necess´ario fixar um valor para o potencial num outro ponto de referˆencia (digamos P1 ). No caso de distribui¸c˜ oes finitas de carga, a escolha usual corresponde a P1 → ∞ e considera-se a´ı o potencial nulo. O potencial no ponto P ´e ent˜ao Z P V (r ) = − ∞ E · dl. (2.7) Chama-se a aten¸c˜ao para o facto de esta maneira de fixar o potencial n˜ao ser aplic´avel quando a distribui¸c˜ao de cargas ´e infinita (por exemplo, uma linha infinita de carga). Deve ent˜ao usar-se uma outra origem para o potencial V (r ). O facto de o campo electrost´atico ser conservativo significa que a sua circula¸c˜ ao ao longo de uma traject´oria fechada C se anula: I C E · dl = 0 . (2.8) Da Eq. (2.6) resulta que o campo electrost´atico se pode escrever como o sim´etrico do gradiente do potencial V : (2.9) E (r ) = −∇V (r ) . Esta express˜ao mostra que o potencial V (r ) descreve completamente o campo electrost´atico, indicando o sinal negativo na express˜ao anterior que E aponta no sentido dos potenciais decrescentes. Se recordarmos que, qualquer que seja a fun¸c˜ ao escalar V , se tem [ver (B.35)] ∇ × ∇V = 0 , imediatamente se conclui que ∇ × E = 0. (2.10) Esta equa¸c˜ao pode tamb´em ser obtida a partir de (2.8) por aplica¸c˜ ao do teorema de Stokes (ver Apˆendice A). O potencial criado por uma carga pontual q num ponto situado `a distˆancia a desta ´e particularmente simples de obter, se no integral (2.7) se considerar um percurso que tenha a direc¸c˜ao definida pela carga e pelo ponto onde se pretende obter o potencial: V = Z ∞ a q dr q = . 2 4π²0 r 4π²0 a (2.11) No caso de uma distribui¸c˜ao de cargas descrita por ρ(r 0 ) contida num volume v (Figura 2.2), o potencial ´e dado, de acordo com o princ´ıpio da sobreposi¸c˜ ao, por V = 1 4π²0 Z v ρ(r 0 ) dv , a (2.12) onde [ver (2.3)] a ´e a distˆancia do ponto (x0 , y 0 , z 0 ) — onde se localiza a carga elementar — ao ponto (x, y, z) — onde se pretende calcular o potencial. Os pontos do espa¸co que est˜ao ao mesmo potencial definem as chamadas superf´ıcies equipotenciais. ´ tamb´em conveniente relembrar a lei de Gauss, a qual desempenha um papel muito E importante quando se pretende calcular o campo electrost´atico E criado por uma distribui¸c˜ ao de cargas possuindo determinadas simetrias. De acordo com a lei de Gauss, o fluxo do campo el´ectrico E atrav´es de uma superf´ıcie fechada S que encerra a carga total Q ´e I S E · dS = Q . ²0 (2.13) ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 11 Usando agora o teorema de Gauss (ver Apˆendice A) e atendendo a que a carga total ´e dada R por Q = v ρ(r 0 ) dv, sendo v o volume total delimitado por S, conclui-se que Z v 1 ²0 ∇ · E dv = Z v ρ dv , de onde resulta a seguinte equa¸c˜ao local para o campo electrost´atico: ∇·E = ρ . ²0 (2.14) Combinando com a Eq. (2.9) obt´em-se a equa¸c˜ ao de Poisson: ∇2 V = − ρ . ²0 (2.15) Numa regi˜ao do espa¸co livre de cargas, ∇2 V = 0 , que ´e a equa¸c˜ao de Laplace. Vamos, a seguir, considerar alguns exemplos de distribui¸c˜ oes est´aticas de carga e obter os correspondentes campos el´ectricos. Exemplo 2.1: Distribui¸ c˜ ao linear de carga de densidade uniforme Consideremos um fio cil´ındrico de comprimento L (muito grande) sobre o qual se encontra uniformemente distribu´ıda a carga Q (λ = Q/L ´e a densidade linear de carga). r z l Figura 2.4. Superf´ıcie de Gauss adequada ` a determina¸ c˜ ao do campo el´ ectrico produzido por uma distribui¸ c˜ ao linear infinita de carga. Escolhe-se o eixo z coincidente com o eixo do fio, como se mostra na Figura 2.4. Comecemos por investigar a configura¸c˜ao das linhas do campo el´ectrico E . Devido `a extens˜ao infinita da distribui¸c˜ ao e `a simetria axial, o campo n˜ao pode depender das coordenadas cil´ındricas z e φ; igualmente, por se tratar de uma distribui¸c˜ ao muito longa com simetria axial, o campo n˜ao tem componente Ez nem Eφ . Assim, o campo el´ectrico tem ˆr. apenas componente radial, a qual ´e fun¸c˜ ao de r, isto ´e, E = E(r)e A determina¸c˜ao de E pode ser feita usando a lei de Gauss (2.13), que se escreve na forma I S E · dS = 1 ²0 Z ` λ d` , (2.16) 12 • ´tico Campo electromagne sendo a superf´ıcie gaussiana adequada uma superf´ıcie cil´ındrica de comprimento ` e raio r, coaxial com a linha de carga, como mostra a Figura 2.4. O integral no primeiro membro da Eq. (2.16) reduz-se ao fluxo do campo el´ectrico que sai pela superf´ıcie lateral do cilindro 2πr`E(r) = de onde se obt´em E= λ` , ²0 λ ˆr . e 2π²0 r (2.17) Exemplo 2.2: Distribui¸ c˜ ao volum´ etrica de carga com simetria esf´ erica Considere-se uma carga Q distribu´ıda uniformemente numa esfera de raio R. A densidade volum´etrica de cargas ´e ρ = 3Q/(4πR3 ). Devido `a simetria da distribui¸c˜ao de carga, o campo el´ectrico tem apenas componente radial, a qual s´o depende de r (distˆancia ao centro da esfera). A aplica¸c˜ao da lei de Gauss far-se-´a em duas etapas: i) Obten¸c˜ao do campo E num ponto interior (r < R): E(r) 4 π r2 = ρ 4 π r3 , ²0 3 (2.18) tendo-se considerado uma superf´ıcie gaussiana esf´erica, de raio r, concˆentrica com a distribui¸c˜ao de carga; no segundo membro de (2.18) considera-se a carga contida no interior desta superf´ıcie; ii) C´alculo do campo E num ponto exterior (r > R): A aplica¸c˜ao da lei de Gauss a esta situa¸c˜ ao segue os mesmos passos, obtendo-se E(r) 4 π r2 = Q , ²0 dado que agora toda a carga Q est´a contida no interior da superf´ıcie gaussiana de raio r > R. Temos, em conclus˜ao: E = E = 2.2 Q ˆr, re 4π²0 R3 Q ˆr, e 4π²0 r2 r ≤ R, r ≥ R. (2.19) (2.20) ˜ MAGNETICA ´ CAMPOS DE INDUC ¸ AO Considere-se a Figura 2.5, que representa um tro¸co de um circuito el´ectrico percorrido por uma corrente estacion´aria (quer dizer, que n˜ao varia no tempo) de intensidade i. A corrente no circuito cria num ponto P, `a distˆancia a do elemento (orientado) de circuito, dl, um campo de indu¸c˜ao magn´etica, B . ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 13 d l â a d B P i Figura 2.5. Campo produzido por um elemento de corrente. O campo elementar dB ´ e perpendicular a a e a dl. A contribui¸c˜ao elementar dB para este campo devida ao tro¸co elementar dl ´e dada pela lei de Biot-Savart: ˆ µ0 i dl × a dB = , 2 4π a onde µ0 = 4π × 10−7 N/A2 (ou, equivalentemente H/m) ´e a permeabilidade magn´etica do v´acuo. O campo de indu¸c˜ao magn´etica B , no ponto P, obt´em-se integrando sobre todo o circuito fechado: I ˆ µ i dl × a B= 0 , (2.21) 2 4π C a e exprime-se, no SI, em tesla (T) ou weber por metro quadrado (Wb/m2 ). Quando se tem uma distribui¸c˜ ao extensa de corrente de intensidade i, pode introduzir-se a densidade de corrente j (expressa em A/m2 no SI) na seguinte forma: Z i= S j · dS , (2.22) sendo dS um elemento de superf´ıcie orientado da sec¸c˜ ao do condutor. Desta forma, a express˜ao (2.21) pode ser generalizada e, em lugar do integral estendido a uma linha de corrente, passa a ter-se um integral estendido a todo o volume v que cont´em a distribui¸c˜ao de correntes: Z ˆ µ0 j (r 0 ) × a B= dv. (2.23) 2 4π v a As fontes do campo B est˜ao confinadas num volume v e s˜ao fun¸c˜ ao das coordenadas (x0 , y 0 , z 0 ), tal como se tinha, na Sec¸c˜ao 2.1, para uma distribui¸c˜ ao de cargas. Experimentalmente, verifica-se que um circuito quando ´e colocado numa regi˜ao onde existe um campo de indu¸c˜ao magn´etica fica sujeito a uma for¸ca (tamb´em uma carga colocada numa regi˜ao onde existe campo el´ectrico fica sujeita a uma for¸ca). Considere-se, ent˜ ao, uma regi˜ao do espa¸co onde existe um campo de indu¸c˜ ao magn´etica, B , cuja origem n˜ao importa conhecer, e que se coloca, nessa regi˜ao, um circuito percorrido por uma corrente i (mas que n˜ao ´e a fonte do campo B ).1 Verifica-se experimentalmente que sobre cada elemento dl do circuito se exerce uma for¸ca dada por dF = i dl × B . (2.24) 1 N˜ ao confundir, portanto, com a situa¸ca ˜o da Figura 2.5, em que o circuito representado ´e a fonte do campo de indu¸ca ˜o magn´etica. 14 • ´tico Campo electromagne Esta express˜ao ´e denominada lei de Laplace. No Exemplo 2.5 consideram-se duas correntes paralelas e determina-se a for¸ca entre elas. O campo de indu¸c˜ao magn´etica pode ser formalmente obtido a partir de cargas (monopolos) magn´eticas. Os monopolos magn´eticos, embora u ´teis de um ponto de vista conceptual, s˜ao objectos fict´ıcios, no sentido em que nunca foram detectados experimentalmente. As cargas magn´eticas (que designamos por q ∗ ) foram propostas por Dirac e tˆem a vantagem de permitir escrever a for¸ca magn´etica de atrac¸c˜ ao ou de repuls˜ao existente entre elas de uma forma idˆentica `a lei de Coulomb (2.1): 1 q∗q0∗ ˆ. F = a 4πµ0 a2 O facto de n˜ao se observarem monopolos magn´eticos significa que os campos de indu¸c˜ao magn´etica s˜ao produzidos por correntes, e as linhas de campo s˜ao sempre fechadas. Consequentemente, o fluxo de B atrav´es de uma superf´ıcie fechada qualquer ´e sempre nulo: I S B · dS = 0 . (2.25) Por aplica¸c˜ao do teorema de Gauss (ver Apˆendice A) resulta a seguinte equa¸c˜ ao local para o campo de indu¸c˜ao magn´etica: ∇ · B = 0. (2.26) Formalmente, o resultado expresso por (2.26) pode ser obtido directamente a partir da lei de Biot-Savart. De facto, tomando a divergˆencia de (2.23) tem-se, usando a Eq. (B.43) e notando que a corrente j ´e s´o fun¸c˜ao das coordenadas (x0 , y 0 , z 0 ) e que o operador ∇ s´ o actua nas coordenadas (x, y, z), ∇·B =− µ0 4π µ Z v j (r 0 ) · ∇ × ˆ a a2 ¶ dv , (2.27) ˆ /a2 pode ser escrito como o sendo o vector a definido por (2.3). Mas, por outro lado, a gradiente de uma fun¸c˜ao escalar: µ ¶ ∇ 1 a µ =∇ 1 |r − r 0 | ¶ =− ˆ r − r0 a = − . |r − r 0 |3 a2 (2.28) Assim, a quantidade dentro de parˆentesis no integral da Eq. (2.27) ´e zero (trata-se do rotacional de um gradiente) e, portanto, obt´em-se o resultado (2.26). A Eq. (2.26) (v´alida sempre) est´a contida na lei de Biot-Savart (que se aplica em regimes estacion´arios). Da Eq. (2.26) resulta ainda, e de uma maneira autom´ atica [ver (B.36)], que o campo B (r ) se pode exprimir como o rotacional de um campo vectorial A(r ), ou seja, B = ∇ × A. (2.29) Conhecido A — o potencial vector — B fica univocamente determinado, mas o mesmo n˜ao sucede com A, quando B ´e conhecido. De facto, pode adicionar-se a A qualquer vector cujo rotacional seja zero sem que tal afecte o campo f´ısico B . De resto, uma situa¸c˜ ao algo semelhante ocorre tamb´em para o potencial escalar V introduzido na Sec¸c˜ ao 2.1. Pode sempre somar-se a V uma fun¸c˜ao escalar cujo gradiente seja nulo (em particular uma constante qualquer) que isso n˜ao altera o campo f´ısico E . (Vimos mesmo, na Sec¸c˜ ao 2.1, que se podia arbitrar a origem do potencial.) ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 15 Vejamos, ent˜ao, qual a forma geral do potencial A do qual “deriva” o campo de indu¸c˜ ao magn´etica. A Eq. (2.23) pode ser escrita na forma µ B= 0 4π µ ¶ Z v 1 a ∇ × j (r 0 ) dv , tendo-se usado (2.28). A express˜ao (B.40) permite escrever µ ¶ 1 ∇ a µ ×j =∇× ¶ 1 1 j − ∇×j. a a Au ´ltima parcela ´e nula, uma vez que o c´alculo do rotacional envolve derivadas em ordem a (x, y, z) e a fun¸c˜ao vectorial j s´o depende do conjunto de vari´ aveis (x0 , y 0 , z 0 ). Assim, B= µ0 4π Z v ∇× j (r 0 ) a · dv = ∇ × µ0 4π Z j (r 0 ) v a ¸ dv , (2.30) onde se usou novamente o facto de o operador nabla, por actuar em fun¸c˜ oes das coordenadas (x, y, z), poder passar para fora do integral [as vari´ aveis sobre as quais se integra s˜ao (x0 , y 0 , z 0 )]. Comparando (2.30) com (2.29) conclui-se que A(r ) = µ0 4π Z j (r 0 ) a v dv . (2.31) Se as correntes forem superficiais (κ ´e a densidade superficial de corrente), µ A(r ) = 0 4π Z κ(r 0 ) dS a S . (2.32) Quando a corrente ´e filamentar tem-se µ i A(r ) = 0 4π I C dl , a (2.33) uma vez que a corrente i ´e a mesma em qualquer ponto do circuito. A lei de Biot-Savart tamb´em permite obter a chamada lei dos circuitos de Amp`ere. Integrando o campo de indu¸c˜ao magn´etica ao longo de um contorno fechado qualquer e aplicando o teorema de Stokes, tem-se I C Z B · dl = S ∇ × B · dS . (2.34) Para determinar o rotacional do campo B vamos usar (2.29) e (2.31). De (B.41), ∇ × B = ∇ × (∇ × A) = ∇(∇ · A) − ∇2 A, (2.35) tendo, pois, de se determinar a divergˆencia e o laplaciano do potencial vector A. Consideremos, de momento, um regime estacion´ario, o qual corresponde a uma situa¸c˜ ao em que n˜ao h´a dependˆencias temporais nem na densidade de carga, nem na densidade de corrente. A equa¸c˜ ao de continuidade que, em geral, se escreve ∂ρ +∇·j =0 ∂t (2.36) reduz-se a ∇ · j = 0, (2.37) 16 • ´tico Campo electromagne dado que, na situa¸c˜ao que estamos a considerar, o primeiro termo no membro esquerdo de (2.36) ´e nulo. O significado f´ısico da equa¸c˜ ao anterior ´e claro: as linhas de corrente fecham-se sobre si pr´oprias. Se atendermos agora, por um lado, `a Eq. (2.12) para o potencial escalar V e `a express˜ao que se obt´em para o seu laplaciano [Eq. de Poisson (2.15)], e, por outro lado, `a forma semelhante a (2.12) de cada uma das componentes de A [ver (2.31)], podemos concluir que cada uma dessas componentes ter´a de obedecer a equa¸c˜ oes de Poisson semelhantes a (2.15). Numa nota¸c˜ao compacta, ∇2 A = −µ0 j . (2.38) Vejamos finalmente o valor da divergˆencia de A a fim de retomarmos (2.35). Aplicando o operador ∇ a (2.31), Z · µ ¶¸ ∇ · j (r 0 ) 1 µ + j (r 0 ) · ∇ dv . ∇·A= 0 4π v a a A primeira parcela do segundo membro ´e nula porque ∇ n˜ao actua nas coordenadas r 0 ; na segunda parcela pode fazer-se a seguinte substitui¸c˜ ao µ ¶ µ ¶ µ ¶ µ ¶ 1 1 1 0 0 1 ∇ =∇ = −∇ = −∇ , (2.39) a |r − r 0 | |r − r 0 | a onde o operador ∇0 actua nas coordenadas r 0 . Integrando por partes, reescreve-se o termo resultante na seguinte forma: ·Z ¶ µ Z ¸ µ ∇0 · j (r 0 ) j (r 0 ) ∇·A=− 0 dv − dv . ∇0 · 4π v a a v Au ´ltima parcela ´e nula atendendo a que estamos a considerar um regime estacion´ario, pelo que (2.37) se verifica. Aplicando o teorema de Gauss `a primeira parcela, I µ0 j (r 0 ) · dS = 0 . 4π S a A igualdade a zero verifica-se porque as correntes est˜ao limitadas no espa¸co, o que significa que j = 0 sobre a superf´ıcie S ou ent˜ ao j ´e tangente `a superf´ıcie S, sendo, por isso, nulo o fluxo atrav´es de S. Usando este resultado e o expresso por (2.38) na Eq. (2.35), obt´em-se ∇·A=− ∇ × B = µ0 j , (2.40) que ´e a forma local da lei dos circuitos de Amp`ere. A forma integral desta lei ´e obtida a partir de (2.34): I Z C B · dl = µ0 S j · dS . (2.41) O conjunto de Eqs. (2.10), (2.14), (2.26) e (2.40) s˜ao as equa¸c˜ oes de Maxwell no vazio para o regime estacion´ario. ´ u E ´til escrever essas equa¸c˜oes em superf´ıcies de descontinuidade: σ ˆ · (E2 − E1 ) = divS E = n (2.42) ²0 rotS E = 0 (2.43) divS B = 0 (2.44) ˆ × (B2 − B1 ) = µ0 κ . rotS B = n (2.45) ˆ ´e normal `a superf´ıcie de separa¸c˜ O versor n ao dos meios 1 e 2 e aponta para o lado 2; E2 , B2 e E1 , B1 s˜ao os campos junto `a superf´ıcie nos meios 2 e 1, respectivamente; σ ´e a densidade superficial de carga e κ ´e a densidade superficial de corrente sobre a superf´ıcie de descontinuidade. Vamos considerar exemplos de distribui¸c˜ oes estacion´arias de correntes e obter os campos de indu¸c˜ao magn´etica resultantes. ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 17 Exemplo 2.3: Condutor infinito percorrido por corrente distribu´ıda uniformemente a C i S 1 d z 1 r h S 2 Figura 2.6. Esquema para a determina¸ c˜ ao de B produzido por uma corrente num condutor rectil´ıneo e infinito. Consideremos um fio condutor muito longo de raio a percorrido por uma corrente i uniformemente distribu´ıda (Figura 2.6). A densidade de corrente ´e ˆz = j =je i ˆz . e π a2 Vamos procurar a solu¸c˜ao para o campo B usando coordenadas cil´ındricas, atendendo `a simetria axial do problema. Em termos das suas componentes, o campo de indu¸c˜ ao magn´etica escreve-se ˆ r + Bφ (r, φ, z)e ˆ φ + Bz (r, φ, z)e ˆz . B (r, φ, z) = Br (r, φ, z)e Por simetria, B n˜ao pode depender de φ nem de z, quer dizer ˆ r + Bφ (r) e ˆ φ + Bz (r) e ˆz . B (r) = Br (r) e (2.46) A Eq. (2.26), quando aplicada ao campo dado por (2.46), permite concluir que 1d (rBr ) = 0 r dr ⇒ Br = C . r Ora, o campo B ´e uma quantidade f´ısica e portanto nunca poder´a tornar-se infinito, de onde se conclui que a constante C deve ser nula, sen˜ao B divergiria na origem. Poder´ıamos ter chegado `a mesma conclus˜ao partindo da lei do fluxo (2.25). Considerando como superf´ıcie auxiliar a superf´ıcie cil´ındrica de raio r > a e altura h (bases S1 e S2 e superf´ıcie lateral SL ), coaxial com o tubo de corrente, como se indica na Figura 2.6, I Z S B · dS = SL Z = SL Z BL · dS + S1 Z B1 · dS + S2 B2 · dS Br (r) dS = 2 π r h Br (r) = 0 , (2.47) 18 • ´tico Campo electromagne onde se teve em conta o facto de os integrais estendidos a S1 e a S2 terem valores sim´etricos, uma vez que B n˜ao depende de z. A Eq. (2.47) confirma que Br (r) = 0. Consideremos agora a lei dos circuitos de Amp`ere aplicada ao contorno C1 situado num plano vertical contendo o eixo do cilindro, como se mostra na Figura 2.6. Tem-se I C1 B · dl = 0 → Bz (r) dz − Bz (r0 ) dz = 0 B (r0 e, supondo → ∞) = 0, vem Bz (r) dz = 0, ou seja, Bz (r) = 0. ˆ φ , sendo a sua express˜ao obtida recorrendo O campo B ´e ent˜ao da forma B = Bφ (r) e de novo `a lei dos circuitos de Amp`ere. Consideremos os caminhos C1 e C2 , indicados na Figura 2.7, para o c´alculo do campo em pontos interiores e pontos exteriores `a distribui¸c˜ ao, respectivamente. a i C 1 C B 2 B Figura 2.7. Contornos C1 e C2 adequados ao c´ alculo do campo no Exemplo 2.3. Para r < a Bφ (r) 2 π r = µ0 ou seja, Bφ (r) = µ0 i π r2 , π a2 ir ˆφ . e 2 π a2 Para r > a B(r) 2 π r = µ0 i , de onde resulta B (r) = µ0 i ˆφ . e 2πr (2.48) Estes resultados foram obtidos tendo em conta que, sobre os caminhos escolhidos, o campo de indu¸c˜ao magn´etica mant´em constante a sua grandeza, e B ´e paralelo em cada ponto `a tangente ao caminho. ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 19 Exemplo 2.4: Solen´ oide infinito De novo recorremos `as equa¸c˜oes de Maxwell, quer na sua forma local, quer na sua forma integral, para obter o campo de indu¸c˜ ao magn´etica criado por um solen´oide infinito. Este sistema ´e, na pr´atica, um enrolamento compacto de espiras circulares cujo raio, a, ´e muito pequeno em compara¸c˜ao com o comprimento L do solen´oide. Dada a simetria da distribui¸c˜ ao de correntes, o problema resolve-se adequadamente em coordenadas cil´ındricas, podendo desde logo notar-se que B ´e, em todo o espa¸co, independente das coordenadas z e φ, pelo que o campo de indu¸c˜ao magn´etica tem a forma dada pela Eq. (2.46). r a z i C S h 1 Figura 2.8. Esquema utilizado para o c´ alculo do campo produzido por um solen´ oide infinito. De modo an´alogo ao que atr´as se discutiu, podemos usar a lei do fluxo, aplicando-a `a superf´ıcie cil´ındrica fechada de raio r e altura h, indicada por S na Figura 2.8. Designando por S1 e S2 as superf´ıcies das bases e por SL a superf´ıcie lateral, I Z Z S B · dS = SL BL · dS + Z = SL S1 Z B1 · dS + S2 B2 · dS Br (r) dS = 2 π r h Br (r) = 0 , uma vez que, sendo B independente de z, a segunda e a terceira parcelas do segundo membro s˜ao sim´etricas. O resultado do c´alculo anterior permite concluir que Br (r) = 0 . Consideremos agora a lei dos circuitos de Amp`ere aplicada ao contorno circular C1 de raio r > a situado no plano perpendicular ao eixo do solen´oide: I C1 I B · dl = C1 Bφ (r) r dφ = 2 π r Bφ (r) = 0 , onde se fez uso do facto de o campo ser independente de φ e de o fluxo de corrente atrav´es da superf´ıcie aberta que se apoia em C1 ser nulo. Pode concluir-se que Bφ = 0 em todo o espa¸co, pois o resultado anterior ´e independente do raio r do contorno escolhido. ˆz . O campo B ser´a, em princ´ıpio, da forma B = Bz (r)e Vejamos agora o campo em pontos interiores, r < a. A equa¸c˜ ao local (2.40) escreve-se, neste caso, ∂Bz ˆ φ = 0, e − ∂r 20 • ´tico Campo electromagne uma vez que as correntes se distribuem sobre a superf´ıcie do solen´oide; assim, o campo no interior tem um valor constante Bz = C; usando exactamente os mesmos argumentos, conclu´ımos que Bz no exterior tamb´em tem de ser constante. Pela lei de Biot-Savart o campo criado num ponto infinitamente afastado do eixo do solen´oide (r → ∞) ´e nulo. Assim, o campo de indu¸c˜ao magn´etica ´e nulo em todo o espa¸co fora do solen´oide: Bext → 0. A express˜ao de B no interior ´e obtida usando a Eq. (2.45) ˆ r × (0 − Ce ˆ z ) = Ce ˆ φ = µ0 κ = µ0 n i e ˆφ , rotS B = e (2.49) em que n = N/L designa o n´ umero de espiras por unidade de comprimento. Podemos ent˜ao escrever, para r < a, ˆz ; B = µ0 n i e (2.50) B=0. (2.51) e, para r > a, Exemplo 2.5: For¸ ca entre duas correntes paralelas Consideremos dois fios rectil´ıneos, muito longos, percorridos por correntes de intensidades i1 e i2 , respectivamente, como mostra a Figura 2.9. Pretende-se determinar a for¸ca que um fio exerce sobre o outro. i1 i2 e^ d z e^ d l e^ 1 f r 2 Figura 2.9. Fios paralelos percorridos por correntes i1 e i2 , ` a distˆ ancia d um do outro. O fio 1 produz um campo de indu¸c˜ ao magn´etica que ´e dado por (2.48): B1 = µ0 i1 ˆφ . e 2πr (2.52) De acordo com a lei de Laplace [ver Eq. (2.24)], a for¸ca que o campo B1 exerce sobre cada elemento de comprimento do condutor 2 ´e dada por dF ˆ z × B1 = = i2 dl e = − µ0 i1 i2 dl ˆr . e 2πd µ0 i1 i2 dl ˆz × e ˆφ e 2πd ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 21 A intensidade da for¸ca por unidade de comprimento ´e, ent˜ ao, dF µ0 i1 i2 = , dl 2πd (2.53) que ´e tamb´em igual `a intensidade da for¸ca por unidade de comprimento que o condutor 2 exerce sobre o condutor 1. Os dois fios atraem-se se as correntes tiverem o mesmo sentido e repelem-se se tiverem sentidos opostos. A Eq. (2.53) ´e utilizada para definir o ampere (unidade de corrente el´ectrica no SI). 2.3 ˜ ESTACIONARIO ´ REGIME NAO E CORRENTE DE DESLOCAMENTO DE MAXWELL Vimos na Sec¸c˜ao 2.2 como se relaciona o campo de indu¸c˜ ao magn´etica com as correntes que o criam. E se o regime n˜ao for estacion´ario? E se houver dependˆencias temporais nas densidades de carga e de corrente? Neste caso h´a, para al´em de uma dependˆencia espacial, uma dependˆencia temporal nos campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica. A lei de Faraday, por exemplo, refere-se a situa¸c˜ oes em que h´a uma dependˆencia temporal do fluxo do campo de indu¸c˜ao magn´etica B atrav´es de uma superf´ıcie aberta S: Z φ= S B · dS . (2.54) A varia¸c˜ao temporal deste fluxo induz uma for¸ca electromotriz, Ei , num circuito fechado C no qual se apoia a superf´ıcie aberta S. Em termos quantitativos, essa for¸ca electromotriz ´e dada por dφ , (2.55) Ei = − dt equa¸c˜ ao que exprime a lei de Faraday. O sinal negativo traduz a lei de Lenz, segundo a qual a corrente induzida no circuito C vai, ela pr´opria, estar na origem de um campo de indu¸c˜ ao magn´etica (campo induzido) cujo fluxo, atrav´es de S, tem uma varia¸c˜ ao temporal que se op˜oe `a varia¸c˜ao de φ. As leis de Faraday e de Lenz s˜ao, `a semelhan¸ca das outras leis que temos vindo a rever, puramente experimentais, isto ´e, a sua validade assenta na sua verifica¸c˜ ao experimental. A for¸ca electromotriz induzida pode ser escrita como a circula¸c˜ ao do campo el´ectrico ao longo do contorno C, pelo que, de (2.54) e (2.55), se obt´em I C E · dl = − d dt Z S B · dS , que ´e a forma integral da lei de Faraday. A aplica¸c˜ ao do teorema de Stokes ao primeiro membro conduz `a forma diferencial da lei de Faraday: ∇×E =− ∂B . ∂t ´ esta equa¸c˜ao de Maxwell que exprime a f´ısica que est´a na base do funcionamento de E componentes t˜ao importantes como os geradores e os transformadores. Note-se que, no caso est´atico, a equa¸c˜ao anterior reduz-se `a Eq. (2.10). No caso n˜ao estacion´ario, tamb´em a Eq. (2.40) tem de ser modificada. Calculando a divergˆencia de ambos os membros desta equa¸c˜ ao vectorial, verifica-se que o primeiro se anula 22 • ´tico Campo electromagne trivialmente. O segundo membro fica, simplesmente, µ0 ∇ · j , que s´o se anula no caso estacion´ario [situa¸c˜ao que corresponde a (2.37)]. Assim, ter´a de se incluir no segundo membro de (2.40) um novo termo cuja divergˆencia seja o sim´etrico de µ0 ∇ · j . Maxwell verificou que esse termo era ²0 µ0 ∂ E /∂t. De facto, se em vez da Eq. (2.40) se considerar ∇ × B = µ0 j + ²0 µ0 ∂E , ∂t (2.56) verifica-se que a divergˆencia do segundo membro (tal como a do primeiro) se anula: · µ0 ¸ · ¸ ∂∇ · E ∂ρ ∇ · j + ²0 = µ0 ∇ · j + = 0. ∂t ∂t A igualdade a zero resulta da equa¸c˜ ao de continuidade que relaciona a densidade de carga, ρ, com a densidade de corrente, j [ver (2.36)]. A express˜ao ²0 ∂ E /∂t ´e a corrente de deslocamento de Maxwell e a necessidade da sua introdu¸c˜ ao tem um significado f´ısico claro: sem esse termo n˜ao poderia haver conserva¸c˜ ao local da carga el´ectrica expressa pela equa¸c˜ ao de continuidade. Claro que a Eq. (2.56) poderia ter sido obtida formalmente a partir de (2.31) e de (2.35). 2.4 ˜ AS EQUAC ¸ OES DE MAXWELL E A FORC ¸ A DE LORENTZ Em resumo, no vazio, as equa¸c˜oes de Maxwell podem ser escritas na forma: ρ ²0 ∂B ∇×E = − ∂t ∇·B = 0 ∇·E = ∇ × B = µ0 j + ²0 µ0 (2.57) (2.58) (2.59) ∂E . ∂t (2.60) ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 23 Na forma integral, estas equa¸c˜ oes escrevem-se: I Z 1 Q ρ dv = ² ² S 0 v 0 I Z d E · dl = − B · dS dt C S I E · dS = S (2.61) (2.62) B · dS = 0 Z µ I C (2.63) B · dl = µ0 S j + ²0 ∂E ∂t ¶ · dS . (2.64) Faz-se notar que a equa¸c˜ao integral (2.62) ´e mais geral do que a equa¸c˜ ao diferencial (2.58), a qual s´o ´e aplic´avel quando B varia no tempo. Se a superf´ıcie S variar no tempo, h´a ainda uma varia¸c˜ao temporal do fluxo do campo de indu¸c˜ ao magn´etica (mesmo que B seja estacion´ario) e, neste caso, ´e (2.62) que se deve aplicar. Recorde-se, tamb´em, que quando uma carga el´ectrica q se desloca, com velocidade v , numa regi˜ao do espa¸co onde existem campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica fica sujeita a uma for¸ca (for¸ca de Lorentz), que ´e dada por F = q (E + v × B ) . (2.65) Como exemplos de aplica¸c˜ao da for¸ca de Lorentz vamos considerar duas experiˆencias hist´oricas: a experiˆencia de Thomson e a experiˆencia de Hall. Exemplo 2.6: Experiˆ encia de Thomson A determina¸c˜ao experimental da raz˜ao carga/massa do electr˜ao, realizada por J. J. Thomson em 1897, marca a descoberta do electr˜ao. Conceptualmente, a experiˆencia baseia-se no efeito que os campos el´ectricos e magn´eticos exercem sobre part´ıculas carregadas e, por isso, ´e um exemplo apresentado frequentemente para ilustrar a aplica¸c˜ ao da for¸ca de Lorentz (2.65). O dispositivo experimental utilizado, conhecido por tubo de raios cat´ odicos, est´a representado esquematicamente na Figura 2.10. + F E , B V P - Figura 2.10. Tubo de raios cat´ odicos usado na experiˆ encia de Thomson. H´a um filamento F que, depois de aquecido, liberta electr˜oes cuja velocidade, em geral pequena, se pode aumentar estabelecendo uma diferen¸ca de potencial V entre P e F. A 24 • ´tico Campo electromagne placa met´alica P tem uma pequena abertura que permite colimar o feixe de electr˜oes. Estes entram a seguir numa regi˜ao entre duas placas met´alicas deflectoras indo, finalmente, embater num ´ecran fluorescente (a fluorescˆencia do ´ecran permite determinar visualmente o ponto de impacto). Na regi˜ao entre as placas pode estabelecer-se um campo el´ectrico, de intensidade E (control´avel externamente) que aponta para baixo, e um campo de indu¸c˜ ao magn´etica de intensidade B (tamb´em controlada externamente) e que aponta para dentro do plano do papel. Sob a ac¸c˜ao do campo el´ectrico, o feixe de electr˜oes sofre um desvio na sua traject´oria, devido `a for¸ca vertical, dirigida para cima, que sobre eles se exerce, passando a descrever uma par´abola (no plano da Figura 2.11). O campo de indu¸c˜ ao magn´etica, quando presente, exerce uma for¸ca sobre os electr˜oes que ´e ainda vertical mas que aponta para baixo. As intensidades E e B dos campos podem ser escolhidas de modo a que a for¸ca resultante que se exerce sobre cada electr˜ao seja nula (despreza-se a for¸ca de interac¸c˜ ao m´ utua entre os electr˜oes do feixe e a for¸ca grav´ıtica). Nestas condi¸c˜oes a traject´oria das part´ıculas passa de novo a ser rectil´ınea [Figuras 2.10 e 2.11)]. y y x E L (a ) E (b ) B (c ) Figura 2.11. Placas deflectoras na experiˆ encia de Thomson. (a) Ausˆ encia de campos; (b) apenas campo el´ ectrico aplicado; (c) campos el´ ectrico e de indu¸ c˜ ao magn´ etica aplicados. Experimentalmente, consideram-se trˆes situa¸c˜ oes distintas: (a) ausˆencia de campos aplicados; (b) apenas campo el´ectrico aplicado; (c) campo el´ectrico e campo de indu¸c˜ ao magn´etica aplicados. Na Figura 2.11 representam-se as placas deflectoras, de comprimento L, e cada uma destas situa¸c˜oes. Em qualquer das situa¸c˜ oes, o movimento das cargas segundo o eixo x ´e rectil´ıneo e uniforme, pois a componente da for¸ca nessa direc¸c˜ ao ´e nula (quer haja, quer n˜ao campos aplicados). O tempo que um electr˜ao demora a passar entre as placas ´e t = L/v0 , sendo v0 a sua velocidade `a sa´ıda do colimador (ou, por outras palavras, `a entrada das placas). Na situa¸c˜ao (b), a part´ıcula fica sujeita a uma for¸ca constante na direc¸c˜ ao do eixo y, dada em m´odulo por F = e E, sendo e o m´odulo da carga do electr˜ao. Segundo esse eixo, o movimento ´e uniformemente acelerado, com acelera¸c˜ ao a = e E/m, onde m ´e a massa do electr˜ao. Nestas condi¸c˜oes os electr˜oes descrevem uma traject´oria parab´olica na regi˜ao entre as placas deflectoras e a distˆancia y indicada na Figura 2.11 (b) ´e dada por y= 1 2 e E L2 . at = 2 2 m v02 (2.66) O valor de y pode ser medido experimentalmente a partir da posi¸c˜ ao do ponto de impacto do feixe no ´ecran fluorescente e do conhecimento das dimens˜oes do tubo. Mantendo o mesmo campo el´ectrico e ligando agora o campo de indu¸c˜ ao magn´etica [situa¸c˜ ao (c)], este pode ser ajustado de tal modo que o desvio da traject´oria dos electr˜oes seja nulo quando atravessam as placas [tal como em (a)]. Usando a express˜ao (2.65) da for¸ca de Lorentz e impondo a ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 25 igualdade da for¸ca el´ectrica e magn´etica, e E = e B v0 , conclui-se que v0 = E/B. Inserindo em (2.66), encontra-se a express˜ao e 2yE = 2 2. m L B Esta express˜ao pode ser usada para obter experimentalmente o valor da raz˜ao carga/massa do electr˜ao (ou de qualquer outra part´ıcula carregada). Exemplo 2.7: Efeito Hall A Figura 2.12 representa um bloco de material condutor, de condutividade σ, fixo no espa¸co. Sob a ac¸c˜ao do campo el´ectrico, E (direc¸c˜ ao y), estabelece-se uma densidade de corrente de condu¸c˜ao j = ρv, (2.67) cujo fluxo atrav´es da sec¸c˜ao recta do condutor ´e a intensidade de corrente i [ver Eq. (2.22)]. A rela¸c˜ao entre a densidade de corrente j e o campo el´ectrico E ´e j = σE. z h v 0 x E j B y Figura 2.12. Condutor para verificar o efeito Hall. Sob a ac¸c˜ao do campo el´ectrico, as cargas negativas (electr˜oes) deslocam-se para a esquerda do condutor2 . Consideremos que se aplica um campo de indu¸c˜ ao magn´etica est´atico e uniforme segundo o eixo x. Sob a ac¸c˜ ao deste campo, os electr˜oes ficam sujeitos `a for¸ca magn´etica Fm = q v × B , que aponta no sentido de −z (note-se que q = −e < 0). Devido a esta for¸ca, as part´ıculas de carga negativa s˜ao desviadas para baixo, contribuindo para uma acumula¸c˜ao de cargas deste tipo na face inferior do condutor (plano xy). Concomitantemente, h´a uma acumula¸c˜ao de cargas positivas na face superior (plano z = h) do condutor. Estas acumula¸c˜oes de cargas d˜ao origem a uma diferen¸ca de potencial entre as duas faces (diferen¸ca de potencial de Hall), e o correspondente campo el´ectrico ´e vertical, apontando no sentido ˆ , as cargas el´ectricas de −z. Sob a ac¸c˜ao deste campo, que vamos designar por E 0 = −E 0 k no condutor ficam tamb´em sujeitas a uma for¸ca vertical, dirigida de baixo para cima, que 2 O efeito de uma corrente de cargas negativas ´e equivalente, muitas vezes, ao de uma corrente de cargas positivas deslocando-se em sentido oposto. O efeito Hall, como veremos, permite distinguir as duas situa¸co ˜es. 26 • ´tico Campo electromagne tende a equilibrar a for¸ca magn´etica. Este ´e o chamado efeito Hall, descoberto em 1879 pelo norte-americano Edwin H. Hall. Quando as for¸cas el´ectrica e magn´etica se igualam, tem-se, da Eq. (2.65), E0 = v B . (2.68) O campo el´ectrico pode ser medido experimentalmente, de forma indirecta atrav´es da diferen¸ca de potencial de Hall, V , pois E 0 = V /h. Sabemos hoje que, nos metais, a corrente el´ectrica ´e devida aos electr˜oes, pelo que a face superior do condutor fica a um potencial mais elevado do que a face inferior. Se as cargas em movimento que est˜ao na origem da corrente el´ectrica fossem positivas, ter-se-ia a situa¸c˜ ao contr´aria. De resto, ´e este o caso em alguns semicondutores e foi justamente o efeito Hall que permitiu chegar a essa conclus˜ao. Combinando as express˜oes (2.68) e (2.67), podemos escrever E0 1 = , jB nq (2.69) tendo-se usado ρ = n q, em que n ´e o n´ umero de cargas por unidade de volume do material condutor. A raz˜ao 1/(n q) ´e conhecida por coeficiente de Hall e ´e uma caracter´ıstica do material. Conhecidos j (a corrente), B (o campo de indu¸c˜ ao magn´etica aplicado) e E 0 (atrav´es da diferen¸ca de potencial medida), pode conhecer-se a estrutura do material, ou seja, o seu coeficiente de Hall. Por outro lado, conhecidos j, E 0 e o coeficiente de Hall, a express˜ao (2.69) ´ esta, precisamente, a fun¸c˜ permite conhecer o campo de indu¸c˜ao magn´etica B. E ao de uma “sonda de Hall”, que pode ter dimens˜oes muito reduzidas. Claro que, antes de ser utilizada, a sonda tem de ser “calibrada” com campos de indu¸c˜ ao magn´etica conhecidos, isto ´e, o seu coeficiente de Hall tem de ser conhecido. 2.5 ˜ EQUAC ¸ OES PARA OS POTENCIAIS A equa¸c˜ao de Maxwell (2.58) implica a generaliza¸c˜ ao da Eq. (2.9), que relaciona o potencial escalar com o campo el´ectrico no caso est´atico. Assim, usando (2.29) no segundo membro da Eq. (2.58), conclui-se que ´e a quantidade E + ∂ A/∂t (e n˜ ao apenas o campo el´ectrico) que se pode exprimir como o gradiente de uma fun¸c˜ ao escalar, isto ´e, E = −∇V − ∂A , ∂t (2.70) A a contribui¸c˜ sendo − ∂∂t ao n˜ao conservativa para E . A equa¸c˜ ao anterior, a par da Eq. (2.29) que aqui reescrevemos, (2.71) B = ∇ × A, permitem determinar os campos f´ısicos E e B a partir dos potenciais V e A. Surge aqui um ponto muito interessante. Constata-se que a escolha destes potenciais n˜ao ´e u ´nica, isto ´e, h´a v´arios conjuntos de pares de potenciais (escalar e vector) que conduzem aos mesmos campos el´ectrico e de indu¸c˜ao magn´etica. Considere-se o par (V, A), a que correspondem os campos f´ısicos obtidos a partir de (2.70) e de (2.71). Se alterarmos V e A, juntando ao segundo o gradiente de uma fun¸c˜ao escalar χ e subtraindo ao primeiro a derivada temporal dessa mesma fun¸c˜ao, isto ´e, se considerarmos os novos potenciais (V 0 , A0 ) que se relacionam com os anteriores atrav´es de ∂χ (2.72) V0 =V − ∂t ˜ es de Maxwell Equac ¸o A0 = A + ∇χ, • 27 (2.73) os campos E 0 e B 0 gerados pelos novos potenciais coincidem com os anteriores: µ E 0 = −∇V + ∇ ∂χ ∂t ¶ − ∂A ∂ − ∇χ = E ∂t ∂t B 0 = ∇ × (A + ∇χ) = ∇ × A = B . As Eqs. (2.72) e (2.73) expressam a chamada liberdade de padr˜ ao (gauge, em inglˆes) na fixa¸c˜ao dos potenciais. Esta liberdade ´e, de resto, uma das caracter´ısticas mais peculiares da teoria do electromagnetismo e corresponde a uma das mais importantes simetrias que as modernas teorias das for¸cas fundamentais incorporam. At´e se designam habitualmente por teorias de gauge! Vejamos quais as equa¸c˜oes a que os potenciais electromagn´eticos tˆem de obedecer. A equa¸c˜ ao para o potencial V obt´em-se aplicando o operador nabla a ambos os membros de (2.70) e usando a Eq. (2.57): ∂A ρ −∇2 V − ∇ · (2.74) = . ∂t ²0 Por outro lado, de (2.35) e de (2.60) conclui-se que ∇(∇ · A) − ∇2 A = µ0 j − tendo-se utilizado (2.70) e onde c2 = 1 ∂2A 1 ∂V , − 2∇ c2 ∂t2 c ∂t 1 ²0 µ0 (2.75) (2.76) ` Eq. (2.75) pode ainda dar-se uma ´e o quadrado da velocidade da luz (c = 3×108 m/s). A outra forma: ¶ µ 1 ∂2A 1 ∂V 2 + ∇ · A . (2.77) − ∇ A = µ j − ∇ 0 c2 ∂t2 c2 ∂t Usando a liberdade de escolha do padr˜ao, ´e sempre poss´ıvel escolher um par (V, A) que satisfa¸ca a equa¸c˜ao 1 ∂V + ∇ · A = 0. (2.78) c2 ∂t Este ´e o chamado padr˜ ao de Lorentz. Nestas condi¸c˜ oes [frisamos bem que a condi¸c˜ ao (2.78) n˜ao introduz nenhuma restri¸c˜ao na determina¸c˜ ao dos campos E e B ] as Eqs. (2.74) e (2.77) ficam desacopladas, passando a escrever-se nas formas ∇2 V − 1 ∂2V ρ =− 2 2 c ∂t ²0 (2.79) 1 ∂2A = −µ0 j . (2.80) c2 ∂t2 H´a outras escolhas de padr˜ao que tamb´em s˜ao habituais. Uma delas consiste em considerar simplesmente ∇ · A = 0 e ´e denominada gauge de Coulomb, da radia¸c˜ ao, ou transversa. As Eqs. (2.79) e (2.80), obtidas na gauge de Lorentz, reduzem-se, no caso do vazio e na ausˆencia de fontes (ρ = 0, j = 0), a um par de equa¸c˜ oes diferenciais homog´eneas, ∇2 A − ∇2 V − 1 ∂2V =0 c2 ∂t2 (2.81) 28 • ´tico Campo electromagne ∇2 A − 1 ∂2A = 0, c2 ∂t2 (2.82) cujas solu¸c˜oes s˜ao ondas que se propagam com velocidade c. Tamb´em os campos E e B obedecem a equa¸c˜ oes de onda semelhantes a estas. Assim, tomando o rotacional em ambos os membros de (2.58) e usando (2.60) e (B.41), tem-se ∇(∇ · E ) − ∇2 E = −µ0 ∂2E ∂j − µ0 ²0 2 . ∂t ∂t Finalmente, fazendo uso de (2.57) e de (2.76), obt´em-se ∇2 E − 1 ∂2E 1 ∂j = ∇ ρ + µ0 , 2 2 c ∂t ²0 ∂t (2.83) que ´e uma equa¸c˜ao n˜ao homog´enea. De modo an´alogo, tem-se, para o campo de indu¸c˜ao magn´etica, 1 ∂2B ∇2 B − 2 = −µ0 ∇ × j . (2.84) c ∂t2 Na ausˆencia de cargas e de correntes, as Eqs. (2.83) e (2.84) transformam-se em equa¸c˜ oes homog´eneas do tipo da Eq. (2.82). 2.6 2.6.1 PROBLEMAS RESOLVIDOS Campo electrost´ atico (coordenadas cartesianas) Quest˜ ao Um campo de vectores ´e definido do seguinte modo:  k ˆ   ²0 j       µ  para y > a ¶ 3 k 1 + y jˆ E = ²0  a         −k j ˆ ²0 para 0 < y < a (2.85) para y < 0 . Verificar se pode tratar-se de um campo electrost´atico e determinar a distribui¸c˜ ao de cargas que cria este campo. Resposta Para que E seja um campo electrost´atico tem de se verificar ∇ × E = 0 [cf. Eq. (2.10)]. O rotacional do campo el´ectrico em coordenadas cartesianas ´e (ver Apˆendice B): µ ∇×E = ¶ ∂Ez ∂Ey ˆ − i+ ∂y ∂z µ ∂Ex ∂Ez − ∂z ∂x ¶ jˆ + µ ¶ ∂Ex ˆ ∂Ey − k. ∂x ∂y Sendo o campo vectorial dado em (2.85) da forma E = Ey (y) jˆ em todo o espa¸co, o seu rotacional ´e nulo e pode, pois, tratar-se de um campo electrost´atico. ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 29 As distribui¸c˜oes volum´etricas de carga s˜ao obtidas a partir de (2.14). Em coordenadas cartesianas a divergˆencia do campo el´ectrico ´e (ver Apˆendice B): ∇·E = ∂Ex ∂Ey ∂Ez + + . ∂x ∂y ∂z i) Para y > a e y < 0, o campo E ´e constante e, portanto, ρ = 0. ii) Para 0 < y < a, tomando a divergˆencia de (2.85), obt´em-se ∇·E = 3k a²0 e, de ∇ · E = ρ/²0 [cf. (2.14)], 3k . a As distribui¸c˜oes superficiais de carga s˜ao obtidas a partir da divergˆencia superficial de E [cf. (2.42)]: σ ˆ · (E2 − E1 ) = divS E = n , ²0 ˆ a normal `a superf´ıcie; o ´ındice 2 designa a regi˜ao para onde aponta o vector unit´ario sendo n e o ´ındice 1 a outra regi˜ao. i) Carga superficial em y = 0: ρ= · µ 3k ˆ k j − − jˆ σ = ²0 jˆ · ²0 ²0 ¶¸ = 4k , ˆ = jˆ . tendo-se escolhido n ˆ = jˆ ): ii) Carga superficial em y = a (escolhendo tamb´em n σ = ²0 jˆ · 2.6.2 µ ¶ k ˆ 6k ˆ j− j = −5k . ²0 ²0 Campo el´ ectrico com simetria cil´ındrica — I Quest˜ ao Um campo el´ectrico ´e dado, em coordenadas cil´ındricas, por E =  µ ¶3  r   ˆr e  E0 para 0 < r < a     0 no resto do espa¸co. a Determinar a distribui¸c˜ao de cargas que cria este campo e o potencial el´ectrico em todo o espa¸co. Resposta A distribui¸c˜ao de carga ´e obtida a partir das express˜oes (2.14) e (2.42). Como o campo ´e dado em coordenadas cil´ındricas deve utilizar-se a express˜ao da divergˆencia do campo el´ectrico em coordenadas cil´ındricas (ver Apˆendice B): ∇·E = 1∂ 1 ∂Eφ ∂Ez (r Er ) + + . r ∂r r ∂φ ∂z 30 • ´tico Campo electromagne ˆ r , pelo que a divergˆencia do campo el´ectrico ´e dada por Na quest˜ao proposta, E = Er (r)e ∇·E = 1d 1d (r Er ) = r dr r dr µ ¶ 4r2 E0 4 r = E0 , a3 a3 donde r2 E0 (2.86) a3 na regi˜ao 0 < r < a. Na regi˜ao r > a o campo ´e nulo e ρ = 0. A distribui¸c˜ao volum´etrica de carga localiza-se num cilindro de raio a. A distribui¸c˜ao superficial de carga sobre a superf´ıcie r = a ´e obtida a partir da divergˆencia superficial do campo el´ectrico dada por ρ = 4²0 ˆ · (E2 − E1 ) = e ˆ r · (0 − E0 e ˆ r ) = −E0 . n Usando (2.42) pode concluir-se que, em r = a, σ = −²0 E0 . (2.87) ´ interessante notar que as distribui¸c˜ E oes de carga (2.86) e (2.87) conduzem a uma carga total nula para um cilindro de altura arbitr´aria L. A carga total nesse cilindro ´e Z Q= Z ρ dv + σ dS e, de (2.86) e (2.87), Z a 4²0 E0 Q = 2πL r2 r dr − 2πaL²0 E0 a3 0 = 2πaL²0 E0 − 2πaL²0 E0 = 0 . Vamos agora obter o potencial electrost´atico, o qual, devido `a simetria cil´ındrica do problema, s´o pode depender de r. Para r > a o campo electrost´atico ´e nulo, pelo que o potencial ´e constante nessa regi˜ao. Para garantir que V (r → ∞) = 0 e, como o potencial ´e constante no exterior, devemos considerar o potencial nulo em r = a. Na regi˜ao exterior ao cilindro, V (r) = 0 , r ≥ a. Na regi˜ao r ≤ a, podemos determinar o potencial a partir da circula¸c˜ ao do campo el´ectrico dado (´e conveniente utilizar percursos radiais nessa circula¸c˜ ao). Assim, a circula¸c˜ ao entre um ponto do eixo do cilindro e um ponto `a distˆancia r deste ´e V (0) − V (r) = Z r 0 E E · dr = 30 a Z r 0 r3 dr = E0 r4 . 4a3 Para garantir que V (a) = 0 ter´a de ser V (0) = E0 a/4. Introduzindo este valor na express˜ao anterior obt´em-se o potencial " E0 a V (r) = 1− 4 µ ¶4 # r a , r ≤ a. ˜ es de Maxwell Equac ¸o 2.6.3 • 31 Campo el´ ectrico com simetria cil´ındrica — II Quest˜ ao A regi˜ao entre dois cilindros coaxiais infinitamente longos est´a carregada, sendo a densidade de carga, expressa em coordenadas cil´ındricas, dada por ρ = A exp(−αr) , onde A e α s˜ao constantes. Calcular o campo el´ectrico em todo o espa¸co em fun¸c˜ ao dos raios dos cilindros interno e externo, a e b respectivamente. Resposta Dada a simetria da distribui¸c˜ ao de cargas, o campo el´ectrico n˜ao depende de φ, nem de z. ˆ r . Designaremos Tamb´em, pela mesma raz˜ao, tem apenas componente radial, E (r ) = Er (r) e Er simplesmente por E. O m´etodo mais expedito para calcular o campo el´ectrico em todo o espa¸co consiste em aplicar a lei de Gauss expressa pela Eq. (2.13), que aqui reescrevemos: I S E · dS = Q , ²0 (2.88) onde Q ´e a carga no volume limitado pela superf´ıcie fechada S (superf´ıcie de Gauss). Para a situa¸c˜ao apresentada, escolhemos superf´ıcies de Gauss cil´ındricas coaxiais, cujo eixo comum ´e o eixo de simetria da distribui¸ca˜o de cargas e cuja altura ´e L (esta altura ´e arbitr´aria e os resultados n˜ao v˜ao depender de L). Consideremos, pois, trˆes superf´ıcies de Gauss, S1 , S2 e S3 . C 3 C 2 C a 1 b Figura 2.13. Corte transversal do sistema referido no Problema 2.6.3. A Figura 2.13 mostra um corte por um plano perpendicular ao eixo de simetria, sendo C1 , C2 e C3 as circunferˆencias que resultam da intersec¸c˜ ao desse plano com as superf´ıcies de Gauss, S1 , S2 e S3 . Seja r o raio de uma qualquer dessas circunferˆencias Ci . O fluxo do campo el´ectrico [ver Eq. (2.88)] ´e I S E · dS = 2πrLE . (2.89) 32 • ´tico Campo electromagne • Regi˜ao 0 < r < a A carga na regi˜ao limitada pela superf´ıcie cil´ındrica S1 ´e zero, pelo que (2.90) E=0 nessa regi˜ao. • Regi˜ao a < r < b Comecemos por calcular a carga dentro da regi˜ao v2 limitada por S2 : Z Q = v2 ρ dv = 2πLA ·µ Z r a e−αr r dr ¯ ¯ ¸ µ exp(−αr) ¯¯r r exp(−αr) ¯¯r − = 2πLA ¯ ¯ −α α2 a a ¸ · 1 −αa r −αr a −αa 1 −αr + 2e . = 2πLA − e + e − 2e α α α α (2.91) Combinando (2.88), (2.89) e (2.91), o campo el´ectrico vem dado por A E= ²0 rα ·µ ¶ µ ¶ ¸ 1 −αa 1 −αr a+ e − r+ e . α α (2.92) • Regi˜ao r > b Segue-se um procedimento an´alogo, mas neste caso a integra¸c˜ ao na coordenada radial para determinar a carga [Eq. (2.91)] vai de a at´e b. Encontra-se para o campo electrost´atico uma express˜ao parecida com (2.92), mas agora com uma dependˆencia mais simples em r: ·µ ¶ µ ¶ ¸ 1 −αa 1 −αb A a+ e − b+ e . (2.93) E= ²0 rα α α Esta dependˆencia em 1/r ´e t´ıpica da linha infinita carregada (ou do campo criado no exterior por qualquer distribui¸c˜ ao infinita de carga com simetria cil´ındrica). ´ interessante confirmar que o campo el´ectrico ´e cont´ınuo, pois n˜ao h´a distribui¸c˜ E oes superficiais de carga. Sobre a superf´ıcie r = a obt´em-se E = 0 de (2.92) [cf. Eq. (2.90)]. Por outro lado, sobre a superf´ıcie r = b, as Eqs. (2.92) e (2.93) conduzem ao mesmo valor para o campo el´ectrico. 2.6.4 Campo el´ ectrico em coordenadas esf´ ericas Quest˜ ao Um campo el´ectrico na regi˜ao r > a ´e dado por 2A cos θ r3 A sin θ = r3 = 0, Er = Eθ Eφ sendo A uma constante. Calcular a distribui¸c˜ ao volum´etrica de carga nesta regi˜ao. ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 33 Resposta De acordo com (2.14), ρ = ²0 ∇ · E , de modo que o problema se reduz `a determina¸c˜ ao da divergˆencia do campo vectorial dado. Conv´em, evidentemente, utilizar a express˜ao da divergˆencia do campo el´ectrico em coordenadas esf´ericas (ver Apˆendice B): ∇·E = 1 ∂ 2 1 ∂ 1 ∂Eφ (r Er ) + (Eθ sin θ) + . 2 r ∂r r sin θ ∂θ r sin θ ∂φ O campo dado n˜ao depende de φ, pelo que a u ´ltima parcela ´e nula. As duas primeiras parcelas s˜ao µ ¶ 1 ∂ 2 1 2A cos θ 2A cos θ − 2 =− (r Er ) = 2 2 r ∂r r r r4 e 1 ∂ 1 2A sin θ cos θ 2A cos θ = , (Eθ sin θ) = 3 r sin θ ∂θ r sin θ r r4 donde ρ=0 em todos os pontos da regi˜ao considerada. 2.6.5 Esfera uniformemente carregada Quest˜ ao Uma esfera de raio R est´a carregada com uma carga total Q uniformemente distribu´ıda no seu volume. Determinar o potencial para todos os valores de r. Resposta No Exemplo 2.2 foi obtido o campo el´ectrico criado por esta distribui¸c˜ ao de cargas [ver Eqs. (2.19) e (2.20)]: 1 Q ˆr E= (2.94) e (r ≥ R) , 4π²0 r2 e 1 Qr ˆr E= e (r ≤ R) . (2.95) 4π²0 R3 O potencial electrost´atico, que s´o depende da coordenada radial, pode ser calculado a partir da circula¸c˜ao do campo el´ectrico tal como no Problema 2.6.2. O potencial vem dado por V (r) = V (r) = Q (r ≥ R) 4π²0 r " µ ¶2 # Q r 3− 8π²0 R R (2.96) (r ≤ R) . (2.97) O termo constante nesta u ´ltima express˜ao garante a continuidade do potencial sobre a superf´ıcie r = R. Note-se que foi feita a escolha usual, limr→∞ V (r) = 0. Usando a rela¸c˜ ao ∇V = −E e tomando a express˜ao do gradiente em coordenadas esf´ericas (Apˆendice B) pode o leitor confirmar que as express˜oes obtidas para o potencial s˜ao consistentes com as indicadas para o campo el´ectrico [Eqs. (2.94) e (2.95)]. 34 • ´tico Campo electromagne 2.6.6 Campo criado por um plano de corrente uniforme Quest˜ ao Calcular o campo de indu¸c˜ao magn´etica em todo o espa¸co criado por uma densidade de corrente uniforme que percorre um plano infinito. Resposta Considere-se que o plano de correntes ´e o plano xy e, portanto, que o eixo z ´e perpendicular a esse plano. Seja κ = κ jˆ a densidade superficial de corrente. O campo de indu¸c˜ ao magn´etica n˜ao pode depender nem de x nem de y, pois a distribui¸c˜ ao de correntes ´e infinita segundo essas direc¸c˜oes. Eventualmente, poder´a depender de z, ou seja, da distˆancia ao plano. Assim, ˆ. B (r ) = Bx (z) ˆi + By (z) jˆ + Bz (z) k (2.98) De acordo com a lei de Biot-Savart, o campo elementar dB produzido por um elemento de corrente dl0 ´e perpendicular a este. Logo, o campo n˜ao pode ter componente segundo y (a direc¸c˜ao da corrente superficial). Por outro lado, a divergˆencia do campo de indu¸c˜ ao magn´etica ´e nula, ∇ · B = 0 [cf. Eq. (2.26)] e, dada a forma (2.98), conclui-se que Bz tem de ser constante. Usando argumentos de simetria, ´e f´acil concluir que esta constante ´e nula. Assim, consideremos um ponto P de coordenadas (X, Y, Z). As correntes no semiplano x > X criam em P um campo B cuja componente segundo z ´e anulada pelas correntes no semi-plano x < X, resultando um campo de indu¸c˜ ao magn´etica paralelo ao plano de correntes. y k k 2 x 1 d B d B 1 d B P 2 z Figura 2.14. Campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica criado por plano de correntes. Na Figura 2.14 representam-se esquematicamente os campos criados num ponto P (0, 0, Z) por duas correntes localizadas simetricamente relativamente ao eixo y. O campo (infinitesimal) produzido por estas correntes ´e paralelo ao plano xy, o mesmo se verificando para quaisquer duas correntes localizadas simetricamente em rela¸c˜ ao ao eixo y. Como o plano de correntes ´e infinito, as raz˜oes aduzidas mantˆem-se v´alidas para qualquer ponto, independentemente da sua localiza¸c˜ao. Desta discuss˜ao conclui-se que B = Bx (z) ˆi . ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 35 Exploremos agora a Eq. (2.45) em z = 0: ˆ × (B2 − B1 ) = µ0 κ . rotS B = n ˆ , se fizermos B2 = B ˆi em z = 0+ , ent˜ ˆ = k Escolhendo n ao B1 = −B ˆi em z = 0− e a equa¸c˜ao anterior reduz-se a 2 B = µ0 κ , donde se obt´em a grandeza do campo, B= κ µ0 , 2 (2.99) junto ao plano de correntes. y x C B D A L z Figura 2.15. Contorno ABCDA adequado ao c´ alculo da circula¸ c˜ ao do campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica. Esse contorno ´ e paralelo ao plano xz. Considere-se, por fim, a circula¸c˜ ao de B ao longo de um rectˆangulo horizontal (paralelo ao plano xz, como mostra a Figura 2.15). Esta circula¸c˜ ao ´e nula, pois n˜ao h´a fluxo de corrente atrav´es da superf´ıcie que se apoia no contorno considerado. Os lados do rectˆangulo paralelos ao plano de corrente tˆem comprimento L e os lados perpendiculares comprimento arbitr´ario. ˆ A circula¸c˜ao de B ao longo destes dois lados ´e nula, porque B ´e perpendicular ao versor k 0 (direc¸c˜ao da circula¸c˜ao). Sendo L o comprimento comum dos segmentos AB e CD, B o valor do campo de indu¸c˜ao magn´etica em cada ponto do segmento AB e B 00 o valor do campo no segmento CD, a circula¸c˜ao ao longo do contorno escolhido reduz-se a B 0 L − B 00 L = 0 → B 0 = B 00 , ou seja, o m´odulo do campo B n˜ ao depende da distˆancia ao plano de correntes. Podemos, ent˜ao, concluir que o campo B ´e constante, tanto nas regi˜oes z > 0, como z < 0, sendo o seu valor dado por (2.99). Teremos, pois, B = − B = κ µ0 ˆ i 2 κ µ0 ˆ i 2 para z < 0 para z > 0 . 36 • ´tico Campo electromagne 2.6.7 Distribui¸c˜ ao de correntes entre planos paralelos Quest˜ ao ˆ , entre duas Considerar uma distribui¸c˜ao de correntes de densidade uniforme, j = j0 k superf´ıcies planas infinitas perpendiculares ao eixo x e situadas `a distˆancia a uma da outra. Calcular o campo de indu¸c˜ao magn´etica em todo o espa¸co. Resposta Em regime estacion´ario o campo de indu¸c˜ ao magn´etica e as correntes volum´etricas que o produzem relacionam-se atrav´es da Eq. (2.40), que aqui reescrevemos: ∇ × B = µ0 j . (2.100) A direc¸c˜ao do campo produzido ´e identificada explorando algumas simetrias do problema. Sabemos que o campo tem de ser perpendicular `as correntes que o originam e, por isso, na situa¸c˜ao concreta que estamos a estudar, o campo s´o pode estar no plano x y, j´a que a corrente tem a direc¸c˜ao do eixo z. z j j a /2 a /2 x n D A B B B j j ^ B y C B Figura 2.16. Esquema da distribui¸ c˜ ao de correntes do Problema 2.6.7. A Figura 2.16 mostra um esquema da situa¸c˜ ao descrita no enunciado, tendo-se considerado a origem dos eixos no ponto m´edio do segmento perpendicular aos dois planos infinitos. A Figura 2.17 mostra a situa¸c˜ao em estudo segundo um corte por um plano horizontal (por exemplo, o plano z = 0). O campo criado em qualquer ponto, P1 , do eixo y (x = 0) ´e nulo. Compreende-se que assim seja pois a distribui¸c˜ ao de correntes ´e sim´etrica relativamente a este ponto, quer no sentido positivo, quer no sentido negativo do eixo x, do eixo y e do eixo z. Como se depreende da Figura 2.17, para pontos P2 da regi˜ao − a2 < x < 0 o campo ´e paralelo ao eixo y e aponta no sentido negativo deste eixo. Na zona 0 < x < a2 , o campo continua a ser paralelo a y, mas aponta agora no sentido positivo de y. O campo de indu¸c˜ao magn´etica s´o tem, pois, componente segundo a direc¸c˜ ao ˜ es de Maxwell Equac ¸o B P • 37 - a /2 2 P 1 P a /2 B C D x 3 y A B Figura 2.17. Corte transversal da distribui¸ c˜ ao de correntes do Problema 2.6.7. y. Por outro lado, s´o pode depender da coordenada x (a distribui¸c˜ ao ´e infinita segundo y e segundo z). Para B = By (x) jˆ a Eq. (2.100) escreve-se ent˜ ao ˆ ∇×B =k donde ∂ ˆ, By = µ0 j0 k ∂x dBy = µ0 j0 , dx que integrada conduz a By (x) = µ0 j0 x . A constante que vem da integra¸c˜ ao da equa¸c˜ ao diferencial ´e nula, pois s´o assim se garante que By (x = 0) = 0. Em termos vectoriais B = µ0 j0 x jˆ , − a a ≤x≤ . 2 2 Para determinar o campo fora do dom´ınio onde h´a correntes considere-se o contorno ABCDA indicado nas figuras 2.16 e 2.17, e a equa¸c˜ ao integral correspondente `a lei diferencial (2.100): I C B · dl = µ0 i , (2.101) onde i ´e a corrente que flui atrav´es de uma superf´ıcie que se apoia no contorno fechado C. Fora da regi˜ao onde h´a correntes o campo continua a ter a direc¸c˜ ao de y, como se pode comprovar utilizando os mesmos argumentos de simetria expressos acima (que s˜ao os argumentos utilizados tamb´em no problema anterior). A circula¸c˜ ao do campo de indu¸c˜ ao magn´etica ao longo de ABCDA ´e nula, pois i = 0. Por outro lado, a circula¸c˜ ao ao longo de BC e de DA ´e zero, dado que o campo tem a direc¸c˜ ao do eixo y e a circula¸c˜ ao se faz ao longo do eixo x. Deste modo, a circula¸c˜ ao do campo ao longo do lado AB ter´a de ser sim´etrica da circula¸c˜ao ao longo do lado CD. Como estes lados tˆem igual comprimento, o campo B ter´a de ter o mesmo valor sobre cada um deles. Sendo arbitr´aria a distˆancia a que cada um 38 • ´tico Campo electromagne dos referidos segmentos se encontra do eixo y, podemos concluir que, fora da distribui¸c˜ao volum´etrica de correntes, o campo B n˜ao depende de y (em analogia com a situa¸c˜ ao do problema anterior). Como n˜ao existe distribui¸c˜ ao superficial de correntes, a componente tangencial do campo de indu¸c˜ao magn´etica (de resto, a u ´nica) n˜ao tem descontinuidade nos a planos x = ± 2 . Deste modo, o valor do campo nas regi˜oes onde n˜ao h´a correntes ´e constante e igual ao seu valor para x = ± a2 . Em resumo para B = para B = 2.6.8 aˆ j 2 µ0 j0 x jˆ a µ0 j0 jˆ 2 B = −µ0 j0 para a x≤− 2 a a − ≤x≤ 2 2 a x≥ . 2 Cilindro carregado a rodar Quest˜ ao Um cilindro infinito de raio a tem distribu´ıda no seu interior uma densidade de carga uniforme, ρ. O cilindro roda em torno do seu eixo com velocidade angular constante, ω. Calcular o campo de indu¸c˜ao magn´etica em todo o espa¸co. Resposta A densidade de corrente devida ao movimento de rota¸c˜ ao ´e ˆφ . j = ρv = ρω × r = ρωre (2.102) O campo B n˜ao pode depender de z, pois o cilindro ´e infinito. Tamb´em n˜ao pode depender do ˆangulo φ, pois a distribui¸c˜ao de correntes n˜ao depende deste ˆangulo. Dadas estas restri¸c˜ oes, o campo B s´o pode ter a forma ˆ r + Bz (r)e ˆ z + Bφ (r)e ˆφ . B = Br (r)e (2.103) Da lei de Biot-Savart tem de se concluir que Bφ = 0, pois os elementos de corrente tˆem a ˆ φ , como mostra (2.102). Como a divergˆencia do campo de indu¸c˜ direc¸c˜ao de e ao magn´etica ´e nula, ∇ · B = 0, conclui-se, utilizando coordenadas cil´ındricas, que ∂Bz 1∂ (r Br ) + = 0. r ∂r ∂z Ora, o u ´ltimo termo ´e nulo, pois n˜ao h´a dependˆencia em z, e portanto Br = C . r Esta express˜ao ´e v´alida tanto no interior como no exterior da distribui¸c˜ ao, mas a constante C n˜ao tem de ser necessariamente a mesma dentro e fora do cilindro. Do lado de dentro, C = 0, a fim de evitar que o campo em r = 0 se torne infinito. Por outro lado, a divergˆencia superficial do campo B ´e nula, o que significa que a componente de B segundo a normal a uma superf´ıcie de separa¸c˜ao tem de ser cont´ınua. Uma vez que se tem Br = 0 no interior do ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 39 cilindro (incluindo r = a− ), ter´a de ser Br = 0 para r = a+ , o que implica que, tamb´em no exterior, C = 0. Assim, tem-se Br = 0 em todo o espa¸co. A express˜ao (2.103) reduz-se agora a ˆz . B = Bz (r) e (2.104) No interior do cilindro, ˆφ ∇ × B = µ0 j = µ0 ρ ω r e e, no exterior, ∇ × B = 0, pois n˜ao h´a correntes. O rotacional de (2.104) em coordenadas cil´ındricas ´e simplesmente ∇×B =− dBz ˆφ , e dr uma vez que n˜ao h´a dependˆencia em φ. No interior − donde dBz = µ0 ρ ω r , dr 1 Bz = − µ0 ρ ω r2 + C0 . 2 No exterior, − (2.105) dBz = 0, dr donde Bz = C00 . A constante C00 tem de ser nula para que o campo seja nulo no exterior, tal como se mostrou no Exemplo 2.4. Por outro lado, n˜ao havendo distribui¸c˜ oes superficiais de corrente, o rotacional superficial do campo B ´e nulo: ˆ r × (B2 − B1 ) = 0 . rotS B = e Esta express˜ao permite obter o valor da constante C0 em (2.105): C0 = 1 µ0 ρ ω a2 . 2 Finalmente, o campo de indu¸c˜ao magn´etica em todo o espa¸co ´e dado por 1 ˆz µ0 ρ ω (a2 − r2 ) e 2 B = 0 B = 2.6.9 r≤a r ≥ a. Cilindro com carga superficial a rodar Quest˜ ao Sobre a superf´ıcie de um cilindro infinito de raio a encontra-se distribu´ıda uma carga el´ectrica com densidade uniforme σ. O cilindro roda em torno do seu eixo com velocidade angular constante, ω. Determinar o campo de indu¸c˜ ao magn´etica em todo o espa¸co. 40 • ´tico Campo electromagne Resposta Devido ao movimento de rota¸c˜ao do cilindro, as cargas superficiais d˜ao origem a correntes superficiais, tendo-se κ = σv. A velocidade linear de rota¸c˜ao dos pontos da superf´ıcie do cilindro relaciona-se com a velocidade angular atrav´es de v = ωa, podendo escrever-se ˆφ . κ = σωae (2.106) Esta densidade superficial de correntes ´e aquela que se observa no caso de um solen´oide. Recordamos que, no caso do solen´oide infinito (Exemplo 2.4), h´a uma densidade de corrente ˆ φ (n ´e o n´ superficial κ = n i e umero de espiras por unidade de comprimento e i ´e a corrente) que produz um campo de indu¸c˜ao magn´etica nulo fora do solen´oide e constante, igual a [cf. ˆ z (z ´e a direc¸c˜ Eq. (2.50)] B = µ0 n i e ao do eixo do solen´oide), no interior. Fazendo a correspondˆencia ni → σ ω a, conclui-se que o campo produzido pelo cilindro que roda ´e nulo no exterior do cilindro e no interior ´e constante e dado por ˆz . B = µ0 σ ω a e (2.107) Formalmente, este resultado pode ser obtido a partir de (2.45) notando que (i) o campo no exterior ´e nulo; (ii) no interior, junto `a superf´ıcie, o campo tem a direc¸c˜ ao do eixo do ˆ =e ˆ r . Vem, ent˜ cilindro; (iii) sobre a superf´ıcie lateral, n ao [ver (2.106)], ˆ r × (0 − B e ˆ z ) = µ0 σ ω a e ˆφ , e donde se conclui (2.107). 2.6.10 Potencial vector de um campo uniforme Quest˜ ao ˆ. Determinar o potencial vector A que d´a origem a um campo uniforme B0 = B0 k Resposta Da rela¸c˜ao entre o potencial vector e o campo de indu¸c˜ ao magn´etica, B = ∇ × A [cf. Eq. (2.29)] obtemos, usando coordenadas cartesianas, ∂Ay ∂Az − ∂y ∂z ∂Ax ∂Az − ∂z ∂x ∂Ay ∂Ax − ∂x ∂y = 0 = 0 = B0 . O potencial A ´e ortogonal a B , pelo que n˜ao pode ter componente segundo o eixo z. Fazendo nas equa¸c˜oes anteriores Az = 0, verifica-se que elas s˜ao satisfeitas simultaneamente se Ax e Ay n˜ao dependerem de z. Tˆem-se, de entre muitas outras, as seguintes situa¸c˜ oes poss´ıveis: ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 41 a) Ax = 0 e Ay = B0 x. O potencial vector est´a representado num diagrama xy na Figura 2.18 (a); b) Ay = 0 e Ax = −B0 y. O potencial vector est´a representado num diagrama xy na Figura 2.18 (b); c) Ax = −B0 y2 e Ay = B0 x2 . As linhas equipotenciais, dadas pela equa¸c˜ ao A2x + A2y = C est˜ao representadas num diagrama xy na Figura 2.18 (c). y y y x x (a ) (b ) x (c ) Figura 2.18. Linhas do potencial vector para campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica constante. Em cada linha indica-se o vector A. Este problema deixa clara a arbitrariedade que existe na determina¸c˜ ao do potencial vector. No caso considerado, esta arbitrariedade na obten¸c˜ ao de A reflecte a possibilidade de um campo de indu¸c˜ao magn´etica uniforme poder ser obtido numa dada regi˜ao do espa¸co de muitas maneiras. De facto, o campo uniforme pode ser obtido, por exemplo, a partir de um plano de correntes uniformes (ver Problema 2.6.6), correspondendo-lhe, neste caso, os diagramas (a) ou (b), tal como pode ser criado por um solen´oide muito longo em pontos do seu interior (Exemplo 2.4), correspondendo, neste caso, `a situa¸c˜ ao (c). A simetria de A reflecte, em cada caso, a simetria das fontes que d˜ao origem ao campo de indu¸c˜ ao magn´etica. A direc¸c˜ ao de A ´e, em cada caso, paralela `a direc¸c˜ao das fontes. 2.6.11 Potencial vector de um solen´ oide infinito Quest˜ ao Considerar um solen´oide muito longo, com n espiras por unidade de comprimento, e percorrido por uma corrente i. Calcular o potencial vector A no interior e no exterior do solen´oide. Resposta O potencial vector criado por uma corrente filamentar ´e [cf. (2.33)] A= µ0 i 4π I C dl , a 42 • ´tico Campo electromagne onde C designa a linha percorrida pela corrente i, e a a distˆancia desde um elemento de linha d` at´e ao ponto onde se deseja obter o potencial. A integra¸c˜ ao faz-se sobre todos os elementos ˆ ˆ de linha dl = d` t, sendo t o versor tangente ao elemento de linha. No caso do solen´oide, e ˆφ. utilizando coordenadas cil´ındricas, o potencial vector A tem a direc¸c˜ ao do versor e d l1 i d l2 Figura 2.19. Vista em corte do solen´ oide infinito. Sobre o eixo do solen´ oide o potencial vector ´ e nulo. Em qualquer ponto do eixo do solen´oide (ver Figura 2.19) o potencial vector ´e nulo, pois a contribui¸c˜ao de um elemento dl de uma qualquer espira do solen´oide ´e anulada pela do elemento diametralmente oposto da mesma espira. As linhas equipotenciais do potencial vector s˜ao circunferˆencias com centro no eixo do solen´oide [ver problema anterior; ao campo constante B no interior do solen´oide correspondem as linhas equipotenciais representadas na Figura 2.18 (c)]. Usando o teorema de Stokes e atendendo `a rela¸ca˜o entre o potencial vector e o campo de indu¸c˜ao magn´etica, B = ∇ × A, pode escrever-se I C Z A · dl = S Z ∇ × A · dS = S B · dS . (2.108) Nesta express˜ao, S designa uma superf´ıcie que se apoia em C. O campo de indu¸c˜ ao magn´etica no interior do solen´oide ´e ˆz B = µ0 n i e e no exterior ´e nulo. Aplicando a express˜ao (2.108) a um contorno circular com centro no eixo do solen´oide, obt´em-se: i) No interior do solen´oide, 2πrA(r) = µ0 n i π r2 , donde A(r) = µ0 n i r ; 2 ii) no exterior do solen´oide, 2πrA(r) = µ0 n i π a2 , ˜ es de Maxwell Equac ¸o donde A(r) = • 43 µ0 n i a2 . 2r Em s´ıntese, e em termos vectoriais, A=  µ0 n i r e  ˆφ   2 r≤a    µ0 n i a2 ˆ 2 r eφ r ≥ a. (2.109) ´ curioso notar que, no exterior do solen´oide, o potencial varia com r, apesar de o campo E de indu¸c˜ao magn´etica ser nulo nessa regi˜ao. 2.6.12 Corrente vari´ avel em solen´ oide Quest˜ ao Um fio condutor est´a enrolado uniformemente em torno de um cilindro de comprimento L e raio a (L À a), descrevendo N espiras. Sendo i(t) = i0 cos(ωt) a corrente que percorre o fio condutor (com i0 constante e ω designando a frequˆencia angular), determinar a corrente induzida numa espira quadrada de lado ` colocada no interior do solen´oide num plano perpendicular ao seu eixo. A espira quadrada tem resistˆencia R. Resposta O campo de indu¸c˜ao magn´etica produzido pelo solen´oide infinito ´e [ver (2.50) e (2.51)]   ˆz  B = µ0 n i0 cos ωt e r a, sendo perpendicular ao plano da espira quadrada. O n´ umero de espiras por unidade de comprimento ´e n = N/L. O fluxo do campo atrav´es da superf´ıcie plana S que se apoia na espira quadrada ´e φ = `2 µ0 n i0 cos ωt . A for¸ca electromotriz induzida na espira ´e dada pela lei de Faraday [Eq. (2.55)] Ei = − dφ = `2 µ0 n i0 ω sin ωt , dt onde o sinal negativo exprime a lei de Lenz. A corrente induzida, i0 (t), ´e dada por i0 (t) = `2 ω µ0 n i0 Ei = sin ωt . R R (2.110) 44 • ´tico Campo electromagne 2.6.13 Solen´ oide toroidal Quest˜ ao Um solen´oide toroidal ´e constitu´ıdo por um condutor enrolado em torno de um tubo de sec¸c˜ao rectangular, como se indica na Figura 2.20, formando N espiras. a) Sabendo que o fio ´e percorrido por uma corrente de intensidade i, calcular o campo de indu¸c˜ao magn´etica no interior e no exterior do tor´oide; b) Calcular o fluxo do campo de indu¸c˜ ao magn´etica que atravessa a ´area delimitada pela espira ABCDA indicada na figura; c) Se a intensidade da corrente variar com o tempo segundo i(t) = 2t, calcular a for¸ca electromotriz induzida na espira ABCDA. B A b a L D C Figura 2.20. Solen´ oide toroidal. Resposta Tal como no solen´oide infinito, tamb´em aqui n˜ao h´a campo de indu¸c˜ ao magn´etica na regi˜ao exterior `a superf´ıcie onde h´a distribui¸c˜ ao de correntes e, dada a simetria do sistema, no interior do solen´oide toroidal as linhas do campo s˜ao circunferˆencias com centro no eixo do tor´oide. Vamos determinar, em primeiro lugar, a forma do campo de indu¸c˜ ao magn´etica B (r ). Seja o eixo z o eixo de simetria do sistema. A face plana inferior do tor´oide est´a no plano z = 0 e a face plana superior no plano z = L. O campo de indu¸c˜ ao magn´etica n˜ao pode depender do ˆangulo azimutal φ, pois h´a simetria axial em torno de z. Dado um ponto qualquer, considerese o plano vertical que passa por esse ponto e pelo eixo z. Esse plano divide o tor´oide em duas partes. As correntes nas faces cil´ındricas do tor´oide s˜ao paralelas ao eixo z e, por isso, produzem no ponto considerado um campo de indu¸c˜ ao magn´etica sem componente z. Por outro ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 45 lado, as correntes horizontais nas faces superior e inferior j´a podem, em princ´ıpio, produzir componentes Bz . Considerando uma face plana de cada vez, as correntes horizontais de um dos lados do plano vertical acima referido produzem um campo de indu¸c˜ ao magn´etica cuja componente vertical ´e exactamente anulada pela componente vertical do campo produzido pelas correntes dispostas simetricamente do outro lado do plano. Pode pois concluir-se que ˆ r + Bφ (r, z) e ˆφ. Bz = 0 e, consequentemente, em qualquer ponto do espa¸co, B (r ) = Br (r, z) e Esta express˜ao vai simplificar-se ainda mais, como veremos de seguida. O campo de indu¸c˜ao magn´etica obedece `a equa¸c˜ ao ∇ · B = 0. Em coordenadas cil´ındricas, e n˜ao havendo dependˆencia em φ, esta equa¸c˜ ao reduz-se a 1∂ (r Br ) = 0 , r ∂r de onde se obt´em C . r Para r = 0 (eixo do tor´oide), o campo tem de permanecer finito, pelo que C = 0. Contudo, Br = 0 n˜ao s´o para r < a, mas tamb´em para a ≤ r ≤ b e r ≥ b, pois a componente normal do campo tem de ser cont´ınua nas superf´ıcies cil´ındricas do tor´oide. Evidentemente que, para z < 0 e z > L, tamb´em Br = 0. O campo de indu¸c˜ ao magn´etica tem agora a forma mais ˆ φ e as linhas de campo s˜ao circunferˆencias com centro em pontos restrita B (r ) = Bφ (r, z) e do eixo z. Vamos mostrar que, no interior do solen´oide, n˜ao pode haver dependˆencia do campo na vari´avel z. Considere-se o contorno MNOPM totalmente dentro do solen´oide, sendo MN e OP arcos de circunferˆencia, de raio r, comprimento `1 e com centro no eixo z; NO e PM s˜ao segmentos de recta verticais de comprimento arbitr´ario `2 (ver Figura 2.21). Br = N O M P Figura 2.21. Contorno MNOPM no interior do solen´ oide. A circula¸ c˜ ao do campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica ´ e nula ao longo desse contorno. A circula¸c˜ao do campo B ao longo do trajecto MNOPM ´e nula, pois n˜ao h´a fluxo de corrente atrav´es, por exemplo, da superf´ıcie cil´ındrica delimitada por aquele contorno. Mas a circula¸c˜ao de B ´e igual `a soma das seguintes contribui¸c˜ oes: 1) circula¸c˜ ao em MN que ´e simplesmente B`1 , sendo B o valor do campo em cada um dos pontos do arco da circunferˆencia ˆ φ ); 2) circula¸c˜ considerada (recorda-se que B = Bφ (r, z) e ao nos segmentos NO e PM, a qual ´e nula, pois o campo ´e sempre perpendicular `a direc¸c˜ ao da circula¸c˜ ao; 3) circula¸c˜ ao em OP, 46 • ´tico Campo electromagne que ´e dada por −B 0 `1 , sendo B 0 o valor do campo de indu¸c˜ ao magn´etica em cada um dos pontos do arco de circunferˆencia. O sinal negativo indica que, apesar de o campo ter aqui a mesma direc¸c˜ao que no trajecto MN, o sentido da circula¸c˜ ao ´e agora o oposto. Daqui se 0 conclui que B = B e, portanto, o campo n˜ao depende da coordenada z. O mesmo racioc´ınio pode ser aplicado a um contorno cil´ındrico do tipo do considerado mas totalmente fora do tor´oide para se concluir que, em todo o espa¸co, ˆφ . B = Bφ (r) e a) Consideremos uma das linhas do campo, uma circunferˆencia de raio arbitr´ario r (a < r < b), que vamos designar por C, e apliquemos a lei de Amp`ere [cf. Eq. (2.41)] I C B · dl = µ0 itotal (2.111) onde itotal ´e toda a corrente que flui atrav´es da superf´ıcie que se apoia no contorno circular C. Todas as espiras do tor´oide intersectam perpendicularmente o c´ırculo delimitado por C — ver Figura 2.22 —, pelo que a corrente total que flui atrav´es dessa superf´ıcie ´e itotal = N i . C a b Figura 2.22. Vista em corte por um plano horizontal do solen´ oide toroidal. Usando este resultado em (2.111) e tendo em aten¸c˜ ao o sentido da corrente, obt´em-se B (r) = − µ0 N i ˆφ e 2πr a < r < b, express˜ao que ´e v´alida no interior do solen´oide. Fora do solen´oide B s´o poder´a depender de r como atr´as se concluiu. Aplicando de novo a lei de Amp`ere e considerando uma circunferˆencia de raio r < a ou r > b, o primeiro membro da Eq. (2.111) fica, do mesmo modo, 2πrB(r), mas o segundo membro anula-se. Conclui-se, ent˜ ao, que o campo ´e nulo. ˜ es de Maxwell Equac ¸o A • 47 B a L B b D C Figura 2.23. Vista em corte, pelo plano vertical que cont´ em a espira ABCDA, do solen´ oide toroidal. b) Considere-se a Figura 2.23, onde se representa a espira ABCDA da Figura 2.20. Indicase o campo de indu¸c˜ao magn´etica que s´o existe no interior do solen´oide e ´e perpendicular ao plano da espira ABCDA (recorda-se que AD est´a sobre o eixo do tor´oide). O fluxo de B atrav´es da espira reduz-se ao fluxo atrav´es da ´area L×(b − a). Esse fluxo ´e dado por Z φ = Z S = − B · dS = − µ0 N iL 2π Z b dr a r S B dS µ ¶ =− µ0 N iL b ln 2π a . c) A for¸ca electromotriz induzida ´e dada pela express˜ao (2.55). Tendo-se i = 2t, vem µ ¶ µ0 N L b ln Ei = π a 2.6.14 . Anel em campo de indu¸c˜ ao magn´ etica vari´ avel Quest˜ ao Um anel condutor de raio a encontra-se numa regi˜ao onde existe um campo de indu¸c˜ ao magn´etica uniforme perpendicular ao plano do anel e que varia com o tempo segundo a express˜ao B(t) = βt. Determinar a intensidade do campo el´ectrico induzido no anel. Calcular o seu valor quando a = 5 cm e β = 0, 1 Wb m−2 s−1 . Resposta A for¸ca electromotriz induzida no anel ´e dada pela express˜ao (2.55). Por outro lado, o fluxo do campo de indu¸c˜ao magn´etica atrav´es do c´ırculo (de ´area S = πa2 ) delimitado pelo anel ´e Z φ= B · dS = πa2 B . S A for¸ca electromotriz induzida ´e pois3 εi = − 3 dφ = −πa2 β . dt (2.112) Representamos a for¸ca electromotriz induzida por εi , ao contr´ ario da nota¸ca ˜o Ei recomendada pelas normas em vigor, para que se n˜ ao confunda com o campo el´ectrico, E. 48 • ´tico Campo electromagne A corrente no anel e o campo el´ectrico s˜ao proporcionais e, portanto, este ´e da forma ˆ φ , sendo E constante. Por outro lado, a for¸ca electromotriz no anel ´e, por defini¸c˜ E =Ee ao, igual `a circula¸c˜ao ao longo do anel C do campo el´ectrico induzido, E : I εi = C E · dl = 2 π a E . O m´odulo do campo el´ectrico induzido obt´em-se facilmente das duas express˜oes anteriores: 1 aβ . 2 |E| = Os sentidos de B e de E s˜ao os indicados na Figura 2.24. B B E a i Figura 2.24. Campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica e campo el´ ectrico induzido na espira. Para os valores dados para a e β obt´em-se |E| = 2, 5×10−3 V/m . 2.6.15 Ciclotr˜ ao Quest˜ ao A Figura 2.25 representa esquematicamente um ciclotr˜ao, que ´e um dispositivo que permite aumentar a energia cin´etica de cargas el´ectricas recorrendo `a ac¸c˜ ao combinada de campos el´ectricos e de indu¸c˜ao magn´etica. O ciclotr˜ao ´e formado por duas cavidades semicil´ındricas, ligeiramente afastadas, nas quais est´a presente um campo de indu¸c˜ ao magn´etica est´atico e uniforme com a direc¸c˜ao do eixo do cilindro. Na fenda entre as partes semicil´ındricas aplica-se uma diferen¸ca de potencial alternada. Seja R o raio do ciclotr˜ao e B a intensidade do campo de indu¸c˜ao magn´etica aplicado. Obter a energia cin´etica m´axima que uma part´ıcula de massa m e carga q pode adquirir neste acelerador. Resposta Vamos analisar este problema sabendo que no interior das cavidades semicil´ındricas o campo el´ectrico ´e nulo e, na fenda entre as cavidades, ´e nulo o campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Quando uma part´ıcula carregada ´e ejectada na fenda entre as cavidades fica sujeita a uma diferen¸ca de potencial que, dependendo do sinal da sua carga, a obriga a deslocar-se para uma das cavidades semicil´ındricas, onde penetra com uma certa velocidade v0 , que vamos ˜ es de Maxwell Equac ¸o E • 49 B B Figura 2.25. Ciclotr˜ ao. considerar perpendicular ao plano que delimita a cavidade semicil´ındrica, como mostra a Figura 2.25. Sob a ac¸c˜ao do campo de indu¸c˜ ao magn´etica, a part´ıcula passa a descrever uma traject´oria circular de raio R0 , mantendo constante o valor da velocidade at´e entrar de novo na regi˜ao da fenda. Se nessa altura, a diferen¸ca de potencial entre os dois semicilindros for oposta `a que a part´ıcula experimentou inicialmente, o que requer uma adequada sincroniza¸c˜ ao do gerador da tens˜ao, a part´ıcula ´e acelerada at´e `a outra cavidade semicil´ındrica, onde penetra com velocidade v1 > v0 . Sujeita de novo a um campo de indu¸c˜ ao magn´etica, a part´ıcula carregada passa a ter movimento circular uniforme, agora de raio R1 > R0 . Ao chegar novamente `a regi˜ao da fenda, o potencial j´a deve estar outra vez invertido, de tal modo que a part´ıcula ´e acelerada at´e penetrar na outra cavidade semicil´ındrica com velocidade v2 > v1 . Passa ent˜ao a descrever uma traject´oria circular de raio R2 > R1 . E assim sucessivamente, at´e que o raio da traject´oria seja pr´oximo do raio do ciclotr˜ao, sendo ent˜ ao a part´ıcula deflectida, por meio de um campo, para fora do ciclotr˜ao, atrav´es de uma pequena abertura na superf´ıcie cil´ındrica. O ponto crucial para o adequado funcionamento do dispositivo ´e a frequˆencia do potencial acelerador, ou do campo el´ectrico resultante, a qual tem de estar ajustada `a frequˆencia do movimento circular da part´ıcula dentro das cavidades. Por cada passagem na fenda a part´ıcula aumenta a sua energia cin´etica de q V , sendo V o “potencial efectivo” aplicado. Antes de calcularmos a energia cin´etica m´axima que a part´ıcula carregada pode adquirir, conv´em apresentar alguns resultados importantes relativos ao movimento circular uniforme de uma carga sujeita a um campo de indu¸c˜ ao magn´etica uniforme perpendicular `a velocidade. Da express˜ao da for¸ca de Lorentz (2.65) e da equa¸c˜ ao fundamental da dinˆamica podemos escrever, para o movimento circular uniforme, qBv = m v2 , r donde se obt´em o raio da traject´oria: r= mv . qB (2.113) 50 • ´tico Campo electromagne O per´ıodo do movimento, tciclo = 2πr 2πm = , v qB n˜ao depende nem do raio nem da velocidade, mas apenas da raz˜ao entre eles, o que constitui um resultado not´avel4 . Assim, as traject´orias semicirculares que as cargas descrevem no ciclotr˜ao demoram todas o mesmo tempo, independentemente do seu raio e da velocidade ´ este resultado que permite uma f´acil sincroniza¸c˜ da part´ıcula. E ao do potencial alternado aplicado: basta utilizar um gerador de tens˜ao alternada de frequˆencia 1/tciclo . A energia cin´etica da part´ıcula ´e 1 T = mv 2 . 2 Resolvendo (2.113) em ordem a v, substituindo na express˜ao anterior e fazendo r = R (o valor m´aximo do raio das traject´orias semicirculares ´e o raio do ciclotr˜ao), obt´em-se para a energia cin´etica m´axima q 2 R2 B 2 m 2 2 Tmax = = ω R , 2m 2 c onde ωc = 2π tciclo = qB m ´e a frequˆencia do ciclotr˜ao. 2.6.16 Magnetr˜ ao Quest˜ ao Considerar dois cilindros condutores coaxiais, o interior com raio a e o exterior com a superf´ıcie interior de raio b, como mostra a Figura 2.26. Estabelece-se uma diferen¸ca de potencial entre os dois cilindros, ficando o exterior a um potencial positivo, V , relativamente ao interior, e aplica-se um campo de indu¸c˜ ao magn´etica, B , est´atico e uniforme, paralelo ao eixo do cilindro e dirigido para fora do plano da figura. Este dispositivo chama-se magnetr˜ao. Estuda-se a dinˆamica de electr˜oes, de massa m e carga −e, que saem da superf´ıcie do cilindro interior (superf´ıcie aquecida). a) Aplica-se inicialmente o potencial V com B = 0. Determinar a velocidade v com que um electr˜ao atinge a superf´ıcie r = b, admitindo que se liberta da superf´ıcie do cilindro interior com velocidade desprez´avel; b) Considerar agora que V = 0, mas que h´a campo de indu¸c˜ ao magn´etica aplicado e que um electr˜ao parte na direc¸c˜ao radial com velocidade inicial v0 . Para campos de indu¸c˜ao magn´etica com valor superior a um certo valor cr´ıtico Bc , o electr˜ao n˜ao atinge o cilindro exterior (ˆanodo). Representar esquematicamente a traject´oria do electr˜ao quando B ´e ligeiramente superior a Bc e determinar este valor cr´ıtico; Na parte restante deste exerc´ıcio considerar que tanto o potencial V como o campo uniforme B est˜ao presentes. 4 Este resultado ´e v´ alido quando a velocidade das part´ıculas for muito menor do que a velocidade da luz. ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 51 b a B Figura 2.26. Magnetr˜ ao. c) Na presen¸ca do campo de indu¸c˜ ao magn´etica o electr˜ao adquire um momento angular L relativamente ao eixo do cilindro. Obter uma equa¸c˜ ao para a taxa de varia¸c˜ ao temporal do momento angular, dL/dt. Mostrar, a partir dessa equa¸c˜ ao, que L − k e B r2 ´e uma constante do movimento, sendo k um n´ umero e r a distˆancia do electr˜ao ao eixo do cilindro. Determinar o valor de k; d) Considerar que um electr˜ao libertado do cilindro interior com velocidade desprez´avel n˜ao atinge o cilindro exterior. Seja rm a distˆancia m´axima ao eixo do cilindro. Determinar, em fun¸c˜ao de rm , a sua velocidade v no ponto onde a distˆancia radial ´e m´axima; e) Pretende usar-se o campo de indu¸c˜ ao magn´etica com o fim de regular a corrente de electr˜oes para o cilindro exterior. Sendo o campo B superior a um valor cr´ıtico Bc0 , um electr˜ao libertado com velocidade desprez´avel n˜ao atinge o cilindro exterior. Determinar Bc0 ; f) Se os electr˜oes s˜ao libertados devido ao aquecimento do cilindro interior, ter˜ao, em geral, uma velocidade inicial diferente de zero `a superf´ıcie do cilindro. A componente da velocidade de um electr˜ao paralela a B ´e vB , e as componentes perpendiculares a B s˜ao vr (na direc¸c˜ao radial) e vφ (na direc¸c˜ao azimutal). Determinar, neste caso, o valor cr´ıtico Bc00 para que o electr˜ao alcance o cilindro exterior. Resposta a) Quando o electr˜ao ´e libertado a sua energia ´e apenas potencial. Quando atinge o cilindro exterior a sua energia ´e apenas cin´etica. A conserva¸c˜ ao da energia permite escrever 1 m v2 = e V , 2 donde s v= 2 eV . m (2.114) 52 • ´tico Campo electromagne No caso de um tratamento relativista5 temos, da conserva¸c˜ ao da energia m c2 q 1− donde − m c2 = e V , v2 c2 s v=c µ 1− m c2 m c2 + e V ¶2 ; b) Quando V = 0, o electr˜ao fica sujeito apenas ao campo B e a for¸ca que sobre ele se exerce, que ´e perpendicular ao campo e `a sua velocidade, obriga-o a descrever um movimento circular uniforme. A traject´oria ´e o arco de circunferˆencia representado na Figura 2.27. Como a for¸ca de Lorentz ´e a for¸ca centr´ıpeta, o raio da ´orbita, R, obt´em-se da seguinte igualdade: m v02 e B v0 = . (2.115) R a R b -R R B Figura 2.27. Traject´ oria do electr˜ ao para o campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica cr´ıtico. A ao cr´ıtica, o raio da traject´oria satisfaz a rela¸c˜ao √ Figura 2.27 mostra que, na situa¸c˜ 2 2 a + R = b − R , da qual se obt´em a express˜ao de R: R= b2 − a2 . 2b Inserindo em (2.115), obt´em-se, para o campo de indu¸c˜ ao magn´etica cr´ıtico, Bc = 2 b m v0 . (b2 − a2 ) e Para campos de intensidade superior a Bc o electr˜ao n˜ao alcan¸ca o ˆanodo; 5 No Cap´ıtulo 10 faz-se uma introdu¸ca ˜o ` a Teoria da Relatividade Restrita. ˜ es de Maxwell Equac ¸o • 53 c) A varia¸c˜ao temporal do momento angular do electr˜ao ´e igual ao momento da for¸ca que actua sobre a part´ıcula. Da diferen¸ca de potencial aplicada resulta um campo el´ectrico que tem a direc¸c˜ao radial e a for¸ca que este campo exerce no electr˜ao, Fe = −eE , ´e tamb´em radial e d´a contribui¸c˜ ao nula para o momento da for¸ca em rela¸c˜ ao a qualquer ponto do eixo dos cilindros. A for¸ca devida ao campo de indu¸c˜ ao magn´etica, Fm = −e v × B , tem componente radial, Fr , e componente azimutal, Fφ . S´o esta u ´ltima contribui para o momento da for¸ca em rela¸c˜ ao a qualquer ponto do eixo dos cilindros, sendo Fφ r o m´odulo deste momento. Note-se, por outro lado, que apenas a componente radial da velocidade, vr = dr/dt, contribui para Fφ , pelo que podemos escrever M= ou ainda dL dr = r Fφ = e B r dt dt à d e B r2 L− dt 2 ! = 0. Desta express˜ao pode concluir-se que a quantidade entre parˆentesis ´e uma constante do movimento: 1 L − e B r2 = C . (2.116) 2 O parˆametro k referido no enunciado ´e, portanto, 12 ; d) Podemos utilizar a constante de movimento C obtida na al´ınea anterior para determinar a velocidade da part´ıcula no ponto de afastamento m´aximo relativamente ao eixo do cilindro. No instante em que o electr˜ao se desprende do cilindro interior o momento angular ´e nulo. No ponto de afastamento m´aximo o momento angular do electr˜ao ´e m v rm . Assim, de (2.116), 1 1 2 − e B a2 = m v rm − e B rm 2 2 e, portanto, v= 2 − a2 ) e B (rm ; 2 m rm (2.117) e) No caso do campo de indu¸c˜ ao magn´etica cr´ıtico Bc0 , a distˆancia m´axima rm ´e igual ao raio do cilindro exterior, b. A velocidade no ponto de afastamento m´aximo ´e, de (2.117), e Bc0 (b2 − a2 ) v= . (2.118) 2mb Por outro lado, como o trabalho da for¸ca magn´etica ´e nulo, a energia cin´etica da part´ıcula ao atingir o cilindro exterior ´e igual a e V , pelo que a sua velocidade ´e dada por (2.114). Igualando esta express˜ao a (2.118) vem, finalmente, s Bc0 2b = 2 b − a2 2mV ; e f) Nenhuma for¸ca actua sobre o electr˜ao segundo a direc¸c˜ ao do campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Se a componente da velocidade inicial do electr˜ao ao longo dessa direc¸c˜ ao for vB , ser´a 54 • ´tico Campo electromagne tamb´em vB quando atinge o cilindro exterior. Designemos por vφ e por vr as componentes azimutal e radial da velocidade inicial do electr˜ao com energia m´ınima para atingir o cilindro exterior. A conserva¸c˜ ao da energia exprime-se por 1 1 2 2 m (vB + vφ2 + vr2 ) + e V = m (vB + v2) , 2 2 (2.119) onde v ´e a componente azimutal da velocidade do electr˜ao ao atingir o cilindro exterior (como estamos a considerar a situa¸c˜ ao-limite em que o electr˜ao ainda atinge o cilindro exterior, a componente radial da velocidade ´e nula). De (2.119), s vr2 + vφ2 + v= 2eV . m (2.120) Por outro lado, pode aplicar-se `a presente situa¸c˜ ao a Eq. (2.116), tendo em conta que a grandeza L que entra nessa express˜ao ´e o momento angular na direc¸c˜ ao do eixo dos cilindros (ou seja, a componente vB da velocidade n˜ao contribui para L dessa express˜ao). Considerando pontos `a superf´ıcie dos dois cilindros tem-se m vφ a − 1 1 e Bc00 a2 = m vb − e Bc00 b2 . 2 2 O campo cr´ıtico ´e, pois, Bc00 = 2 m (v b − vφ a) , e (b2 − a2 ) ou ainda, utilizando (2.120), s  vφ a  2mb 2eV  v2 + v2 + − . Bc00 = r φ 2 2 e (b − a ) m b 56 • ´tico Campo electromagne CAP´ITULO 3 ´ ENERGIA ELECTROSTATICA Na primeira parte deste cap´ıtulo aborda-se o problema da determina¸c˜ ao da energia electrost´atica associada a uma distribui¸c˜ ao est´atica de cargas. Na segunda parte considera-se o problema das for¸cas el´ectricas em condutores. 3.1 ˜ ESTATICA ´ ENERGIA DE UMA DISTRIBUIC ¸ AO DE CARGAS Consideremos um conjunto de cargas el´ectricas pontuais fixas (n˜ao importa como!) numa certa regi˜ao do espa¸co. Pretende-se saber qual ´e a energia (potencial electrost´atica) “armazenada” num tal sistema f´ısico. Conceptualmente, a quest˜ao ´e bem simples: a energia ´e igual ao trabalho que ´e necess´ario realizar por um agente externo, por exemplo pela for¸ca exterior Fext , para construir a referida distribui¸c˜ ao, trazendo as cargas do infinito. Para trazer uma primeira carga q n˜ao ´e necess´ario realizar qualquer trabalho: a energia electrost´atica de uma s´o carga pontual ou auto-energia ou energia pr´ opria considera-se nula1 . Traz-se agora 0 do infinito uma segunda carga q ` a presen¸ca de q, deixando-a, no final, a uma distˆancia a desta. A for¸ca el´ectrica a que q 0 fica sujeita ´e dada por [ver (2.2)] F = q0E , sendo E o campo el´ectrico criado por q no ponto em que q 0 se encontra. Ora, a for¸ca cujo trabalho importa considerar para a obten¸c˜ ao da energia electrost´atica ´e a sim´etrica desta, Fext = −F . O trabalho realizado pela for¸ca externa ´e dado por Wext = 1 Z a ∞ Fext · dl = − qq 0 4π²0 Z a 1 ∞ r dr = − 2 µ ¯ qq 0 1 ¯a qq 0 − ¯¯ = . 4π²0 r ∞ 4π²0 a Dizemos “considera-se” porque, embora isso possa parecer paradoxal, a teoria cl´ assica do electromagnetismo prevˆe uma auto-energia que at´e ´e infinita! Veremos este ponto mais ` a frente nesta mesma sec¸ca ˜o. Na verdade, sempre que se fala em energia electrost´ atica de uma distribui¸ca ˜o de cargas pontuais excluem-se todas as auto-energias. 58 • ´tico Campo electromagne Este trabalho ´e igual `a energia (electrost´atica) armazenada no sistema. Numa outra perspectiva, pode afirmar-se que esta energia ´e afinal o trabalho realizado pela for¸ca do campo quando se “desfaz” a distribui¸c˜ao, ou seja2 , U =W = Z ∞ a q q0 F · dl = 4 π ²0 Z ∞ 1 a r dr = 2 qq 0 . 4 π ²0 a Se tivermos mais de duas cargas, ´e conveniente considerar para cada par de cargas qi e qj a energia respectiva: qi qj , Uij = 4π²0 rij onde rij =| ri − rj |, sendo ri e rj respectivamente os vectores posicionais de cada uma das cargas. Usando a nova nota¸c˜ao, a energia associada `as cargas 1 e 2 ´e, pois, U21 = U12 . Se transportarmos agora uma terceira carga q3 do infinito para junto das outras duas, colocandoa a uma distˆancia r31 de q1 e r32 de q2 , o trabalho que ´e necess´ario realizar ´e q3 q1 q3 q2 + = U (3) 4 π ²0 r13 4 π ²0 r23 e a energia total do sistema ´e esta mais U (2) = U21 . Para trazer a carga N `a presen¸ca das restantes N − 1 tem de se realizar um trabalho que vai ser igual `a varia¸c˜ ao da energia do sistema: U (N ) = N −1 X UN i . i=1 A energia total armazenada no sistema de N cargas ´e, pois, U= N X U (j) j=2 ou, ainda, U= X todos os N 1 X Uij = Uij = 2 i=1 i R , e 4π²0 r2 66 • ´tico Campo electromagne ´e mais f´acil calcular a energia a partir de (3.10): Ue µ Z ²0 Q E dv = 4π = 2 4π²0 Q2 1 Q2 = 2π²0 = . 8π²0 R 16π 2 ²20 R ²0 2 2 ¶2 Z ∞ 1 R r4 r2 dr Admitindo que esta energia ´e igual `a energia de repouso de um electr˜ao, mc2 , obt´em-se para o raio desta part´ıcula o valor R= Q2 . 8π²0 mc2 Fazendo as substitui¸c˜oes, Q = 1, 602×10−19 C ²0 = 8, 854×10−12 F m−1 m = 9, 109×10−31 kg c = 3×108 m s−1 , obt´em-se R = 1, 4×10−15 m = 1, 4 fm . Um tal modelo para o electr˜ao est´a claramente errado, pois o electr˜ao, se for extenso, ter´a uma dimens˜ao v´arias ordens de grandeza inferior a esta. O prot˜ao (part´ıcula cuja estrutura ´e relativamente bem conhecida experimentalmente) tem dimens˜ao da ordem do fermi. Considerando agora que a carga do electr˜ao se distribui uniformemente, tem-se Ue0 = mc2 onde agora se designa por Ue0 a energia (3.21). Como Ue0 = 6Ue /5, segue-se que R0 = 6R/5, isto ´e, no modelo em que a carga est´a uniformemente distribu´ıda no volume esf´erico o raio do electr˜ao ´e da mesma ordem de grandeza da do valor encontrado antes. 3.3.3 Energia de um condensador plano Quest˜ ao Calcular a energia armazenada num condensador plano a partir de ²0 2 R E 2 dv. Resposta Seja A a ´area das placas do condensador plano e d a distˆancia (pequena) entre elas. A capacidade do condensador plano ´e A (3.22) C = ²0 . d Se for Q a carga do condensador, a energia armazenada ´e Ue = 1 Q2 . 2 C (3.23) Trata-se agora de obter este resultado a partir da express˜ao (3.10). O m´odulo do campo el´ectrico entre as placas do condensador ´e constante e dado por E= σ , ²0 ´ tica Energia electrosta • 67 sendo σ a densidade superficial de carga nas placas. O campo ´e nulo fora dessa regi˜ao. A energia calculada a partir de (3.10) ´e, pois, ²0 Ue = 2 µ σ ²0 ¶2 Ad. Como Q = σA, e atendendo a (3.22), da express˜ao anterior resulta imediatamente (3.23). 3.3.4 For¸ca num condensador plano isolado Quest˜ ao Considere-se um condensador plano carregado e isolado. Usando o m´etodo do trabalho virtual, obter a for¸ca por unidade de ´area que se exerce em cada placa do condensador em fun¸c˜ao do campo el´ectrico. Resposta Seja x a separa¸c˜ao das placas do condensador plano e A a ´area de cada uma das placas. A capacidade do condensador ´e A C = ²0 . (3.24) x Se o condensador estiver carregado com a carga Q, a densidade superficial de carga ´e σ = Q/A e o campo el´ectrico entre as placas ´e σ . (3.25) E= ²0 Considere-se que uma placa do condensador est´a fixa e que a outra, devido a uma for¸ca exterior, de m´odulo F (igual `a for¸ca electrost´atica), se desloca de uma distˆancia infinitesimal dx. O trabalho realizado pela for¸ca exterior ´e δW = F dx . Estando o condensador isolado, este trabalho ´e igual `a varia¸c˜ ao da energia do condensador. A energia do condensador ´e 1 1 Q2 Ue = QV = 2 2 C e a sua varia¸c˜ao, mantendo-se constante a carga, vem 1 dC dUe = − Q2 2 . 2 C 2 Da express˜ao (3.24) obt´em-se dC = −²0 A dx/x , pelo que dUe = A dx 1 ²0 Q2 2 2 x µ x ²0 A ¶2 = Q2 dx , 2 A ²0 tendo-se usado novamente (3.24). Igualando a varia¸c˜ ao da energia interna dUe ao trabalho realizado sobre o sistema, dU = δW , obt´em-se ²0 Q2 = F = 2A²0 2 e, finalmente, — ver (3.25) — vem µ σ ²0 ¶2 A F ²0 = E2 . A 2 Vimos, na Sec¸c˜ao 3.2, que a express˜ao geral para a for¸ca por unidade de superf´ıcie, para qualquer condutor em equil´ıbrio electrost´atico, ´e dada por (3.14). A express˜ao anterior (tamb´em encontrada no Exemplo 3.2) est´a de acordo com essa express˜ao geral. 68 • ´tico Campo electromagne 3.3.5 Condensador plano suspenso de uma mola Quest˜ ao Um condensador plano ´e formado por duas placas, cada uma com ´area A. A placa inferior est´a fixa ao tampo de uma mesa isoladora e a placa superior ´e suspensa de uma mola de constante de elasticidade k. As placas est˜ao inicialmente descarregadas. Mostrar que, quando as placas s˜ao carregadas com as cargas Q e −Q, a distˆancia entre elas varia de Q2 /(2Ak²0 ). Resposta Quando o condensador est´a descarregado as placas do condensador est˜ao a uma distˆancia d. Quando se carrega o condensador a for¸ca por unidade de superf´ıcie (press˜ao) que a placa de baixo exerce sobre a placa de cima ´e igual `a densidade de energia electrost´atica junto a essa placa. Essa densidade ´e dada por (3.14) e, atendendo a que o campo ´e constante, dF ²0 F = E2 = . dA 2 A (3.26) Para um condensador plano o campo el´ectrico ´e dado por E= Q σ = , ²0 A²0 donde, substituindo em (3.26), se obt´em F = Q2 . 2A²0 Quando h´a equil´ıbrio est´atico esta for¸ca, dirigida de cima para baixo, ´e compensada pela for¸ca el´astica, dirigida de baixo para cima e que vale k ∆d. Tem-se ent˜ ao, como se pretendia demonstrar, Q2 ∆d = . 2 A k ²0 3.3.6 For¸cas num condensador cil´ındrico Quest˜ ao Um condensador ´e formado por dois condutores infinitamente longos com superf´ıcies cil´ındricas coaxiais. Seja a o raio do cilindro interior, que ´e maci¸co, e b e c os raios interno e externo, respectivamente, do cilindro exterior. Aplica-se uma diferen¸ca de potencial V entre os dois cilindros, ficando o condutor exterior ligado `a terra. Calcular a grandeza da for¸ca, por unidade de ´area, exercida sobre a superf´ıcie do cilindro interior. Indicar a direc¸c˜ao e o sentido desta for¸ca. Calcular a for¸ca total exercida por unidade de comprimento do cilindro. Resposta Quando se aplica uma diferen¸ca de potencial V entre as armaduras do condensador, a superf´ıcie externa do cilindro interior adquire uma densidade de carga λ (carga Q uniformemente distribu´ıda no comprimento L), a face interna da armadura exterior fica com uma densidade de carga −λ e sobre a superf´ıcie externa desta armadura n˜ao h´a cargas. O campo el´ectrico no exterior ´e nulo, como ´e f´acil reconhecer a partir da lei de Gauss, tal como ´e ´ tica Energia electrosta • 69 nulo o campo no interior de ambas as armaduras, pois trata-se de condutores em equil´ıbrio electrost´atico. Para a < r < b o campo el´ectrico ´e radial e ´e igual ao que seria produzido por uma linha infinita carregada com uma densidade λ = Q/L, quer dizer, o campo ´e dado por [cf. (2.17)] λ E= rˆ . 2π²0 r O campo el´ectrico junto da superf´ıcie da armadura interior ´e perpendicular `a superf´ıcie cil´ındrica e o seu m´odulo ´e λ E= (3.27) . 2π²0 a A for¸ca por unidade de superf´ıcie ´e dada por (3.14). Interessa primeiro, por´em, exprimir λ em fun¸c˜ao dos dados do problema. A diferen¸ca de potencial entre as armaduras do condensador, V , ´e simplesmente a circula¸c˜ao do campo el´ectrico entre as armaduras interna e externa. Escolhendo um percurso radial, Z V = = donde E · dr = Z b µ ¶a b λ ln 2π²0 a Edr = λ 2π²0 Z b dr a r , · µ ¶¸−1 b λ = V ln 2π²0 a . Substituindo, primeiro em (3.27), e o resultado em (3.14) obt´em-se para a intensidade da for¸ca por unidade de superf´ıcie · µ ¶¸−2 ²0 V 2 b dF = ln dA 2a2 a . A for¸ca sobre uma superf´ıcie elementar do cilindro interior ´e perpendicular a essa superf´ıcie e aponta para fora. Assim, a for¸ca num elemento de superf´ıcie dA ´e de intensidade igual, mas de sentido contr´ario, `a for¸ca sobre o elemento de superf´ıcie diametralmente oposto. Deste modo, em cada “anel” de comprimento arbitr´ario do condutor a for¸ca resultante ´e nula, pelo que, considerando toda a superf´ıcie cil´ındrica, tem-se, evidentemente, que ´e nula a for¸ca resultante. 70 • ´tico Campo electromagne CAP´ITULO 4 ´ MULTIPOLOS ELECTRICOS 4.1 ˜ INTRODUC ¸ AO Indicou-se, no Cap´ıtulo 2, a express˜ao do potencial escalar criado por uma carga el´ectrica pontual [Eq. (2.11)]. No caso de uma distribui¸c˜ ao arbitr´aria de cargas, basta aplicar o princ´ıpio de sobreposi¸c˜ao para se conhecer o potencial num dado ponto. O c´alculo expl´ıcito do potencial produzido por determinadas distribui¸c˜ oes de cargas pode ser intrincado. No entanto, sempre que a regi˜ao do espa¸co que importa considerar seja suficientemente afastada das cargas, esse c´alculo ´e desnecess´ario. Na regi˜ao onde as cargas se localizam ocorrem grandes varia¸c˜ oes no potencial electrost´atico. A´ı, o conhecimento da forma pormenorizada da distribui¸c˜ ao das cargas ´e determinante na obten¸c˜ao do valor do potencial, de modo que s˜ao de esperar varia¸c˜ oes significativas do potencial quando se passa de um ponto a outro. Contudo, longe da regi˜ao onde as cargas se encontram, o potencial ´e naturalmente menor, mas, acima de tudo, as varia¸c˜ oes do potencial quando se passa de um ponto para outro j´a n˜ao s˜ao grandes. H´a uma menor sensibilidade do potencial relativamente `a distribui¸c˜ ao espacial das cargas e o conjunto das cargas, dispostas de uma forma arbitr´aria, actua como se de uma s´o carga se tratasse. Quando falamos em distˆancias “grandes” (ou “pequenas”) estamos sempre a tomar como referˆencia a separa¸c˜ ao t´ıpica entre as cargas, ou melhor, uma distˆancia que possa caracterizar a dimens˜ao da regi˜ao do espa¸co onde as cargas se localizam. Demonstra-se que o efeito de uma dada distribui¸c˜ ao de cargas, por mais complexa que seja, pode ser expresso como uma sobreposi¸c˜ ao de v´arios termos multipolares. Cada multipolo ´e, na realidade, um conjunto de cargas el´ectricas pontuais que possuem determinadas simetrias. O estudo dos multipolos tem muito interesse, pois v´arios sistemas f´ısicos — desde sistemas macrosc´opicos at´e `as mol´eculas, aos n´ ucleos at´omicos e aos hadr˜oes, passando ainda por diferentes formas de mat´eria condensada — possuem campos el´ectricos que podem ter caracter´ısticas multipolares bem definidas: dizem-se ent˜ ao monopolos, dipolos, quadrupolos, 72 • ´tico Campo electromagne octopolos, etc., cujo significado preciso ser´a dado neste cap´ıtulo. Pode tamb´em acontecer que o campo el´ectrico em torno desses objectos seja uma sobreposi¸c˜ ao de dois ou mais (mas poucos!) multipolos, circunstˆancia em que ainda ´e muito u ´til fazer a an´alise multipolar. Um campo monopolar ´e o campo produzido por uma carga el´ectrica pontual (monopolo). Antes de estudarmos com toda a generalidade os multipolos el´ectricos, abordaremos a quest˜ao mais concreta do dipolo e do quadrupolo linear. Estes s˜ao sistemas simples e o seu estudo n˜ao s´o serve de motiva¸c˜ao como ajuda a compreender os termos multipolares de ordem superior. Estudaremos na parte final do cap´ıtulo a interac¸c˜ ao dos diferentes termos multipolares com um campo el´ectrico externo. 4.2 ´ DIPOLO ELECTRICO Um dipolo el´ectrico ´e um sistema formado por duas cargas, uma positiva e outra negativa, de grandezas iguais e separadas por uma distˆancia s. P ( r ,q ,f ) r s /2 s /2 + Q r s q r + Q Figura 4.1. Dipolo el´ ectrico. A Figura 4.1 representa um dipolo el´ectrico. Nesta sec¸c˜ ao iremos calcular o potencial V e o campo el´ectrico E que ele produz a distˆancias grandes comparadas com s, isto ´e, admitiremos sempre que r À s, em que r ´e a distˆancia do ponto P que estamos a considerar ao centro do dipolo. Esta distˆancia ´e uma das coordenadas esf´ericas desse ponto, sendo θ e φ as outras duas coordenadas (num referencial em que o eixo z tem a direc¸c˜ ao definida pelo dipolo). A simetria do sistema permite adiantar que os resultados n˜ao podem depender do ˆangulo azimutal, mas apenas de r e do ˆangulo polar θ. O potencial em P ´e dado por V = Q 4π²0 µ 1 1 − r− r+ ¶ = Q 4π²0 r µ ¶ r r − . r− r+ (4.1) As distˆancias r± (Figura 4.1) s˜ao os m´odulos dos vectores r± = r ± s 2 , (4.2) ´ctricos Multipolos ele • 73 sendo s o vector posicional da carga positiva relativamente `a carga negativa. Da express˜ao anterior resulta µ ¶2 s 2 2 r± = r + ± sr cos θ. 2 As quantidades que importa considerar em (4.1) s˜ao " r = 1+ r± µ s 2r ¶2 s ± cos θ r #−1/2 . (4.3) Dado que r À s, faz todo o sentido considerar o desenvolvimento desta express˜ao em potˆencias de s/r, cabendo aqui recordar que, em geral, se tem o seguinte desenvolvimento em s´erie: 1 3 5 (1 + η)−1/2 = 1 − η + η 2 − η 3 + O(η 4 ) . 2 8 16 (4.4) Assim, desenvolvendo (4.3) e retendo apenas os termos at´e ordem (s/r)2 , obt´em-se r 1s 1 =1∓ cos θ + r± 2r 8 µ ¶2 s r h i (3 cos2 θ − 1) + O (s/r)3 . (4.5) Substituindo na express˜ao (4.1), vem ¸ · ³ ´ Q s V = cos θ + O (s/r)3 , 4π²0 r r pelo que, em primeira ordem, podemos escrever V ≈ Qs cos θ . 4π²0 r2 (4.6) Esta express˜ao ´e v´alida para r3 À s3 (como admitimos sempre esta condi¸c˜ ao, substituiremos de agora em diante o sinal de “aproximadamente” igual por uma igualdade). De notar que a dependˆencia do potencial ´e em 1/r2 e n˜ao em 1/r, como seria no caso de o sistema ser formado por uma s´o carga. O facto de existirem duas cargas de sinais opostos leva ao n˜aoaparecimento do termo de ordem r−1 caracter´ıstico do potencial monopolar. O momento dipolar do dipolo ´e, por defini¸c˜ ao, o vector p = Qs . (4.7) ˆ = Qs cos θ, podemos escrever o potencial (4.6) na forma Se notarmos que p · r V = p · rˆ p cos θ = . 2 4π²0 r 4π²0 r2 (4.8) O campo el´ectrico criado pelo dipolo calcula-se a partir do potencial (E = −∇V ). Em coordenadas esf´ericas, ˆ r + Eθ e ˆ θ + Eφ e ˆφ E = Er e com ∂V p cos θ = ∂r 2π²0 r3 1 ∂V p sin θ = − = r ∂θ 4π²0 r3 1 ∂V = − = 0. r sin θ ∂φ Er = − Eθ Eφ (4.9) (4.10) (4.11) 74 • ´tico Campo electromagne Assim, o campo el´ectrico dipolar ´e dado por p ˆ r + sin θ e ˆ θ ). E (r, θ) = (2 cos θ e 4π²0 r3 (4.12) As superf´ıcies equipotenciais — superf´ıcies sobre as quais o potencial ´e constante, V = C — s˜ao obtidas a partir da equa¸c˜ao que resulta directamente de (4.8): p r2 = cos θ = C0 cos θ , 4π²0 C sendo C0 uma nova constante. Estas superf´ıcies equipotenciais nunca cortam o plano perpendicular ao dipolo que passa pelo seu centro, plano esse que se pode considerar ao potencial zero (os potenciais s˜ao positivos para θ < π/2 e negativos para θ > π/2). Na Figura 4.2 est˜ao representadas a tracejado linhas equipotenciais. Note-se que, perto da origem, a aproxima¸c˜ao que se faz ao admitir r À s deixa de ser v´alida. V 2 V 1 E V = 0 E ' -V -V V = 0 1 2 Figura 4.2. Curvas equipotenciais (representadas por linhas a tracejado) e linhas de campo el´ ectrico (a cheio) para o dipolo el´ ectrico. O campo el´ ectrico ´ e, em cada ponto, tangente ` as linhas de campo. Estas linhas v˜ ao interceptando superf´ıcies equipotenciais a potenciais sucessivamente menores. As linhas do campo el´ectrico s˜ao perpendiculares `as superf´ıcies equipotenciais e est˜ao representadas na Figura 4.2, a cheio. Por defini¸c˜ ao, o campo el´ectrico ´e tangente `as linhas de campo, pelo que, formalmente, elas podem ser obtidas resolvendo a equa¸c˜ ao dl × E = 0 , (4.13) ˆ r + rdθ e ˆ θ + r sin θdφ e ˆ φ ´e um elemento infinitesimal da linha de campo. Esta onde dl = dr e equa¸c˜ao pode ser escrita sob a forma do seguinte determinante simb´ olico: ¯ ¯e ˆ ¯ r ¯ dr ¯ ¯E r ˆθ e r dθ Eθ ¯ ¯ ¯ r sin θ dφ ¯¯ = 0. ¯ 0 ˆφ e ´ctricos Multipolos ele • 75 Daqui resulta r sin θ Eθ dφ = 0 , (4.14) r sin θEr dφ = 0 e ainda Eθ dr = r Er dθ. (4.15) As rela¸c˜oes (4.14) exprimem o facto de o campo el´ectrico estar no plano definido pelos versores ˆr, e ˆ θ ), isto ´e, dφ = 0. A Eq. (4.15), uma vez feita a substitui¸c˜ (e ao de Er e Eθ pelas express˜oes (4.9) e (4.10) e a integra¸c˜ao por separa¸c˜ ao de vari´ aveis, conduz `a equa¸c˜ ao r = C00 sin2 θ , onde C00 ´e uma constante. Cada uma das linhas a cheio na Figura 4.2 corresponde a um certo valor de C00 . 4.3 ´ O QUADRUPOLO ELECTRICO LINEAR O quadrupolo el´ectrico linear ´e um conjunto de cargas agrupadas como se indica na Figura 4.3. P ( r ,q ,f ) r + Q r s 2 Q q r + s + Q Figura 4.3. Quadrupolo el´ ectrico linear. Consideramos, tal como na Sec¸c˜ ao 4.2, regi˜oes do espa¸co tais que r À s. Usando a t´ecnica exposta no caso do dipolo, vamos determinar o potencial e o campo el´ectrico devidos a este arranjo de cargas. O potencial ´e dado por Q V = 4π²0 µ 1 2 1 − + r− r r+ ¶ Q = 4π²0 r µ ¶ r r + −2 . r− r+ (4.16) As distˆancias r± s˜ao os m´odulos dos vectores r± = r ± s. Note-se, relativamente a (4.2), a ausˆencia do factor 21 , uma vez que s ´e agora outro vector posicional. Por este motivo, as raz˜oes r/r± escrevem-se numa forma ligeiramente modificada relativamente a (4.5), ou seja, r s 1 = 1 ∓ cos θ + r± r 2 µ ¶2 s r h i (3 cos2 θ − 1) + O (s/r)3 . 76 • ´tico Campo electromagne Substituindo em (4.16), obt´em-se o potencial V = Qs2 (3 cos2 θ − 1) , 4π²0 r3 (4.17) tendo-se desprezado termos de ordem (s/r)4 e superiores (os termos de ordem ´ımpar anulamse sempre). Pode agora obter-se o campo el´ectrico tal como se fez para o caso dipolar. Em coordenadas esf´ericas as componentes de E s˜ ao ∂V 3Qs2 (3 cos2 θ − 1) = ∂r 4π²0 r4 (4.18) 1 ∂V 3Qs2 = 2 sin θ cos θ , r ∂θ 4π²0 r4 (4.19) Er = − Eθ = − sendo nula a componente Eφ . O campo el´ectrico criado pelo quadrupolo linear a grandes distˆancias ´e i 3Qs2 h 2 ˆ ˆ (3 cos θ − 1) e + 2 sin θ cos θ e . E (r, θ) = (4.20) r θ 4π²0 r4 As superf´ıcies equipotenciais s˜ao determinadas a partir da equa¸c˜ ao [ver (4.17)] r3 = C (3 cos2 θ − 1) , (4.21) sendo C uma constante relacionada directamente com o valor do potencial. As linhas de campo s˜ao obtidas a partir de (4.13), que, para o campo dado por (4.20), resulta nas eqs. (4.14) e (4.15). Usando as componentes de E dadas por (4.18) e (4.19) na equa¸c˜ ao diferencial (4.15), obt´em-se à ! 3 cos2 θ − 1 r 2 cos2 θ − 1 cos θ dr =r = + . dθ 2 cos θ sin θ 2 cos θ sin θ sin θ Separando as vari´aveis e integrando, ln r = 1 1 [ln(cos θ sin θ) + ln(sin θ)] + ln C0 2 2 e finalmente r2 = C0 cos θ sin2 θ , (4.22) onde C0 ´e uma constante de integra¸c˜ ao que caracteriza cada uma das linhas de campo. Na Figura 4.4 representam-se as curvas equipotenciais1 para o quadrupolo linear (a tracejado) e as linhas do campo el´ectrico (a cheio). 4.4 DESENVOLVIMENTO EM MULTIPOLOS DO POTENCIAL ESCALAR J´a anteriormente se afirmou que uma carga el´ectrica pontual, Q, ´e um monopolo. O dipolo pode ser obtido deslocando ligeiramente essa carga e colocando no s´ıtio onde ela estava inicialmente uma outra carga de grandeza igual mas de sinal oposto. O quadrupolo linear obt´em-se deslocando o dipolo paralelamente a si mesmo, para uma distˆancia igual `a separa¸c˜ao entre as cargas, e colocando outro dipolo igual na posi¸c˜ ao do primeiro, mas com 1 As curvas equipotenciais indicadas resultam da intersec¸c˜ ao das superf´ıcies equipotenciais com um plano vertical que cont´em o eixo z. ´ctricos Multipolos ele • 77 Figura 4.4. Linhas de campo el´ ectrico (a cheio) e curvas equipotenciais (representadas por linhas a tracejado) para o quadrupolo el´ ectrico linear. N˜ ao se representam as linhas perto do quadrupolo, pois a aproxima¸ c˜ ao efectuada e que permitiu obter a Eq. (4.21) para as superf´ıcies equipotenciais, e a Eq. (4.22) para as linhas de campo, n˜ ao ´ e v´ alida. orienta¸c˜ao oposta. Da mesma maneira se pode construir um octopolo linear e, generalizando, um multipolo linear de ordem qualquer. O multipolo de ordem 2` requer ` deslocamentos (por exemplo, o hexadecapolo — ordem ` = 4 — requer quatro deslocamentos). O valor de 2` ´e igual ao n´ umero de vezes que a carga Q aparece no multipolo, levando em conta apenas a grandeza e n˜ao o sinal das cargas. A carga total do multipolo, `a excep¸c˜ ao do monopolo, ´e nula. Veremos que, dada uma distribui¸c˜ ao de carga, o potencial V num ponto P longe dessa distribui¸c˜ao ´e equivalente a um potencial V0 criado por um monopolo de valor igual `a carga total na distribui¸c˜ao, mais V1 , que ´e o potencial criado por um dipolo cujo momento dipolar ´e igual ao momento dipolar da distribui¸c˜ ao de cargas (adiante se definir´a momento dipolar de uma distribui¸c˜ao), mais um potencial V2 , que ´e o potencial criado pelo quadrupolo cujo momento quadrupolar ´e igual ao momento quadrupolar da distribui¸c˜ ao (conceitos que tamb´em se definir˜ao adiante com todo o rigor), mais etc. Vimos que o potencial criado por um monopolo (ordem ` = 0) varia com 1/r, o do dipolo (ordem ` = 1) com 1/r2 e o do quadrupolo (ordem ` = 2) com 1/r3 . O potencial octopolar (ordem ` = 3) varia com 1/r4 e, em geral, o do 2` -polo varia com 1/r`+1 . Fica claro que, para distˆancias muito grandes (comparadas com a dimens˜ao t´ıpica da distribui¸c˜ ao de cargas), os termos multipolares de ordens sucessivamente mais elevadas d˜ao contribui¸c˜ oes sucessivamente menos importantes. Consideremos um conjunto de N cargas pontuais qi , i = 1, ..., N localizadas num volume v (Figura 4.5). Seja O a origem de um referencial e ri0 , com i = 1, ..., N os vectores posicionais das cargas relativamente a essa origem. Queremos obter o potencial num ponto P que est´a `a distˆancia r de O e cujo vector posicional ´e r . Tal como no Cap´ıtulo 3, distinguiremos 78 • ´tico Campo electromagne coordenadas das fontes, que s˜ao as componentes do vector r 0 , das coordenadas do ponto onde se pretende saber o potencial ou o campo, que s˜ao as componentes de r . q v O r i ' q a i P r i Figura 4.5. Distribui¸ c˜ ao de carga em v produzindo um potencial el´ ectrico em P. Esse potencial ´e V (r ) = onde N X qi i=1 4π²0 |r − ri0 | = N X i=1 qi , 4π²0 ai (4.23) 2 ai = |r − ri0 | = (r2 − 2ri0 r cos θi + ri0 )1/2 , ˆ como sendo a sendo θi o ˆangulo que ri0 e r formam entre si. Se escolhermos a direc¸c˜ ao r direc¸c˜ao z de um referencial, θi ´e, nesse referencial, a coordenada esf´erica polar da carga i (ri0 ´e coordenada esf´erica radial nesse referencial). Relembramos que estamos sempre a considerar que P est´a longe de O, isto ´e, que r À ri0 qualquer que seja i. Podemos ent˜ ao desenvolver a express˜ao 1 1 1 = · ³ 0 ´2 ¸1/2 ai r r0 r 1 − 2 ri cos θi + ri em s´erie de potˆencias de ri0 /r `a semelhan¸ca do que fizemos nas sec¸c˜ oes anteriores para r± . Usando o desenvolvimento (4.4) e considerando termos at´e segunda ordem em ri0 /r, vem 1 ai ( ri0 r ¶2 # · 3 r0 r0 −2 i cos θi − 2 i cos θi + r 8 r = = 1 r0 1 1 + i cos θi + r r 2 " 1 1− 2 "µ 1 r µ 0 ¶2 r i r ¸2 ) + ... # (3 cos2 θi − 1) + ... . (4.24) Substituindo em V (r ), V (r ) = N N X 1 1 X qi + qi ri0 cos θi 4π²0 r i=1 4π²0 r2 i=1 N 2 X 1 0 2 (3 cos θi − 1) + + ... q r i i 4π²0 r3 i=1 2 (4.25) Esta express˜ao corresponde ao desenvolvimento “multipolar” do potencial. Cada termo do desenvolvimento tem uma dependˆencia em r da forma 1r , r12 , r13 , r14 , ... pelo que, para r grande, apenas os primeiros termos do desenvolvimento em s´erie s˜ao importantes. ´ctricos Multipolos ele • 79 Introduzindo os polin´omios de Legendre podemos exprimir o desenvolvimento do potencial em multipolos de uma forma compacta. O polin´omio de Legendre de ordem n ´e definido pela rela¸c˜ao 1 dn 2 Pn (ξ) = n (ξ − 1)n , ξ = cos θ , n inteiro. 2 n! dξ n Os polin´omios de ordem mais baixa s˜ao P0 (ξ) = 1 P1 (ξ) = ξ 1 P2 (ξ) = (3 ξ 2 − 1) 2 1 P3 (ξ) = (5 ξ 3 − 3 ξ) 2 1 P4 (ξ) = (35 ξ 4 − 30 ξ 2 + 3) 8 1 P5 (ξ) = (63 ξ 5 − 70 ξ 3 + 15 ξ) . 8 Conhecidos P0 e P1 , podem ser determinados todos os outros polin´omios de Legendre a partir da seguinte rela¸c˜ao de recorrˆencia: (` + 1) P`+1 (ξ) = (2` + 1) ξ P` (ξ) − ` P`−1 (ξ). Se analisarmos os primeiros termos do desenvolvimento do potencial (4.25), verificamos que eles podem ser escritos em fun¸c˜ ao dos polin´omios de Legendre de ordem mais baixa. De facto, mostra-se que ∞ X 1 = P` (ξ) y ` (1 − 2ξy + y 2 )1/2 `=0 para y < 1, |ξ| ≤ 1 , r0 pelo que a express˜ao (4.24), identificando yi = ri e ξi = cos θi , representa exactamente os trˆes primeiros termos do desenvolvimento em s´erie µ ∞ 1 1X r0 = P` (ξi ) i ai r `=0 r ¶` . (4.26) O potencial (4.23) escreve-se ent˜ao na seguinte forma geral: V (r ) = N X i=1 µ 0 ¶` ∞ ∞ N X r 1 X 1 X qi ` P` (ξi ) i = qi ri0 P` (ξi ) . 4 π ²0 r `=0 r 4π²0 `=0 r`+1 i=1 (4.27) As vari´aveis ξi podem ser escritas em termos dos co-senos directores lx , ly , lz da direc¸c˜ ao r : ˆ·r ˆi0 = r ˆ· ξi = cos θi = r ri0 ri0 = lx x0i + ly yi0 + lz zi0 , ri0 sendo (x0i , yi0 , zi0 ) as componentes cartesianas de ri0 . Para uma distribui¸c˜ao volum´etrica cont´ınua de cargas, descrita por ρ(r 0 ), tem-se o seguinte potencial: Z ∞ 1 X 1 ` V (r ) = ρ(r 0 ) P` (ξ) r0 dv, (4.28) 4π²0 `=0 r`+1 v 80 • ´tico Campo electromagne sendo dv o elemento de volume, expresso em fun¸c˜ ao das componentes de r 0 sobre as quais se integra. Fa¸camos algumas considera¸c˜oes sobre cada um dos termos do desenvolvimento multipolar do potencial escalar. Termo monopolar (` = 0) ´ o primeiro termo do desenvolvimento (4.27): E V0 (r ) = N 1 1X Q qi = 4π²0 r i=1 4π²0 r com N X Q= qi i=1 a carga total ou momento monopolar da distribui¸c˜ ao. O termo monopolar ´e o termo dominante do desenvolvimento em s´erie. Para pontos muito afastados da distribui¸c˜ ao de cargas esta comporta-se como se fosse uma carga pontual, de valor Q, colocada na origem. Se a distribui¸c˜ao de cargas for cont´ınua, tem-se, evidentemente, Z Q = Q = Zv S ρ(r 0 )dv σ(r 0 )dS Z Q = λ(r 0 )dl, C conforme a distribui¸c˜ao de cargas seja volum´etrica, superficial ou linear. Termo dipolar (` = 1) O termo com ` = 1 em (4.27) ´e dado por V1 (r ) = N N X 1 1 X 1 0 ˆ q r cos θ = r · qi ri0 . i i i 4π²0 r2 i=1 4π²0 r2 i=1 Na u ´ltima express˜ao o somat´orio depende apenas de caracter´ısticas intr´ınsecas da distribui¸c˜ ao de cargas, ou seja, do valor das cargas e da sua disposi¸c˜ ao no espa¸co. Introduz-se habitualmente o momento dipolar da distribui¸c˜ ao, que se define por p= N X qi ri0 , (4.29) i=1 o qual s´o depende da natureza da distribui¸c˜ ao e n˜ao do ponto onde se pretende obter o potencial. Em fun¸ca˜o deste vector, o potencial escreve-se V1 (r ) = p · rˆ 4π²0 r2 . (4.30) ´ importante notar que o termo dipolar do potencial, V1 , ´e o produto escalar de dois facE tores: p, que s´o depende da distribui¸c˜ ao de cargas; e r /(4π²0 r3 ) , que apenas depende da ´ctricos Multipolos ele • 81 localiza¸c˜ao do ponto P. Comparando com (4.8) conclu´ımos que a contribui¸c˜ ao do termo dipolar ´e equivalente `a de um dipolo colocado na origem com momento dipolar p. No caso de o momento monopolar ser nulo (Q = 0), o termo dominante do desenvolvimento multipolar ´e V1 e prova-se neste caso, como veremos, que o momento dipolar ´e independente da escolha da origem. No caso de distribui¸c˜oes cont´ınuas de carga, o momento dipolar da distribui¸c˜ ao ´e dado por Z p= p= p= Zv ZS C ρ(r 0 ) r 0 dv ; (4.31) σ(r 0 ) r 0 dS; (4.32) λ(r 0 ) r 0 dl , (4.33) conforme a distribui¸c˜ao de cargas seja volum´etrica, superficial ou linear. Termo quadrupolar (` = 2) O termo quadrupolar do desenvolvimento em multipolos do potencial el´ectrico (4.27) ´e dado por µ ¶ N qi ri0 2 1 X V2 (r ) = (3 cos2 θi − 1) (4.34) 4π²0 r i=1 2 r e, tamb´em neste caso, ´e poss´ıvel factorizar a express˜ao num termo que depende apenas das caracter´ısticas da distribui¸c˜ao de cargas e outro apenas dependente das coordenadas do ponto onde se pretende calcular o potencial el´ectrico. Usando a igualdade 2 ˆ )2 − ri0 2 ri0 (3 cos2 θi − 1) = 3(ri0 .r podemos escrever o membro esquerdo desta equa¸c˜ ao usando os co-senos directores (lx , ly , lz ) 0 0 0 ˆ de r e das componentes cartesianas (xi , yi , zi ) de ri0 . Assim, temos: 2 2 ri0 (3 cos2 θi − 1) = 3(x0i lx + yi0 ly + zi0 lz )2 − ri0 (lx2 + ly2 + lz2 ) 2 2 2 = 3(x0i lx2 + yi0 ly2 + zi0 lz2 + 2x0i yi0 lx ly + 2x0i zi0 lx lz + 2yi0 zi0 ly lz ) 2 −ri0 (lx2 + ly2 + lz2 ) 2 2 2 2 2 2 = lx2 (3x0i − ri0 ) + ly2 (3yi0 − ri0 ) + lz2 (3zi0 − ri0 ) +6 lx ly x0i yi0 + 6 lx lz x0i zi0 + 6 ly lz yi0 zi0 . Substituindo em (4.34), esta express˜ao passa a ser escrita do seguinte modo: 1 V2 = 8π²0 r3 " lx2 N X 2 qi (3x0i − 2 ri0 ) + lx ly i=1 +ly lx 3qi x0i yi0 + lx lz i=1 N X 3qi yi0 x0i i=1 N X + lz lx + ly2 N X 2 qi (3yi0 i=1 N X 3qi zi0 x0i + lz ly i=1 = N X 3 X 1 lk Qkm lm 8 π ²0 r3 k,m=1 i=1 N X 3qi x0i zi0 i=1 − 2 ri0 ) + ly lz N X 3qi yi0 zi0 i=1 3qi zi0 yi0 + lz2 N X 2 qi (3zi0 # − 2 ri0 ) i=1 (4.35) 82 • ´tico Campo electromagne com N X Qkm = (i) (i) 2 qi (3x0 k x0 m − δkm ri0 ) . (4.36) i=1 (i) Usou-se nesta express˜ao a nota¸c˜ao x0 k para designar a componente cartesiana k do vector ri0 . As nove quantidades Qkm s˜ao as componentes cartesianas do tensor momento quadrupolar da distribui¸c˜ao de carga. Trata-se, efectivamente, de um tensor de segunda ordem. Num novo referencial que se obtenha a partir do primeiro por uma transforma¸c˜ ao ortogonal, as novas componentes do tensor quadrupolar el´ectrico s˜ao dadas por 3 X Q0km = akj ami Qji , j,i=1 onde {alj } s˜ao os coeficientes que definem a transforma¸c˜ ao ortogonal. O valor da quantidade P3 l Q l ´ e independente do referencial considerado, pois trata-se de um escalar. k,m=1 k km m Se em (4.35) substituirmos os co-senos directores de r por lj = xj /r, obt´em-se 3 1 1 X xk Qkm xm . V2 (r ) = 4π²0 r5 2 k,m=1 (4.37) Esta ´e a parcela dominante do desenvolvimento multipolar se V0 (r ) e V1 (r ) forem ambos nulos. Para uma distribui¸c˜ao cont´ınua e volum´etrica de cargas, as componentes do tensor momento quadrupolar s˜ao dadas por Z Qkm = 2 v ρ(r 0 ) (3x0k x0m − δkm r0 ) dv . (4.38) Vejamos algumas propriedades do tensor momento quadrupolar. Trata-se de um tensor sim´etrico, ou seja, Qmk = Qkm , o que reduz para seis o n´ umero de componentes Qkm independentes. Al´em disso, ´e f´acil verificar que tem tra¸co nulo. De facto: X k=x,y,z Qkk = Qxx + Qyy + Qzz = N X 2 2 2 2 2 2 qi (3x0 i − r0 i + 3y 0 i − r0 i + 3z 0 i − r0 i ) = 0 , (4.39) i=1 o que diminui para cinco o n´ umero de componentes independentes. Se o sistema f´ısico tiver certas simetrias, h´a componentes do tensor momento quadrupolar que se anulam. Consideremos, por exemplo, que a distribui¸c˜ ao de cargas tem simetria axial, isto ´e, que fica invariante quanto a rota¸c˜ oes em torno de um eixo que se escolhe para eixo z. A existˆencia desta simetria implica que, se existir uma carga qi num ponto (x0i , yi0 , zi0 ), ter´a de existir tamb´em uma carga de valor igual em cada um dos pontos (−x0i , yi0 , zi0 ), (x0i , −yi0 , zi0 ) e (−x0i , −yi0 , zi0 ), pelo que (e considerando agora a distribui¸c˜ ao cont´ınua de cargas2 ), Z ρ(r 0 ) 3x0 y 0 dv = 0 Qxy = Z ρ(r 0 ) 3x0 z 0 dv = 0 Qxz = Z Qyz = 2 ρ(r 0 ) 3y 0 z 0 dv = 0 . S´ o uma distribui¸ca ˜o cont´ınua de carga pode ter simetria cil´ındrica. Mas certas distribui¸c˜ oes discretas de carga podem tamb´em ter Qkm = 0, se k 6= m. ´ctricos Multipolos ele • 83 Sempre que haja simetria axial Qkm = 0, se k 6= m. Restam, pois, duas componentes independentes. Mas, havendo simetria em torno do eixo z ´e evidente que se ter´a Qxx = Qyy , o que permite, usando (4.39), encontrar ainda uma rela¸c˜ ao entre Qxx e Qzz : 2Qxx + Qzz = 0 Qzz Q(2) Qxx = − =− . 2 2 Neste caso, podemos exprimir o potencial V2 (r ) apenas em fun¸c˜ ao de uma quantidade Q(2) : V2 = = = Q(2) 4π²0 r5 Q(2) 4π²0 r5 µ 1 1 − (x2 + y 2 ) + z 2 2 2 à ! 1 3 2 r2 z − 2 2 2 ¶ Q(2) 3 cos2 θ − 1 , 4π²0 4 r3 (4.40) ˆ. sendo θ o ˆangulo entre o eixo z, e a direc¸c˜ ao r Exemplo 4.1: Momentos quadrupolares de n´ ucleos A F´ısica Nuclear fornece exemplos concretos que ilustram a utilidade do que acab´amos de estudar. Tabela 4.1. Momentos quadrupolares de alguns n´ ucleos em unidades de carga do prot˜ ao por 10−28 m2 (barn). N´ ucleo Q(2) 16 6O 0,0 17 8O −0,026 39 19 K 0,11 40 20 Ca 0,0 161 66 Dy 2,4 176 71 Lu 8,0 208 82 Pb 0,0 209 83 Bi −0,35 Muitos n´ ucleos apresentam uma deforma¸c˜ ao mas continuam a possuir um eixo de simetria. Podem, por exemplo, ter a forma de um elips´oide de revolu¸c˜ ao e a sua forma assemelhar-se-´a `a de um charuto (dizem-se ent˜ao prolatos) ou ter uma forma semelhante `a de uma panqueca (dizem-se, neste caso, oblatos). Estas formas s˜ao aquelas que d˜ao maior estabilidade ao 84 • ´tico Campo electromagne sistema com certo n´ umero de prot˜oes e de neutr˜oes e resultam das m´ ultiplas interac¸c˜ oes entre os nucle˜oes, quest˜ao que n˜ao vamos aqui considerar. O que ´e comum aos n´ ucleos deformados com simetria axial ´e a existˆencia de um momento quadrupolar diferente de zero. O momento quadrupolar mede o afastamento relativamente `a distribui¸c˜ ao esf´erica de cargas. Os valores positivos do momento quadrupolar correspondem a formas prolatas, os negativos a formas oblatas e os valores nulos indicam distribui¸c˜ oes de carga esfericamente sim´etricas. Na Tabela 4.1 indicam-se os momentos quadrupolares de alguns n´ ucleos. O oxig´enio-16, o c´alcio-40 e o chumbo-208 tˆem momento quadrupolar el´ectrico nulo (tˆem “n´ umeros m´agicos” de prot˜oes e de neutr˜oes). O oxig´enio-17 e o bismuto-209 s˜ao ambos oblatos, mas o primeiro ´e menos deformado. O pot´assio-39 tem uma forma prolata. O dispr´osio-161 e o lut´ecio176 apresentam deforma¸c˜oes prolatas muito acentuadas, em particular o segundo, e dizem-se superdeformados. 4.5 ESCOLHA DA ORIGEM Vejamos qual a influˆencia da escolha da origem nos momentos multipolares. O momento monopolar Q ´e, evidentemente, independente da origem do sistema de referˆencia, mas, em geral, quer o momento dipolar p, quer o quadrupolar Qij , dependem do referencial e, em particular, da escolha da origem O. Consideremos um novo referencial com uma nova origem O0 , sendo R o vector posicional da nova origem relativamente a O. Designando, no novo referencial, os vectores posicionais das cargas por s0i , tem-se ri0 = s0i + R (4.41) (relembra-se que, relativamente a O, a localiza¸c˜ ao das cargas ´e dada pelos vectores posicionais ri0 ). Se designarmos por pO o momento dipolar relativamente a O, e por pO0 o momento dipolar em rela¸c˜ao `a nova origem O0 , vem [ver (4.29) e (4.41)] p O0 = N X qi s0i i=1 = N X qi (ri0 − R) = pO − QR. i=1 P Quando i qi = Q = 0, o momento dipolar n˜ao depende da origem das coordenadas. Nesse caso tˆem de existir, pelo menos, duas cargas de sinais opostos e grandezas iguais. O sistema mais simples com momento dipolar el´ectrico ´e o dipolo, estudado na Sec¸c˜ ao 4.2. O valor do momento dipolar do dipolo n˜ao depende, pois, da origem das coordenadas [ver (4.7)]. Por seu lado, num sistema com Q 6= 0, ´e sempre poss´ıvel escolher para origem um ponto relativamente ao qual o momento dipolar da distribui¸c˜ ao seja nulo. Esse ponto especial ´e o centro de cargas que, em analogia com o centro de massa de um sistema de part´ıculas, se define atrav´es de RC = N 1 X qi ri0 Q i=1 ou RC = 1 Q Z ρ(r 0 ) r 0 dv . (4.42) Seja ent˜ao O0 o centro de cargas. Relativamente a esse ponto, o momento dipolar el´ectrico da distribui¸c˜ao ´e pO 0 = N X i=1 qi s0i = N X i=1 qi ri0 − RC N X i=1 qi = RC Q − RC Q = 0 . ´ctricos Multipolos ele • 85 Consideremos agora o momento quadrupolar, analisando, por exemplo, a sua componente Qxy . Relativamente a O0 esta componente vem [designamos as componentes cartesianas de s0i por (Xi0 , Yi0 , Zi0 )] Q0xy = = = N X i=1 N X i=1 N X qi 3 Xi0 Yi0 qi 3 (x0i − Rx ) (yi0 − Ry ) qi 3 x0i yi0 − i=1 N X qi 3 (x0i Ry + yi0 Rx ) + i=1 N X qi 3 Rx Ry i=1 = Qxy − 3 px Ry − 3 py Rx + 3 Q Rx Ry . Se Q e p se anularem, o momento quadrupolar n˜ao depender´a da origem, quer dizer, Q0xy = Qxy . As condi¸c˜oes Q = 0 e p = 0 s˜ao satisfeitas se a distribui¸c˜ ao contiver, pelo menos, quatro cargas de m´odulo igual, duas positivas e duas negativas (da´ı o nome quadrupolo). Dois exemplos de sistemas que satisfazem as condi¸co˜es anteriores est˜ao representados na Figura 4.6. No quadrupolo linear h´a uma carga dupla ao centro que pode ser considerada uma sobreposi¸c˜ao de duas cargas −Q pelo que h´a, ao todo, quatro cargas. Da Figura 4.6 reconhecese imediatamente que os momentos monopolar e dipolar de qualquer das distribui¸c˜ oes s˜ao nulos. Q Q Q p 1 Q p 1 Q p 2 Q 2 p Q 2 Figura 4.6. Quadrupolos el´ ectricos. 4.6 ˜ DE CARGAS ENERGIA DE UMA DISTRIBUIC ¸ AO NUM CAMPO EXTERIOR Vimos, no Cap´ıtulo 3, como se determinava a energia armazenada numa distribui¸c˜ ao de cargas. Nesta sec¸c˜ao abordaremos uma quest˜ao relacionada com aquela tem´atica: qual ´e a energia de interac¸c˜ao de uma certa distribui¸c˜ ao de cargas, sistema que designaremos por D, com um campo externo E ? Se pensarmos que o campo externo tamb´em tem origem numa distribui¸c˜ ao de cargas, o que pretendemos, afinal, ´e apenas uma parte da energia de interac¸c˜ ao entre todas as cargas envolvidas. Note-se que n˜ao nos interessa, neste momento, obter a energia electrost´atica armazenada na distribui¸c˜ao D, cujas cargas ocupam posi¸c˜ oes fixas e bem determinadas. Esta energia ´e, digamos, uma constante caracter´ıstica de D. 86 • ´tico Campo electromagne A energia total, que podemos designar por Utotal , ´e a soma de trˆes contribui¸c˜ oes e, de acordo com (3.1), dada por Utotal = Uext + Usis + Uint , (4.43) onde Ne 1 X 1 Qe,i Qe,j , 2 i,j=1,i6=j 4π²0 re,ij Uext = sendo Qe as cargas “externas” (fontes do campo externo E ) e re,ij = |re,i − re,j | a distˆancia entre os pares de cargas externas; a segunda parcela em (4.43) ´e Usis N 1 X 1 qi qj = 0 , 2 i,j=1,i6=j 4π²0 rij em que q s˜ao cargas que constituem o sistema D; a terceira parcela (note-se, agora, a ausˆencia do factor 12 ), Uint = Ne N X X qi Qe,j 1 0 4π² | r 0 e,j − ri | i=1 j=1 (4.44) ´e a energia de interac¸c˜ao que nos importa considerar. Se designarmos por V (ri0 ) o potencial electrost´atico devido ao conjunto de cargas “externas” Qe,i , a energia (4.44) pode ser escrita, de acordo com (3.2), na forma Uint = N X qi V (ri0 ) . (4.45) i=1 Frisemos bem o car´acter de V (ri0 ): trata-se do potencial “externo”, isto ´e, o potencial devido apenas `as cargas externas a D no ponto onde se encontra a carga qi que pertence a D, localizada pelo vector posicional ri0 . Numa situa¸c˜ao experimental t´ıpica, as cargas que d˜ao origem ao campo externo est˜ao muito afastadas de D, pelo que o potencial V (r 0 ) n˜ao varia muito dentro do volume v que cont´em a distribui¸c˜ao D. Sejam O um ponto desse volume escolhido para origem de um (i) (i) (i) referencial e (x0 1 , x0 2 , x0 3 ) as componentes cartesianas de ri0 — vector posicional de qi — nesse referencial. Dado que o potencial varia pouco, podemos desenvolvˆe-lo em s´erie de Taylor em torno de O de coordenadas (0, 0, 0): V (ri0 ) = V0 + à 3 X (i) x0 n n=1 ∂V ∂x0 (i) n ! 3 1 X (i) (i) + x0 n x0 m 2 n,m=1 0 à ∂2V 0 (i) ∂x0 (i) n ∂x m ! + ... 0 O ´ındice 0 significa que a fun¸c˜ao e as suas derivadas est˜ao a ser tomadas na origem [por exemplo, V0 = V (0, 0, 0)]. Introduzindo a nota¸c˜ ao mais compacta, ∂n0 = ∂ 0 (i) , a express˜ao ∂x anterior pode ser escrita na forma V (ri0 ) = V0 − ri0 3 1 X (i) (i) · E0 − x0 x0 (∂ 0 Em )0 , 2 n,m=1 n m n n (4.46) pois, como se sabe, (∇0 V )0 = −E0 . Como a divergˆencia de E ´e nula em todos os pontos da distribui¸c˜ao D, porquanto n˜ao h´a a´ı fontes do campo “externo”, podemos acrescentar `a ´ctricos Multipolos ele • 87 equa¸c˜ ao anterior uma parcela da forma ri0 2 (∇ (i) · E )0 /6 sem com isso lhe alterar o valor. Inserindo a express˜ao que resulta para V em (4.45), vem 0 Uint = U0,int + U1,int + U2,int + ... = Q V0 − p · E0 − N X 3 1X (i) (i) 2 0 qi (3x0 m x0 n − ri0 δmn ) (∂m En )0 + ... 6 i=1 n,m=1 tendo-se usado, no segundo termo, a defini¸c˜ ao de momento dipolar p da distribui¸c˜ ao D [ver (4.29)]. Podemos ainda escrever o terceiro termo numa forma mais compacta, se atendermos `a defini¸c˜ao (4.36) do momento quadrupolar: U2,int = − 3 1 X Qmn (∂n0 Em )0 . 6 m,n=1 Num outro referencial, cuja origem seja dada pelo vector posicional r relativamente `a origem O, a energia de interac¸c˜ao vem Uint 3 ∂Em (r ) 1 X Qmn + ... , = Q V (r ) − p · E (r ) − 6 m,n=1 ∂xn (4.47) o que equivale a fazer o desenvolvimento em s´erie em torno de um ponto localizado pelo vector posicional r com origem em O. A suposi¸c˜ao de que o sistema D ´e constitu´ıdo por cargas pontuais n˜ao ´e restritiva. Poderse-iam ter considerado distribui¸c˜ oes cont´ınuas de carga que o resultado anterior ainda se mantinha. Importa sublinhar que a interac¸c˜ ao quadrupolar [terceira parcela em (4.47)] ´e importante em muitos dom´ınios da F´ısica. Por exemplo, em F´ısica Nuclear, essa interac¸c˜ ao permite a medi¸c˜ao de momentos quadrupolares, podendo da´ı inferir-se a forma dos n´ ucleos e compreender melhor a natureza da for¸ca entre os neutr˜oes e os prot˜oes. Recorde-se que numa rede cristalina h´a varia¸c˜oes de campo el´ectrico e, estando os n´ ucleos sujeitos a este campo, a sua energia inclui uma contribui¸c˜ ao de tipo quadrupolar. Esta contribui¸c˜ ao levanta degenerescˆencias existentes no espectro de energias do n´ ucleo e o desdobramento dos n´ıveis permite determinar o seu momento quadrupolar. 4.6.1 Interac¸c˜ ao dipolo - campo el´ ectrico Vejamos qual ´e o efeito da aplica¸c˜ ao de um campo exterior sobre um dipolo el´ectrico. Se designarmos por θ o ˆangulo que a direc¸c˜ ao do momento dipolar do dipolo p forma com o campo E , a energia de interac¸c˜ao, como vimos acima, ´e dada por Uint = −p · E = −pE cos θ (4.48) com o valor do campo el´ectrico a ser tomado no centro do dipolo. A equa¸c˜ ao anterior tamb´em P pode ser obtida fazendo o c´alculo directo a partir de i qi V (i). Assim, Uint = q ( V+q − V−q ), onde os ´ındices ±q se referem `a posi¸c˜ ao da carga positiva e negativa. Considerando o desenvolvimento do potencial em s´erie de Taylor, at´e primeira ordem, em torno do centro do dipolo [ver Eq. (4.46)] a energia vem Uint = −q (r+q − r−q ) · E , que se reduz `a forma dada na Eq. (4.48), atendendo `a defini¸c˜ ao de momento dipolar do dipolo. A Eq. (4.48) mostra que, na presen¸ca de um campo el´ectrico, o dipolo tende a alinhar com a direc¸c˜ao do campo, tornando assim m´ınima a energia. Ao inv´es, a energia ser´a m´axima 88 • ´tico Campo electromagne quando cos θ = −1, isto ´e, quando p e E forem antiparalelos. Se o campo el´ectrico for constante na regi˜ao do dipolo, a for¸ca total que sobre ele se exercer ser´a nula: F = q (E+q − E−q ) = 0. Mas se houver uma dependˆencia espacial do campo el´ectrico a for¸ca sobre o dipolo j´a n˜ao ser´a nula. Por exemplo, as componentes x das for¸cas que se exercem sobre cada uma das cargas s˜ao dadas por q Ex + q (r±q · ∇)Ex , com Ex e derivadas de Ex tomadas na origem. A for¸ca total que se exerce sobre o dipolo ´e F = q [(r+q − r−q ) · ∇] E = (p · ∇)E . (4.49) Verificamos que, se E for constante, a for¸ca ser´a nula. Contudo, mesmo neste caso, h´a um momento M que ´e dado por M = q r+q × E − q r−q × E = q(r+q − r−q ) × E = p × E . (4.50) Dado tratar-se de um sistema de for¸ca resultante nula, este momento ´e independente do ponto escolhido para origem. Deve assinalar-se que se podia explorar um pouco mais a express˜ao (4.47), desenvolvendo o campo externo em multipolos, e identificando no final as contribui¸c˜ oes para a energia resultantes de termos com caracter´ısticas multipolares bem definidas: energia de interac¸c˜ao dipolo-dipolo, monopolo-quadrupolo, dipolo-quadrupolo, etc. Exemplo 4.2: Interac¸ c˜ ao dipolo-dipolo ´ conveniente exprimir Vejamos, a t´ıtulo de exemplo, o caso da interac¸c˜ ao dipolo-dipolo. E o campo criado por um dipolo [ver (4.12)] sem fazer referˆencia a um qualquer sistema de coordenadas. Assim, partindo do potencial (4.8) pode obter-se o campo el´ectrico: E= ˆ )r ˆ−p 3(p · r , 4π ²0 r3 express˜ao que ´e equivalente a (4.12). A express˜ao anterior ser´a obtida formalmente no Problema 4.7.11. Seja p1 o momento dipolar de um dipolo localizado em r1 e p2 o momento de um dipolo localizado em r2 . Seja ainda R = r1 − r2 . A energia de p1 no campo de p2 (energia de interac¸c˜ao dipolo-dipolo) ´e dada por UDD = −p1 · E2 h i 1 ˆ )(p1 · R ˆ) . = p · p − 3 ( p · R 1 2 2 4π²0 R3 Como ´e ´obvio, se tiv´essemos calculado a energia de p2 no campo produzido por p1 , ter´ıamos chegado ao mesmo resultado. De facto, a express˜ao anterior fica invariante quando se permuta ˆ → −R ˆ ). p1 com p2 (e R 4.7 4.7.1 PROBLEMAS RESOLVIDOS Distribui¸c˜ ao de carga em superf´ıcie esf´ erica Quest˜ ao Calcular o momento dipolar de uma distribui¸c˜ ao superficial esf´erica de carga cuja densidade ´e σ = σ0 cos θ, sendo θ o ˆangulo polar. O raio da esfera ´e R. ´ctricos Multipolos ele • 89 Resposta Por defini¸c˜ao, o momento dipolar de uma distribui¸c˜ ao superficial de carga ´e [cf. (4.32)] Z p= S σ(r 0 ) r 0 dS . (4.51) Considere-se a Figura 4.7. O vector posicional r 0 de um elemento de carga sobre a superf´ıcie esf´erica ´e r 0 = R rˆ 0 . z r' q f y x Figura 4.7. Distribui¸ c˜ ao de carga do Problema 4.7.1. ˆ 0 relaciona-se com os vectores unit´arios segundo os eixos x, y e z atrav´es O vector unit´ario r de ˆ. rˆ 0 = sin θ cos φ ˆi + sin θ sin φ jˆ + cos θ k ´ conveniente utilizar um elemento de superf´ıcie da esfera carregada da forma E dS = Rdθ R sin θ dφ = R2 sin θ dθ dφ. (4.52) Usando o elemento de superf´ıcie (4.52), a componente x do momento dipolar (4.51) ´e Z px = S σ0 cos θ R sin θ cos φ R2 sin θ dθ dφ = σ0 R3 Z 2π 0 cos φ dφ Z π 0 sin2 θ cos θ dθ = 0 . A ectrico ´e proporcional a um integral da forma R 2πcomponente y do momento dipolar el´ ao, que tamb´em 0 sin φ dφ, verificando-se, por esta raz˜ py = 0 . Finalmente, a componente z ´e dada por Z pz = S σ0 cos θ R cos θ R2 sin θdθdφ = 2πσ0 R3 Z π 0 cos2 θ sin θ dθ = 4πσ0 R3 . 3 90 • ´tico Campo electromagne Para se escrever a u ´ltima igualdade utilizou-se a express˜ao Z π 0 ¯π à (cos θ)m+1 ¯¯ 1 − (−1)m+1 cos θ sin θ dθ = − , ¯ = m + 1 ¯0 m+1 m (4.53) com m = 2. Em conclus˜ao, podemos escrever p= 4.7.2 4 ˆ. π R3 σ0 k 3 Cubo de carga Quest˜ ao No interior de um cubo de aresta a est´a distribu´ıda, uniformemente, uma carga Q. Tomando para origem o centro do cubo, provar que os momentos dipolar e quadrupolar da distribui¸c˜ao s˜ao nulos. Resposta O momento dipolar el´ectrico escreve-se [cf. (4.31)] Z p= cubo r 0 ρ(r 0 ) dv . Na situa¸c˜ao do problema a densidade de carga ´e constante e dada por ρ= Q . a3 Considera-se a origem no centro do cubo (que ´e tamb´em o centro de cargas). Os trˆes eixos coordenados passam pelo centro de todas as faces do cubo. Isto significa que as coorˆ dos elementos denadas x0 , y 0 e z 0 — componentes do vector posicional r 0 = x0ˆi + y 0 jˆ + z 0 k 0 0 0 de carga localizados no volume elementar dv = dx dy dz — variam todas de −a/2 a +a/2. A componente x do momento dipolar el´ectrico ´e Q px = 3 a Z a/2 −a/2 0 0 x dx Z a/2 −a/2 dy 0 Z a/2 −a/2 dz 0 = 0 , (4.54) pois o primeiro dos trˆes integrais ´e nulo (trata-se do integral de uma fun¸c˜ ao ´ımpar num dom´ınio sim´etrico). Quando se calculam as componentes y e z do momento dipolar el´ectrico, surgem integrais, respectivamente, sobre y 0 e sobre z 0 do tipo do integral em x0 na express˜ao (4.54), pelo que p = 0. De resto, dada a simetria do problema, os momentos px , py e pz tˆem de ser iguais (as direc¸c˜ oes dos trˆes eixos coordenados s˜ao equivalentes). Se px ´e nulo, as outras duas componentes, py e pz , tamb´em tˆem de ser nulas. Os elementos do tensor momento quadrupolar s˜ao dados por [cf. (4.38)] Z Qij = cubo 2 (3x0i x0j − r0 δij ) ρ(r 0 ) dv . (4.55) ´ctricos Multipolos ele • 91 Vejamos, em primeiro lugar, os elementos diagonais. O elemento xx ´e dado por Z Qxx = = Z Q Q 2 2 2 (3x − r ) 3 dx0 dy 0 dz 0 = 3 (2x0 − y 0 − z 0 ) dx0 dy 0 dz 0 a a " Z Z a/2 Z a/2 Z a/2 Z a/2 Z a/2 a/2 Q 02 0 0 0 0 02 0 2 x dx dy dz − dx y dy dz 0 a3 −a/2 −a/2 −a/2 −a/2 −a/2 −a/2 − 02 02 Z a/2 0 −a/2 dx Z a/2 −a/2 Ora, dy Z α −α 0 # Z a/2 02 −a/2 ξ m dξ = z dz 0 . (4.56) αm+1 − (−α)m+1 m+1 (4.57) e de (4.56) vem, finalmente, Qxx Q = 3 a " # a5 a5 a5 − − = 0. 6 12 12 (4.58) Repetindo os c´alculos para os outros elementos diagonais, verifica-se que tamb´em s˜ao nulos: Qxx = Qyy = Qzz = 0 . Uma forma bem mais simples de concluir que os elementos diagonais tˆem de ser nulos consiste em notar que, por simetria, Qxx = Qyy = Qzz . Mas, por outro lado, o tra¸co do tensor momento quadrupolar el´ectrico tem de ser nulo, o que s´o ´e poss´ıvel, em fun¸c˜ ao das igualdades anteriores, se cada um dos elementos diagonais se anular. Quanto aos elementos n˜ao diagonais, considere-se, em primeiro lugar, Qxy . Tem-se, a partir de (4.55), Z Qxy = = 3x0 y 0 ρ(r ) dx0 dy 0 dz 0 3Q a3 Z a/2 −a/2 x0 dx0 Z a/2 −a/2 y 0 dy 0 Z a/2 −a/2 dz 0 . Calculando os integrais a partir de (4.57) conclui-se que Qxy ´e nulo. Nulos s˜ao tamb´em os outros elementos n˜ao diagonais, ou seja: Qxy = Qxz = Qyz = 0 . Em conclus˜ao, o vector momento dipolar e os elementos do tensor momento quadrupolar s˜ao nulos para a distribui¸c˜ao dada e no referencial considerado. 4.7.3 Distribui¸c˜ ao discreta de cargas — I Quest˜ ao Considerar a distribui¸c˜ao de cargas da Figura 4.8 dispostas simetricamente em rela¸c˜ ao `a origem O. Com base na desenvolvimento multipolar do potencial, obter a express˜ao do potencial el´ectrico criado por esta distribui¸c˜ ao de cargas num ponto `a distˆancia r À a da origem. 92 • ´tico Campo electromagne y Q O a 4 Q Q a 4 Q a Q a a x a z Q Figura 4.8. Distribui¸ c˜ ao de carga do Problema 4.7.3. Resposta O momento monopolar ´e a carga total: Qtot = 12Q . (4.59) O momento dipolar, que ´e dado por [cf. (4.29)] p= 6 X qi ri0 , i=1 ´e nulo, pois por cada carga localizada num ponto h´a uma outra, de igual valor, localizada simetricamente relativamente `a origem (ver Tabela 4.2, que resume os dados relativos `a distribui¸c˜ ao de cargas). Assim, p = 0. (4.60) Os elementos do momento quadrupolar s˜ao dados por [cf. (4.36)] Qkm = 6 X (i) (i) 2 qi (3x0 k x0 m − δkm ri0 ) , (4.61) i=1 onde i ´e o ´ındice de part´ıcula e k, m = x, y, z s˜ ao ´ındices cartesianos. Note-se que, para todas as cargas da distribui¸c˜ao (ver Figura 4.8), ri0 2 = a2 . O elemento xx de (4.61) ´e Qxx = 6 X · ³ qi 3 x 0 (i) ´2 − 2 ri0 ¸ i=1 = (3a2 − a2 )Q + (3a2 − a2 )Q − a2 Q − a2 Q − a2 4Q − a2 4Q = −6 a2 Q . (4.62) Efectuando os c´alculos, verifica-se que o elemento yy tem tamb´em este valor: Qyy = −6a2 Q . (4.63) ´ctricos Multipolos ele • 93 Tabela 4.2. Localiza¸ c˜ ao das cargas do Problema 4.7.3. Carga # # # # # # Valor x0 y0 z0 Q Q Q Q 4Q 4Q a −a 0 0 0 0 0 0 a −a 0 0 0 0 0 0 a −a 1 2 3 4 5 6 De resto, este resultado pode ser obtido notando que os eixos x e y s˜ao equivalentes entre si (o eixo z j´a n˜ao!). A maneira mais simples de obter o elemento zz ´e tirar partido do facto de o tensor do momento quadrupolar ter tra¸co nulo: 3 X Qkk = 0 . k=1 Assim, Qzz = −Qxx − Qyy = 12 a2 Q . (4.64) Pode o leitor chegar a este resultado usando a express˜ao geral (4.61). Quanto aos elementos n˜ao diagonais, s˜ao todos nulos. Vejamos apenas um, a t´ıtulo de exemplo: Qxy = 3 6 X x0i yi0 qi = 0 (= Qxz = Qyz ) , (4.65) i=1 pois duas das coordenadas x0i , yi0 , zi0 s˜ ao nulas para cada uma das seis cargas (ver Tabela 4.2). Tendo obtido os momentos multipolares de ordem mais baixa, podemos utilizar agora a express˜ao do desenvolvimento multipolar do potencial para obter V (r) a distˆancias relativamente grandes da distribui¸c˜ao de cargas: V (r ) ' 3 Q p · rˆ 1 1 X + + xk Qkm xm . 4π²0 r 4π²0 r2 4π²0 r5 2 k,m=1 Usando nesta express˜ao os resultados (4.59), (4.60), (4.62), (4.63), (4.64) e (4.65), obt´em-se " V (r ) ' ' # Q a2 12 + 4 (−6x2 − 6y 2 + 12z 2 ) 4π²0 r 2r 12Q 3a2 Q + (3z 2 − r2 ) . 4π²0 r 4π²0 r5 94 • ´tico Campo electromagne 4.7.4 Distribui¸c˜ ao discreta de cargas — II Quest˜ ao Considerar uma distribui¸c˜ao de cargas pontuais localizadas nos v´ertices de um cubo de aresta a do modo seguinte: −3q(0, 0, 0);−2q(a, 0, 0);−q(a, a, 0);q(0, a, 0);2q(0, a, a);3q(a, a, a);4q(a, 0, a);5q(0, 0, a). a) Calcular os momentos monopolar, dipolar e quadrupolar desta distribui¸c˜ ao de cargas em rela¸c˜ao `a origem (0, 0, 0); b) Determinar a posi¸c˜ao de uma nova origem, em rela¸c˜ ao `a qual o momento dipolar seja nulo. Resposta Na Tabela 4.3 resume-se a distribui¸c˜ ao de cargas. Na u ´ltima coluna indica-se o quadrado √ √ da distˆancia de cada carga `a origem. Essa distˆancia pode ser a, 2a e 3a. Tabela 4.3. Localiza¸ c˜ ao das cargas do Problema 4.7.4. A quantidade na u ´ ltima coluna ´ e o quadrado da distˆ ancia de cada carga ` a origem. Carga # # # # # # # # 1 2 3 4 5 6 7 8 Valor x0 y0 z0 r0 2 −3q −2q 4q 5q q −q 3q 2q 0 a a 0 0 a a 0 0 0 0 0 a a a a 0 0 a a 0 0 a a 0 a2 2a2 a2 a2 2a2 3a2 2a2 a) O momento monopolar da distribui¸c˜ ao ´e Q = 15 q − 6 q = 9 q . (4.66) O momento dipolar ´e dado pela express˜ao (4.29). Em rela¸c˜ ao `a origem (0, 0, 0) tem-se px = (−2q + 4q − q + 3q)a = 4 q a py = (q − q + 3q + 2q)a = 5 q a pz = (4q + 5q + 3q + 2q)a = 14 q a , ou seja, ˆ) . p = q a (4 ˆi + 5 jˆ + 14 k (4.67) ´ctricos Multipolos ele • 95 Os elementos do tensor momento quadrupolar s˜ao calculados a partir de (4.36). Os elementos diagonais s˜ao: Qxx = 8 X 2 2 qi (3x0i − ri0 ) i=1 = −2q (3a2 − a2 ) + 4q (3a2 − 2a2 ) + 5q (−a2 ) + q (−a2 ) −q (3a2 − 2a2 ) + 3q (3a2 − 3a2 ) + 2q (−2a2 ) = −11 q a2 Qyy = 8 X 2 2 qi (3yi0 − ri0 ) i=1 = −2q (−a2 ) + 4q (−2a2 ) + 5q (−a2 ) + q (3a2 − a2 ) −q (3a2 − 2a2 ) + 3q (3a2 − 3a2 ) + 2q (3a2 − 2a2 ) = −8 q a2 Qzz = −Qxx − Qyy = 19 q a2 . Quanto aos elementos n˜ao diagonais, Qxy = 3 8 X qi x0i yi0 i=1 = 3 (−qa2 + 3qa2 ) = 6 q a2 = Qyx Qxz = 3 8 X qi x0i zi0 i=1 = 3 (4qa2 + 3qa2 ) = 21 q a2 = Qzx Qyz = 3 8 X qi yi0 zi0 i=1 = 3 (2qa2 + 3qa2 ) = 15 q a2 = Qzy ; b) Quando o momento monopolar de uma distribui¸c˜ ao de cargas ´e diferente de zero, ´e sempre poss´ıvel encontrar um ponto relativamente ao qual o momento dipolar dessa distribui¸c˜ao ´e nulo. Esse ponto especial — centro de cargas — define-se atrav´es de [cf. (4.42)] N 1 1 X qi ri0 = p RC = Q i=1 Q (repare-se na analogia com a defini¸c˜ ao de centro de massa). Relativamente `a origem (0, 0, 0), o vector posicional do centro de cargas da distribui¸c˜ ao ´e, atendendo a (4.66) e a (4.67), RC = 4.7.5 a ˆ ˆ) . (4 i + 5 jˆ + 14 k 9 Distribui¸c˜ ao linear de carga Quest˜ ao Uma carga Q est´a uniformemente distribu´ıda num segmento de recta de comprimento d. 96 • ´tico Campo electromagne a) Calcular V por integra¸c˜ao, escolhendo a origem das coordenadas no centro de cargas; b) Calcular os termos monopolar, dipolar e quadrupolar do desenvolvimento de V ; c) Para que valores de r ´e o termo quadrupolar inferior a 1/100 do termo monopolar? Discutir o resultado. Resposta Na Figura 4.9 introduz-se a nota¸c˜ ao que se ir´a utilizar: r 0 ´e o vector posicional de um elemento de carga relativamente `a origem, r ´e o vector posicional, relativamente `a mesma origem, do ponto onde se pretende conhecer o potencial e a = r − r 0 . P r a q O d /2 r' x d /2 Figura 4.9. Segmento de recta uniformemente carregado. a) O potencial no ponto P ´e 1 V = 4π²0 Z d/2 −d/2 λ dx , |r − r 0 | (4.68) onde λ = Q/d ´e a densidade linear de carga. Relembrando o seguinte desenvolvimento multipolar (4.26) µ 0 ¶` ∞ 1 1 X r = P (cos θ) , ` |r − r 0 | r `=0 r e substituindo em (4.68), vem V = ∞ 1 λX 4π²0 r `=0 Z d/2 −d/2 P` (cos θ) µ 0 ¶` r r dx , que ´e a Eq. (4.27) [ou (4.28)] adequada `a distribui¸c˜ ao linear de carga deste problema. Para x < 0, r0 = −x (r0 ´e sempre positivo) e o ˆangulo θ ´e o suplementar do que est´a indicado na Figura 4.9, pelo que o co-seno do ˆangulo entre r e r 0 ´e o sim´etrico do co-seno do ˆangulo indicado. Dado que P` (− cos θ) = (−1)` P` (cos θ), o potencial pode ser escrito na forma " V = ∞ 1 λX P` (cos θ) (−1)` 4π²0 r `=0 r` Z 0 −d/2 ` (−x) dx + Z d/2 0 # ` x dx ´ctricos Multipolos ele = Z ∞ λ X P` (cos θ) d/2 ` x dx 4π²0 r `=0 r` −d/2 = ∞ λ X P` (cos θ) 4π²0 r `=0 r` = λ 4π²0 r ∞ X • 97 à `+1 ¯d/2 ¯ r0 ¯ ¯ ` + 1¯ µ ¶` P` (cos θ) `=0 1 r −d/2 (d/2)`+1 − (−d/2)`+1 . `+1 Se ` ´e ´ımpar, o u ´ltimo factor ´e nulo. Se ` ´e par, o numerador do u ´ltimo termo d´a `+1 simplesmente 2(d/2) . O potencial vem ent˜ ao V = 2λ 4π²0 ∞ X P` (cos θ) `=0 (` par) 1 `+1 µ d 2r ¶`+1 ; (4.69) b) O termo monopolar do potencial — termo correspondente a ` = 0 em (4.69) — ´e V0 = Q 2λd = . 8 π ²0 r 4 π ²0 r (4.70) O termo dipolar (` = 1) ´e nulo. Note-se que o momento dipolar el´ectrico da distribui¸c˜ ao ´e nulo, pois o centro geom´etrico do segmento, escolhido para origem, ´e tamb´em o centro de cargas. O termo quadrupolar (` = 2) do desenvolvimento (4.69) ´e V2 = d3 d3 λ λ 2 P2 (cos θ) 3 = (3 cos2 θ − 1) 3 . 12π²0 8r 12π²0 8r (4.71) Desta express˜ao e da express˜ao geral para o potencial quadrupolar quando h´a simetria axial [cf. (4.40)], como ´e o caso presente, conclui-se que Q(2) = Qzz = Q d2 ; 6 c) Pretende-se determinar os valores de r para os quais |V2 | < 1 |V0 | . 100 A partir de (4.70) e (4.71) obt´em-se d2 |3 cos2 θ − 1| 1 |V2 | = < . |V0 | 24r2 100 Ora, |3 cos2 θ − 1| varia entre 0 e 2. Quando |3 cos2 θ − 1| = 0, tem-se, r > 0. Quando 3 cos2 θ − 1 = 2, tem-se r2 > 200 2 d ∼ 8d2 24 −→ √ r > 2 2d. √ Para distˆancias r > 2 2 d o potencial quadrupolar ´e tal que |V2 | < 100 |V0 |. 98 • ´tico Campo electromagne 4.7.6 Anel de carga Quest˜ ao Considerar um anel de raio a sobre o qual existe uma carga total Q uniformemente distribu´ıda. Obter o desenvolvimento multipolar do potencial el´ectrico criado pelo anel em qualquer ponto P a uma distˆancia r do centro do anel tal que r À a. Resposta A situa¸c˜ao est´a representada na Figura 4.10. P z r q y a f x Figura 4.10. Anel circular carregado uniformemente. O ponto P est´a a uma distˆancia r do centro do anel que ´e muito maior do que o raio deste. Designa-se por θ o ˆangulo entre a direc¸c˜ ao vertical (eixo z) e a direc¸c˜ ao do vector posicional do ponto P. O momento monopolar, Q, relaciona-se com a densidade linear de carga, λ, atrav´es de Q = 2πλa. (4.72) O momento dipolar da distribui¸c˜ ao, sendo dado por I p= anel λ r 0 d` , (4.73) n˜ao tem componente segundo o eixo z, pois a distribui¸c˜ ao de cargas localiza-se no plano 0 xy (para qualquer elemento de carga z = 0). As componentes x e y do momento dipolar el´ectrico (4.73) tamb´em se anulam. De facto, fazendo d` = a dφ, x0 = a cos φ, y 0 = a sin φ em (4.73), obt´em-se I px = λ anel x0 d` = λa2 I py = λ anel y 0 d` = λa2 Z 2π 0 Z 2π 0 cos φ dφ = 0 sin φ dφ = 0 . ´ctricos Multipolos ele • 99 Como o sistema tem simetria axial relativamente ao eixo z, basta calcular o elemento Qzz do tensor momento quadrupolar: I Qzz = Q(2) = λ anel 2 2 (3z 0 − r0 ) d` . Recordando que z 0 ´e sempre nulo e, fazendo a integra¸c˜ ao na coordenada angular, tal como anteriormente, obt´em-se Q(2) = −λa3 Z 2π 0 dφ = −2πλa3 = −Qa2 , tendo-se utilizado (4.72). Recorda-se que o termo quadrupolar do potencial, no caso de simetria axial, ´e dado por (4.40). Assim, considerando os termos do potencial de ordem mais baixa (o que ´e v´alido a distˆancias grandes), o potencial em P ´e V = 4.7.7 Q Qa2 3 cos2 θ − 1 − . 4π²0 r 4π²0 4 r3 Distribui¸c˜ oes lineares de carga Quest˜ ao Duas distribui¸c˜oes lineares de carga λ1 = λ0 y e λ2 = −λ0 y (sendo λ0 uma constante positiva) est˜ao localizadas em x = b e x = −b, respectivamente, e estendem-se desde y = −a at´e y = a. Calcular os termos monopolar, dipolar e quadrupolar do desenvolvimento em multipolos do potencial el´ectrico criado por esta distribui¸c˜ ao de cargas, em rela¸c˜ ao `a origem. Resposta A distribui¸c˜ao est´a indicada na Figura 4.11 (o eixo z ´e perpendicular ao plano do papel e aponta para fora). y a b b x a Figura 4.11. Distribui¸ c˜ oes lineares de carga do Problema 4.7.7. 100 • ´tico Campo electromagne Atendendo `as express˜oes da densidade linear de carga, cada uma das linhas tem carga total nula. A linha 1 tem carga positiva para y > 0 e carga sim´etrica desta para y < 0. Para a linha 2 tem-se o oposto. O momento monopolar do sistema ´e, pois, nulo: Q = 0. O momento dipolar ´e, neste caso, dado por Z p= x0 linha 1 λ1 r d` + z0 Para a linha 1, = b, = 0 e λ1 = λ0 ambos os casos, d` = dy 0 . Assim, px = λ0 py = λ0 Z a −a Z a −a Z 0 y0; linha 2 λ2 r 0 d` . para a linha 2, x0 = −b, z 0 = 0 e λ2 = −λ0 y 0 . Em b y 0 dy 0 − λ0 2 y 0 dy 0 − λ0 Z a −a Z a −a ³ ¯ 2 ¯a (−b) y 0 dy 0 = λ0 b y 0 ¯ −a =0 2 y 0 dy 0 = 0 pz = 0 , quer dizer, o momento dipolar da distribui¸c˜ ao ´e nulo. Vejamos agora as componentes do tensor momento quadrupolar. Os elementos diagonais [ver (4.38)] s˜ao Z Z Qii = a −a 2 a 2 (3x0 i − r0 )λ1 dy 0 + −a 2 2 (3x0 i − r0 )λ2 dy 0 , que se anulam, pois as duas parcelas s˜ao sim´etricas (λ1 = λ0 y 0 e λ2 = −λ0 y 0 ). Globalmente, as fun¸c˜oes integrandas s˜ao ´ımpares e por isso o integral ´e zero. Os elementos n˜ao diagonais Qxz e Qyz s˜ao evidentemente nulos, pois ambos incluem o factor z 0 , que ´e sempre nulo. Finalmente, Qxy = Z a −a 3x0 y 0 λ1 dy 0 + = 3 b λ0 Z a −a à = 6 b λ0 Z a 2 −a 3x0 y 0 λ2 dy 0 y 0 dy 0 + 3 b λ0 y0 3 3 ¯a ¯ ¯ ¯ ¯ Z a −a 2 y 0 dy 0 = 4 b a3 λ0 = Qyx . −a A contribui¸c˜ao de ordem mais baixa para o desenvolvimento multipolar do potencial — que ´e a quadrupolar — ´e dada por [cf. (4.37)] V2 = 4.7.8 3 b λ0 a3 x y 1 1 X x Q x = . k km m 4π²0 r5 2 k,m=1 π ²0 r5 Distribui¸c˜ ao de carga com simetria axial Quest˜ ao Uma distribui¸c˜ao de carga ´e dada, em coordenadas esf´ericas, pela seguinte densidade volum´etrica    ρ0 r2 sin2 θ  r a, sendo ρ0 uma constante. Calcular os momentos monopolar, dipolar e quadrupolar da distribui¸c˜ ao. ´ctricos Multipolos ele • 101 Resposta O momento monopolar ´e a carga total do sistema: Z Q= v ρ dv , (4.75) sendo v o volume onde a carga se distribui (interior de uma esfera de raio a). Assim, inserindo (4.74) em (4.75), vem Z Z π Z 2π ρ0 a 4 3 Q= 2 r dr sin θdθ dφ . a 0 0 0 Aplicando a rela¸c˜ao3 Z π 0 (sin θ)2m+1 dθ = obt´em-se Q= 2 (2m)!! , (2m + 1)!! ρ0 a5 4 8 2π = π ρ0 a3 . a2 5 3 15 O momento dipolar ´e definido por4 Z p= v ρ r dv , cujas componentes s˜ao: px = Z a ρ0 a2 0 r5 dr Z π 0 sin4 θ dθ Z 2π 0 cos φ dφ = 0 , uma vez que o u ´ltimo integral ´e nulo; do mesmo modo, py = finalmente Z a ρ0 a2 0 r5 dr Z a ρ0 pz = 2 a 0 Z π 5 r dr 0 sin4 θ dθ Z π 0 Z 2π 0 sin φ dφ = 0 ; 3 sin θ cos θ dθ Z 2π 0 dφ = 0 pelo que p = 0 para a distribui¸c˜ao dada. A u ´ltima express˜ao anula-se, pois o integral em θ ´e nulo. Em geral, Z π 0 sinm θ cos θdθ = 0 . A distribui¸c˜ao de cargas tem simetria axial, pois a densidade de cargas n˜ao depende da coordenada esf´erica φ. Para conhecer o tensor momento quadrupolar basta, pois, calcular Qzz : Z Qzz = = 3 v (3z 2 − r2 ) ρ dv ρ0 a2 Z a 0 6 r dr Z π 0 2 3 (3 cos θ − 1) sin θdθ Z 2π 0 dφ . O s´ımbolo “!!” designa duplo factorial, tendo-se (2m)!! = 2×4×6×...×2m, e (2m+1)!! = 1×3×5×...×(2m+1). Para tornar mais leve a nota¸ca ˜o, e quando apenas se calculam momentos multipolares, n˜ ao vamos pˆ or “linhas” nas vari´ aveis sobre as quais se integra. 4 102 • ´tico Campo electromagne Usando (4.53) obt´em-se, para o integral em θ, Z π 0 = 2 3 (3 cos θ − 1) sin θ dθ = Z π 0 Z π 0 (3 cos2 θ − 1)(1 − cos2 θ) sin θ dθ 2 2 8 (−3 cos θ + 4 cos θ − 1) sin θdθ = −3× + 4× − 2 = − , 5 3 15 4 2 donde Qzz = − 8 ρ0 a7 16 2π 2 =− π a5 ρ0 . 15 a 7 105 Lembrando que Qxx = Qyy = −Qzz /2, a matriz completa dos elementos do momento quadrupolar escreve-se   1 0 0 8 π ρ0 a5   0 . (Qij ) =  0 1 105 0 0 −2 4.7.9 Cilindro de carga Quest˜ ao Considerar uma distribui¸c˜ao de cargas com simetria axial dada, em coordenadas cil´ındricas, pela seguinte densidade volum´etrica:  ρ0 r/a       ρ =       para 0 ≤ r ≤ a ; 0 ≤ z ≤ L − ρ0 r/a para 0 ≤ r ≤ a ; −L ≤ z ≤ 0 0 (4.76) para r > a ; z qualquer Calcular os momentos monopolar e dipolar da distribui¸c˜ ao e mostrar que este ´e independente da origem escolhida. Resposta O problema tem simetria cil´ındrica, pois a densidade de cargas n˜ao depende da coordenada angular cil´ındrica φ. A carga total do cilindro ´e nula, uma vez que na parte de cima do cilindro, z > 0, a densidade de carga ´e sim´etrica da da parte de baixo, z < 0. Vejamos qual ´e a carga em cada uma das partes (na parte de cima, por exemplo): Q+ = = Z a 0 ρ r dr Z L 0 dz Z 2π 0 dφ 2 π L ρ0 a2 . 3 (4.77) ˆ , e que a integra¸c˜ao Recordando que, em coordenadas cil´ındricas r = r cos φ ˆi+r sin φ jˆ +z k na vari´avel φ de um seno ou de um co-seno d´a zero, o momento dipolar s´o pode ter componente na direc¸c˜ao z. Esta componente ´e dada por pz = Z a 0 r dr Z L −L ρ z dz Z 2π 0 dφ . ´ctricos Multipolos ele • 103 As integra¸c˜oes a efectuar s˜ao semelhantes `as da express˜ao (4.77), com a excep¸c˜ ao da integra¸c˜ ao em z. Obt´em-se ρ0 a3 2 2π pz = 2π L = ρ0 a2 L2 . a 3 3 Atendendo ao resultado (4.77) podemos escrever ˆ. p = Q+ L k Esta express˜ao sugere que a distribui¸c˜ ao (4.76) ´e equivalente a um dipolo formado pelas cargas Q+ e −Q+ localizadas no eixo z, respectivamente em L/2 e em −L/2. O momento dipolar da distribui¸c˜ ao ´e independente da escolha da origem, pois a carga total ´e nula. 4.7.10 Momento quadrupolar de um elips´ oide Quest˜ ao Mostrar que o elemento zz do tensor quadrupolar el´ectrico de um elips´oide de revolu¸c˜ ao de semi-eixo maior, b, e semi-eixo menor, a, com uma carga Q uniformemente distribu´ıda, ´e dado por b−a ¯ a+b 4 ¯2 δ com δ = ¯ , R = . (4.78) Qzz = Q R 5 2 R Resposta ´ conveniente fazer o estudo utilizando coordenadas cil´ındricas. Escolhe-se o eixo z seE gundo o eixo maior do elips´oide. O momento quadrupolar ´e Z Qzz = ρ v [3z 2 − (r2 + z 2 )] r dr dφ dz , (4.79) onde ρ ´e a densidade de carga. Esta ´e simplesmente ρ= Q 4 2 3 πa b , sendo o denominador o volume do elips´oide de revolu¸c˜ ao. A equa¸c˜ ao do elips´oide ´e x2 y 2 z 2 + 2 + 2 = 1, a2 a b ou ainda, em termos da coordenada cil´ındrica r, r2 z2 + = 1. a2 b2 A integra¸c˜ao sobre r, em (4.79), ter´a de ser efectuada de 0 at´e s r=a 1− z2 . b2 (4.80) 104 • ´tico Campo electromagne Tem-se, ent˜ao, Qzz = 2πρ = 2πρ Z b −b Z b −b dz Z a q b 0  (2z 2 − r2 ) r dr à dz z 2 a2 Z b 2 1− z2 z2 1− 2 b ! a4 − 4 à z2 1− 2 b !2   à z 4 a2 a4 a4 z 2 a4 z 4 dz z a − 2 − = 2πρ − + b 4 2b2 4b4 −b 2 2 ! . Efectuando a integra¸c˜ao em z, obt´em-se Qzz = 8 π ρ a2 b (b2 − a2 ) . 15 Esta express˜ao pode ainda ser escrita, atendendo a (4.80), na seguinte forma: Qzz = 2 Q (b − a) (b + a) . 5 ¯ — ver (4.78) — obt´em-se a express˜ao Finalmente, atendendo `as defini¸c˜oes de δ e de R pretendida: 4 ¯2 δ. Qzz = Q R 5 4.7.11 Campo el´ ectrico dipolar Quest˜ ao Um dipolo de momento dipolar p est´a localizado na origem, mas sem orienta¸c˜ ao especial relativamente ao sistema de eixos. Mostrar que o campo el´ectrico pode ser escrito na forma E (r ) = 1 ˆ) r ˆ − p]. [3 ( p · r 4π²0 r3 (4.81) Resposta Basta notar que, independentemente da orienta¸ca˜o do dipolo, o potencial dipolar ´e dado por [cf. (4.8)] p · rˆ 1 1 V = = p·r 3 . 4π²0 r2 4π²0 r Tomando o sim´etrico do gradiente desta express˜ao, obt´em-se o campo el´ectrico: 1 E = −∇V = − 4π²0 · ∇(p · r ) r3 µ 1 +p·r∇ 3 r ¶¸ . (4.82) Em geral (ver Apˆendice B), ∇(A · B ) = (B · ∇)A + (A · ∇)B + B × (∇ × A) + A × (∇ × B ) . (4.83) ´ctricos Multipolos ele • 105 No c´alculo de ∇(p · r ) deve notar-se que, sendo o vector p constante, o primeiro e o terceiro termos no lado direito de (4.83) anulam-se. Al´em disso, o rotacional de r ´e nulo, pelo que ∇(p · r ) = (p · ∇)r µ = px ¶ ∂ ∂ ∂ ˆ) = p . + py + pz (xˆi + y jˆ + z k ∂x ∂y ∂z Por outro lado, verifica-se que µ 1 ∇ 3 r ¶ =− ˆ 3r . 4 r Substituindo as duas u ´ltimas express˜oes em (4.82), obt´em-se 1 E=− 4π²0 4.7.12 µ ¶ p 3 1 ˆ )r ˆ − p] . ˆ = − p · r 4r [ 3(p · r 3 r r 4π²0 r3 Energia de um dipolo Quest˜ ao Considerar uma esfera imagin´aria de raio a centrada num dipolo de momento p. Mostrar, por integra¸c˜ao da densidade de energia de r = a at´e infinito, que a energia el´ectrica associada `a regi˜ao do espa¸co fora da esfera ´e U = p2 / (12π²0 a3 ). Resposta Consideremos a express˜ao do campo el´ectrico produzido por um dipolo [Eq. (4.81)]. Se tomarmos a direc¸c˜ao do momento dipolar para eixo z, o ˆangulo de p com r ´e a coordenada esf´erica angular θ, podendo escrever-se 1 ˆ] . ˆ − pk [3p cos θ r 4π²0 r3 E= ˆ= ˆ·k A densidade de energia, u, ´e proporcional ao quadrado desta express˜ao (note-se que r cos θ): u = = ²0 E·E 2 µ ¶2 ²0 p (3 cos2 θ + 1) . 2 4π²0 r3 A energia pretendida ´e o integral desta express˜ao para r ≥ a, ²0 U= 2 µ p 4π²0 ¶2 Z ∞ 1 r6 a 2 r dr Z π 0 2 (3 cos θ + 1) sin θ dθ Z 2π 0 dφ . A integra¸c˜ao no ˆangulo θ faz-se recorrendo `a express˜ao (4.53), tendo-se, finalmente, U µ ¶2 = ²0 2 = p2 . 12π²0 a3 p 4π²0 µ ¯ ¶µ 2 2π 3× + 2 3 − 1 ¯¯∞ 3r3 ¯a 106 • ´tico Campo electromagne 4.7.13 For¸ca entre dipolos Quest˜ ao Um dipolo de momento p1 est´a localizado em r1 e um outro dipolo de momento p2 em r2 . Determinar a for¸ca F2 exercida em p2 . Calcular F2 nos seguintes casos particulares: i) p1 ´e paralelo a p2 mas perpendicular a R; ii) p1 ´e paralelo a p2 e paralelo a R, sendo R = r2 − r1 . Resposta Vimos no Exemplo 4.2 que a energia de interac¸c˜ ao dipolo-dipolo era dada por 1 ˆ )(p2 · R ˆ )], [ p1 · p2 − 3(p1 · R UDD = 4π²0 R3 (4.84) sendo R = r2 − r1 . A for¸ca a que um dipolo de momento p fica sujeito quando est´a na presen¸ca de um campo el´ectrico E ´e, em geral, dada por (4.49). Al´em disso, a for¸ca pode ser expressa como o sim´etrico do gradiente da energia potencial (que, neste caso, ´e a energia do sistema). Para mostrarmos isso mesmo, neste caso particular, consideremos o gradiente do escalar p · E e apliquemos a express˜ao (4.83): ∇(p · E ) = (E · ∇)p + (p · ∇)E + E × (∇ × p) + p × (∇ × E ) . No lado direito desta equa¸c˜ao, o primeiro e o terceiro termos s˜ao nulos, porque p ´e constante; o quarto termo ´e zero porque o campo electrost´atico ´e irrotacional; a u ´nica parcela n˜ao nula ´e o segundo termo, que ´e a for¸ca (4.49): F = (p · ∇)E . De (4.48) conclui-se, como se esperava, que F = −∇U . Podemos agora determinar a for¸ca que se exerce no dipolo 2. Basta tomar o gradiente da energia de interac¸c˜ao dipolo-dipolo em rela¸c˜ ao ` as coordenadas r2 (´e este o significado do ´ındice 2 no operador nabla na express˜ao seguinte): F2 = −∇2 UDD . (4.85) Mas, como R = r2 − r1 , tomar o operador nabla em ordem `as coordenadas do dipolo 2 ´e equivalente a tomar o operador nabla relativamente a R. Vamos designar este operador nabla simplesmente por ∇, sem qualquer ´ındice. Para se calcular o gradiente de (4.84) tem de se usar µ ¶ 1 R ∇ = −3 5 (4.86) R3 R e ˆ ) = (p · ∇) R (4.87) ∇(p · R R [para se escrever esta u ´ltima express˜ao usou-se (4.83) e ainda o facto de p ser constante ˆ , tal como R, ser irrotacional]. Usando coordenadas cartesianas, em termos das e de R componentes, tem-se ˆ) = ∇i (p · R 3 X j=1 pj ∂ ∂xj 3 µ X pj δij µ xi R ¶ xj = − pj xi 3 R R j=1 xi pi − (p · R) . = R R3 ¶ ´ctricos Multipolos ele • 107 A Eq. (4.87) passa a ser escrita do seguinte modo: ˆ)= ∇(p · R p R − R R3 (p · R) . (4.88) Vamos usar os resultados (4.86) e (4.88) para, de acordo com (4.85), tomarmos o gradiente da energia (4.84): · ¸ 3R 3 p1 R ˆ )(p2 · R ˆ )] + ˆ) F2 = [ p1 · p2 − 3(p1 · R − 3 (p1 · R) (p2 · R 5 3 4π²0 R 4π²0 R R R · + = ¸ 3 p2 R ˆ) − 3 (p2 · R) (p1 · R 4π²0 R3 R R h i 3 ˆ − 5 (p1 · R ˆ ) (p2 · R ˆ )R ˆ + p1 (p2 · R ˆ ) + p2 (p1 · R ˆ) . ( p · p ) R 1 2 4π²0 R4 (4.89) 108 • ´tico Campo electromagne Consideremos agora os seguintes casos particulares: i) Os momentos p1 e p2 s˜ao paralelos entre si e perpendiculares a R. Neste caso (4.89) reduz-se a 3p1 p2 ˆ F2 = R. 4π²0 R4 ii) Os momentos p1 e p2 s˜ao paralelos entre si e paralelos a R. Neste caso, (4.89) reduz-se a 3 ˆ (p1 p2 − 5p1 p2 + p1 p2 + p1 p2 ) R 4π²0 R4 3p1 p2 ˆ = − R. 2π²0 R4 F2 = CAP´ITULO 5 ´ MEIOS DIELECTRICOS 5.1 ˜ INTRODUC ¸ AO ` escala do nanometro, a mat´eria pode ser vista como um conjunto de cargas positivas A ´ (n´ ucleos) e negativas (nuvem electr´onica). Atomos e mol´eculas, porque s˜ao electricamente neutros, tˆem momento monopolar nulo. Em certos materiais, como os condutores, algumas cargas el´ectricas podem mover-se com grande liberdade quando ficam sujeitas `a ac¸c˜ ao de campos el´ectricos externos. Noutros materiais n˜ao h´a cargas livres e, por isso, s˜ao n˜ao condutores. Esses materiais, que vamos considerar neste cap´ıtulo, s˜ao designados por diel´ectricos e s´o possuem cargas ligadas. A presen¸ca de um campo el´ectrico externo d´a origem unicamente a um pequeno deslocamento das cargas negativas relativamente `as positivas, dizendo-se ent˜ ao que o material fica polarizado. Esta ideia deve ficar bem clara desde o in´ıcio: nos condutores e semicondutores h´a cargas livres que se deslocam; nos diel´ectricos as cargas est˜ao sempre ligadas, podendo apenas sofrer pequenos deslocamentos. Saliente-se que, mesmo na ausˆencia de campos externos, h´a certas mol´eculas que, embora globalmente neutras, apresentam, devido `a sua estrutura, um momento dipolar permanente. Um exemplo comum ´e a mol´ecula de ´agua. Estas mol´eculas s˜ao polares, assim chamadas por oposi¸c˜ao `as que n˜ao apresentam qualquer momento dipolar e que se denominam n˜ ao polares. Os dipolos moleculares orientam-se quase sempre ao acaso, pelo que o momento dipolar de uma amostra ´e nulo (tal como o momento monopolar). Refira-se, a t´ıtulo de curiosidade, que h´a materiais com dipolos el´ectricos permanentes que tendem a orientar-se paralelamente entre si, mesmo na ausˆencia de campo externo. S˜ao os chamados electretes, bastante raros e de muito menor interesse do que os seus correspondentes magn´eticos — os magnetes permanentes. Por fim, para certos materiais pode acontecer que, depois de estarem sujeitos `a ac¸c˜ao de um campo el´ectrico externo, mantenham por mais algum tempo a polariza¸c˜ao que neles foi induzida. Em geral, o electromagnetismo pode ser formulado sem necessidade de recorrer `a descri¸c˜ ao microsc´opica da mat´eria. Pode, pois, falar-se de cargas e correntes sem necessidade de apurar 110 • ´tico Campo electromagne qual ´e a sua constitui¸c˜ao elementar, ou seja, sem necessidade de saber de que s˜ao “feitas” essas cargas e essas correntes. No caso dos diel´ectricos, embora a mesma perspectiva possa ser adoptada, h´a vantagem em procurar entender os fen´omenos com base no comportamento microsc´opico dos constituintes da mat´eria. Notemos, no entanto, que, `a escala microsc´opica, muitos dos fen´omenos s´o s˜ao compreens´ıveis no quadro da mecˆanica quˆantica. As cautelas ter˜ao, portanto, de ser redobradas... Num peda¸co de mat´eria cujas mol´eculas sejam n˜ao polares, e na ausˆencia de campo el´ectrico externo, os centros de cargas positivas e negativas de cada mol´ecula coincidem (um exemplo ´e a mol´ecula de O2 ). Sob a ac¸c˜ ao de um campo electrost´atico externo, o centro de carga da nuvem electr´onica desloca-se ligeiramente em rela¸c˜ ao ao centro de carga do n´ ucleo −8 (o deslocamento ´e da ordem de ∼ 10 do diˆametro do ´atomo). Diz-se que o campo el´ectrico externo produziu uma polariza¸c˜ ao electr´ onica. A polariza¸c˜ ao direccional ocorre no caso de o material ser constitu´ıdo por mol´eculas polares. Neste caso, o campo el´ectrico externo faz orientar os dipolos para tornar m´ınima a energia de interac¸c˜ao (como vimos no fim do cap´ıtulo anterior, o momento dipolar tende a alinhar com a direc¸c˜ao do campo). Al´em disso, o pr´oprio momento dipolar de cada mol´ecula aumenta por ac¸c˜ao do campo externo. Se o material for um s´olido como o NaCl, os i˜oes de diferentes sinais deslocam-se em sentidos opostos quando sujeitos a um campo el´ectrico externo e tem-se ent˜ ao a polariza¸c˜ ao at´ omica. 5.2 ˜ ELECTRICA. ´ POLARIZAC ¸ AO CARGAS E CORRENTES ˜ DE POLARIZAC ¸ AO A polariza¸c˜ao de um material ´e caracterizada por uma grandeza vectorial — o vector polariza¸c˜ao, P — que se define como o momento dipolar el´ectrico por unidade de volume do material, isto ´e, dp P = , (5.1) dv sendo dp o momento dipolar el´ectrico da mat´eria contida no volume elementar dv. Portanto, o vector P (r ) ´e uma densidade de momento dipolar. O momento dipolar total de uma amostra de volume v ´e Z ptotal = P dv . v Nas express˜oes anteriores, o volume elementar dv, que ´e “pequeno” `a escala macrosc´opica, dever´a ser, contudo, suficientemente “grande” `a escala molecular, de modo a conter muitas mol´eculas para que eventuais flutua¸c˜ oes estat´ısticas no n´ umero de mol´eculas ou na orienta¸c˜ ao dos seus dipolos n˜ao tenham efeito significativo. Se assim for, a polariza¸c˜ ao definida por (5.1) ´e uma fun¸c˜ao bem comportada. Se todos os momentos dipolares moleculares, p, apontarem numa mesma direc¸c˜ ao, e se n for o n´ umero de mol´eculas por unidade de volume, a polariza¸c˜ ao pode ser escrita como P = np . (5.2) Esta express˜ao estabelece uma rela¸c˜ ao entre uma propriedade macrosc´opica, P , e uma pro1 priedade microsc´opica , p. No caso de se aplicar ao diel´ectrico um campo el´ectrico externo 1 No Cap´ıtulo 4 introduzimos o s´ımbolo p para representar o momento dipolar de uma distribui¸ca ˜o de cargas. Advertimos o leitor para o facto de o mesmo s´ımbolo ser usado para designar tanto o momento dipolar do “indiv´ıduo” (´ atomo ou mol´ecula) como o de uma por¸ca ˜o macrosc´ opica de mat´eria. ´ctricos Meios diele • 111 E , ´e evidente que, sendo P uma medida da “resposta” do material `a solicita¸c˜ao externa, a densidade de polariza¸c˜ao dever´a ter uma rela¸ca˜o directa com E . Mas deixemos para mais tarde a discuss˜ao desta rela¸c˜ao entre os dois vectores. As cargas ligadas dos diel´ectricos s˜ao afinal a “fonte” (origem) do vector P e dever˜ ao tamb´em ter com este uma rela¸c˜ao muito estreita. Vejamos qual ´e essa rela¸c˜ ao. Consideremos uma ´area infinitesimal dS no interior de um material diel´ectrico como mostra a Figura 5.1. E ^ n + + s d v = s d S d S + Figura 5.1. Superf´ıcie elementar no interior de um diel´ ectrico polarizado por ac¸ c˜ ao do campo externo E . O volume ˆ dS = s · dS . elementar referido no texto ´ e dv = s · n Designemos por s o vector posicional do centro de cargas positivas, Q, numa mol´ecula polarizada, relativamente ao centro de cargas negativas, −Q, da mesma mol´ecula. Quando se aplica um campo externo E , as mol´eculas orientam-se tendendo a alinhar os seus momentos dipolares el´ectricos com E . Seja N+ o n´ umero de cargas positivas que se deslocam num sentido (o do campo E ) atravessando a ´area dS (Figura 5.1) e N− o n´ umero de cargas negativas, −Q, que se deslocam no sentido oposto, atravessando a mesma ´area infinitesimal. A carga total deslocada e que atravessa a superf´ıcie dS ´e igual a dQ = N+ Q − N− (−Q) = (N+ + N− )Q . ˆ , com Ora, N+ + N− ´e o n´ umero de mol´eculas num volume elementar dv = s · dS (dS = dS n ˆ n a normal `a superf´ıcie elementar dS), de modo que a carga deslocada ´e dada pela express˜ao dQ = Q n s · dS , (5.3) onde, como foi dito antes, n ´e o n´ umero de part´ıculas (mol´eculas) por unidade de volume. Atendendo `a defini¸c˜ao de momento dipolar da mol´ecula, p = Qs e `a Eq. (5.2), pode escreverse (5.3) na forma (5.4) dQ = n p · dS = P · dS . Se o elemento de ´area se localizar sobre a superf´ıcie do diel´ectrico, haver´ a a´ı uma acumula¸c˜ao de carga ligada ou carga de polariza¸c˜ ao, cuja densidade superficial ´e σp = dQ ˆ. =P ·n dS (5.5) 112 • ´tico Campo electromagne Quanto `a densidade volum´etrica de carga ligada, comecemos por notar o seguinte. A carga que sai de um volume elementar ´e, de acordo com (5.4), o fluxo de P atrav´es da ´area orientada que delimita esse volume. Assim, a carga total que sai de um volume finito v no interior do diel´ectrico ´e dada pelo integral I Qsai = P · dS S estendido `a superf´ıcie fechada S que delimita v. A carga que fica no volume ´e o sim´etrico da carga que sai. A express˜ao anterior e o teorema de Gauss permitem escrever a carga que fica na forma de um integral estendido ao volume v: Z Qfica = − ∇ · P dv. v Sendo v qualquer, esta express˜ao permite-nos definir uma densidade volum´etrica de carga ligada ou de polariza¸c˜ao, ρp (r ), dada por ρp = −∇ · P . (5.6) Se um diel´ectrico est´a sob a ac¸c˜ ao de um campo el´ectrico vari´ avel no tempo, gera-se no material uma corrente de polariza¸c˜ ao, cuja densidade designamos por jp . Considerando novamente um volume v arbitr´ario no interior do diel´ectrico, limitado pela superf´ıcie fechada S, o fluxo da corrente de polariza¸c˜ao atrav´es desta superf´ıcie, isto ´e, o fluxo do vector jp , ´e igual `a varia¸c˜ao por unidade de tempo da carga de polariza¸c˜ ao nesse volume v. Como se tem de verificar a equa¸c˜ao de continuidade para as cargas ligadas, I d jp · dS = − dt S Z v ρp dv . Usando (5.6) e o teorema de Gauss, I S I jp · dS = S ∂P · dS , ∂t de onde resulta, porque S ´e qualquer, jp = ∂P . ∂t Existe uma corrente de polariza¸c˜ao sempre que P dependa explicitamente do tempo. 5.3 ´ POTENCIAL ELECTRICO CRIADO PELAS CARGAS ˜ DE POLARIZAC ¸ AO Consideremos um bloco de material diel´ectrico, electricamente neutro, que se encontre polarizado, sendo, por isso, equivalente a um conjunto de dipolos el´ectricos. O momento dipolar do volume elementar dv, cuja localiza¸c˜ ao ´e descrita pelo raio vector r 0 , ´e dada por P dv. Vamos calcular o potencial produzido num ponto P, fora do diel´ectrico, sendo r o seu vector posicional. Na Sec¸c˜ao 5.8 consideraremos o caso em que o ponto P se localiza no interior do diel´ectrico. Mantendo a nota¸c˜ ao utilizada no Cap´ıtulo 2, introduzimos o vector ´ctricos Meios diele • 113 a = r − r 0 (ver Figura 2.2). Atendendo `a express˜ao (4.8), o potencial criado em P pela distribui¸c˜ao de dipolos contida no volume v ´e 1 V (r ) = 4π²0 Z ˆ P (r 0 ) · a dv . a2 v Note-se que a integra¸c˜ao ´e sobre as vari´ aveis r 0 (em coordenadas cartesianas, por exemplo, dv = dx0 dy 0 dz 0 ). Usando (2.28) e (2.39) podemos escrever o potencial na forma µ ¶ Z 1 V (r ) = 4π²0 0 v 1 dv , a 0 P (r ) · ∇ onde ∇0 ´e o operador gradiente relativamente `a vari´ avel r 0 . Algumas transforma¸c˜ oes alg´ebricas simples permitem dar outra forma `a equa¸c˜ ao anterior. Assim, V (r ) = 1 4π²0 = 1 4π²0 ·Z µ 0 I S v ∇ · P (r 0 ) ¶ a ˆ P ·n a Z dv − 1 dS + 4π²0 Z v v ∇0 · P (r 0 ) a ¸ dv −∇0 · P dv , a (5.7) ˆ a normal exterior, em cada ponto, a essa sendo S a superf´ıcie fechada que envolve v e n superf´ıcie. Conclui-se que o potencial criado pelo material diel´ectrico polarizado ´e afinal o mesmo que seria produzido por uma distribui¸c˜ ao volum´etrica de carga de densidade ρp = ˆ −∇ · P [segundo termo de (5.7)] e por uma distribui¸c˜ ao superficial de densidade σp = P · n (primeiro termo da referida express˜ao). Verificamos que estas densidades s˜ao precisamente aquelas que foram deduzidas na Sec¸c˜ ao 5.2. Do ponto de vista dos efeitos no exterior, podemos considerar que o bloco de material diel´ectrico polarizado — que ´e um conjunto de dipolos descritos por P — pode ser “substitu´ıdo” por uma distribui¸c˜ao de cargas ligadas (ou de polariza¸c˜ ao) de densidades σp e ρp dadas por (5.5) e (5.6), respectivamente. As cargas de polariza¸c˜ ao s˜ao distribui¸c˜ oes reais de carga, que representam acumula¸c˜ oes de carga em determinadas zonas do material diel´ectrico. ´ conveniente considerar desde j´a alguns exemplos de aplica¸c˜ E ao. Exemplo 5.1: Efeito de um diel´ ectrico num condensador plano Consideremos um condensador plano com capacidade C0 (´ area das placas, A, e distˆancia entre estas, d), carregado com uma carga Q. Essa carga resulta da aplica¸c˜ ao da diferen¸ca de potencial V0 entre as suas placas, tendo-se C0 = Q . V0 Isolando o condensador (isto ´e, mantendo Q constante) e colocando um material diel´ectrico entre as suas placas, verifica-se experimentalmente que a diferen¸ca de potencial entre as placas diminui, quer dizer V < V0 e, portanto, a capacidade aumenta: C > C0 . A diferen¸ca de potencial ´e, em cada caso, V0 = Z − + E0 · dl = E0 d e V = Z − + E · dl = E d , (5.8) sendo a circula¸c˜ao do campo el´ectrico da placa positiva do condensador para a negativa e E0 e E as grandezas do campo el´ectrico entre as placas na situa¸c˜ ao em que n˜ao existe 114 • ´tico Campo electromagne + + + + E + + + + + + + + P 0 + + (a ) + E + + + (b ) Figura 5.2. Condensador plano carregado (a) sem diel´ ectrico e (b) com diel´ ectrico. [Figura 5.2 (a)] e em que existe diel´ectrico [Figura 5.2 (b)]. Admitindo que P ´e constante, de (5.6) conclui-se que ρp = 0, isto ´e, n˜ao h´a densidade volum´etrica de carga de polariza¸c˜ ao no diel´ectrico. Mas `a superf´ıcie deste h´a carga, tendo sinal contr´ ario `a carga livre nas placas do condensador [Figura 5.2 (b)]. O campo el´ectrico com diel´ectrico, E = σ/²0 , ´e menor do que o campo quando n˜ao h´a diel´ectrico, E0 = σ` /²0 , onde σ = σ` + σp ´e a densidade superficial de carga total, σ` a densidade de carga livre e σp , que tem sinal contr´ ario a σ` , a densidade de carga de polariza¸c˜ao. De (5.8) obt´em-se imediatamente a rela¸c˜ ao entre os potenciais quando existe e quando n˜ao existe diel´ectrico: ¶ µ σp V0 . V = 1+ σ` A capacidade do condensador com diel´ectrico ´e µ σp Q = 1+ C= V σ` ¶−1 C0 = σ` C0 . σ (5.9) A presen¸ca de um meio diel´ectrico entre as placas de um condensador faz aumentar a sua capacidade, pois, como anteriormente se disse, σp tem sinal oposto a σ` e portanto σ` /σ > 1 (ver Problema 5.12.3). Exemplo 5.2: Campo criado por uma esfera uniformemente polarizada Uma esfera uniformemente polarizada ´e equivalente a duas distribui¸c˜ oes esf´ericas de carga Q e −Q, cuja separa¸c˜ao entre os centros ´e descrita pelo vector s (Figura 5.3). Designamos por ρ a densidade (uniforme) de carga de cada esfera. O campo el´ectrico ´e a soma dos campos criados pelas cargas positivas e pelas cargas negativas. Mantendo a nota¸c˜ao da Sec¸c˜ ao 4.2, designamos por r− o vector posicional do ponto P onde se quer obter o valor do campo relativamente ao centro de cargas positivas, e por r+ o vector posicional do mesmo ponto, agora em rela¸c˜ ao ao centro de cargas negativas (note-se que r+ = s + r− ). Comecemos por obter a express˜ao do campo num ponto localizado no interior da esfera polarizada. Relembrando o resultado expresso na Eq. (2.18), podemos escrever o campo criado por cada um dos tipos de carga, ρ r− 3²0 ρ r+ = − , 3²0 E+ = E− ´ctricos Meios diele r 115 P r + + + + • + s P Figura 5.3. A esfera polarizada uniformemente pode ser vista como uma sobreposi¸ c˜ ao de duas esferas com cargas opostas cujos centros est˜ ao ligeiramente afastados um do outro. de onde se obt´em o campo no interior da esfera, E = E+ + E− = − ρs . 3 ²0 Atendendo a que o vector polariza¸c˜ ao est´a relacionado com s atrav´es de P = dp dq =s = ρs, dv dv conclui-se que E=− P . (5.10) 3²0 Para a situa¸c˜ao descrita, P ´e constante e a densidade volum´etrica de carga de polariza¸c˜ ao ´e nula. S´o h´a carga de polariza¸c˜ao `a superf´ıcie, sendo a respectiva distribui¸c˜ ao superficial dada por ˆ=Ps ˆ·r ˆ = P cos θ , σp = P · r onde θ ´e o ˆangulo que o vector posicional do ponto da superf´ıcie forma com a direc¸c˜ ao s. No exterior da esfera os campos criados pelas cargas positivas e negativas s˜ao [ver (2.20)]: Q r− 3 4π²0 r− Q r+ = − 3 4π²0 r+ E+ = E− e o campo total ´e E = Q 4π²0 = Q 4π²0 à r− 3 r− µ − r+ ! 3 r+ r − s/2 r + s/2 − 3 |r − s/2| |r + s/2|3 ¶ , sendo r o vector posicional do ponto relativamente ao centro da esfera polarizada (r± = ´ interessante escrever a express˜ao do potencial num ponto exterior e analis´a-la r ± s/2). E 116 • ´tico Campo electromagne na situa¸c˜ ao em que r À s (os pormenores deste c´alculo foram apresentados na Sec¸c˜ ao 4.2). Tem-se µ ¶ ˆ ˆ Q 1 1 Qs · r vP ·r V (r ) = − ≈ = , 4π²0 |r − s/2| |r + s/2| 4π²0 r2 4π²0 r2 onde v ´e o volume da esfera. Quer dizer, a esfera uniformemente polarizada produz em pontos exteriores (r À s) o mesmo potencial que seria criado por um dipolo, de momento dipolar p = v P , colocado no centro da esfera. 5.4 ´ LEI DE GAUSS NA PRESENC ¸ A DE DIELECTRICOS E CAMPO DESLOCAMENTO D A lei de Gauss, tal como foi formulada no Cap´ıtulo 2, continua a ser v´alida, desde que se inclua a carga total, isto ´e, a carga livre mais a carga de polariza¸c˜ ao. Consideremos uma superf´ıcie fechada S no interior da qual (regi˜ao de volume v) podem existir cargas livres e cargas de polariza¸c˜ao. Admita-se que sobre a superf´ıcie S n˜ ao h´a distribui¸c˜ oes superficiais de carga de qualquer esp´ecie. A lei de Gauss aplicada ao volume v conduz `a express˜ao I S Q` + Qp Q = , ²0 ²0 E · dS = onde Q ´e a carga total contida no volume v, Z Q= v (ρ` + ρp )dv . Daqui resulta que a equa¸c˜ao local para o campo E passa a ser escrita do seguinte modo: ∇·E = ρ` + ρp ρ = , ²0 ²0 (5.11) onde ρ, ρ` e ρp designam, respectivamente, as densidades volum´etricas de carga total, livre e de polariza¸c˜ao. Atendendo a (5.6), a Eq. (5.11) pode ser escrita na forma ∇ · (²0 E + P ) = ρ` . ´ pois, poss´ıvel definir um vector cuja divergˆencia dependa apenas da densidade volum´etrica E, de cargas livres. Esse vector, (5.12) D = ²0 E + P , chama-se vector ou campo deslocamento el´ectrico (ou, simplesmente, deslocamento) e obedece `a equa¸c˜ao local ∇ · D = ρ` , (5.13) bem como `a correspondente equa¸c˜ao integral, Z v I ∇ · D dv = S D · dS = Q` , (5.14) as quais permitem, em princ´ıpio, calcular D uma vez conhecida a distribui¸c˜ ao de carga livre. O campo el´ectrico macrosc´opico no interior de um diel´ectrico pode ser visto como a sobreposi¸c˜ao do campo deslocamento [que obedece `a Eq. (5.13)] e do campo devido `as cargas de polariza¸c˜ao: E= D ²0 − P ²0 . ´ctricos Meios diele • 117 Sobre a superf´ıcie que separa dois meios 1 e 2, a divergˆencia, no primeiro membro de (5.13), ´e substitu´ıda pela divergˆencia superficial, tendo-se a seguinte equa¸c˜ ao, an´aloga `a Eq. (2.42) para o campo el´ectrico: ˆ · (D2 − D1 ) = D2n − D1n = σ` , divS D = n (5.15) ˆ o versor normal `a superf´ıcie e que aponta para o meio 2. Note-se que a componente sendo n do vector D segundo a normal `a superf´ıcie ´e cont´ınua sobre esta superf´ıcie se n˜ao houver ´ este o caso quando a fronteira separa dois meios distribui¸c˜ao superficial de cargas livres. E diel´ectricos. Se, por´em, a fronteira ´e entre um condutor e um diel´ectrico, D = 0 no interior do condutor (meio 1) pelo que, de (5.15), no meio 2 (diel´ectrico), junto `a superf´ıcie, Dn = σ` , sendo σ` a densidade de carga livre `a superf´ıcie do condutor. Em situa¸c˜oes est´aticas, da equa¸c˜ ao de Maxwell ∇ × E = 0 e de (5.12) resulta ∇×D = ∇×P. (5.16) Sobre uma superf´ıcie de descontinuidade a componente do campo el´ectrico E tangente `a superf´ıcie ´e cont´ınua [ver (2.43)], isto ´e, E2t = E1t . Pode adiantar-se que esta continuidade de Et ´e geral, mantendo-se mesmo no caso de situa¸c˜ oes n˜ao est´aticas (ver Cap´ıtulo 9). Se o meio 1 for um condutor e o meio 2 um diel´ectrico, no meio 1 E = 0, e portanto Et = 0 no diel´ectrico. Esta equa¸c˜ao exprime o facto, j´a conhecido, de o campo el´ectrico ser sempre perpendicular `a superf´ıcie do condutor. Para uma superf´ıcie de descontinuidade a Eq. (5.16) conduz a: D2t − D1t = P2t − P1t , (5.17) onde Pit , Dit s˜ao as componentes dos campos P e D numa direc¸c˜ ao perpendicular `a normal2 na superf´ıcie de separa¸c˜ao dos meios 1 e 2. 5.5 ˜ DOS DIELECTRICOS ´ CLASSIFICAC ¸ AO Na Sec¸c˜ao 5.2 foi afirmado que deve existir uma rela¸c˜ ao entre o campo el´ectrico, E , e o vector polariza¸c˜ao, P . H´a certos meios diel´ectricos que apresentam uma polariza¸c˜ ao permanente, quer dizer P 6= 0 mesmo quando E = 0. Mas, em geral, a rela¸c˜ ao funcional P = P (E ) ´e tal que P (E = 0) = 0, isto ´e, n˜ao h´a polariza¸c˜ao se n˜ao houver campo aplicado. Neste caso, a express˜ao mais simples que se pode considerar para as componentes do vector polariza¸c˜ao ´e um desenvolvimento nas componentes de E : Pi = X αij Ej + j X βijk Ej Ek + ... (5.18) jk Os valores dos coeficientes deste desenvolvimento caracterizam o tipo de diel´ectrico. Se forem necess´arios termos de segunda ordem e superiores para relacionar os vectores E e P , o ao linear. Se a primeira parcela de (5.18) for suficiente, o diel´ectrico diz-se diel´ectrico diz-se n˜ linear e, nesse caso, X X (5.19) Pi = αij Ej = ²0 χij Ej , j 2 j Na superf´ıcie de separa¸ca ˜o podem ser definidos dois eixos ortogonais. A Eq. (5.17) designa, de uma forma compacta, a projec¸ca ˜o sobre cada um desses eixos. 118 • ´tico Campo electromagne onde χij s˜ao as componentes do tensor susceptibilidade el´ectrica. Estas quantidades s˜ao adimensionais e caracter´ısticas do material, n˜ao dependendo de E (caso contr´ ario, cai-se na situa¸c˜ao n˜ao linear). As componentes do tensor susceptibilidade el´ectrica podem n˜ao ser constantes, isto ´e, podem variar de ponto para ponto do material. A Eq. (5.19) mostra que, em geral, P e E n˜ao s˜ao paralelos mesmo em materiais diel´ectricos lineares (situa¸c˜ ao que ocorre, por exemplo, em cristais). Mas h´a materiais diel´ectricos lineares que s˜ao tamb´em isotr´opicos. A isotropia significa que, em cada ponto do material, as suas propriedades el´ectricas s˜ao independentes da direc¸c˜ ao E ; o vector polariza¸c˜ ao ´e ent˜ ao paralelo ao campo el´ectrico. Todas as direc¸c˜oes s˜ao equivalentes e χij = 0 se i 6= j e χxx = χyy = χzz = χe . A rela¸c˜ao entre P e E ´e, ent˜ao, localmente, de simples proporcionalidade, P = ²0 χe E , (5.20) embora a susceptibilidade el´ectrica χe , numa situa¸c˜ ao mais geral, possa ser uma fun¸c˜ ao de r , ou seja, possa variar de ponto para ponto do diel´ectrico. Se tal dependˆencia n˜ao existir, quer dizer se o diel´ectrico for linear, isotr´ opico e homog´eneo, χe ´e uma constante e o diel´ectrico diz-se da classe A. Naturalmente que o valor de χe depende do diel´ectrico considerado, verificando-se experimentalmente que ´e sempre positivo para todos os materiais conhecidos. Usando a rela¸c˜ao (5.20), a express˜ao do vector deslocamento el´ectrico, dada por (5.12), pode ser escrita na forma D = ²0 E (1 + χe ) = ²0 ²r E = ² E , (5.21) sendo ² a permitividade do meio e ²r , dada por ² , (5.22) ²0 a permitividade relativa, que ´e uma quantidade sempre maior ou igual a 1. Esta grandeza ´e tamb´em designada por constante diel´ectrica do material, sendo ent˜ ao representada por κe . As quantidades χe , ²r (≡ κe ) ou ² s˜ao obtidas experimentalmente e caracterizam as propriedades diel´ectricas do material. Quando o campo externo E ´e pouco intenso os diel´ectricos tˆem um comportamento linear. Mas, mesmo para campos de intensidade moderada, a grande maioria dos materiais exibe ainda um comportamento linear. A anisotropia aparece essencialmente em s´olidos cristalinos cujas propriedades variam com a direc¸c˜ ao. Em materiais anisotr´opicos, a rela¸c˜ ao (5.12) continua v´alida mas, em geral, D , E e P n˜ ao P s˜ao paralelos. A Eq. (5.21) ´e escrita, em termos das componentes de D , na forma Di = ²0 j (²r )ij Ej , sendo (²r )ij as componentes de um tensor. Em meios diel´ectricos isotr´opicos, lineares e homog´eneos, o potencial electrost´atico satisfaz uma equa¸c˜ao semelhante a (2.15). Assim, reescrevendo a Eq. (5.21) em fun¸c˜ ao do potencial V, D = ²E = −² ∇V , tomando a divergˆencia de ambos os membros desta equa¸c˜ ao e considerando que a permitividade do meio, ², ´e constante, vem ²r = 1 + χe = ∇ · D = −² ∇2 V , ou, fazendo uso de (5.13), ρ` , (5.23) ² que ´e a equa¸c˜ao de Poisson. Apesar de, no numerador do segundo membro, aparecer simplesmente a densidade de carga livre, isto n˜ao significa que o efeito das cargas de polariza¸c˜ ao tenha desaparecido. Esse efeito est´a inclu´ıdo em ². A Eq. (5.23) ´e equivalente a (2.15) [no numerador de (2.15) a densidade de carga refere-se `a carga total], como veremos na pr´oxima sec¸c˜ao. ∇2 V = − ´ctricos Meios diele 5.5.1 • 119 ˜ ENTRE CARGAS LIVRES E DE POLARIZAC ˜ RELAC ¸ AO ¸ AO Tendo-se analisado a rela¸c˜ao entre os vectores E e P para diel´ectricos lineares e isotr´opicos, ser´a f´acil encontrar agora uma rela¸c˜ ao entre as densidades de carga livre e de polariza¸c˜ao (ou de carga total e de polariza¸c˜ ao). Assim, usando (5.6) e (5.20), e considerando χe constante, pode escrever-se ρp = −²0 χe ∇ · E . A equa¸c˜ao de Maxwell (2.42) permite substituir a divergˆencia de E pela densidade de carga total dividida pela permitividade do vazio, o que conduz a ρp = −χe (ρ` + ρp ) ; usando a rela¸c˜ao entre ²r e χe dada por (5.22), obt´em-se µ 1 ²r ρp = −ρ` 1 − ¶ . (5.24) Este resultado mostra que se a densidade de carga livre for nula, a de polariza¸c˜ ao sˆe-lo-´ a tamb´em. A rela¸c˜ao entre a densidade de carga total ρ e a carga livre obt´em-se da express˜ao anterior, bastando somar a ambos os membros de (5.24) a quantidade ρ` : ρ` ρ= . (5.25) ²r Esta equa¸c˜ao mostra que a densidade de carga total num ponto ´e igual ou menor do que a densidade de carga livre nesse ponto, uma vez que se verifica sempre ²r ≥ 1. Substituindo ρ` , dado por (5.25), em (5.23) obt´em-se a equa¸c˜ ao de Poisson (2.15). Exemplo 5.3: Interface condutor-diel´ ectrico Consideremos as distribui¸c˜oes superficiais de carga de polariza¸c˜ ao e de carga livre na superf´ıcie de separa¸c˜ao entre um condutor e um diel´ectrico, como se representa na Figura 5.4. n^ + + + d ie lé c tric o + + n ' ^ + c o n d u to r E = 0 D = 0 Figura 5.4. Interface condutor-diel´ ectrico. No condutor, E e D s˜ao nulos. As densidades superficiais de carga livre (no condutor) e de polariza¸c˜ao (no diel´ectrico) s˜ao ˆ σ` = D · n ˆ 0 = −P · n ˆ. σp = P · n (5.26) (5.27) 120 • ´tico Campo electromagne Au ´ltima destas equa¸c˜oes ainda se pode escrever, usando (5.20) e (5.21), na forma σp = − ²0 χe ˆ. D·n ² (5.28) Tendo em conta (5.22) e combinando (5.28) com (5.26), conclui-se que µ σp = −σ` 1 − 1 ²r ¶ [note-se a semelhan¸ca com (5.24)] ou, ainda, somando σ` a cada membro da equa¸c˜ ao anterior, σ= σ` . ²r A Eq. (5.9) que relaciona as capacidades de um condensador plano sem diel´ectrico (C0 ) e com diel´ectrico (C) pode, atendendo `a equa¸c˜ ao anterior, ser escrita na forma seguinte: C = ²r C0 . 5.5.2 (5.29) Diel´ ectricos lineares e isotr´ opicos — exemplos que ilustram o c´ alculo de D , E e P Vamos considerar alguns exemplos com diel´ectricos lineares e isotr´opicos. A Eq. (5.20), v´alida para esta classe de diel´ectricos, pode ser escrita nas seguintes formas [ver (5.22)]: P = ²0 χe E = (²r − 1) ²0 E = (² − ²0 ) E . Na Tabela 5.1 fornecem-se alguns valores para permitividades relativas est´aticas, ²r , para v´arios meios diel´ectricos e nas condi¸c˜ oes indicadas. Para a maior parte dos gases `a temper◦ atura T = 273, 15 K (= 0 C) e press˜ao P = 1, 01×105 Pa (= 1 atm) — condi¸c˜ oes PTN — a permitividade relativa ´e apenas ligeiramente superior `a unidade. No caso de um campo el´ectrico vari´ avel, a permitividade de um material pode depender da frequˆencia do campo. Na realidade, quando a frequˆencia de oscila¸c˜ ao ´e muito elevada, os dipolos n˜ao se orientam em tempo u ´til e a permitividade relativa diminui com o aumento da frequˆencia. Na Tabela 5.2 apresentam-se os valores de ²r para trˆes frequˆencias distintas. Exemplo 5.4: Carga pontual num diel´ ectrico infinito Consideremos uma carga pontual Q num diel´ectrico infinito. Como se conhece a distribui¸c˜ao de cargas livres, mas n˜ao as de polariza¸c˜ ao, podemos primeiro calcular o campo D e s´o depois E . Atendendo `a simetria esf´erica do problema, o vector deslocamento el´ectrico pode ser calculado usando a Eq. (5.14) e considerando uma superf´ıcie de Gauss esf´erica com centro na carga pontual. Como o campo D tem de ser radial, a aplica¸c˜ ao de (5.14) conduz imediatamente a 1 Q ˆr . D= e 4π r2 O campo el´ectrico ´e obtido a partir de D , fazendo uso de (5.21): E= D ² = 1 Q ˆr . e 4π² r2 Esta express˜ao mostra claramente que o campo el´ectrico ´e atenuado relativamente ao campo no vazio, pois o factor ² ´e sempre maior ou igual a ²0 . Tamb´em a for¸ca que a carga Q exerce numa carga Q0 ´e menor na presen¸ca de um meio diel´ectrico do que no caso do v´acuo. No Problema 5.12.7 obtˆem-se as cargas de polariza¸c˜ ao no diel´ectrico. ´ctricos Meios diele • 121 Tabela 5.1. Permitividades relativas (est´ aticas) de alguns materiais diel´ ectricos. Material ²r Ar (PTN) ´ Agua (vapor: 1 atm, 110 ◦ C) ´ Agua (l´ıquida: 1 atm, 100 ◦ C) ´ Agua (l´ıquida: 1 atm, 25 ◦ C) ´ Agua (l´ıquida: 1 atm, 0 ◦ C) Benzeno (1 atm, 20 ◦ C) Diamante (1 atm, 20 ◦ C) H´elio (1 atm, 140 ◦ C) H´elio l´ıquido (1 atm, 4,19 K) Nylon (1 atm, 20◦ C) Parafina (1 atm, 20◦ C) Porcelana (1 atm, 20◦ C) Vidro, p´ırex 7070 (1 atm, 20 ◦ C) 1,000 59 1,012 6 55,33 78,54 88,00 2,28 5,5 1,000 07 1,048 3,5 2,0 – 2,5 6,0 – 8,0 4,00 Exemplo 5.5: Superf´ıcie de separa¸ c˜ ao de dois meios diel´ ectricos Consideram-se dois meios diel´ectricos lineares, isotr´opicos e homog´eneos. Abord´amos, na Sec¸c˜ao 5.4, as condi¸c˜ oes que o campo D deve satisfazer sobre uma superf´ıcie que separa dois meios. A Eq. (5.15), que aqui recordamos, D2n − D1n = σ` , (5.30) mostra que a componente do campo D segundo a normal `a superf´ıcie s´o ´e cont´ınua se a ´ este, em geral, o caso, quando os meios 1 e densidade superficial de cargas livres for nula. E 2 s˜ao ambos diel´ectricos. A partir das eqs. (5.30) e (5.21) pode obter-se uma express˜ao que relaciona as componentes normais do campo E . O potencial electrost´atico tem de ser cont´ınuo sobre a superf´ıcie de separa¸c˜ao de dois meios pois, caso contr´ ario, o campo f´ısico E , que ´e mensur´avel, tornar-se-´a infinito sobre a superf´ıcie, o que n˜ao ser´a aceit´avel. A equa¸c˜ ao para o campo el´ectrico sobre a superf´ıcie ´e dada por (2.42), sendo a densidade de carga superficial que surge no membro direito dessa equa¸c˜ao a soma da carga livre e da carga de polariza¸c˜ ao. De (5.30) obt´em-se uma equa¸c˜ao equivalente para as componentes normais do campo el´ectrico nos meios 1 e 2 junto da superf´ıcie de separa¸c˜ao: ²2 E2n − ²1 E1n = σ` , onde ²1 e ²2 s˜ao as permitividades dos meios 1 e 2, respectivamente. N˜ao havendo carga superficial livre, a equa¸c˜ao anterior reduz-se a E2n = ²1 E1n . ²2 122 • ´tico Campo electromagne Tabela 5.2. Permitividades relativas de alguns materiais ` a temperatura de 25 o C para trˆ es frequˆ encias do campo el´ ectrico. ²r f = 102 Hz Material ´ Agua ´ Acido clor´ıdrico Benzeno Esferovite Gelo Tetracloreto de carbono Vidro (borosilicato de s´odio) f = 106 Hz f = 1010 Hz 78,2 5,90 2,28 1,03 4,15 2,17 4,84 34 5,90 2,28 1,03 3,20 2,17 4,82 81 2,28 1,03 2,17 5,00 Por outro lado, e como tamb´em j´a se referiu na Sec¸c˜ ao 5.4, as componentes perpendiculares ˆ dos campos el´ectricos E1 e E2 (componentes tangenciais) s˜ao sempre iguais: an E2t = E1t . Dividindo membro a membro as duas equa¸c˜ oes anteriores, obt´em-se tan θ1 = ²1 tan θ2 , ²2 ˆ. onde θ1 e θ2 s˜ao os ˆangulos que os vectores E1 e E2 fazem com a normal n E E E E 2 n q 2 m e io 2 1 t q 1 n E 2 E 2 t m e io 1 1 1 Figura 5.5. Refrac¸ c˜ ao das linhas de campo el´ ectrico na superf´ıcie de separa¸ c˜ ao de dois meios diel´ ectricos. ´ctricos Meios diele • 123 A Figura 5.5 mostra, em esquema, uma superf´ıcie plana a separar dois meios diel´ectricos 1 e 2, e ilustra a refrac¸c˜ao das linhas do campo el´ectrico. As linhas de E afastam-se da normal (θ2 > θ1 ) quando, ao passar de um meio 1 para um meio 2, a permitividade aumenta (²2 > ²1 ). 5.6 ENERGIA ARMAZENADA NO CAMPO NA PRESENC ¸A ´ DE MEIOS DIELECTRICOS A energia de uma distribui¸c˜ao de carga no vazio, representada pela densidade ρ, foi obtida R no Cap´ıtulo 3 e ´e dada por [ver (3.3)] U = 12 v ρ(r )V (r )dv, sendo o integral estendido ao volume v onde se encontra a distribui¸c˜ ao de carga. Na realidade, como referimos no Cap´ıtulo 3, o integral pode ser estendido a todo o espa¸co, pois fora do volume v a densidade ´e nula e n˜ao haver´a qualquer contribui¸c˜ ao para o integral nos pontos exteriores a esse volume. Na altura, embora n˜ao se tenha explicitado qual o tipo de carga representado por ρ, fez-se a interpreta¸c˜ao f´ısica de U : trata-se da energia (trabalho revers´ıvel) que ´e necess´ario dispender para juntar as cargas numa dada configura¸c˜ ao, trazendo-as do infinito. Esta ´e tamb´em a energia que o sistema fornece ao exterior quando a distribui¸c˜ ao de cargas se desfaz. Havendo meios diel´ectricos, apenas as cargas livres podem ser “´ uteis” na “reposi¸c˜ao” do trabalho inicialmente realizado. Assim, a express˜ao da energia electrost´atica na presen¸ca de um diel´ectrico deve ser3 Z 1 (5.31) ρ` (r )V (r ) dv , Ue = 2 com o integral estendido a todo o espa¸co pelas raz˜oes atr´as referidas. O potencial V (r ) ´e devido `a presen¸ca de todas as cargas, incluindo as de polariza¸c˜ ao, e ´e precisamente a´ı que est´a inclu´ıdo o efeito do diel´ectrico. Recordando que ρ` = ∇ · D e escrevendo uma equa¸c˜ ao semelhante a (3.7), envolvendo agora o campo deslocamento el´ectrico, ou seja (∇ · D )V = ∇ · (D V ) − D · ∇V , a energia (5.31) vem dada por 1 Ue = 2 Z 1 (−D · ∇V ) dv + 2 Z ∇ · (D V ) dv . (5.32) Aplicando o teorema de Gauss ao segundo integral, obt´em-se o fluxo do vector D V atrav´es de uma superf´ıcie infinita, uma vez que o integral de volume ´e estendido a todo o espa¸co. Usando argumentos semelhantes aos apresentados no Cap´ıtulo 3 [ver Eq. (3.9)], conclui-se que o valor deste integral ´e zero. Substituindo, no primeiro integral −∇V = E , a energia (5.32) vem dada por Z 1 Ue = D · E dv . (5.33) 2 No caso de diel´ectricos da classe A, Ue = ² 2 Z E 2 dv , (5.34) que ´e uma generaliza¸c˜ao de (3.10). A densidade de energia [cf. (3.11)] ´e agora 1 1 ² ue = D · E = D2 = E 2 , 2 2² 2 (5.35) sendo as duas u ´ltimas igualdades v´alidas apenas para meios diel´ectricos lineares e isotr´opicos. 3 A f´ ormula (5.31) ´e v´ alida para diel´ectricos lineares. 124 • ´tico Campo electromagne Exemplo 5.6: Energia de um condensador esf´ erico Consideremos um condensador esf´erico de raio interno a e externo b carregado com a carga Q. O espa¸co entre os condutores ´e ocupado por um material diel´ectrico de permitividade ². ´ conveniente utilizar a lei de Gauss para determinar o campo D , escolhendo superf´ıcies de E Gauss esf´ericas com centro em O e com raios r < a , a < r < b , e r > b , (ver Figura 5.6). Q + Q O e a b Figura 5.6. Condensador esf´ erico com diel´ ectrico. Obtemos D= 0, Q D= rˆ , 4πr2 r < a, r > b; a < r < b. A densidade de energia, Eq. (5.35), ´e ue = 1 Q2 1 , 2² (4π)2 r4 (5.36) na regi˜ao onde existe diel´ectrico e ´e nula fora dessa regi˜ao. Integrando sobre todo o espa¸co ocupado pelo diel´ectrico obtemos a energia electrost´atica armazenada no condensador Z Ue = 4π Q2 ue dv = 2² (4π)2 Z b dr a Q2 = r2 8π² µ 1 1 − a b ¶ , ou ainda, Ue = Q2 b − a . 8π² ab 2 Como, por outro lado, Ue = 21 QV = 12 QC , pode obter-se directamente quer a diferen¸ca de potencial entre as duas esferas, quer a capacidade do condensador. Para a capacidade C = 4π² ab , b−a ´ctricos Meios diele • 125 express˜ao que ´e an´aloga `a da capacidade do condensador esf´erico, C0 , quando n˜ao existe diel´ectrico entre as armaduras. A diferen¸ca entre as duas express˜oes reside apenas na substitui¸c˜ao da permitividade do vazio, ²0 , pela permitividade do meio, ². Como ² = ²0 ²r , podemos relacionar facilmente as duas capacidades: C = ²r C0 . Uma vez mais se verifica que quando o espa¸co entre as armaduras ´e ocupado por um diel´ectrico, a capacidade do condensador aumenta: veja-se a semelhan¸ca entre a equa¸c˜ ao anterior e a Eq. (5.29), que se refere ao condensador plano. Retomando a express˜ao (5.36), note-se que, no caso de ausˆencia de diel´ectrico e estando o condensador carregado com a mesma carga Q, a densidade de energia seria dada por uma express˜ao an´aloga, mas agora no denominador apareceria ²0 em vez de ², ou seja, ue0 = ²r ue , com o ´ındice “0” referente `a situa¸c˜ ao em que n˜ao existe diel´ectrico. Para um condensador plano isolado, com ou sem diel´ectrico entre as suas placas, a grandeza do vector deslocamento ´e D = σ` , pois possuem ambos a mesma carga livre. A densidade de energia, dada por (5.35), ´e ue0 = σ`2 /2²0 no caso em que n˜ao existe diel´ectrico, e ue = σ`2 /2² quando este est´a presente. Tamb´em neste caso, ue0 = ²r ue (ver Problema 5.12.3). 5.7 ´ FORC ¸ AS EM DIELECTRICOS A situa¸c˜ao que acab´amos de descrever ´e geral: a densidade de energia e, portanto, a energia total de um condensador isolado, carregado com uma certa carga Q, diminui quando nele se introduz um diel´ectrico. No Exemplo 5.8, a apresentar mais adiante, analisa-se pormenorizadamente esta situa¸c˜ao, para o caso de um condensador plano. Antes, no Exemplo 5.7, considera-se igualmente um condensador plano, mas agora mantido a um potencial constante. Neste caso, o condensador j´a n˜ao est´a isolado e, portanto, pode receber mais carga livre da bateria, que o mant´em a um potencial constante, quando possui um diel´ectrico no seu interior. Consequentemente, aumenta a sua energia, tal como a sua densidade de energia, verificando-se agora ue = ²r ue0 . Assim, dados dois condensadores, iguais do ponto de vista das suas caracter´ısticas geom´etricas, um sem diel´ectrico e o outro com diel´ectrico, possui menor energia o que tiver diel´ectrico, no caso de ambos estarem carregados com a mesma carga livre, Q; armazena mais energia o que tiver diel´ectrico se ambos estiverem a um mesmo potencial, V . Em qualquer dos casos, quando se come¸ca a introduzir um diel´ectrico no condensador4 , o diel´ectrico fica sujeito a uma for¸ca que o puxa para o espa¸co entre as placas, situa¸c˜ao que ´e ilustrada nos exemplos 5.7 e 5.8. Importa referir que, quando um diel´ectrico fica sujeito `a ac¸c˜ao de um campo externo, sofre uma deforma¸c˜ ao que, em geral, ´e pequena, pelo que as for¸cas mecˆanicas envolvidas n˜ao s˜ao consideradas. Para se obter a for¸ca exercida sobre um diel´ectrico ´e u ´til usar “m´etodos energ´eticos” como, por exemplo, o m´etodo do trabalho virtual referido e aplicado na Sec¸c˜ ao 3.2. Vamos considerar um mesmo sistema f´ısico — o condensador plano — e calcular a for¸ca a que fica sujeito um diel´ectrico quando ´e introduzido entre as placas do condensador. Dada a importˆancia de que se reveste o facto de o sistema estar ou n˜ao isolado, teremos de distinguir duas situa¸c˜ oes: num primeiro exemplo, consideramos que a diferen¸ca de potencial entre as placas do condensador permanece constante e, no segundo, consideramos que a carga nas placas do condensador ´e mantida constante. Em ambos os casos vamos desprezar o efeito dos bordos, isto ´e, o efeito da distor¸c˜ao das linhas do campo el´ectrico na periferia das placas. 4 Podemos raciocinar em fun¸ca ˜o de um condensador plano, mas a situa¸ca ˜o descrita ´e geral. 126 • ´tico Campo electromagne Exemplo 5.7: For¸ ca sobre um diel´ ectrico introduzido entre as placas de um condensador (V constante) Considere-se um condensador plano ligado a uma bateria e um diel´ectrico que cabe exactamente entre as suas placas. O diel´ectrico ´e um paralelep´ıpedo de dimens˜oes L × b × d, como mostra a Figura 5.7, e ´e introduzido entre as placas do condensador num processo quase-est´atico. L b L -x x d 1 A L Figura 5.7. Diel´ ectrico a ser introduzido entre as placas de um condensador plano. Para manter o potencial constante, `a medida que se introduz o diel´ectrico, tem de haver um acr´escimo de carga dQ nas placas, uma vez que a capacidade do condensador vai aumentando (recorde-se que V = Q/C). O trabalho realizado sobre o condensador ´e igual `a varia¸c˜ ao da sua energia interna, dU , e cont´em duas contribui¸co˜es: o trabalho da for¸ca exterior F que segura o diel´ectrico e o trabalho realizado pela bateria. Quando o bloco diel´ectrico se desloca dx entre as placas do condensador, a lei de conserva¸c˜ ao da energia permite escrever dU = F dx + V dQ . (5.37) Nesta express˜ao, F dx ´e o trabalho que a for¸ca exterior realiza durante o deslocamento dx, e V dQ ´e o trabalho realizado pela bateria para manter constante a diferen¸ca de potencial entre as placas do condensador. Por outro lado, a energia armazenada num condensador ´e dada por U = QV /2 = V 2 C/2. A sua varia¸c˜ ao, mantendo-se constante o potencial, ´e dU = V2 dC . 2 Atendendo a que dQ = V dC , pode concluir-se, a partir da Eq. (5.37), que V2 dC . (5.38) 2 Coloca-se agora a quest˜ao de saber como varia a capacidade do condensador `a medida que o diel´ectrico vai sendo introduzido. A capacidade do condensador representado na Figura 5.7 ´e igual `a capacidade da associa¸c˜ao em paralelo de dois condensadores, com capacidades F dx = − C1 = ²0 ²r bx d e C2 = ²0 b(L − x) , d ´ctricos Meios diele • 127 o primeiro para a parte j´a com diel´ectrico (zona 1) e o segundo para a parte sem diel´ectrico (zona 2). A capacidade total ´e C = C1 + C2 = ²0 b (L − x + ²r x) d (5.39) e a sua varia¸c˜ao ´e dada por ²0 b (²r − 1) dx . d Introduzindo esta express˜ao em (5.38) e recordando que V = Ed, vem dC = F =− ²0 E 2 (²r − 1) b d . 2 Esta ´e a for¸ca exterior que se exerce sobre o diel´ectrico durante o processo de introdu¸c˜ ao no condensador. A for¸ca devida ao campo el´ectrico, Fe , ´e igual a esta em grandeza, mas de sentido oposto (a introdu¸c˜ao do diel´ectrico ´e feita com acelera¸c˜ ao nula), Fe = ²0 E 2 (²r − 1) b d . 2 (5.40) A for¸ca, por unidade de ´area, exercida sobre a face do diel´ectrico de ´area A = bd ´e uma for¸ca atractiva dada por Fe ²0 E 2 = (²r − 1) , A 2 que puxa o diel´ectrico para o interior do condutor. Exemplo 5.8: For¸ ca sobre um diel´ ectrico introduzido entre as placas de um condensador (Q constante) Consideremos agora o mesmo condensador plano, carregado com carga Q e isolado, e o mesmo diel´ectrico do problema anterior. Sendo Q constante, o trabalho realizado, durante o processo quase-est´atico de introdu¸c˜ ao do diel´ectrico, ´e apenas o trabalho realizado para empurrar (ou segurar) o bloco. Este trabalho ´e igual `a varia¸c˜ ao de energia interna do condensador, isto ´e, (5.41) F dx = dU . Durante o processo a carga total em cada placa mant´em-se constante, mas o campo deslocamento el´ectrico, D , n˜ao ´e constante em toda a regi˜ao entre as placas. De facto, a introdu¸c˜ ao do diel´ectrico faz mover as cargas nas placas condutoras, pois s´o assim ´e poss´ıvel manter todos os pontos de cada placa do condensador ao mesmo potencial. Assim, na zona j´a ocupada (1) pelo diel´ectrico (zona 1 da Figura 5.7) dever´ a haver uma densidade de carga superficial σ` maior do que na outra zona (zona 2) para que V1 e V2 , dados por (2) (1) σ V1 = ` d ²0 ²r σ V2 = ` d , ²0 e sejam iguais. Desta igualdade resulta (1) σ` (2) = σ` ²r . Sabemos tamb´em que a carga total nas placas se mant´em constante e igual a Q: (1) (2) Q = σ` bx + σ` b(L − x) . 128 • ´tico Campo electromagne Resolvendo estas duas equa¸c˜oes em ordem `as densidades superficiais de carga, obt´em-se: (1) = (2) = σ` σ` Q²r b[²r x + (L − x)] Q . b[²r x + (L − x)] (i) As grandezas dos vectores deslocamento el´ectrico nas zonas 1 e 2 s˜ao D(i) = σ` , i = 1, 2, pelo que as densidades de energia, calculadas a partir de (5.35), s˜ao Q2 ²2r 2 r x + (L − x)] Q2 = . 2²0 b2 [²r x + (L − x)]2 ue1 = ue2 2²b2 [² Para uma dada distˆancia x estas densidades s˜ao constantes e as energias em cada uma das zonas s˜ao obtidas multiplicando as densidades pelos volumes respectivos. Efectuando os c´alculos obt´em-se para a energia U= Q2 d . 2 ²0 b (²r x + L − x) Esta equa¸c˜ao poderia igualmente ter sido obtida a partir de U = Q2 /2C, usando a express˜ao da capacidade dada por (5.39). A varia¸c˜ao da energia do condensador com x ´e dU Q2 d (1 − ²r ) = . dx 2²0 b (²r x + L − x)2 A for¸ca exercida pelo campo el´ectrico sobre o diel´ectrico ´e oposta a F , isto ´e, Fe = −F . De (5.41) e da express˜ao anterior resulta Fe = −F = − dU Q2 d(²r − 1) Q2 (²r − 1) ²0 b = , = dx 2 ²0 b (²r x + L − x)2 2 C2 d tendo-se usado a express˜ao da capacidade (5.39). Em fun¸c˜ao do potencial (V = Q/C) tem-se Fe = V 2 (²r − 1)²0 b ; 2d em fun¸c˜ao do campo el´ectrico (E = V /d), Fe = que ´e precisamente a Eq. (5.40). ²0 (²r − 1)E 2 bd , 2 ´ctricos Meios diele 5.8 • 129 ´ CAMPO NO INTERIOR DO DIELECTRICO Os c´alculos desenvolvidos na Sec¸c˜ ao 5.3 para se obter o potencial el´ectrico criado por um material diel´ectrico num ponto exterior n˜ao podem ser aplicados directamente ao caso de um ponto interior. Em rigor, o campo el´ectrico no interior do diel´ectrico ´e uma fun¸c˜ ao com grandes flutua¸c˜ oes, quer no espa¸co, quer no tempo: num dado ponto, pode variar muito de instante para instante e pode tamb´em variar muito de ponto para ponto, n˜ao s´o em grandeza, mas tamb´em em orienta¸c˜ao. Em muitas situa¸c˜oes, o que importa considerar ´e o campo el´ectrico macrosc´ opico, o qual deve ser tomado como um valor m´edio no espa¸co e no tempo do campo local que vamos designar por ε. Sendo ε o valor m´edio no tempo do campo el´ectrico em determinado ponto, ε= 1 ∆t Z ∆t 0 ε dt , o campo el´ectrico macrosc´opico ´e resultado de uma nova m´edia sobre o espa¸co do vector dado pela equa¸c˜ao anterior, isto ´e, Z 1 E= ε dv . v v O volume v dever´a ser suficientemente grande para que as flutua¸c˜ oes estat´ısticas n˜ao tenham um grande significado mas, por outro lado, n˜ao deve ser t˜ao extenso que a polariza¸c˜ ao tenha grandes modifica¸c˜oes, quer dizer, o vector P n˜ao deve variar significativamente nesse volume v. O campo el´ectrico E ser´a, assim, uma grandeza que variar´ a suavemente no espa¸co e no tempo e ser´a mesmo independente do tempo no caso est´atico. S v ' P S ' v " Figura 5.8. Dom´ınio esf´ erico no interior de diel´ ectrico. Vamos calcular o campo el´ectrico no interior do diel´ectrico polarizado do modo que a seguir se descreve. Consideramos no interior do diel´ectrico uma esfera imagin´aria de raio R (arbitrariamente pequeno) centrada no ponto P onde se quer calcular o campo. No interior e sobre a superf´ıcie desta esfera o vector polariza¸c˜ ao ´e constante. A superf´ıcie da esfera divide o material em duas partes: a regi˜ao interior, que ´e o volume v 00 da esfera, e a regi˜ao exterior `a esfera, com volume v 0 . A superf´ıcie da esfera imagin´aria ´e S 0 e a superf´ıcie exterior do diel´ectrico ´e S (ver Figura 5.8). O campo no ponto P ´e o resultado de duas contribui¸c˜ oes: E = E 0 + E 00 . A contribui¸c˜ao E 0 ´e devida ao campo criado pelos dipolos que est˜ao mais 130 • ´tico Campo electromagne afastados, isto ´e, os da regi˜ao v 0 ; quanto a E 00 , resulta da contribui¸c˜ ao dos dipolos do interior da esfera. Sendo σp e σp0 as densidades superficiais de carga na superf´ıcie exterior do diel´ectrico e na superf´ıcie da esfera, e ρp a densidade de carga de polariza¸c˜ ao no volume v 0 , 0 a contribui¸c˜ao E , ou seja, o campo criado por todo o material menos a esfera centrada em P, ´e dada por "Z # I I 0 dS 0 0 σ σ dS 1 ρ dv p p p ˆ+ ˆ+ ˆ . E0 = a a a (5.42) 2 4π²0 v0 a2 a2 S a S0 Come¸camos por calcular o terceiro destes integrais (ou seja, o integral sobre a superf´ıcie esf´erica). Escolhe-se o eixo z com a orienta¸c˜ ao do vector polariza¸c˜ ao, que ´e constante sobre ˆ a superf´ıcie esf´erica, isto ´e, P = P k (ver Figura 5.9). z P P n q ^ R P Figura 5.9. Cavidade esf´ erica no diel´ ectrico indicado na Figura 5.8. A densidade de carga superficial σp0 ´e ˆ = −P cos θ . σp0 = P · n ˆ que aparece nos integrais (5.42), em fun¸c˜ O versor a ao das suas componentes cartesianas, ´e escrito do seguinte modo: ˆ. ˆ =n ˆ = − sin θ cos φ ˆi − sin θ sin φ jˆ − cos θ k a Para o terceiro integral em (5.42) o elemento de ´area ´e dS 0 = R2 sin θdθdφ; as compoR 2π nentes x e y desse integral s˜ a o nulas, pois, no seu c´ a lculo, surgem os integrais 0 cos φ dφ = R 2π ao 0 sin φ dφ = 0. Vem ent˜ Z I S0 π σp0 dS 0 ˆ ˆ a = P k dθ sin θ cos2 θ a2 0 4π ˆ = Pk . 3 Z 2π 0 dφ 0 —´ O campo devido `a distribui¸c˜ao de carga sobre S 0 — designemo-lo por E(3) e, ent˜ ao, dado por P 1 4π ˆ 0 Pk= . E(3) = (5.43) 4π²0 3 3²0 ´ctricos Meios diele • 131 Considerando que o vector polariza¸c˜ ao ´e constante no interior da esfera, o campo E 00 , criado pela distribui¸c˜ao de dipolos existente no volume v 00 , ´e [ver (5.10)] E 00 = − P 3²0 , que cancela exactamente o campo (5.43) devido `a carga de polariza¸c˜ ao em S 0 . Assim, o campo el´ectrico em P ´e apenas o que resulta dos dois primeiros termos de (5.42) 1 E= 4π²0 ·Z v0 ρp dv 0 ˆ+ a a2 ¸ I S σp dS ˆ . a a2 (5.44) Notemos que, ao primeiro destes integrais, podemos sempre juntar uma parcela do tipo 1 E= 4π²0 Z v 00 ρp dv 00 ˆ. a a2 (5.45) De facto, se a polariza¸c˜ao no interior da esfera ´e constante, como anteriormente se considerou, ρp = 0 e o integral (5.45) ´e nulo. Podemos, pois, estender o primeiro integral em (5.44) a todo o volume v do diel´ectrico; o segundo estende-se a toda a superf´ıcie que o limita: E= 1 4π²0 ·Z v ρp dv ˆ+ a a2 I S ¸ σp dS ˆ . a a2 Este campo ´e devido `as cargas de polariza¸c˜ ao (dipolos induzidos). Se a ele se juntar o que tem origem em cargas livres, Elivre , obt´em-se o campo el´ectrico total: Etotal = Elivre + E . 5.9 ´ ´ CAMPO ELECTRICO EM CAVIDADES NUM DIELECTRICO O campo el´ectrico no interior de uma cavidade existente num meio diel´ectrico depende muito da forma da cavidade. Nas situa¸c˜ oes que vamos analisar, consideramos sempre, por uma quest˜ao de simplicidade, que o meio diel´ectrico tem uma polariza¸c˜ ao constante, P . Designamos por E o campo el´ectrico no diel´ectrico e por E0 o campo na cavidade. No primeiro caso, a cavidade tem a forma de um paralelep´ıpedo muito estreito (aresta infinitesimal, d`), com a face maior paralela ao campo el´ectrico (ver Figura 5.10). Como ∇ × E = 0, a circula¸c˜ao do campo el´ectrico ao longo do contorno C, indicado na referida figura, ´e nula. Conclui-se, assim, que o campo no interior desta cavidade estreita tem de ser igual ao campo no diel´ectrico: E0 = E . (5.46) Analisemos agora uma cavidade, ainda com a forma de um paralelep´ıpedo, de altura infinitesimal, dh, e com a face maior perpendicular ao campo el´ectrico (ver Figura 5.11). Neste caso, devido `as cargas de polariza¸c˜ ao sobre as bases, o campo no interior da cavidade vai ser diferente do campo no diel´ectrico. Aplicando a lei de Gauss `a superf´ıcie fechada S indicada em corte na Figura 5.11, vem ˆ · (E − E0 ) = n ˆ σp P ·n =− , ²0 ²0 132 • ´tico Campo electromagne d l E E 0 E 0 C E d l Figura 5.10. Cavidade com a forma de um paralelep´ıpedo num diel´ ectrico polarizado. A face maior ´ e paralela ao campo el´ ectrico. n E ^ E + E d h + + + + 0 + S Figura 5.11. Cavidade com a forma de um paralelep´ıpedo num diel´ ectrico polarizado. A face maior do paralelep´ıpedo ´ e perpendicular ao campo el´ ectrico. de onde resulta E0 = E + P ²0 , (5.47) isto ´e, na cavidade o campo el´ectrico ´e mais intenso do que no diel´ectrico (recorde-se que P e E s˜ao paralelos para diel´ectricos lineares e isotr´opicos). Consideremos finalmente uma cavidade esf´erica. O campo num ponto P no interior de uma cavidade esf´erica pode ser visto como o campo devido a todo o material diel´ectrico menos o campo produzido por uma esfera uniformemente polarizada, com a mesma polariza¸c˜ ao do diel´ectrico, centrada em P e com as dimens˜oes da cavidade. Esta interpreta¸c˜ ao est´a ilustrada na Figura 5.12. O campo criado pela esfera, Eesfera , relaciona-se com a polariza¸c˜ ao P atrav´es da Eq. (5.10). Como se tem E = E0 + Eesfera , podemos concluir que o campo no interior da cavidade esf´erica ´e E0 = E + P 3²0 . (5.48) ´ctricos Meios diele P P = • 133 P Figura 5.12. Esquema para ilustrar o modo de obter o campo el´ ectrico no interior de uma cavidade esf´ erica num diel´ ectrico polarizado. Sublinhe-se que este campo ´e interm´edio relativamente ao que se tem no caso da cavidade paralelepip´edica estreita, consoante a face maior do paralelep´ıpedo seja paralela [ver (5.46)] ou perpendicular [ver (5.47)] ao campo el´ectrico E . 5.10 PERMITIVIDADE RELATIVA DE GASES E L´IQUIDOS ˜ POLARES NAO Como sabemos, a presen¸ca de um campo el´ectrico E induz um momento dipolar em mol´eculas apolares. Afirmou-se na Sec¸c˜ ao 5.1 que o tipo de polariza¸c˜ ao que essas mol´eculas sofrem ´e a chamada polariza¸c˜ ao electr´ onica. No caso dos gases mono-at´omicos (h´elio, por exemplo) e, considerando campos relativamente fracos, o deslocamento da distribui¸c˜ ao electr´ onica, relativamente ao n´ ucleo, ´e pequeno, pelo que o momento dipolar at´omico induzido p tamb´em ´e pequeno. Num grande n´umero de materiais, o momento dipolar ´e proporcional a E, p = α ²0 E , (5.49) sendo α a chamada polarizabilidade, grandeza que mede a facilidade com que um momento dipolar ´e induzido [o factor ²0 em (5.49) ´e inclu´ıdo por raz˜oes hist´oricas]. Na Tabela 5.3 apresentam-se valores para polarizabilidades de i˜oes de halog´eneos, para ´atomos de gases raros e para i˜oes de metais alcalinos. Havendo n mol´eculas por unidade de volume, a polariza¸c˜ ao, P = np, ´e escrita do seguinte modo: P = n α ²0 E . (5.50) A permitividade relativa (ou constante diel´ectrica) do meio, ²r , relaciona-se com o campo el´ectrico e a polariza¸c˜ao atrav´es de [ver (5.20) e (5.22)] ²r − 1 = P . ²0 E (5.51) Combinando as duas u ´ltimas equa¸c˜ oes, resulta ²r − 1 = nα , (5.52) 134 • ´tico Campo electromagne Tabela 5.3. Polarizabilidades de i˜ oes de halog´ eneos, de ´ atomos de gases raros e de i˜ oes de metais alcalinos em unidades de 10−30 m3 . O elemento e os i˜ oes da mesma linha tˆ em a mesma estrutura electr´ onica. Halog´eneos − F Cl− Br− I− α 1,2 3 4,5 7 Gases raros He Ne Ar Kr Xe α Alcalinos α 0,2 0,4 1,6 2,5 4,0 Li+ Na+ K+ Rb+ Cs+ 0,03 0,2 0,9 1,7 2,5 Fonte: Ref. 1 (ver Bibliografia). concluindo-se que a permitividade relativa aumenta com a massa vol´ umica5 . Contudo, se a massa vol´ umica aumentar muito, por exemplo, aumentando muito a press˜ao e diminuindo a temperatura, a express˜ao (5.52) deixa de ser v´alida. De facto, um material denso apolar (como o h´elio l´ıquido ou o ´argon l´ıquido), colocado, por exemplo, entre as armaduras de um condensador, pode adquirir uma polariza¸c˜ ao P muito grande. Nestas condi¸c˜ oes, o campo el´ectrico que actua num ´atomo, campo local, ´e, em boa aproxima¸c˜ ao, determinado pela polariza¸c˜ao dos ´atomos seus vizinhos. J´a se disse que o campo el´ectrico apresenta varia¸c˜ oes enormes `a escala microsc´opica, sendo muito intenso junto ao ´atomo e menos intenso na regi˜ao entre os ´atomos. At´e agora, ignor´amos completamente estas varia¸c˜ oes microsc´opicas, considerando um campo “m´edio”, E , que ´e o campo el´ectrico sentido por um ´atomo “m´edio”, ocupando uma posi¸c˜ao “m´edia”. Num l´ıquido, esta aproxima¸c˜ ao ´e bastante grosseira. De facto, o campo que um ´atomo sente dever´ a assemelhar-se ao que existe numa cavidade esf´erica no meio diel´ectrico quando se aplica um campo externo. Assim, no caso de l´ıquidos apolares, ser´a mais correcto substituir o campo el´ectrico em (5.50) pelo campo numa cavidade esf´erica dado por (5.48). Obt´em-se µ P = n α ²0 E0 = n α ²0 E + P 3²0 ¶ , de onde resulta, para a express˜ao da polariza¸c˜ ao, nα P = ²0 E . 1 − nα/3 Combinando a equa¸c˜ao anterior com (5.51) obt´em-se a rela¸c˜ ao entre a permitividade relativa dos l´ıquidos n˜ao polares e a sua polarizabilidade at´omica α, nα ²r − 1 = , (5.53) 1 − n α/3 que ´e conhecida por lei de Clausius-Mossotti. Se nα for muito pequeno, como no caso dos gases, nα/3 pode ser desprezado no denominador da equa¸c˜ ao anterior, reduzindo-se essa express˜ao a (5.52). 5 Sendo n o n´ umero de part´ıculas por unidade de volume, a sua rela¸ca ˜o com a massa vol´ umica ´e directa. ´ctricos Meios diele • 135 Tabela 5.4. Permitividades relativas de l´ıquidos obtidas a partir das permitividades relativas de gases da mesma substˆ ancia. Por d designam-se as densidades relativas. ´ GAS Substˆancia ²r nα L´IQUIDO dg d` d` /dg nα (exp.) O2 Ar CS2 CCl4 1,000523 1,000545 1,0029 1,0030 0,000523 0,000545 0,0029 0,0030 0,00143 0,00178 0,00339 0,00489 1,19 1,44 1,293 1,59 832 810 381 325 0,435 0,441 1,11 0,977 ²r ²r (teor.) (exp.) 1,509 1,517 2,76 2,45 1,507 1,54 2,64 2,24 Fonte: Ref. 7 (ver Bibliografia). A Eq. (5.53) permite fazer previs˜oes para a permitividade relativa de l´ıquidos partindo das polarizabilidades e das massas vol´ umicas. A partir de ²r do g´as pode ser obtido o valor de nα para o g´as usando (5.52), e, a partir da raz˜ao das massas vol´ umicas de l´ıquido e vapor da mesma substˆancia, obt´em-se nα para a fase l´ıquida. A Eq. (5.53) permite, finalmente, determinar o valor de ²r para o l´ıquido. A Tabela 5.4 mostra dados experimentais relativos a v´arios materiais e a previs˜ao de ²r para cada l´ıquido feita com base na Eq. (5.53). Verifica-se um bom acordo para o ´argon e para o oxig´enio e acordos razo´aveis para o tetracloreto de carbono e para o sulfureto de carbono. 5.11 ´ PERMITIVIDADE RELATIVA DE GASES DE MOLECULAS POLARES Como referimos anteriormente, algumas substˆancias possuem momentos dipolares permanentes. Um exemplo familiar ´e a mol´ecula de ´agua, cujo momento dipolar intr´ınseco vamos designar por p0 . Quando o campo el´ectrico externo ´e nulo, estes dipolos orientam-se de forma aleat´oria e a polariza¸c˜ao total de uma amostra macrosc´opica ´e nula. Quando se aplica um campo externo os dipolos moleculares tendem a orientar-se paralelamente ao campo. Al´em da polariza¸c˜ao que resulta da orienta¸c˜ ao dos dipolos, h´a que ter em conta, se quisermos ser rigorosos, a polariza¸c˜ao electr´onica que foi considerada na sec¸c˜ ao anterior. Vamos supor, contudo, que essa contribui¸c˜ao ´e pequena e que pode ser desprezada (um tal efeito pode sempre ser acrescentado). Quando se aplica um campo externo, se todos os dipolos se orientassem paralelamente a esse campo, a polariza¸c˜ao resultante seria muito grande. O que acontece, na pr´atica, ´e que, devido `a agita¸c˜ao t´ermica, h´a um alinhamento “m´edio” dos dipolos moleculares, mas ´ necess´ario utilizar os m´etodos da F´ısica nem todos ficam a apontar na direc¸c˜ ao de E . E Estat´ıstica para se calcular a polariza¸c˜ ao a uma dada temperatura. Obtivemos no Cap´ıtulo 4 [Eq. (4.48)] a energia de interac¸c˜ ao de um dipolo com um campo externo E , U = −p0 E cos θ , 136 • ´tico Campo electromagne onde θ ´e o ˆangulo que o campo el´ectrico forma com o momento dipolar. Numa situa¸c˜ ao de equil´ıbrio t´ermico o n´ umero de mol´eculas com uma dada energia U ´e proporcional a µ U exp − kT ¶ , onde k ´e a constante de Boltzmann e T a temperatura absoluta. O n´ umero de mol´eculas por unidade de volume e por unidade de ˆangulo s´olido, para um dado ˆangulo polar θ, escreve-se, ent˜ao, n0 (θ) = n0 e−U/kT = n0 ep0 E cos θ/kT , (5.54) ` temperatura ambiente, T ´e grande e o exsendo n0 uma “constante de normaliza¸c˜ ao”. A poente, para campos el´ectricos de interesse pr´atico, torna-se pequeno. Pode fazer-se um desenvolvimento em s´erie da exponencial e tomar para n0 (θ) a express˜ao µ n0 (θ) = n0 1 + p0 E cos θ kT ¶ . (5.55) Esta equa¸c˜ao mostra que n0 (θ) ´e m´aximo quando θ = 0 e m´ınimo para θ = π, o que significa que h´a mais mol´eculas cujos momentos dipolares s˜ao paralelos ao campo externo do que antiparalelos. Integrando a express˜ao (5.55) sobre todo o ˆangulo s´olido [s´o a primeira parcela de (5.55) contribui para o integral], obt´em-se o n´ umero de part´ıculas por unidade de volume, n: Z n0 (θ) dΩ = 4 π n0 = n . A constante de normaliza¸c˜ao em (5.54) ´e, pois, n0 = n . 4π A polariza¸c˜ao m´edia ´e dada pelo somat´orio das componentes segundo E dos momentos dipolares de cada uma das mol´eculas contidas na unidade de volume, p0 cos θi para cada mol´ecula i, ou, ainda, Z P = p0 cos θ n0 (θ) sin θ dθ dφ . Inserindo (5.55) nesta express˜ao e notando que s´o o segundo termo de (5.55) contribui para este integral, obt´em-se p2 E n P = 0 . (5.56) 3kT A polariza¸c˜ao m´edia ´e proporcional ao campo el´ectrico e inversamente proporcional `a temperatura, como seria de esperar: para temperaturas mais altas haver´ a menos alinhamentos dos dipolos com a direc¸c˜ao do campo por causa das colis˜oes. A dependˆencia em 1/T ´e chamada lei de Curie. A permitividade relativa do meio obt´em-se de (5.51) e de (5.56): ²r − 1 = p20 n . 3 ²0 k T (5.57) Note-se a dependˆencia com n da permitividade relativa, semelhante `a das outras situa¸c˜ oes estudadas na sec¸c˜ao anterior. A Figura 5.13 mostra, para o vapor de ´agua, ²r − 1 em fun¸c˜ ao de 1/T dado pela equa¸c˜ ao anterior, bem como alguns valores obtidos experimentalmente, para diferentes temperaturas, ´ctricos Meios diele e r 1 / 1 0 • 137 3 4 3 2 1 0 0 1 2 3 T 1 / 1 0 3 K 1 Figura 5.13. Valores experimentais e previs˜ ao te´ orica [Eq. (5.57)] da permitividade relativa do vapor de ´ agua para v´ arias temperaturas. mantendo n constante. A compara¸c˜ ao dos resultados mostra que existe um bom acordo entre as previs˜oes te´oricas e as medi¸c˜oes experimentais. Refira-se, por u ´ltimo, uma outra caracter´ıstica da permitividade relativa no caso de mol´eculas polares. Devido ao momento de in´ercia das mol´eculas, demora algum tempo a efectuar-se o alinhamento dos momentos dipolares com a direc¸c˜ ao do campo externo. Assim, para um campo oscilante de elevada frequˆencia, a contribui¸c˜ ao da polariza¸c˜ ao intr´ınseca das mol´eculas para ²r desaparece, pois as mol´eculas deixam de conseguir “responder” em tempo u ´til `as varia¸c˜oes do campo. Ao inv´es, mesmo para frequˆencias de oscila¸c˜ ao elevadas, a polariza¸c˜ao electr´onica, estudada na sec¸c˜ ao anterior, perdura, devido `a menor in´ercia dos electr˜oes. 5.12 5.12.1 PROBLEMAS RESOLVIDOS Diamante polarizado Quest˜ ao Uma amostra de diamante tem uma massa vol´ umica 3,5×103 kg/m3 e uma polariza¸c˜ ao 10−7 2 C/m . O ´atomo de carbono tem uma carga nuclear igual a + 6e rodeada por seis electr˜oes e o seu diˆametro ´e da ordem de 10−10 m. Determinar a separa¸c˜ao m´edia entre os centros de carga positiva e negativa. Calcular o momento dipolar m´edio por ´atomo de carbono. Resposta A polariza¸c˜ao, P , ´e o produto do n´ umero de dipolos por unidade de volume, n, pelo momento dipolar de cada dipolo, p, de acordo com (5.2). Por outro lado, sendo Q o valor 138 • ´tico Campo electromagne absoluto de cada uma das cargas que constituem o dipolo e s o vector dirigido da carga negativa para a positiva, podemos escrever P = nQs. (5.58) Para determinar o n´ umero de part´ıculas por unidade de volume, lembremos que em 0,012 kg de carbono h´a um n´ umero de ´atomos igual `a constante de Avogadro, NA , ou seja, 23 6, 022×10 ´atomos. Na amostra de diamante considerada o n´ umero de part´ıculas por unidade de volume ´e 3, 5×103 × 6, 022×1023 n= = 1, 756×1029 m−3 . 0, 012 A partir do valor dado para a polariza¸c˜ ao, do valor encontrado para o n´ umero de part´ıculas por unidade de volume, n, e da carga Q = 6 e = 6 × 1, 602 ×10−19 C, obt´em-se, de (5.58), o seguinte valor para a separa¸c˜ao s: s = 10−7 10−29 1019 = 5, 924×10−19 m = 5, 924×10−4 fm , 1, 756 6×1, 602 valor que ´e muito menor do que a dimens˜ao do ´atomo (o diˆametro do ´atomo ´e da ordem de 10−10 m) e at´e do pr´oprio nucle˜ao (diˆametro da ordem de 1 fm = 10−15 m)! O momento dipolar m´edio de cada ´atomo ´e [cf. (5.2)] p = Pn , pelo que p= 5.12.2 10−7 = 5, 695×10−36 C m . 1, 756×1029 Diel´ ectrico com polariza¸c˜ ao n˜ ao uniforme Quest˜ ao Uma placa de um dado material diel´ectrico tem faces paralelas. Uma das faces est´a no plano z = 0 e a outra no plano z = h. O material tem uma polariza¸c˜ ao n˜ao uniforme ˆ , onde P e α s˜ao constantes. Calcular as densidades de carga ligada P = P (1 + αz) k superficial e volum´etrica. Verificar que a carga ligada total, contida num cilindro de sec¸c˜ ao A cujo eixo ´e paralelo ao eixo z, ´e nula. Resposta A densidade volum´etrica de carga de polariza¸c˜ ao ´e dada por (5.6) e a densidade superfi6 cial de carga de polariza¸c˜ao ´e dada por (5.5) . No caso presente, a normal `a superf´ıcie do ˆ . Para a outra face a normal ´e k ˆ . Tˆem-se, pois, as diel´ectrico, assente no plano z = 0, ´e −k seguintes densidades superficiais: ˆ = −P σ(z = 0) = −P (z = 0) · k ˆ = P (1 + αh) ; σ(z = h) = P (z = h) · k usando a express˜ao da divergˆencia em coordenadas cartesianas, a densidade volum´etrica vem ˆ ] = −P α . ρp = −∇ · [ P (1 + αz) k ˆ nesta equa¸ca Chama-se de novo a aten¸c˜ ao para o facto de o versor n ˜o ser normal ` a superf´ıcie do diel´ectrico e apontar para o lado de fora deste. 6 ´ctricos Meios diele • 139 A carga total contida num cilindro de ´area de base A ´e a soma da carga de polariza¸c˜ ao na base inferior, q1 , da carga de polariza¸c˜ ao na base superior, q2 , e da carga no volume cil´ındrico, q3 . Na superf´ıcie lateral n˜ao pode haver carga de polariza¸c˜ ao, pois o vector P tem a direc¸c˜ ao do eixo z e, por isso, ´e perpendicular ao versor normal `a superf´ıcie lateral do cilindro. As densidades superficiais de carga s˜ao constantes e as cargas nas bases s˜ao q1 + q2 = −A P + A P (1 + αh) = A P α h . (5.59) A carga de polariza¸c˜ao no volume cil´ındrico ´e Z q3 = v ρp dv = −P αA Z h 0 dz = −A P α h . Comparando com (5.59) conclui-se que a carga total de polariza¸c˜ ao, q1 + q2 + q3 , ´e nula. 5.12.3 Condensador plano com diel´ ectrico Quest˜ ao Considere-se um condensador plano, com placas de ´area A separadas por uma pequena distˆancia d. O condensador est´a carregado com uma carga Q uniformemente distribu´ıda e est´a isolado. O espa¸co entre as placas ´e totalmente preenchido por um diel´ectrico linear, isotr´opico e homog´eneo de permitividade relativa ²r . Calcular: a) A intensidade do campo el´ectrico no interior do diel´ectrico; b) As densidades de carga de polariza¸c˜ ao no diel´ectrico; c) A capacidade do condensador; d) A rela¸c˜ao entre a energia do condensador com diel´ectrico e sem diel´ectrico. Resposta A intensidade do vector deslocamento entre as placas do condensador ´e D = σ` , sendo σ` = Q/A a densidade de carga livre na placa do condensador. a) O valor do campo el´ectrico ´e E= D Q = ; ² A ²r ²0 (5.60) b) O vector polariza¸c˜ao relaciona-se com o campo el´ectrico e com o vector deslocamento atrav´es de P = D − ²0 E . Se as placas do condensador forem paralelas ao plano xy e a placa superior tiver carga positiva, tem-se µ ¶ ˆ Q 1 − 1 = −k ˆ ²r − 1 Q . P = −k A ²r ²r A 140 • ´tico Campo electromagne Trata-se de um vector constante e, por isso a densidade de carga de polariza¸c˜ ao no interior do diel´ectrico ´e nula. Sobre as superf´ıcies do diel´ectrico ˆ = ²r − 1 Q σp,1 = −P · k ²r A ² r ˆ =− −1Q, σp,2 = P · k ²r A respectivamente, para as faces inferior e superior do diel´ectrico, reconhecendo-se, de imediato, que a carga total de polariza¸c˜ ao ´e nula; c) A capacidade de um condensador ´e definida por C= Q , V onde V ´e a diferen¸ca de potencial entre as placas. Como a diferen¸ca de potencial ´e a circula¸c˜ao do campo el´ectrico, tem-se, usando (5.60), V =Ed= Qd . A ²r ²0 A capacidade vem C = ²r ²0 A . d (5.61) A introdu¸c˜ao do diel´ectrico faz aumentar a capacidade de um factor ²r (cf. Exemplo 5.1); d) A energia do condensador ´e U= 1 1 Q2 QV = . 2 2 C (5.62) Como a capacidade ´e alterada pela introdu¸c˜ ao do diel´ectrico, de acordo com (5.61), tamb´em a energia armazenada no condensador com diel´ectrico, U , vai ser diferente da energia do condensador sem diel´ectrico, U0 . Usando (5.61) e (5.62), essa rela¸c˜ ao ´e U= 5.12.4 1 U0 . ²r (5.63) Condensadores — I Quest˜ ao Dois condensadores de igual capacidade C est˜ ao ligados em paralelo. S˜ao primeiro carregados at´e ficarem ao potencial V e depois desligados da fonte e isolados. Introduz-se ent˜ ao um diel´ectrico de permitividade relativa ²r num dos condensadores, preenchendo completamente o espa¸co entre as placas. Calcular a carga livre que flui de um condensador para o outro e a nova diferen¸ca de potencial entre as placas dos condensadores. ´ctricos Meios diele • 141 Resposta Quando os condensadores est˜ao ao potencial V a carga em cada um deles ´e Q=CV . As capacidades dos condensadores depois da introdu¸c˜ ao do diel´ectrico, e de acordo com (5.61), passa a ser C10 = ²r C e C20 = C . (5.64) Mesmo depois de desligados da fonte de alimenta¸c˜ ao e de se ter introduzido o diel´ectrico, os condensadores continuam ao mesmo potencial, pois est˜ao em paralelo. Designando por V 0 o novo potencial, tem-se Q0 Q0 V 0 = 10 = 20 , C1 C2 donde, usando (5.64), Q01 = ²r Q02 . (5.65) Por outro lado, a carga total tem de se conservar: Q01 + Q02 = 2Q = 2 C V . (5.66) Resolvendo o sistema de equa¸c˜oes (5.65) e (5.66), obt´em-se  2²r 0    Q1 = 1 + ²r C V   2  Q0 = 2 1 + ²r C V . A carga que flui de um condensador para o outro ´e Q01 − Q = ²r − 1 CV ²r + 1 e o novo potencial ´e V0 = 5.12.5 2 V. 1 + ²r Condensadores — II Quest˜ ao Uma lˆamina de um material diel´ectrico ´e inserida entre as placas de um condensador plano. A espessura do diel´ectrico ´e metade da distˆancia de separa¸c˜ ao entre as placas. Sendo ²r a permitividade relativa da lˆamina diel´ectrica, calcular a rela¸c˜ ao entre as capacidades do condensador antes e depois de se introduzir a lˆamina. 142 • ´tico Campo electromagne Resposta A capacidade do condensador sem lˆamina ´e C = ²0 A , d (5.67) onde A ´e a ´area de cada placa do condensador. Depois de se introduzir a lˆamina o sistema pode ser visto, para efeito deste c´alculo, como uma associa¸c˜ ao de dois condensadores em s´erie, cada um com distˆancia “entre placas” igual a d/2, e portanto de capacidades C 1 = ²0 2A , d C2 = ²0 ²r 2A . d Da associa¸c˜ao em s´erie de condensadores com estas capacidades resulta uma capacidade equivalente: C1 C2 2²r C0 = = C. C1 + C2 1 + ²r 5.12.6 Condensadores — III Quest˜ ao Considerar um condensador plano com dois diel´ectricos de permitividades relativas ²r1 e ²r2 , cada um ocupando metade do volume entre as armaduras, como se mostra na Figura 5.14. Obter a capacidade deste condensador. Figura 5.14. Condensador plano com dois diel´ ectricos. Resposta O sistema representado na Figura 5.14 ´e equivalente a uma associa¸c˜ ao de dois condensadores em paralelo, de capacidades C1 e C2 , cada um com o seu diel´ectrico. A capacidade do condensador sem diel´ectricos ´e [cf. (5.67)] C = ²0 Ad , e as capacidades C1 e C2 s˜ao dadas por A A C1 = ²r1 ²0 e C2 = ²r2 ²0 . 2d 2d A capacidade equivalente ´e simplesmente a soma destas duas capacidades: C 0 = C1 + C2 = ²r1 + ²r2 C. 2 ´ctricos Meios diele 5.12.7 • 143 Esfera diel´ ectrica com carga livre no centro Quest˜ ao Uma esfera diel´ectrica da classe A, com raio R e permitividade relativa ²r , tem uma carga pontual, Q, no seu centro. Calcular o vector campo el´ectrico em todo o espa¸co. Calcular a carga total de polariza¸c˜ ao. Resposta O campo el´ectrico no interior e no exterior do diel´ectrico ´e (cf. Exemplo 5.3)  Q  rˆ E=    4π²0 ²r r2 para r < R     E= para r > R . Q r ˆ 4π²0 r2 A fim de calcularmos a carga de polariza¸c˜ ao vamos primeiro determinar o vector polariza¸c˜ao, que se relaciona com o campo el´ectrico segundo (5.20). Tem-se:  ²r − 1 Q r   ˆ  P = ²r 4πr2 para r < R    P =0 para r > R . A densidade volum´etrica de cargas resulta do c´alculo da divergˆencia do vector polariza¸c˜ ao. Usando coordenadas esf´ericas, obt´em-se µ 1 ²r − 1 d Q ρp = −∇ · P = − 2 r2 r ²r dr 4πr2 ¶ =0 no interior da esfera; no exterior, ρp = 0, pois P = 0. Na superf´ıcie da esfera a densidade de carga de polariza¸c˜ao ´e ² −1 Q ˆ · P (R) = r σp = r (5.68) ²r 4πR2 e a carga total de polariza¸c˜ao na superf´ıcie da esfera ´e obtida multiplicando (5.68) por 4πR2 , ou seja, ²r − 1 . (5.69) Qp = Q ²r Como a carga total de polariza¸c˜ ao ´e nula, ter´a de existir uma carga de polariza¸c˜ ao em r = 0 com valor sim´etrico de (5.69). Para tornarmos este ponto mais claro consideremos uma superf´ıcie esf´erica de raio dr, arbitrariamente pequeno, em torno da carga livre Q. O versor ˆ e a densidade superficial normal a esta superf´ıcie que aponta para fora do diel´ectrico ´e −r de carga de polariza¸c˜ao ´e µ 0 ˆ·r ˆ σp = −r ²r − 1 Q ²r 4π(dr)2 ¶ =− ²r − 1 Q . ²r 4π(dr)2 Multiplicando este valor pela ´area da superf´ıcie interior, 4π(dr)2 , obt´em-se Q0p = −Qp . 144 • ´tico Campo electromagne 5.12.8 Polariza¸c˜ ao com simetria cil´ındrica Quest˜ ao Considerar a seguinte distribui¸c˜ao de densidade de momento dipolar em coordenadas cil´ındricas: µ ¶  2 b b r  ˆ  para r ≤ a e − < z <  P = P0 1 − 2 k 2 2 a    P = 0 no resto do espa¸co (note-se que r ´e a distˆancia ao eixo z). a) Calcular a correspondente distribui¸c˜ ao de carga de polariza¸c˜ ao; b) Calcular ∇ × P , mostrando que o m´odulo desse vector ´e apenas fun¸c˜ ao de r e que, em cada ponto, esse vector ´e perpendicular ao plano que cont´em o ponto considerado e o eixo z. Obter as linhas de campo de ∇ × P . Resposta A polariza¸c˜ao no interior do cilindro pode ser escrita, em fun¸c˜ ao das coordenadas cartesianas, do seguinte modo: à ! x2 + y 2 ˆ P = P0 1 − (5.70) k. a2 a) Utilizando a express˜ao (5.6) para determinar a densidade volum´etrica de carga de polariza¸c˜ao, conclui-se que esta ´e nula. De facto, a Eq. (5.70) mostra que a polariza¸c˜ao s´o tem componente z, a qual depende apenas das vari´ aveis x e y. As distribui¸c˜oes superficiais de carga s˜ao dadas por (5.5). Na base superior do cilindro, ˆ , pelo que ˆ =k n à ! r2 σp = P0 1 − 2 . a Sobre a base inferior, à 0 σp = −P0 r2 1− 2 a ! = −σp . Na superf´ıcie lateral do cilindro a densidade superficial de carga de polariza¸c˜ ao ´e nula, pois P e a normal a essa superf´ıcie s˜ao sempre ortogonais; b) O rotacional do vector polariza¸c˜ ao pode ser obtido em coordenadas cartesianas: ¯ ¯ ¯ ∇ × P = ¯¯ ¯ ¯ ˆi jˆ ∂ ∂x ∂ ∂y 0 0 ˆ φ = − yr ˆi + Em fun¸c˜ao do versor e x r ¯ ˆ ¯¯ k 2P0 ¯ i − x jˆ ) . ¯ = − 2 (yˆ ¯ a Pz ¯ ∂ ∂z (5.71) jˆ , a express˜ao (5.71) ´e escrita do seguinte modo: ∇×P = 2P0 r ˆφ ; e a2 o m´odulo deste vector ´e apenas fun¸c˜ ao de r. ´ctricos Meios diele • 145 z P y x Figura 5.15. Linhas de campo do rotacional de P . Pode mostrar-se que, em cada ponto, o vector (5.71) ´e perpendicular ao plano que cont´em esse ponto e o eixo z. De facto, notemos que a direc¸c˜ ao normal a esse plano ´e ˆ × ( x ˆi + y jˆ + z k ˆ ) = x jˆ − y ˆi que ´e a direc¸c˜ a do vector k ao de (5.71). As linhas do campo ∇ × P s˜ao circunferˆencias assentes em planos paralelos ao plano xy, como se indica na Figura 5.15. 5.12.9 Condensador esf´ erico com diel´ ectrico de permitividade vari´ avel Quest˜ ao No espa¸co compreendido entre duas superf´ıcies met´alicas esf´ericas e concˆentricas encontrase um diel´ectrico com permitividade relativa ²r = r/a. As superf´ıcies interior e exterior do diel´ectrico tˆem raios a e b, respectivamente (Figura 5.16). Existe uma carga livre Q na superf´ıcie met´alica interior e a armadura exterior est´a ligada `a terra. Calcular: a) O vector deslocamento D em todo o espa¸co; b) A densidade de carga livre em r = a e r = b; c) A densidade de carga de polariza¸c˜ ao no diel´ectrico; d) A carga total de polariza¸c˜ ao no diel´ectrico. Resposta a) No interior da superf´ıcie met´alica interna n˜ao h´a cargas livres e a carga total livre contida numa esfera de raio r > b tamb´em ´e nula. O vector deslocamento ´e, pois, nulo para r < a e para r > b. Considerando uma superf´ıcie de Gauss esf´erica, de raio r, na regi˜ao entre as duas superf´ıcies met´alicas obt´em-se o vector deslocamento, que ´e dado por Q D= rˆ a < r < b; 4πr2 146 • ´tico Campo electromagne b a Figura 5.16. Condensador esf´ erico com diel´ ectrico. b) A densidade superficial de carga livre em r = a e em r = b ´e dada pela divergˆencia superficial do vector D [cf. (5.15)]: ˆ · (D2 − D1 ) . divS D = σ` = n Para r = a vem µ ¶ Q Q ˆ· 0− σ` = −r rˆ = ; 2 4πa 4πa2 para r = b, de forma an´aloga se obt´em σ0` = − Q ; 4πb2 c) O campo el´ectrico ´e nulo para r < a e para r > b. Na regi˜ao a < r < b ´e dado por E= 1 Q Qa D= rˆ = rˆ . 2 ²r ²0 4π²0 ²r r 4π²0 r3 De (5.20) e de (5.22), e atendendo a que ²r − 1 = r/a − 1, vem µ P = ²0 ¶ r Qa Q (r − a) −1 rˆ = rˆ . 3 a 4π²0 r 4πr3 (5.72) A densidade de carga de polariza¸c˜ ao no interior do diel´ectrico ´e dada por: · ¸ Q 1 d r−a ρp = −∇ · P = − r2 3 , 2 4π r dr r que conduz a ρp = − Qa . 4πr4 (5.73) A densidade superficial de carga de polariza¸c˜ ao em r = a ´e nula, pois o vector de polariza¸c˜ao ´e nulo [ver (5.72)]. Em r = b, ˆ = σp0 = P · n Q (b − a) Q (b − a) rˆ · rˆ = ; 3 4πb 4πb3 (5.74) ´ctricos Meios diele • 147 d) A carga de polariza¸c˜ao em r = b ´e simplesmente o produto de (5.74) pela ´area da superf´ıcie esf´erica: Q (b − a) Qp(s) = . (5.75) b Vamos confirmar que a carga de polariza¸c˜ ao distribu´ıda no volume, Q(v) e sim´etrica p , ´ desta. Integrando (5.73), obt´em-se Q(v) = −4π p Z b Qa a 4πr r2 dr = −Qa 4 µ Z b 1 a r dr = Qa 2 ¯ 1 ¯¯b Q (a − b) = , r ¯a b que ´e, de facto, sim´etrica de (5.75). 5.12.10 Diel´ ectrico n˜ ao homog´ eneo Quest˜ ao Mostrar que, num diel´ectrico linear e isotr´opico mas n˜ao homog´eneo, se n˜ao houver qualquer carga livre, ρ` = 0, a densidade de carga de polariza¸c˜ ao ´e dada por ρp = −(²0 /²r )E ·∇²r . Resposta A densidade de carga livre ´e a divergˆencia do vector deslocamento ∇ · D = ρ` ; (5.76) este vector relaciona-se com o campo el´ectrico atrav´es de D = ²0 ²r E (5.77) e o vector polariza¸c˜ao relaciona-se com o campo el´ectrico atrav´es de P = ²0 (²r − 1) E . (5.78) Usando (5.78) em (5.77) e introduzindo a express˜ao resultante para D na express˜ao (5.76), obt´em-se ¶ µ ²r ∇· P = ρ` . (5.79) ²r − 1 Recordando que (ver Apˆendice B) ∇ · (f A) = f ∇ · A + A · ∇f e que, por hip´otese, ρ` = 0, a Eq. (5.79) passa a ser escrita do seguinte modo: µ ²r ²r ∇·P +P ·∇ ²r − 1 ²r − 1 Usando (5.6), − ¶ = 0. ²r P ρp − · ∇²r = 0 , ²r − 1 (²r − 1)2 donde P · ∇²r . ²r − 1 Finalmente, exprimindo P em termos de E [ver (5.78)], conclui-se que ²r ρp = − ρp = − ²0 E · ∇²r . ²r (5.80) 148 • ´tico Campo electromagne 5.12.11 Condensador esf´ erico com dois diel´ ectricos Quest˜ ao O espa¸co entre as duas armaduras de um condensador esf´erico ´e exactamente preenchido por dois diel´ectricos homog´eneos, lineares e isotr´opicos de permitividades ²1 e ²2 . Cada diel´ectrico ocupa metade do volume total entre as armaduras, como se mostra na Figura 5.17. Sobre a armadura interior est´a distribu´ıda a carga Q e os raios das armaduras interna e externa s˜ao a e b, respectivamente. A armadura exterior est´a ligada `a terra. a) Determinar os campos E e D em todo o espa¸co; b) Calcular as densidades de carga de polariza¸c˜ ao; c) Determinar a energia armazenada no condensador. b e 1 a e 2 Figura 5.17. Condensador esf´ erico com dois diel´ ectricos. Resposta O sistema descrito est´a representado na Figura 5.17. a) Devido `a presen¸ca dos diel´ectricos, a distribui¸c˜ ao de cargas livres n˜ao vai ser uniforme sobre a superf´ıcie das esferas. Cada uma das armaduras pode ser dividida em dois hemisf´erios que est˜ao em contacto com o diel´ectrico 1 e com o diel´ectrico 2, respectivamente. Consideremos apenas uma das armaduras, por exemplo, a interior. A densidade de carga livre no hemisf´erio em contacto com o diel´ectrico 1 ´e diferente da densidade de carga livre no hemisf´erio em contacto com o diel´ectrico 2. De facto, a distribui¸c˜ ao de cargas que confere ao sistema estabilidade m´axima (energia m´ınima) ´e aquela em que a densidade de carga total est´a uniformemente distribu´ıda sobre a superf´ıcie esf´erica r = a. Assim, e porque os diel´ectricos polarizam de formas diferentes, quando se carrega o condensador, as cargas livres distribuem-se at´e que na superf´ıcie r = a haja uma distribui¸c˜ao uniforme de carga total. Designemos por Q0 a carga total distribu´ıda em r = a. No interior dos diel´ectricos n˜ao h´a cargas livres, pelo que as densidades de carga de polariza¸c˜ao s˜ao nulas [ver Problema 5.12.10, designadamente a express˜ao (5.80)]. Para obter o campo el´ectrico para a < r < b podemos aplicar a lei de Gauss ´ctricos Meios diele • 149 usando como superf´ıcie de Gauss uma superf´ıcie esf´erica concˆentrica com as armaduras, obtendo-se Q0 E= rˆ a < r < b. 4π²0 r2 O vector deslocamento nas regi˜oes ocupadas por cada um dos diel´ectricos ´e ²1 Q0 rˆ 4π²0 r2 ²2 Q0 = ²2 E2 = rˆ . 4π²0 r2 D1 = ²1 E1 = (5.81) D2 (5.82) Falta calcular o valor de Q0 , que ´e a soma da carga livre e da carga de polariza¸c˜ ao (tem-se, evidentemente, Q0 < Q). A densidade superficial de carga livre no hemisf´erio 1 ´e obtida a partir da divergˆencia superficial de D1 : ˆ · (D1+ − D1− ) = σ`,1 , divS D1 = r ˆ e o sinal − ao onde o sinal + em ´ındice se refere ao lado para onde aponta o versor r outro lado. Usando (5.81) e atendendo a que o campo ´e nulo no interior da armadura, D1− = 0, vem ²1 Q0 σ`,1 = . 4π²0 a2 A densidade de carga superficial livre no outro hemisf´erio ´e dada por uma express˜ao an´aloga: ²2 Q0 σ`,2 = . 4π²0 a2 Multiplicando cada uma destas express˜oes pela ´area de cada hemisf´erio, 2πa2 , e somando obt´em-se a carga livre Q: Q= ²1 + ²2 0 Q , 2²0 Q0 = 2 ²0 Q, ²1 + ²2 ou seja, verificando-se que, de facto, Q0 < Q. Introduzindo o resultado anterior nas express˜oes dos campos, obt´em-se, para a < r < b: E= Q rˆ 2π(²1 + ²2 ) r2 (5.83) e D1 = D2 = ²1 Q rˆ 2π(²1 + ²2 ) r2 ²2 Q rˆ . 2π(²1 + ²2 ) r2 (5.84) (5.85) Para r > b o campo el´ectrico ´e nulo, pois na esfera exterior h´a uma distribui¸c˜ ao uniforme da carga total −Q0 ; assim, tamb´em o vector deslocamento se anula, nesta regi˜ao; 150 • ´tico Campo electromagne b) O vector polariza¸c˜ao, que se relaciona com E atrav´es da express˜ao P = (² − ²0 )E , ´e dado, em cada uma das regi˜oes, por ²1 − ²0 Q rˆ ²1 + ²2 2πr2 ²2 − ²0 Q rˆ . ²1 + ²2 2πr2 P1 = P2 = Pode agora confirmar-se que a densidade de carga de polariza¸c˜ ao no interior dos diel´ectricos ´e nula [resultado que j´a se utilizou na al´ınea a)]. Usando coordenadas esf´ericas, tem-se, para o diel´ectrico 1, Q(²1 − ²0 ) 1 d ρ1 = −∇ · P1 = − 2π(²1 + ²2 ) r2 dr µ 1 r 2 r ¶ 2 =0 e o mesmo se passa para o diel´ectrico 2. A densidade superficial de carga de polariza¸c˜ ao em r = a ´e, para o diel´ectrico 1, ˆ · P1 = − σ1 (r = a) = −r e para o diel´ectrico 2, σ2 (r = a) = − ²1 − ²0 Q , ²1 + ²2 2πa2 ²2 − ²0 Q . ²1 + ²2 2πa2 Para a superf´ıcie r = b vem σ1 (r = b) = σ2 (r = b) = ²1 − ²0 Q ²1 + ²2 2πb2 ²2 − ²0 Q . ²1 + ²2 2πb2 Sobre a superf´ıcie de separa¸c˜ao dos dois diel´ectricos (que ´e uma coroa circular) n˜ao h´a cargas de polariza¸c˜ao, pois a normal a essa superf´ıcie ´e perpendicular ao vector polariza¸c˜ao num e noutro meio. Por outras palavras, a divergˆencia superficial do vector polariza¸c˜ao ´e nula nesta superf´ıcie; c) A energia armazenada no condensador pode ser obtida a partir da express˜ao (5.33). O integral, que se estende ao volume entre as armaduras do condensador, ´e uma soma de dois termos: um para a regi˜ao ocupada pelo diel´ectrico 1 e outro para a regi˜ao ocupada pelo diel´ectrico 2. Fazendo uso das express˜oes (5.83) a (5.85), vem 1 Q2 Ue = 2π 2 2 4π (²1 + ²2 )2 e, finalmente, Ue = à ²1 Z b 1 a r2 dr + ²2 Q2 (b − a) . 4 π a b (²1 + ²2 ) Z b 1 a r2 ! dr , (5.86) Como a energia de um condensador ´e dada por Ue = Q2 /(2C), podemos obter de (5.86) uma express˜ao para a capacidade do condensador esf´erico considerado: C= 2 π a b (²1 + ²2 ) . b−a ´ctricos Meios diele 5.12.12 • 151 Condensador plano com diel´ ectrico de permitividade vari´ avel — I Quest˜ ao O espa¸co entre as placas de um condensador plano ´e preenchido com um material diel´ectrico cuja permitividade absoluta varia linearmente desde ²1 numa placa at´e ²2 < ²1 na outra. As placas — dois discos circulares de ´area A — est˜ao carregadas com as cargas Q e −Q, respectivamente, e encontram-se a uma pequena distˆancia d uma da outra. a) Calcular a capacidade do condensador assim constitu´ıdo; b) Obter as distribui¸c˜oes de carga induzidas no diel´ectrico; c) Verificar que a carga total de polariza¸c˜ ao ´e nula. Resposta Considere-se que uma placa do condensador (a que tem carga positiva) est´a em x = 0 e a outra em x = d. O campo deslocamento ´e dado por D = σ ˆi = Qˆ i. A A permitividade absoluta ´e ²2 − ²1 x d e, portanto, o campo el´ectrico, considerando o diel´ectrico linear e isotr´opico, vem ²(x) = ²1 + D E= ²(x) = (5.87) Q d ˆi . A ²1 d + (²2 − ²1 ) x a) A diferen¸ca de potencial ´e a circula¸c˜ ao do campo el´ectrico, ou seja, V = = Z d 0 E dx = Qd A Z d µ 0 Qd ²2 ln A(²2 − ²1 ) ²1 dx Qd 1 = [ ln |²1 d + (²2 − ²1 ) x | |d0 ²1 d + (²2 − ²1 ) x A ²2 − ²1 ¶ . A capacidade do condensador, que ´e dada por C = Q/V , vem ent˜ ao · C= µ A ²2 (²2 − ²1 ) ln d ²1 ¶¸−1 ; b) Determinemos agora o vector polariza¸c˜ ao. Tem-se Q ˆ Q P = (² − ²0 )E = (² − ²0 ) i= A² A µ ²0 1− ² ou, inserindo a express˜ao (5.87) de ², · ¸ Q d ²0 ˆi . P = 1− A ²1 d + (²2 − ²1 ) x ¶ ˆi , 152 • ´tico Campo electromagne A densidade de carga de polariza¸c˜ ao ´e ρp = −∇ · P = − Q d ²0 (²2 − ²1 ) . A [ ²1 d + (²2 − ²1 ) x ]2 (5.88) As densidades de carga superficial s˜ao i) sobre x = 0, Q ²1 − ²0 σp = −ˆi · P (0) = − ; A ²1 ii) sobre x = d, σp = ˆi · P (d) = (5.89) Q ²2 − ²0 ; A ²2 (5.90) c) Calculemos em primeiro lugar a carga de polariza¸c˜ ao sobre as superf´ıcies do diel´ectrico, para o que basta multiplicar as densidades (5.89) e (5.90) pela ´area A. A carga total de polariza¸c˜ao sobre as superf´ıcies do diel´ectrico ´e dada por µ ²0 ²0 −1+ = Q 1− ²2 ²1 ²2 − ²1 = Q ²0 . ²1 ²2 (s) Qp ¶ (5.91) A carga de polariza¸c˜ao no volume ´e o integral de (5.88) estendido ao volume do diel´ectrico: Q(v) = −Q d ²0 (²2 − ²1 ) p · Z d 0 dx [²1 d + (²2 − ²1 ) x]2 ¯ · ¯d 1 ¯ = Q²0 1 − 1 = Q d ²0 [²1 d + (²2 − ²1 ) x] ¯0 ²2 ²1 ²1 − ²2 = Q ²0 , ²1 ²2 ¸ que ´e o sim´etrico de (5.91). Est´a pois provado, como se pretendia, que a carga total de polariza¸c˜ao, Q(s) + Q(v) e nula. p p , ´ 5.12.13 Condensador plano com diel´ ectrico de permitividade vari´ avel — II Quest˜ ao Um condensador plano com placas condutoras em x = 0 e x = d est´a preenchido com material diel´ectrico cuja permitividade relativa varia de acordo com a express˜ao ²r = 2d / (x+ d). Aplica-se uma d.d.p. V0 entre as suas placas. Considerando desprez´aveis os efeitos dos bordos, calcular: a) Os campos E , D e P entre as placas e representar graficamente esses campos; b) As distribui¸c˜oes de carga livre e de polariza¸c˜ ao; c) A capacidade do condensador. ´ctricos Meios diele • 153 Resposta O problema ´e semelhante a 5.12.12, mas agora ´e dada a permitividade relativa (e n˜ao a absoluta, como anteriormente). Considere-se que uma placa do condensador (a que tem carga positiva) est´a em x = 0 e a outra em x = d. O campo deslocamento ´e dado por D = σ ˆi = Qˆ i, A (5.92) sendo Q a carga do condensador quando lhe ´e aplicada uma d.d.p. V0 . A permitividade relativa ´e dada por 2d , ²r (x) = x+d e, portanto, o campo el´ectrico ´e E= D ²0 ²r (x) = Q(x + d) ˆ i. 2dA²0 (5.93) a) A diferen¸ca de potencial, V0 , ´e a circula¸c˜ ao do campo el´ectrico, ou seja, V0 = Z d 0 E dx = Q 2dA²0 Z d 0 (x + d) dx = 3Qd , 4A²0 donde se obt´em a carga em fun¸c˜ ao do potencial: 4 A V0 ²0 . 3d Q= (5.94) Substituindo este resultado em (5.92) e em (5.93) obtˆem-se as seguintes express˜oes para o vector deslocamento e para o campo el´ectrico: D= e E= 4V0 ²0 ˆ i 3d 2V0 (x + d) ˆ i. 3d2 O vector polariza¸c˜ao vem µ P = (²r − 1) ²0 E = = ¶ 2V0 (x + d) ˆ 2d − 1 ²0 i x+d 3d2 2²0 V0 (d − x) ˆ i. 3d2 A representa¸c˜ao gr´afica das grandezas dos vectores deslocamento, campo el´ectrico e polariza¸c˜ao ´e dada na Figura 5.18; b) A densidade volum´etrica de carga de polariza¸c˜ ao ´e ρp = −∇ · P = 2²0 V0 . 3d2 Para as densidades superficiais de cargas de polariza¸c˜ ao obt´em-se (5.95) 154 • ´tico Campo electromagne D , e 0 E , P 4 V 0e 0/3 d D e 0 E P d x Figura 5.18. Campo el´ ectrico, campo deslocamento e polariza¸ c˜ ao em fun¸ c˜ ao da distˆ ancia x. i) sobre x = 0, ii) sobre x = d, 2²0 V0 ; σp = −ˆi · P (0) = − 3d (5.96) σp = ˆi · P (d) = 0 . Calculemos em primeiro lugar a carga de polariza¸c˜ ao sobre as superf´ıcies do diel´ectrico, para o que basta multiplicar a densidade (5.96) pela ´area A. A carga total superficial de polariza¸c˜ao no diel´ectrico ´e Qp(s) = − 2A²0 V0 . 3d (5.97) Como a densidade de carga de polariza¸c˜ ao (5.95) ´e constante, a carga de polariza¸c˜ ao no volume ´e 2A²0 V0 Q(v) = , p 3d que ´e sim´etrica de (5.97). Quanto `as cargas livres, s´o se encontram nas placas do condensador, tendo-se, em x = 0 [ver (5.94)], Q 4V0 ²0 σ= = , A 3d e o sim´etrico em x = d; c) A capacidade do condensador, que ´e dada por C = Q/V , vem ent˜ ao C = ²0 5.12.14 4A . 3d Esfera polarizada radialmente Quest˜ ao ˆ , sendo α e n constantes e Uma esfera de raio a tem uma polariza¸c˜ ao radial P = α rn r n ≥ 0. Calcular as densidades superficial e volum´etrica de carga de polariza¸c˜ ao. Determinar E dentro e fora da esfera. Determinar tamb´em o potencial V dentro e fora da esfera. ´ctricos Meios diele • 155 Resposta A densidade volum´etrica de carga de polariza¸c˜ ao obt´em-se a partir da divergˆencia do vector polariza¸c˜ao (conv´em calcular a divergˆencia em coordenadas esf´ericas): ρp = −∇ · P = − α d n+2 r = −α (n + 2) rn−1 . r2 dr Sobre a superf´ıcie da esfera a densidade de carga de polariza¸c˜ ao ´e ˆ = α an r ˆ·r ˆ = α an . σp = P · n (5.98) ` semelhan¸ca do que se fez em problemas anteriores, podemos mostrar explicitamente que a A carga total de polariza¸c˜ao ´e nula. A carga existente no volume ´e Q(v) = −α (n + 2) 4π p Z a 0 rn+1 dr = −4 π α an+2 . (5.99) Na superf´ıcie a carga ´e [ver (5.98)] Q(s) = 4 π α an+2 , p que ´e, de facto, o sim´etrico de (5.99). O campo el´ectrico s´o pode depender da coordenada radial e aponta na direc¸c˜ ao radial: ˆ E = E(r)r . No exterior da esfera o campo ´e nulo, como se pode concluir aplicando a lei de Gauss e usando o facto de a carga total na esfera ser nula. O campo el´ectrico no interior da esfera calcula-se tamb´em utilizando a lei de Gauss. Atrav´es de uma superf´ıcie de raio r, o fluxo do campo el´ectrico ´e 4πr2 E e a carga total no interior dessa superf´ıcie esf´erica ´e 0 Q = 4π Z r 0 Da lei de Gauss ρp (r)r2 dr = −4 π α rn+2 . I S E · dS = Q0 ²0 resulta 1 αrn P n+2 ˆ 4 π α r r = − rˆ = − . (5.100) 2 4πr ²0 ²0 ²0 Para r > a o campo el´ectrico ´e nulo e, portanto, o potencial ´e constante. Como o potencial ´e nulo em pontos muito afastados da esfera (r → ∞), conclui-se que o potencial ´e nulo no exterior da esfera. O potencial dentro da esfera ´e igual `a diferen¸ca de potencial entre um ponto do interior da esfera e um ponto da superf´ıcie, que est´a ao potencial nulo. Calculando a circula¸c˜ao do campo el´ectrico (5.100) ao longo de uma traject´oria radial, obt´em-se: E=− V = 5.12.15 Z a r E dr = − α ²0 Z a r rn dr = α (rn+1 − an+1 ) . ²0 (n + 1) Diel´ ectrico em equil´ıbrio Quest˜ ao Um condensador cil´ındrico de comprimento ` formado por dois condutores coaxiais de raios a e b (ver Figura 5.19) est´a carregado com a carga Q (a, b ¿ `). ´ introduzido no condensador um diel´ectrico, de permitividade relativa ²r , que preenche E completamente o espa¸co entre os cilindros condutores. Sabendo que o diel´ectrico tem a massa m, calcular o comprimento z0 indicado na figura na posi¸c˜ ao em que o diel´ectrico fica em equil´ıbrio no campo grav´ıtico. 156 • ´tico Campo electromagne b a l z 0 Figura 5.19. Condensador cil´ındrico com diel´ ectrico em equil´ıbrio est´ atico. Resposta Se n˜ao existir diel´ectrico, o campo el´ectrico entre as armaduras do condensador cil´ındrico ´e E= Q 2πr²0 ` e o potencial entre as armaduras, V , ´e simplesmente a circula¸c˜ ao deste campo entre r = a e r = b. A capacidade do condensador cil´ındrico sem diel´ectrico ´e Q/V , obtendo-se C0 = 2π²0 ` . ln(b/a) Quando existe diel´ectrico, a express˜ao da capacidade ´e semelhante `a anterior, bastando substituir ²0 por ² = ²r ²0 . ` medida que o diel´ectrico vai preenchendo o espa¸co entre as armaduras, o sistema pode A ser considerado uma associa¸c˜ao de dois condensadores em paralelo. A capacidade do conjunto ´e, pois, 2π²0 (` − z) 2π²0 ²r z 2π²0 C= + = [ ` + z(²r − 1) ] . ln(b/a) ln(b/a) ln(b/a) A energia do sistema ´e U= Q2 ln(b/a) 1 1 Q2 = . 2 C 4π²0 ` + z (²r − 1) ´ctricos Meios diele • 157 O trabalho da for¸ca el´ectrica sobre o diel´ectrico quando este sofre um deslocamento infinitesimal dz ´e δW = F dz, sendo tal trabalho o sim´etrico da varia¸c˜ ao infinitesimal da energia do sistema, dU , decorrente do deslocamento infinitesimal do diel´ectrico. Podemos, pois, escrever F =− dU Q2 ln(b/a) ²r − 1 = . dz 4π²0 [` + z(²r − 1)]2 (5.101) A condi¸c˜ao de equil´ıbrio est´atico ´e F + Fg = 0, pelo que a for¸ca el´ectrica (5.101) ´e, em m´odulo, igual `a for¸ca grav´ıtica, mg, exercida no diel´ectrico. Da igualdade Q2 ln(b/a) ²r − 1 = mg 4π²0 [` + z0 (²r − 1)]2 tira-se a express˜ao de z0 : s 1  z0 = ²r − 1  Q2 (²r − 1) ln(b/a) − ` . 4 π m g ²0 158 • ´tico Campo electromagne CAP´ITULO 6 ˜ DA EQUAC ˜ SOLUC ¸ AO ¸ AO DE LAPLACE O campo el´ectrico produzido por uma dada distribui¸c˜ ao de cargas est´aticas pode ser calculado a partir do sim´etrico do gradiente do potencial electrost´atico, o qual ´e muitas vezes obtido por integra¸c˜ao [ver (2.12)]. Alternativamente, a determina¸c˜ ao do potencial pode ser procurada resolvendo-se a equa¸c˜ ao de Poisson (2.15), que ´e uma equa¸c˜ ao diferencial de segunda ordem `as derivadas parciais: ∇2 V = − ρ , ²0 ∇2 V = − ρ` , ² ou, tal como vimos no Cap´ıtulo 5, (6.1) no caso dos meios diel´ectricos da classe A. Mais simples do que resolver a equa¸c˜ ao de Poisson ´e resolver a equa¸c˜ ao de Laplace, ∇2 V = 0 , (6.2) ´ este o objectivo principal deste cap´ıtulo. v´alida em dom´ınios onde n˜ao existam cargas. E Antes de abordar esta quest˜ao, vamos apresentar um teorema importante que fundamenta e justifica os desenvolvimentos a fazer a seguir. 6.1 TEOREMA DA UNICIDADE Segundo o teorema da unicidade para potenciais el´ectricos, n˜ao pode haver mais do que um potencial V (r ) que satisfa¸ca a equa¸c˜ ao de Poisson e um dado conjunto de condi¸c˜oes de 160 • ´tico Campo electromagne fronteira. Uma consequˆencia importante deste teorema ´e a liberdade de que dispomos para calcular V (r ), usando o m´etodo mais apropriado a cada situa¸c˜ ao. P˜oe-se, naturalmente, a quest˜ao de explicitar quais s˜ao as condi¸c˜ oes de fronteira apropriadas para que a equa¸c˜ao de Poisson (ou de Laplace) tenha uma solu¸c˜ ao u ´nica e bem comportada, ou seja, fisicamente aceit´avel, numa regi˜ao limitada por uma superf´ıcie. Os resultados experimentais levam-nos a concluir que a especifica¸c˜ ao do potencial sobre a superf´ıcie-fronteira define um problema u ´nico. Neste caso tem-se uma dada regi˜ao do espa¸co limitada por uma superf´ıcie e, embora n˜ao se conhe¸cam os pormenores da distribui¸c˜ ao de cargas, conhece-se o potencial em todos os pontos dessa superf´ıcie (condi¸c˜ ao de fronteira de Dirichlet). A express˜ao geral da fun¸c˜ao V ´e determinada a partir de (6.2), com a condi¸c˜ ao de, sobre a superf´ıcie de fronteira, reproduzir os valores dados. Em alternativa ao conhecimento de V sobre a fronteira, pode especificar-se a derivada do potencial el´ectrico segundo a normal, ∂V ˆ ˆ ´e a normal `a superf´ıcie). Neste ıcie de fronteira (n ∂n = ∇V · n, em cada ponto da superf´ caso, as condi¸c˜oes de fronteira dizem-se de von Neumann. Vamos ent˜ao demonstrar que existe apenas uma solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Poisson dentro de um volume, v, com condi¸c˜oes de fronteira impostas sobre a superf´ıcie fechada, S, que delimita esse volume. Admitamos, por hip´otese, que existiam duas solu¸c˜ oes, V1 e V2 , satisfazendo as mesmas condi¸c˜oes de fronteira, e seja a diferen¸ca entre elas designada por V : V = V2 − V1 . Dado que, por hip´otese, ∇2 V1 = − ρ ²0 , ∇2 V2 = − ρ , ²0 em v e ∂V1 ∂V2 = em S, ∂n ∂n conforme se imponham condi¸c˜oes de fronteira de Dirichlet ou de von Neumann, a fun¸c˜ ao V satisfaz as seguintes express˜oes: ∇2 V = 0 em v V1 = V2 ou e ∂V =0 ∂n Estas condi¸c˜oes de fronteira permitem que se escreva V =0 ou I I S V ∇V · dS = S V em S. ∂V dS = 0 . ∂n (6.3) Por outro lado, usando o teorema de Gauss, I Z S V ∇V · dS = Z = (A igualdade v Z ∇ · (V ∇V ) dv = I v |∇V |2 dv = 0 . ∂V V dS = ∂n S ´e designada teorema de Green.) v Z ∇V · ∇V dv + Z v v V ∇2 V dv (6.4) Z ∇V · ∇V dv + v V ∇2 V dv (6.5) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 161 Conclui-se ent˜ao, de (6.4), que ∇V = 0, pois a fun¸c˜ ao integranda ´e definida positiva. Em coordenadas cartesianas, este resultado implica que ∂V ∂V ∂V = = = 0, ∂x ∂y ∂z (6.6) ou seja, V ´e constante em todos os pontos do volume v. Considerando condi¸c˜ oes de Dirichlet, V = 0 sobre S, ter´a de verificar-se V = 0 em todo o dom´ınio (volume e superf´ıcie), pois s´o assim se garante a continuidade de V . Logo, V1 = V2 em todo o dom´ınio, como quer´ıamos provar. Considerando condi¸c˜oes de von Neumann, a Eq. (6.6), que se refere ao volume v, mant´em-se ainda sobre a superf´ıcie S, donde se conclui que V ´e constante em todo o dom´ınio, e portanto V1 = V2 + C. Quer dizer, as duas solu¸c˜ oes s˜ao iguais a menos de uma constante arbitr´aria que n˜ao ´e relevante. Relembramos que a origem do potencial ´e arbitr´aria e que o campo f´ısico E ´e obtido a partir das derivadas do potencial. 6.2 ´ O METODO DAS IMAGENS O m´etodo das imagens fornece uma t´ecnica para o c´alculo do potencial el´ectrico e, consequentemente, do campo el´ectrico. A ideia subjacente consiste em encontrar um conjunto de cargas fict´ıcias (chamadas cargas-imagem) que, juntamente com as cargas reais presentes, criem um potencial el´ectrico que satisfa¸ca todas as condi¸c˜ oes de fronteira. Este m´etodo ´e utilizado frequentemente em problemas envolvendo cargas pontuais na vizinhan¸ca de condutores. O efeito dos condutores pode ser simulado por uma ou por v´arias cargas-imagem, de tal modo que as superf´ıcies dos condutores s˜ao “substitu´ıdas” por superf´ıcies equipotenciais que, devido `a ac¸c˜ ao conjunta de cargas reais e das cargas-imagem (ou fict´ıcias) devem encontrar-se ao mesmo potencial dos condutores reais do problema. Respeitam-se, deste modo, as condi¸c˜ oes de fronteira e a solu¸c˜ ao assim encontrada para o potencial ´e u ´nica. As cargas fict´ıcias simulam, afinal, o papel de outras distribui¸c˜ oes de carga que determinam as condi¸c˜oes de fronteira. O potencial pode, ent˜ ao, ser escrito na forma V = X qi,reais i 4π²0 Ri + X qj,fict´ıcias j 4π²0 Rj , (6.7) sublinhando-se que todas as cargas fict´ıcias tˆem de estar localizadas fora da regi˜ao onde importa conhecer o potencial. Caso contr´ ario, estar´ıamos a alterar os dados do problema. Consideremos alguns exemplos concretos que ilustram o m´etodo e ajudam a compreendˆe-lo melhor. Exemplo 6.1: Carga pontual e condutor plano ligado ` a terra A Figura 6.1 representa um condutor semi-infinito com uma fronteira plana em x = 0 e uma carga pontual Q `a distˆancia d do plano. O plano condutor est´a ligado `a terra, pelo que a condi¸c˜ao de fronteira sobre o plano x = 0 ´e V (0, y, z) = 0, para qualquer y e z. Pretende calcular-se o potencial no ponto P de coordenadas (x, y, z), para x ≥ 0, devido `a carga Q e ao condutor. ´ f´acil reconhecer que se pode obter a mesma condi¸c˜ E ao de fronteira colocando uma carga 0 Q sim´etrica da carga real `a mesma distˆancia d do plano, mas do lado oposto. A carga Q0 = −Q est´a fora da regi˜ao onde se quer conhecer o potencial e, juntamente com a carga 162 • ´tico Campo electromagne y P ( x ,y ,z ) R ' -Q R d m a te ria l c o n d u to r x Q d v a z io Figura 6.1. Carga pontual e condutor plano ligado ` a terra. real, cria no plano x = 0 um potencial nulo. De facto, o potencial criado pelas duas cargas no ponto P ´e µ V ¶ Q 1 1 = VQ + V−Q = − 0 4π²0 R R à ! Q 1 1 p = −p 4π²0 (x − d)2 + y 2 + z 2 (x + d)2 + y 2 + z 2 (6.8) e, sobre o plano x = 0, o potencial anula-se, quaisquer que sejam y e z, tal como se pretendia. O potencial (6.8), v´alido para x ≥ 0, satisfaz as condi¸c˜ oes de fronteira do problema e ´e u ´nico. Para x ≤ 0 o potencial ´e identicamente nulo, dado tratar-se do interior de um condutor em equil´ıbrio electrost´atico. O campo el´ectrico obtido a partir da equa¸c˜ ao E = −∇V ´e µ Ex = Ey = Ez = Q x−d x+d − 4π²0 R3 R0 3 µ ¶ Qy 1 1 − 4π²0 R3 R0 3 µ ¶ 1 Qz 1 − . 4π²0 R3 R0 3 ¶ (6.9) (6.10) (6.11) Para x = 0, tem-se R = R0 e, das equa¸c˜ oes anteriores, resulta Ey = Ez = 0, pelo que o campo el´ectrico apenas tem componente segundo x: E (x = 0, y, z) = − 2d Q ˆi . 2 2 4π²0 (d + y + z 2 )3/2 (6.12) O campo el´ectrico ´e perpendicular, em qualquer ponto, `a superf´ıcie do condutor, como era de esperar. Vejamos a seguir qual ´e a distribui¸c˜ ao de carga, σ, na superf´ıcie condutora. Pela lei de Gauss em superf´ıcies de descontinuidade, ˆ · (E2 − E1 ) = n σ = ˆi · E , ²0 ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 163 ˆ = ˆi, e E2 e E1 , respectivamente, os campos nas regi˜oes x = 0+ e x = 0− ; E2 = sendo n E (0, y, z) ´e dado por (6.12). A densidade superficial de carga ´e σ(0, y, z) = − 2π(d2 Qd . + y 2 + z 2 )3/2 Esta distribui¸c˜ao de carga “induzida” no plano pela presen¸ca da carga pontual Q n˜ao ´e uniforme: tem um m´aximo na origem (em frente a Q) e tende para zero quando y, z → ∞. A carga total no condutor obt´em-sepintegrando a densidade superficial, sendo conveniente utilizar as coordenadas polares r = y 2 + z 2 e φ, ao efectuar a integra¸c˜ ao sobre o plano: Z Qplano = Qd σdS = − 2π Z ∞ 0 Z 2π 0 dφ ¯ µ = − r dr 2 (d + r2 )3/2 Q −1 ¯¯∞ 2πd √ ¯ = −Q . 2π d2 + r 2 0 Conclui-se, assim, que a carga total induzida no plano condutor ´e igual `a carga-imagem, como seria de esperar, uma vez que se pretende, com a carga-imagem, simular o comportamento global do condutor. Vejamos, por fim, qual ´e a for¸ca exercida pelo plano condutor sobre Q. O campo produzido pelo plano condutor ´e dado pelas eqs. (6.9), (6.10) e (6.11), mas no ponto (d, 0, 0), onde se encontra a carga Q, s´o a componente x ´e diferente de zero. O campo ´e obtido de (6.9) e a for¸ca — produto da carga Q pelo campo que as outras cargas criam nesse ponto — ´e F =Q Q2 ˆ −Q ˆ i = − i. 4π²0 (2d)2 16π²0 d2 Esta express˜ao ´e exactamente a mesma que resultaria de (2.1), usando o facto de as cargas pontuais Q e Q0 estarem `a distˆancia 2d uma da outra. Exemplo 6.2: Carga pontual junto a uma esfera condutora ligada ` a terra Consideremos uma carga pontual Q `a distˆancia d do centro de uma esfera condutora de raio a, ligada `a terra. Escolhemos um sistema de eixos com origem no centro da esfera e cujo eixo dos z passa pelo ponto onde est´a a carga Q. Pretende calcular-se o potencial em pontos exteriores `a esfera (no interior da esfera o potencial ´e nulo), devendo ser satisfeita a condi¸c˜ao de fronteira V (a, θ, φ) = 0. Introduz-se uma carga-imagem Q0 a uma distˆancia d0 do centro da esfera O (d0 < a), portanto fora da regi˜ao onde se pretende conhecer o potencial. A situa¸c˜ao est´a representada esquematicamente na Figura 6.2. O potencial criado, em P (x, y, z), pelas cargas real e fict´ıcia ´e V (r, θ, φ) = 1 4π²0 µ Q Q0 + R R0 ¶ . (6.13) Designando por r o vector posicional, relativamente `a origem das coordenadas, do ponto gen´erico P e por d o vector posicional de Q relativamente a O, tem-se r = d + R, pelo que R = (r2 + d2 − 2rd cos θ)1/2 (6.14) e, de modo an´alogo, designando por d0 o vector posicional de Q0 relativamente a O, se escreve r = d0 + R0 , donde 164 • ´tico Campo electromagne z R P ( x ,y ,z ) R ' d q Q R P ( x ,y ,z ) d r Q ' d ' a Q r O q O Figura 6.2. Carga pontual e esfera condutora ligada ` a terra. 2 R0 = (r2 + d0 − 2rd0 cos θ)1/2 . (6.15) Sobre a superf´ıcie da esfera, a express˜ao (6.13) tem de se anular, pois esta ´e a condi¸c˜ ao de fronteira que deve ser satisfeita. Para r = a, o potencial escreve-se " 1 Q Q0 √ V (a, θ, φ) = 0 = +p 4π²0 a2 + d2 − 2ad cos θ a2 + d0 2 − 2ad0 cos θ # . Esta express˜ao ´e v´alida para qualquer ˆangulo θ, em particular para θ = 0 e para θ = π. Obtˆem-se, assim, duas equa¸c˜oes que permitem determinar Q0 e d0 . Tem-se, respectivamente (note-se que d > a > d0 ), Q Q0 + = 0, d − a a − d0 Q Q0 + = 0. d + a a + d0 Resolvendo o sistema de equa¸c˜oes, chega-se a d0 = a2 d e a Q0 = − Q . d (6.16) Substituindo em (6.13), obt´em-se o potencial, v´alido para qualquer ponto do exterior da esfera,  V (r, θ, φ) = Q  1 √ −r  2 2 4π²0 r + d − 2rd cos θ  r2 + e que satisfaz as condi¸c˜oes de fronteira.   ,  a/d ³ ´ 2 2 a d ³ − 2r ´ 2 a d cos θ ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a O campo el´ectrico s´o tem componentes (esf´ericas) Er e Eθ : ( £ r − d cos θ (a/d) r − (a2 /d) cos θ − R3 R0 3 Er ∂V Q = − = ∂r 4π²0 Eθ 1 ∂V Qd sin θ 1 (a/d)3 = − = − r ∂θ 4π²0 R3 R0 3 " • 165 ¤) (6.17) # . (6.18) A distˆancia R0 [ver (6.15)], em fun¸c˜ ao de d, a e θ, ´e s R0 = r2 + µ 2 ¶2 a d − 2r µ 2¶ a d cos θ , donde se conclui que, para r = a, R0 e R [ver Eq. (6.14)] relacionam-se entre si atrav´es de R0 = R a/d. Inserindo este resultado em (6.18), obt´em-se Eθ (r = a) = 0, ou seja, o campo el´ectrico ´e perpendicular em todos os pontos `a superf´ıcie da esfera. Tal como fizemos no exemplo anterior, vejamos qual ´e a densidade superficial de carga induzida na esfera condutora. A divergˆencia superficial do campo ´e σ ˆ · (E2 − E1 ) = n . (6.19) ²0 ˆ =e ˆ r , o campo “interior” ´e E1 = 0 e o “exterior” ´e E2 , o qual se obt´em de (6.17) Com n fazendo r = a: Q ˆr . E2 = (a2 − d2 ) e 4π²0 R3 a A densidade superficial de carga sobre a esfera obt´em-se a partir de (6.19): σ=− Q(d2 − a2 ) . 4πa(a2 + d2 − 2ad cos θ)3/2 Deixa-se ao leitor a tarefa de verificar que o integral desta densidade estendido a toda a superf´ıcie esf´erica — carga total na esfera condutora — ´e igual `a carga-imagem [cf. (6.16)]: I Qesfera Q (d2 − a2 ) a = σdS = −2π 4π S Z π 0 (a2 + d2 a sin θdθ = −Q . 3/2 d − 2ad cos θ) A for¸ca que a esfera condutora exerce sobre a carga Q pode ser determinada a partir da for¸ca que a carga-imagem exerce sobre Q. Como o campo produzido pela carga-imagem no ponto onde se encontra Q ´e 1 Qa ˆ, E=− k 4π²0 d (d − d0 )2 a for¸ca vem Q2 a ˆ. F = QE = − k 4π²0 d (d − d0 )2 Usando a rela¸c˜ao entre d e d0 [ver (6.16)] esta for¸ca pode ser expressa por F =− Q2 ad ˆ. k 4π²0 (d2 − a2 )2 No limite em que d À a, pode desprezar-se a2 no denominador relativamente a d2 e, usando a rela¸c˜ao entre Q0 e Q [ver (6.16)], escrever a express˜ao anterior na forma da for¸ca coulombiana entre duas cargas pontuais `a distˆancia d uma da outra: F = Q Q0 ˆ k. 4 π ²0 d2 166 • ´tico Campo electromagne Exemplo 6.3: Carga pontual pr´ oxima de uma esfera condutora descarregada e isolada Considere-se um sistema f´ısico semelhante ao anterior, mas com a esfera condutora descarregada e isolada. “Coloca-se” a mesma carga-imagem Q0 a uma distˆancia d0 do centro da esfera, sendo os valores destas quantidades ainda dados por (6.16). Como vimos, as cargas real Q e imagem Q0 criam sobre a superf´ıcie da esfera um potencial nulo. Na situa¸c˜ ao presente o potencial da esfera tem de ser constante, mas n˜ao nulo, pois a esfera n˜ao est´a ligada `a terra; por outro lado, a carga total da esfera tem de ser nula. Ter´ a, pois, de se considerar uma nova ´nica posi¸c˜ao carga-imagem de valor Q00 = −Q0 = ad Q algures no interior da esfera. Ora, a u poss´ıvel para esta carga, de modo a que a superf´ıcie esf´erica continue a ser uma superf´ıcie equipotencial, ´e o centro da esfera. O potencial da esfera ´e V (r = a) = Q 1 Qa/d = , 4π²0 a 4π²0 d sendo esta a condi¸c˜ao de fronteira, sobre a superf´ıcie da esfera, a ser satisfeita pela solu¸c˜ao V (r, θ, φ) v´alida para o exterior da esfera. Exemplo 6.4: Diel´ ectrico semi-infinito e carga pontual Considere-se um material diel´ectrico da classe A de permitividade ² e com uma fronteira plana, e seja Q uma carga pontual colocada `a distˆancia d da superf´ıcie do diel´ectrico (Figura 6.3). Pretende conhecer-se o potencial el´ectrico em todo o espa¸co. y m e io 1 (d ie lé c tric o ) m e io 2 (v a z io ) Q d x Figura 6.3. Carga pontual e diel´ ectrico plano semi-infinito. Na regi˜ao do diel´ectrico, x < 0, a densidade volum´etrica de carga de polariza¸c˜ ao ´e zero. Efectivamente [ver (5.6) e (5.20) a (5.22)], tem-se ρp = −∇ · P = −²0 (²r − 1)∇ · E = − ²0 (²r − 1) ∇ · D = 0, ²0 ²r uma vez que, n˜ao existindo densidade de carga livre no diel´ectrico, vem ∇ · D = 0. Sobre a superf´ıcie do diel´ectrico h´a uma densidade de carga de polariza¸c˜ ao σp . A componente x do ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 167 campo el´ectrico produzido por esta carga de polariza¸c˜ ao ´e σp 2²0 σp = − 2²0 Epext ,x = x = 0+ Epint,x x = 0− . Considerando apenas a componente do campo total perpendicular `a superf´ıcie do diel´ectrico, tem-se, para x = 0+ , σp Qd Exext = . (6.20) − 2²0 4π²0 r3 Para x = 0− , vem Exint = − σp Qd . − 2²0 4π²0 r3 (6.21) Nestas duas express˜oes, a segunda parcela no segundo membro ´e a contribui¸c˜ ao para a componente x do campo el´ectrico resultante da presen¸ca da carga real Q (a quantidade d/r ´e o co-seno do ˆangulo que a direc¸c˜ao r faz com o eixo x). A densidade superficial de carga de polariza¸c˜ao σp ´e ˆ = ²0 (²r − 1) E int · ˆi = ²0 (²r − 1)Exint . (6.22) σp = P · n Substituindo em (6.21), Exint = − ²0 (²r − 1) int Qd Ex − 2²0 4π²0 r3 e resolvendo em ordem a Exint , µ int Ex ²r − 1 =− 1− ²r + 1 ¶ Qd . 4π²0 r3 (6.23) Usando agora (6.23) em (6.22) e a express˜ao resultante em (6.20), obt´em-se µ Exext = − 1 + ²r − 1 ²r + 1 ¶ Qd . 4π²0 r3 (6.24) As duas u ´ltimas equa¸c˜oes exprimem condi¸c˜ oes de fronteira e v˜ao ser exploradas no sentido de se obterem as cargas-imagem u ´teis para o c´alculo do campo em todo o espa¸co. A equa¸c˜ao relevante para a regi˜ao x > 0 ´e (6.24). A condi¸c˜ ao de fronteira expressa por esta equa¸c˜ao ´e a que seria obtida colocando, para al´em da carga real em (d, 0, 0), uma carga de valor Q0 = −Q(²r − 1)/(²r + 1) no ponto (−d, 0, 0), isto ´e, fora da regi˜ao onde se pretende determinar o potencial e o campo. Para se calcular o campo no interior do diel´ectrico, ou seja, para x < 0, atente-se na Eq. (6.23). Conclui-se que esse campo ´e o que seria produzido colocando uma carga-imagem justamente sobre Q [ponto (d, 0, 0)] de valor igual a Q00 = −Q(²r − 1)/(²r + 1) ou, o que ´e o mesmo, substituindo a carga real pela carga Q000 = Q + Q00 = 2Q/(²r + 1). Em suma: primeiro substitu´ımos o diel´ectrico por uma densidade de cargas superficial σp . Para a situa¸c˜ao estudada verifica-se que ρp = 0 e, portanto, pudemos resolver o problema substituindo σp pela carga-imagem Q0 = −Q(²r − 1)/(²r + 1) colocada em (−d, 0, 0), quando se pretendeu calcular o campo para x > 0. Ou ent˜ ao, para a regi˜ao x < 0, substituindo σp e Q pela carga 2Q/(²r + 1) colocada em (d, 0, 0). Repare-se que, em cada um dos casos, x > 0 e x < 0, as cargas-imagem consideradas est˜ao sempre fora da regi˜ao onde se pretende calcular o potencial. Note-se, tamb´em, que, com as cargas-imagem consideradas, est´a garantida a continuidade das componentes tangenciais do campo el´ectrico na superf´ıcie de separa¸c˜ ao. 168 • ´tico Campo electromagne 6.3 ˜ DA EQUAC ˜ DE LAPLACE EM COORDENADAS SOLUC ¸ AO ¸ AO CARTESIANAS O m´etodo das imagens ´e adequado em muitas circunstˆancias, mas um m´etodo mais geral para a obten¸c˜ao do potencial (e do campo el´ectrico) ser´a a pr´opria resolu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Poisson (6.1). Por ser mais simples, abordaremos a quest˜ao da resolu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace (6.2), que se aplica em regi˜oes do espa¸co onde n˜ao existam cargas. Obtida a solu¸c˜ ao desta equa¸c˜ao — equa¸c˜ao diferencial, homog´enea, de segunda ordem — ´e f´acil, em princ´ıpio, escrever a solu¸c˜ao da equa¸c˜ao de Poisson. Esta solu¸c˜ ao ´e a soma da solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace e de uma solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao completa. Nesta sec¸c˜ao vamos obter solu¸c˜oes da equa¸c˜ ao de Laplace. Em coordenadas cartesianas, a Eq. (6.2) vem (ver Apˆendice B) ∇2 V = ∂2V ∂2V ∂2V + + = 0. ∂x2 ∂y 2 ∂z 2 (6.25) Esta equa¸c˜ao vai ser resolvida pelo m´etodo da separa¸c˜ ao das vari´ aveis, procurando-se uma solu¸c˜ao da forma V (x, y, z) = X(x) Y (y) Z(z) , (6.26) em que X(x), Y (y) e Z(z) s˜ao fun¸c˜oes, respectivamente, das vari´ aveis x, y e z. Substituindo (6.26) em (6.25) e dividindo por V obt´em-se 1 d2 X 1 d2 Y 1 d2 Z + + = 0. 2 2 X(x) dx Y (y) dy Z(z) dz 2 Cada uma das parcelas desta express˜ao depende apenas de uma das vari´ aveis x, y ou z, pelo que a igualdade a zero s´o se obt´em se cada uma das parcelas for igual a uma constante, ou seja, se 1 d2 X X(x) dx2 1 d2 Y Y (y) dy 2 1 d2 Z Z(z) dz 2 = ±c21 (6.27) = ±c22 (6.28) = ±c23 , (6.29) onde c2i s˜ao trˆes constantes positivas arbitr´arias apenas sujeitas `a condi¸c˜ ao ±c21 ± c22 ± c23 = 0 (6.30) e, naturalmente, `as condi¸c˜oes de fronteira. O problema da resolu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace reduz-se ao da resolu¸c˜ao das trˆes equa¸c˜ oes diferenciais dependentes de uma vari´ avel apenas, (6.27) a (6.29), com as condi¸c˜oes (6.30). A solu¸c˜ ao X(x) ´e, para −c21 , uma fun¸c˜ ao oscilante, dada por (6.31) X(x) = Aeic1 x + Be−ic1 x ou, de modo equivalente, por X(x) = A0 cos(c1 x) + B 0 sin(c1 x) . (6.32) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 169 Para +c21 a solu¸c˜ao da Eq. (6.27) ´e uma sobreposi¸c˜ ao de exponenciais: X(x) = Cec1 x + De−c1 x (6.33) X(x) = C 0 cosh(c1 x) + D0 sinh(c1 x) . (6.34) ou, de forma equivalente, Nestas express˜oes, A, B, ..., C 0 , D0 s˜ ao constantes de integra¸c˜ ao. As fun¸c˜ oes Y (y) e Z(z) s˜ao formalmente idˆenticas a X(x), pois as equa¸c˜ oes a que obedecem s˜ao do mesmo tipo. H´a, evidentemente, muitos conjuntos de valores de c1 , c2 , c3 que satisfazem (6.30). Uma vez que cada combina¸c˜ao corresponde, de facto, a uma solu¸c˜ ao poss´ıvel da equa¸c˜ ao de Laplace, h´a um n´ umero infinito de poss´ıveis solu¸c˜ oes do tipo V{c} (x, y, z) = Xc1 (x) Yc2 (y) Zc3 (z) , linearmente independentes. Uma combina¸c˜ ao linear destas solu¸c˜ oes ´e ainda uma solu¸c˜ ao, pelo que a equa¸c˜ao de Laplace tem por solu¸c˜ ao geral V (x, y, z) = X A{c} V{c} (x, y, z) , {c} em que A{c} s˜ao constantes fixadas pelas condi¸c˜ oes de fronteira. ´ E a introdu¸c˜ao das condi¸c˜oes de fronteira que permite eliminar todas as solu¸c˜ oes que, sendo poss´ıveis matematicamente, n˜ao o s˜ao fisicamente. Chega-se, ent˜ ao, a uma solu¸c˜ ao que, como j´a sabemos, ´e u ´nica. De notar que as eqs. (6.27) a (6.29) admitem solu¸c˜ oes simplificadas em alguns casos especiais. De facto, a condi¸c˜ao (6.30) verifica-se sempre que c1 = c2 = c3 = 0, tendo-se, nesse caso, a solu¸c˜ao dada por V (x, y, z) = (A + B x) (C + D y) (E + F z) . (6.35) Outra situa¸c˜ao particular ocorre num problema a duas dimens˜oes, em que V (x, y) = X(x) Y (y) e a Eq. (6.30) se reduz a c21 + c22 = 0, ou seja, c21 = −c22 = β 2 , sendo β uma constante real ou imagin´aria. As solu¸c˜ oes de (6.27) e (6.28) s˜ao, respectivamente, do tipo (6.33) e (6.32), ou seja, X(x) = Aeβx + Be−βx Y (y) = C cos(βy) + D sin(βy) . Uma solu¸c˜ao geral do problema a duas dimens˜oes ´e, pois, uma combina¸c˜ ao linear de produtos de fun¸c˜oes do tipo X(x) e Y (y). As condi¸c˜ oes de fronteira imp˜oem, de um modo geral, que o parˆametro β seja discreto, pelo que a solu¸c˜ ao do problema a duas dimens˜oes ´e da forma V (x, y) = ∞ ³ X ´ An eβn x + Bn e−βn x [Cn cos(βn y) + Dn sin(βn y)] , (6.36) n=1 onde βn , An , Bn , Cn e Dn s˜ao determinados pelas condi¸c˜ oes de fronteira. Note-se que se os βn forem imagin´arios, a dependˆencia em x ´e oscilante e a dependˆencia em y ´e exponencial. 170 • ´tico Campo electromagne y b V 0 x Figura 6.4. Dois condutores planos ligados ` a terra e lˆ amina ao potencial V0 . Exemplo 6.5: Potencial entre dois el´ ectrodos planos semi-infinitos, ligados ` a terra e separados por um el´ ectrodo plano ao potencial V0 Vamos aplicar o formalismo desenvolvido nesta sec¸c˜ ao `a situa¸c˜ ao representada na Figura 6.4. A separa¸c˜ao entre os el´ectrodos ligados `a terra ´e b e as condi¸c˜ oes de fronteira s˜ao1 V V V V = = = → 0 0 V0 0 y = 0 (x ≥ 0) y = b (x ≥ 0) x = 0 (0 < y < b) x → ∞. (6.37) (6.38) (6.39) (6.40) O sistema ´e infinito segundo o eixo dos z e, por isso, o potencial n˜ao deve depender de z. A solu¸c˜ao ´e, pois, do tipo (6.36). A condi¸c˜ ao (6.37) implica que Cn = 0 para qualquer n. A condi¸c˜ao (6.38) implica que Dn sin(βn b) = 0 ⇒ βn = nπ b (n = 1, 2, ...) . Fica, assim, determinada a dependˆencia em y da express˜ao do potencial: µ Yn (y) ∼ sin nπ y b ¶ (n = 1, 2, ...) . Quanto `a parte que depende de x, a condi¸c˜ ao de fronteira (6.40) implica que todos os coeficientes An , em (6.36), se anulem. Teremos, portanto, V (x, y) = ∞ X n=1 µ Cn0 sin nπ y b ¶ e− nπ x b . (6.41) 1 A situa¸c˜ ao apresentada ´e acad´emica. De facto, ela ´e imposs´ıvel de ser realizada na pr´ atica, pois h´ a uma descontinuidade no potencial segundo o eixo y. A uma descontinuidade no potencial corresponderia um campo el´ectrico infinito. ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 171 Os coeficientes Cn0 desta s´erie s˜ao determinados usando-se a condi¸c˜ ao de fronteira (6.39) que n˜ao foi ainda explorada. A equa¸c˜ ao anterior em x = 0 reduz-se a V (0, y) = V0 = ∞ X µ Cn0 n=1 nπ sin y b ¶ . (6.42) Antes de prosseguir, conv´em recordar alguns aspectos das s´eries de Fourier que v˜ao ser necess´arios ao problema em estudo. Uma fun¸c˜ ao bem comportada F (y), isto ´e, cont´ınua ou, pelo menos, cont´ınua por partes, e nunca infinita, definida num intervalo [0, b] pode sempre ser escrita como uma s´erie de Fourier: ∞ · X F (y) = µ Cn00 n=0 ¶ µ nπ nπ sin y + Dn00 cos y b b ¶¸ . As fun¸c˜oes trigonom´etricas formam uma base completa e gozam das seguintes propriedades de ortogonalidade: Z b 0 µ ¶ µ ¶ mπy nπy sin sin dy = b b Z b 0 µ ¶ µ ¶ mπy nπy b cos cos dy = δmn , b b 2 Retomemos a Eq. (6.42), multipliquemos ambos os membros por sin de 0 a b. O primeiro membro fica Z b 0 µ V0 sin mπ y b    2V0 b ¶ dy = n, m 6= 0 . (6.43) ¡ mπ ¢ b y e integremos se m ´e ´ımpar mπ   0 (6.44) se m ´e par. Quanto ao segundo membro pode usar-se a propriedade de ortogonalidade da fun¸c˜ ao seno [ver (6.43)]: ¶ µ ¶ µ Z b ∞ X nπy mπy 0 b 0 sin dy = Cm . Cn sin b b 2 0 n=1 0 : Desta equa¸c˜ao e de (6.44) obt´em-se a express˜ao pretendida para Cm 0 Cm =    4V0 se m ´e ´ımpar mπ   0 (6.45) se m ´e par . Substituindo, finalmente, os valores de Cn0 dados por esta express˜ao em (6.41), 4V0 V (x, y) = π ∞ X n=1,3,... µ nπ 1 sin y n b ¶ e− nπ x b . (6.46) O campo el´ectrico ´e ent˜ao 4V E (x, y) = −∇V = − 0 b ∞ X n=1,3,... · µ nπ y − sin b ¶ µ ˆi + cos nπ y b ¶ ¸ nπ jˆ e− b x . As contribui¸c˜oes das diferentes parcelas s˜ao tanto menores quanto maior for n devido a` fun¸c˜ao exponencial. Na direc¸c˜ ao x o campo tende para zero rapidamente. Por outro lado, para (x = 0, y = 0, z) e (x = 0, y = b, z), o campo torna-se infinito (como j´a se referiu anteriormente, o potencial tem uma descontinuidade e a situa¸c˜ ao apresentada n˜ao pode ser realizada na pr´atica). 172 • ´tico Campo electromagne 6.4 ˜ DA EQUAC ˜ DE LAPLACE EM COORDENADAS SOLUC ¸ AO ¸ AO ´ ESFERICAS Em coordenadas esf´ericas, a equa¸c˜ ao de Laplace tem a forma (ver Apˆendice B) µ ∇2 V = 1 ∂ ∂V r2 2 r ∂r ∂r ¶ µ + 1 ∂ ∂V sin θ 2 r sin θ ∂θ ∂θ ¶ + 1 ∂2V = 0, r2 sin2 θ ∂φ2 sendo a sua solu¸c˜ao expressa em fun¸c˜ao das coordenadas esf´ericas, V = V (r, θ, φ). Utilizaremos a mesma t´ecnica de separa¸c˜ao de vari´ aveis mas, como o desenvolvimento do formalismo se torna bastante trabalhoso, limitar-nos-emos aos casos em que haja simetria axial, isto ´e, `as situa¸c˜oes em que o potencial seja independente do ˆangulo azimutal φ. A equa¸c˜ ao anterior reduz-se a µ ¶ µ ¶ 1 ∂ 1 ∂ ∂V 2 2 ∂V ∇ V (r, θ) = 2 r + 2 sin θ =0 (6.47) r ∂r ∂r r sin θ ∂θ ∂θ e procuram-se solu¸c˜oes da forma V (r, θ) = R(r) Θ(θ) . (6.48) Substituindo (6.48) em (6.47) e dividindo por V , vem µ 1 d dR r2 R dr dr ¶ µ + 1 d dΘ sin θ Θ sin θ dθ dθ ¶ = 0. (6.49) A primeira parcela s´o depende de r e a segunda s´o depende de θ. Para que a equa¸c˜ ao seja satisfeita com toda a generalidade, cada uma das parcelas s´o pode ser igual a uma constante: se a parte que depende de r for igual a k, a que depende de θ ter´a de ser igual a −k, sendo k uma constante real. A equa¸c˜ao para R(r) ´e r2 d2 R dR − kR = 0 , + 2r 2 dr dr (6.50) a qual admite solu¸c˜oes da forma R(r) = Arn + Br−(n+1) . (6.51) A rela¸c˜ao entre n e a constante k obt´em-se substituindo (6.51) em (6.50). Vem, ent˜ ao, ³ ´ (n2 + n − k) A rn + B r−(n+1) = 0 , concluindo-se que k = n (n + 1) . (6.52) Vejamos agora a equa¸c˜ao para Θ(θ), que se obt´em facilmente a partir de (6.49). Usando j´a o resultado (6.52), a Eq. (6.49) vem µ d dΘ sin θ dθ dθ ¶ + n(n + 1) sin θ Θ(θ) = 0 . (6.53) Trata-se de uma equa¸c˜ao que aparece em muitos ramos da F´ısica (por exemplo, no estudo de um campo de for¸cas central em mecˆanica quˆantica n˜ao relativista) e cuja solu¸c˜ ao se exprime ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 173 em fun¸c˜ao dos polin´omios de Legendre. Para obter essas solu¸c˜ oes efectuamos a mudan¸ca de vari´avel q q d d e = − 1 − ξ2 ξ = cos θ → sin θ = 1 − ξ 2 ; dθ dξ na Eq. (6.53). Escrevendo Θ(θ) = Pn (ξ), obt´em-se a conhecida equa¸c˜ ao de Legendre: · ¸ d dPn (1 − ξ 2 ) + n(n + 1) Pn = 0 . dξ dξ As solu¸c˜oes desta equa¸c˜ao, Pn (cos θ), com n inteiro, s˜ao os polin´omios de Legendre, que j´a foram referidos no Cap´ıtulo 4 (Sec¸c˜ ao 4.4). ´ importante notar que n0 = −(n + 1) conduz exactamente ao mesmo valor de k [ver E (6.52)] e, portanto, a equa¸c˜ao de Legendre fica invariante. Quer isto dizer que Pn (cos θ) = P−(n+1) (cos θ). Combinando a solu¸c˜ ao para a parte angular, representada pelos polin´omios de Legendre, com a solu¸c˜ao (6.51) para a parte radial (onde, ent˜ ao, n = 0, 1, 2, ...), podemos afirmar que, quando existe simetria axial, a equa¸c˜ ao de Laplace admite, em coordenadas esf´ericas, uma solu¸c˜ao geral da forma V (r, θ) = ∞ ³ X ´ An rn + Bn r−(n+1) Pn (cos θ) . (6.54) n=0 A rela¸c˜ao de ortogonalidade dos polin´omios de Legendre, Z 1 −1 Pm (cos θ) Pn (cos θ)d(cos θ) = 2 δmn , 2n + 1 (6.55) ´e muito u ´til na obten¸c˜ao dos coeficientes An e Bn da express˜ao (6.54), como se mostra nos exemplos de aplica¸c˜ao seguintes. Exemplo 6.6: Esfera ligada ` a terra num campo uniforme ˆ , numa regi˜ao do espa¸co onde se coloca Consideremos um campo uniforme, E0 = E0 k uma esfera condutora, de raio a, ligada `a terra. As cargas que produzem o campo (por exemplo, cargas nas placas de um condensador plano) est˜ao muito longe da esfera. Pretendese determinar o potencial V e o campo el´ectrico E na regi˜ao fora da esfera. A situa¸c˜ ao est´a esquematizada na Figura 6.5. Vamos considerar coordenadas esf´ericas com origem no centro da esfera. As condi¸c˜ oes de fronteira, para este problema, devem garantir que, a uma grande distˆancia da esfera (r → ∞), o campo inicial se mant´em inalterado (E = E0 ) e que o potencial se anula para r = a. As express˜oes seguintes traduzem estas duas condi¸c˜ oes r→∞ V (r → ∞, θ) = −E0 z = −E0 r cos θ (6.56) r=a V (r = a, θ) = 0 . (6.57) Note-se que, para escrever a Eq. (6.56), se utilizou o facto de E = −∇V e z = r cos θ. A simetria do problema sugere que se procure o potencial a partir da solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas esf´ericas com simetria axial [Eq. (6.54)]. Em r = a a Eq. (6.54) e a condi¸c˜ao de fronteira (6.57) conduzem a V (a, θ) = ∞ ³ X n=0 ´ An an + Bn a−(n+1) Pn (cos θ) = 0 . (6.58) 174 • ´tico Campo electromagne E 0 a z Figura 6.5. Esfera condutora ligada ` a terra colocada numa regi˜ ao onde existia previamente um campo el´ ectrico uniforme E0 . Os coeficientes An e Bn podem ser determinados utilizando as condi¸c˜ oes de ortogonalidade dos polin´omios de Legendre. Assim, se multiplicarmos ambos os membros de (6.58) por Pm (cos θ) e integrarmos sobre cos θ obt´em-se, aplicando a rela¸c˜ ao de ortogonalidade (6.55), a seguinte equa¸c˜ao para An e Bn : ´ 2 ³ An an + Bn a−(n+1) = 0 , 2n + 1 ou seja, Bn = −An a2n+1 . (6.59) r−(n+1) Para grandes distˆancias, o termo Bn tende para zero, mas o potencial, de acordo com (6.56), n˜ao tende para zero. Para r grande, ∞ X An rn Pn (cos θ) = −E0 r cos θ . (6.60) n=0 O segundo membro depende de θ apenas atrav´es do co-seno. Ora (ver Sec¸c˜ ao 4.4) P1 (cos θ) = cos θ, pelo que, usando novamente as condi¸c˜ oes de ortogonalidade (6.55), conclu´ımos que An = 0 se n 6= 1 e A1 = −E0 e, de (6.59), segue-se que B1 = E0 a3 , Bn = 0 (n 6= 1). Finalmente, o potencial que se procura ´e dado por à V (r, θ) = −E0 a3 1− 3 r ! r cos θ . (6.61) Note-se que o primeiro termo corresponde ao potencial a grandes distˆancias. O segundo termo resulta da presen¸ca da esfera. As componentes esf´ericas do vector campo el´ectrico, que deriva deste potencial, s˜ao: à ! Er ∂V 2a3 = − = E0 1 + 3 ∂r r Eθ a3 1 ∂V = −E0 1 − 3 = − r ∂θ r à cos θ ! sin θ . ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 175 Em r = a a componente Eθ anula-se — o campo ´e perpendicular `a superf´ıcie do condutor (superf´ıcie equipotencial). Junto `a superf´ıcie da esfera e do lado exterior o campo el´ectrico ˆ r . Como o campo no interior da esfera ´e nulo, s´o tem componente normal: E = 3E0 cos θ e pode obter-se, a partir da divergˆencia superficial do campo el´ectrico [Eq. (2.42)], a densidade superficial de carga na esfera: σ = ²0 divS E = 3²0 E0 cos θ . (6.62) A carga total induzida na esfera ´e nula, mas a esfera adquire o momento dipolar ˆ, p = 4π²0 a3 E0 k como se pode verificar efectuando a integra¸c˜ ao em (4.32) para a distribui¸c˜ ao de carga (6.62). De resto, note-se que o segundo termo em (6.61) tem a forma t´ıpica do potencial criado por um dipolo el´ectrico [ver (4.8)]. Exemplo 6.7: Esfera diel´ ectrica num campo uniforme Consideremos uma esfera diel´ectrica de raio a e permitividade relativa ²r numa regi˜ao do ˆ . A situa¸c˜ espa¸co onde existe inicialmente um campo uniforme E0 = E0 k ao ´e semelhante `a que acabou de ser estudada (ver Figura 6.5), substituindo-se a esfera condutora pela esfera diel´ectrica. Pretende obter-se o potencial e o campo el´ectrico em todo o espa¸co. O problema ´e um pouco mais complicado do que o anterior em virtude de, na regi˜ao interior da esfera, o potencial j´a n˜ao ser simplesmente constante. Usaremos de novo a solu¸c˜ao da equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas esf´ericas (caso em que h´a simetria axial) — Eq. (6.54) —, tendo-se as seguintes condi¸c˜ oes de fronteira: 1. Para r = 0, o potencial Vint deve manter-se finito. 2. Em r = a o potencial deve ser uma fun¸c˜ ao cont´ınua: Vint (r = a) = Vext (r = a) . 3. Para r → ∞ (r À a) o campo inicial n˜ao dever´ a ser perturbado significativamente. Tal como em (6.56), V (r → ∞, θ) = −E0 r cos θ . (6.63) 4. A componente normal do campo deslocamento el´ectrico ´e cont´ınua para r = a, pois σ` = 0, isto ´e (Dint )n = (Dext )n . Daqui resulta ²r (Eint )n = (Eext )n . Sendo a direc¸c˜ ao ˆ r , tem-se En = Er = − ∂V da normal `a superf´ıcie esf´erica a do versor e . Verifica-se, ∂r pois, a seguinte condi¸c˜ao de fronteira em r = a: ²r ∂Vint ∂Vext = . ∂r ∂r 5. As componentes tangenciais de E s˜ ao cont´ınuas na superf´ıcie esf´erica r = a. Como n˜ao h´a dependˆencia em φ, exige-se a continuidade para a componente Eθ = − 1r ∂V e, ∂θ , isto ´ (Eint )θ = (Eext )θ , ou ainda, usando o potencial, ∂Vint ∂Vext = . ∂θ ∂θ 176 • ´tico Campo electromagne Consideramos para Vint e para Vext express˜oes do tipo (6.54). O potencial no interior da esfera ´e simplesmente X n Vint = A(i) (6.64) n r Pn (cos θ) , n (i) Bn pois todos os tˆem de se anular para que se verifique a condi¸c˜ ao de fronteira 1., isto ´e, para que o potencial se mantenha finito. No exterior Vext = X³ ´ n (e) −(n+1) A(e) Pn (cos θ) . n r + Bn r (6.65) n A condi¸c˜ao (6.63) implica que a express˜ao de Vext para r À a se reduza a Vext (r À a) = X A(e) n Pn (cos θ) = −E0 r cos θ , n (e) de onde se conclui, usando as rela¸c˜oes de ortogonalidade (6.55) que A1 0, n 6= 1. A Eq. (6.65) passa, ent˜ao, a ser escrita na forma Vext = −E0 r cos θ + X (e) = −E0 e An = Bn(e) r−(n+1) Pn (cos θ) . (6.66) n A condi¸c˜ao 2. exige a continuidade da fun¸c˜ ao potencial em r = a: −E0 a cos θ + X Bn(e) a−(n+1) Pn (cos θ) = X n n A(i) n a Pn (cos θ) . n Da equa¸c˜ ao anterior resulta (e) −E0 a + e B1 (i) = A1 a , n = 1 a2 (6.67) (e) Bn n (6.68) = A(i) n a , n 6= 1 . an+1 Usando ainda as express˜oes de Vint [Eq. (6.64)] e de Vext [Eq. (6.66)], a condi¸c˜ ao de fronteira 4. conduz `as seguintes equa¸c˜oes em r = a: (e) (i) ²r A1 = −E0 − 2 B1 , n=1 a3 (6.69) (e) n−1 n ²r A(i) = −(n + 1) n a Bn , n 6= 1 . an+2 (6.70) n 6= 1 . (6.71) As eqs. (6.68) e (6.70) permitem concluir que Bn(e) = A(i) n = 0, Por outro lado, resolvendo o sistema formado pelas eqs. (6.67) e (6.69), obt´em-se 3E0 2 + ²r ²r − 1 E 0 a3 . ²r + 2 (i) = − (6.72) (e) = (6.73) A1 B1 ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 177 Podemos confirmar que a solu¸c˜ ao obtida satisfaz automaticamente a condi¸c˜ ao de fronteira 5. Estamos finalmente em condi¸c˜ oes de escrever os potenciais no interior e no exterior. Substituindo os resultados (6.71), (6.72) e (6.73) nas express˜oes (6.64) e (6.66), os potenciais tomam as formas Vint (r, θ) = − 3E0 r cos θ ²r + 2 Vext (r, θ) = −E0 r cos θ + r≤a ²r − 1 a3 E0 cos θ ²r + 2 r2 (6.74) r ≥ a. (6.75) O campo el´ectrico no interior obt´em-se mais facilmente em coordenadas cartesianas, no0 z e o campo el´ectrico ´e tando que r cos θ = z. Vem, ent˜ ao, Vint = − ²3E r +2 Eint = −∇Vint = 3E0 ˆ 3 k= E0 . ²r + 2 ²r + 2 (6.76) O campo no interior da esfera diel´ectrica ´e constante, paralelo ao campo exterior inicialmente existente, mas menos intenso do que este, pois ²r > 1. O vector polariza¸c˜ ao ´e [ver (5.20) e (5.22)] ² −1 3 ²0 E0 . (6.77) P = (²r − 1) ²0 Eint = r ²r + 2 Este vector ´e constante e, por isso, para obter o momento dipolar da esfera diel´ectrica, p, basta multiplic´a-lo pelo volume da esfera: p = 4 π ²0 a3 ²r − 1 E0 . ²r + 2 (6.78) O potencial criado pela esfera polarizada num ponto exterior ´e [ver (4.8)] Vdip = p · rˆ 4π²0 r2 = ²r − 1 a3 E0 cos θ , ²r + 2 r2 tendo-se utilizado o valor do momento dipolar dado por (6.78). Esta parcela ´e exactamente a que se acrescenta ao potencial inicial, −E0 z, para obter o potencial no exterior da esfera [ver (6.75)]. O potencial no exterior pode, pois, ser escrito na forma Vext = −E0 z + Vdip . O campo el´ectrico no exterior da esfera ´e Eext = −∇Vext à ²r − 1 2a3 = E0 cos θ 1 + ²r + 2 r3 ! à ² − 1 2a3 ˆ r + E0 sin θ −1 + r e ²r + 2 r3 ! ˆθ . e Para r À a, ˆ r − E0 sin θ e ˆ θ = E0 . Eext = E0 cos θ e As linhas do campo el´ectrico E para uma esfera diel´ectrica num campo uniforme est˜ao representadas na Figura 6.6. ´ interessante acrescentar um coment´ E ario relativamente ao campo el´ectrico no interior da esfera. Este campo, Eint , tem duas contribui¸c˜ oes: o campo E0 e o campo local criado pela distribui¸c˜ao de cargas de polariza¸c˜ ao: Eint = E0 + Elocal . 178 • ´tico Campo electromagne Figura 6.6. Linhas de campo el´ ectrico para esfera diel´ ectrica colocada numa regi˜ ao onde existia um campo el´ ectrico uniforme E0 . Usando a express˜ao (6.76) para o campo no interior, obtemos Elocal = 1 − ²r 3 E0 − E0 = E0 . ²r + 2 ²r + 2 Atendendo a (6.77) pode escrever-se o campo local em fun¸c˜ ao do vector polariza¸c˜ ao: Elocal = − P 3²0 . Note-se que este ´e precisamente o resultado (5.10). De um modo geral, µ Elocal = −N P ²0 ¶ , onde N ´e o chamado factor de despolariza¸c˜ ao. 6.5 ˜ DA EQUAC ˜ DE LAPLACE EM COORDENADAS SOLUC ¸ AO ¸ AO ´ CILINDRICAS Comecemos por escrever a equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas cil´ındricas (ver Apˆendice B): µ ¶ ∂V 1 ∂2V ∂2V 1∂ 2 r + 2 + = 0. (6.79) ∇ V = r ∂r ∂r r ∂φ2 ∂z 2 Aplicando, de novo, o m´etodo de separa¸c˜ ao de vari´ aveis, procuram-se solu¸c˜ oes da forma V (r, φ, z) = R(r) Φ(φ) Z(z) . (6.80) Substituindo a express˜ao (6.80) na Eq. (6.79) e dividindo por V , obt´em-se a seguinte equa¸c˜ ao: µ 1 1 d dR r R r dr dr ¶ + 1 1 d2 Φ 1 d2 Z + = 0. Φ r2 dφ2 Z dz 2 ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 179 As duas primeiras parcelas n˜ao dependem de z e a u ´ltima s´o depende de z, pelo que cada uma das partes referidas tem de ser igual a uma constante: 1 d2 Z = k2 Z(z) dz 2 e µ 1 1 d dR r R r dr dr ¶ + 1 1 d2 Φ = ξ2 . Φ r2 dφ2 (6.81) Como k 2 + ξ 2 = 0, tem-se que k 2 = −ξ 2 . Multiplicando ambos os membros de (6.81) por r2 , a equa¸c˜ao resultante cont´em uma parte que s´o depende de r e outra que s´o depende de φ: µ 1 d dR r r R dr dr ¶ + k2 r2 + 1 d2 Φ = 0. Φ dφ2 (6.82) Au ´ltima parcela ´e igual a uma constante, que designamos por −η 2 . Supomos que k, ξ e η s˜ ao parˆametros reais. Com a constante assim escolhida, Φ ´e uma fun¸c˜ ao peri´odica, o que garante que a fun¸c˜ao potencial satisfaz V (r, φ, z) = V (r, φ + 2π, z). A dependˆencia da solu¸c˜ao nas vari´aveis z e φ ´e determinada, respectivamente, pelas equa¸c˜ oes: d2 Z − k2 Z = 0 , dz 2 que admite solu¸c˜oes das formas (6.33) ou (6.34) e d2 Φ + η2 Φ = 0 , dφ2 (6.83) que admite solu¸c˜oes das formas (6.31) ou (6.32). Desenvolvendo a parte radial em (6.82) e igualando-a a η 2 , resulta a seguinte equa¸c˜ ao para r: à ! d2 R 1 dR η2 2 + + k − 2 R = 0. (6.84) dr2 r dr r Introduzindo a vari´avel x = kr (ent˜ ao dR dr = k dR c˜ ao anterior transforma-se em dx ), a equa¸ à η2 d2 R 1 dR + 1 − + dx2 x dx x2 ! R = 0, que ´e a equa¸c˜ao de Bessel. As suas solu¸c˜ oes s˜ao as fun¸c˜ oes de Bessel de ordem η. H´a muitas situa¸c˜oes em que, devido `a simetria do problema, a solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace assume uma forma mais simples. Referimo-nos ao caso em que n˜ao h´a dependˆencia em z, pelo que o potencial ´e da forma V = V (r, φ), ou seja, s´o depende das coordenadas polares. Nesse caso, procuram-se solu¸c˜ oes da forma V (r, φ) = R(r) Φ(φ) e, na Eq. (6.81), o segundo membro ´e nulo, pois ξ 2 = −k 2 = 0. A Eq. (6.83) continua v´alida e tem solu¸c˜ao da forma [ver (6.31) ou (6.32)] Φ = A cos(ηφ) + B sin(ηφ) ou, equivalentemente, Φ = A0 eiηφ + B 0 e−iηφ . (6.85) 180 • ´tico Campo electromagne Para garantir a periodicidade de Φ(φ) [e.g. Φ(0) = Φ(2π)], η s´ o pode ser nulo ou inteiro2 . Passaremos, ent˜ao, a designar η, de forma mais sugestiva, por n. A equa¸c˜ao para r obt´em-se fazendo k 2 = 0 em (6.84): d2 R 1 dR n2 + − 2 R = 0, dr2 r dr r (6.86) que admite solu¸c˜oes da forma R(r) = C rn + D r−n , v´ alidas para n 6= 0 . (6.87) Sugere-se ao leitor que verifique, por substitui¸c˜ ao, que (6.87) ´e de facto solu¸c˜ ao de (6.86). A express˜ao geral do potencial, para n 6= 0, escreve-se na forma V (r, φ) = ∞ X £ ¤ [An cos(nφ) + Bn sin(nφ)] Cn rn + Dn r−n . n=1 Consideremos a solu¸c˜ao que corresponde a n = 0. A solu¸c˜ ao em φ ´e, neste caso, V = Φ = A + Bφ . Se se exigir a periodicidade de Φ, ent˜ ao B = 0. A solu¸c˜ ao em r ´e obtida da equa¸c˜ ao d2 R 1 dR 1 d = + 2 dr r dr r dr da qual se conclui que µ dR r dr µ r dR dr ¶ = 0, ¶ = k1 e, portanto, R = k1 lnr + k2 sendo k1 e k2 constantes. Finalmente, a solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas cil´ındricas (peri´odica em φ), quando n˜ao h´a dependˆencia da coordenada z, ´e V (r, φ) = A0 + B0 ln r + ∞ X £ ¤ [An cos(nφ) + Bn sin(nφ)] Cn rn + Dn r−n . (6.88) n=1 Tˆem-se as seguintes rela¸c˜oes de ortogonalidade [cf. (6.43)], muito u ´teis na determina¸c˜ ao dos coeficientes An e Bn em situa¸c˜oes concretas: Z 2π 0 Z 2π 0 sin(nφ) sin(mφ) dφ = Z 2π 0 sin(nφ) cos(mφ) dφ = 0 . cos(nφ) cos(mφ) dφ = π δnm , n, m 6= 0 (6.89) (6.90) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a E y a • 181 0 r P f x Figura 6.7. Cilindro condutor colocado numa regi˜ ao onde existia inicialmente um campo el´ ectrico uniforme E0 . Exemplo 6.8: Condutor cil´ındrico em campo uniforme Considere-se um condutor cil´ındrico infinito de raio a ligado `a terra e colocado numa regi˜ao onde existe um campo el´ectrico uniforme, E0 = E0ˆi, perpendicular ao eixo do cilindro, o qual ´e coincidente com a direc¸c˜ao z. A situa¸c˜ ao est´a representada na Figura 6.7. As condi¸c˜oes de fronteira a satisfazer s˜ao: para r = a, V (r = a, φ) = 0 (6.91) V (r → ∞, φ) = −E0 x = −E0 r cos φ , (6.92) e, para r À a (r → ∞), que ´e uma express˜ao idˆentica a (6.56), com z substitu´ıdo por x e θ por φ. Esta u ´ltima condi¸c˜ ao implica que no somat´orio em (6.88) interesse apenas o termo com n = 1. Ambas as condi¸c˜ oes de fronteira implicam que, n˜ao havendo termos constantes, e n˜ao havendo dependˆencia em sin φ ou qualquer dependˆencia logar´ıtmica, se tenha3 A0 = B0 = B1 = 0. Para grandes distˆancias, a solu¸c˜ao geral (6.88) fica reduzida a V (r À a, φ) = A1 C1 r cos φ . A condi¸c˜ao (6.92) implica que A1 C1 = −E0 . Para r = a o potencial ´e µ D1 V (a, φ) = A1 cos φ C1 a + a 2 ¶ = 0, Acrescente-se que a Eq. (6.84) s´ o tem solu¸co ˜es “bem comportadas” para η inteiro. Esta argumenta¸ca ˜o est´ a, digamos, baseada na intui¸c˜ ao f´ısica. Na realidade, a redu¸ca ˜o do somat´ orio em (6.88) a n = 1 ´e matematicamente justific´ avel. Tal como se fez no Exemplo 6.7, se consider´ assemos todos os termos de (6.88), seriam as condi¸co ˜es de fronteira (6.91) e (6.92) a seleccionar, atrav´es das rela¸co ˜es de ortogonalidade (6.89) e (6.90), n˜ ao s´ o n = 1, mas tamb´em Bn = 0, para qualquer n, e A0 = B0 = 0. Deixamos este tratamento matem´ atico completo como exerc´ıcio para o leitor, salientando que a parte da solu¸ca ˜o geral (6.88) que estamos a considerar ´e a relevante. De facto, o potencial (6.93) que se vai determinar verifica as condi¸co ˜es de fronteira e, pelo teorema da unicidade, ´e a solu¸ca ˜o do problema. 3 182 • ´tico Campo electromagne para qualquer valor de φ. A condi¸c˜ao (6.91) implica que A1 C1 a + A1 D1 =0 a A1 D1 = −a2 A1 C1 = a2 E0 . → Finalmente, à V (r, φ) = −E0 r cos φ a2 1− 2 r ! . (6.93) Quanto ao campo el´ectrico, ´e obtido calculando o gradiente de (6.93): ˆr E = −∇V = −e ∂V 1 ∂V ˆφ −e . ∂r r ∂φ Efectuando as opera¸c˜oes de deriva¸c˜ao da fun¸c˜ ao (6.93) encontra-se4 E = E0 ˆi + 6.6 6.6.1 a2 E0 ˆ r cos φ + e ˆ φ sin φ) . (e r2 PROBLEMAS RESOLVIDOS Linha carregada e plano condutor Quest˜ ao Uma linha infinita, carregada com densidade linear de carga constante λ, est´a colocada paralelamente a um plano condutor ligado `a terra, e `a distˆancia a deste. Calcular o potencial em todos os pontos e a for¸ca por unidade de comprimento exercida sobre a linha carregada. Resposta Considere-se a Figura 6.8, onde a situa¸c˜ ao est´a representada. O condutor ´e espesso e, por isso, para x < 0, o potencial ´e nulo. A condi¸c˜ ao de fronteira ´e que o potencial seja zero sobre o plano x = 0. A linha de carga, perpendicular ao plano do papel, localiza-se paralelamente ao eixo z, passando pelo ponto (x = a, y = 0). O problema consiste em determinar o potencial electrost´atico para x > 0 e ´e conveniente, para a situa¸c˜ao apresentada, utilizar o m´etodo das imagens. Note-se que, se considerarmos uma linha infinita de carga fict´ıcia, de sinal contr´ ario `a da linha de carga real, e paralela a esta, localizada em (x = −a, y = 0), o conjunto das duas distribui¸c˜ oes (a real e a “imagem”) garante que o potencial sobre x = 0 seja nulo, observando-se assim a condi¸c˜ ao de fronteira. Veja-se, de resto, a semelhan¸ca deste problema com o Exemplo 6.1. O potencial criado por uma linha infinita de carga de densidade λ, num ponto `a distˆancia r da linha, ´e µ r0 λ ln V (r) = 2π²0 r ¶ , onde r0 ´e a distˆancia da linha de carga ao ponto de referˆencia onde o potencial ´e zero. O potencial criado pelas duas distribui¸c˜ oes lineares de carga num ponto P pode ser escrito · µ λ r0 V = ln 2π²0 r 4 ˆ = (e ˆ r cos φ − e ˆ φ sin φ). Nota: i ¶ − ln µ 0 ¶¸ r 0 r0 , (6.94) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 183 y P ( x ,y ,z ) r' r l l a x a c o n d u to r v a z io Figura 6.8. Linha carregada uniformemente e condutor plano ligado ` a terra. onde r e r0 s˜ao, respectivamente, as distˆancias do ponto P `as linhas de carga real e de carga fict´ıcia. Por outro lado, r0 e r00 , s˜ao as distˆancias das linhas de carga ao ponto de referˆencia a potencial nulo. No presente caso qualquer ponto do plano ligado `a terra pode servir de referˆencia e, qualquer que seja o ponto escolhido, verifica-se sempre r0 = r00 . A express˜ao (6.94) simplifica-se, reduzindo-se a µ r0 λ ln V = 2π²0 r ¶ . Em coordenadas cartesianas, Ãp λ (x + a)2 + y 2 V (x, y) = ln p 2π²0 (x − a)2 + y 2 ! . O potencial n˜ao depende de z, uma vez que as “distribui¸c˜ oes de carga” s˜ao infinitas segundo z, e satisfaz V (x = 0, y) = 0, como se tinha de garantir. A distribui¸c˜ao de carga real induz no plano ligado `a terra uma densidade superficial de carga que produz, na regi˜ao x > 0, um campo el´ectrico igual ao que seria produzido pela carga-imagem. Assim, o campo el´ectrico experimentado pela carga real ´e exactamente o campo el´ectrico que seria produzido pela linha de carga fict´ıcia nos pontos (a, 0, z) e que ´e E=− λ ˆi = − λ ˆi . 2π²0 (2a) 4π²0 a A for¸ca exercida sobre a carga Q, existente no comprimento L de fio, ´e F = −Q λ ˆ i 4π²0 a e, como Q = λ L, a for¸ca por unidade de comprimento do fio ´e F L =− λ2 ˆ i. 4π²0 a 184 • ´tico Campo electromagne 6.6.2 Cavidade esf´ erica em condutor Quest˜ ao Considerar uma carga pontual Q no interior de uma cavidade esf´erica de um condutor ligado `a terra. A cavidade tem raio a e a carga Q encontra-se `a distˆancia b do seu centro, conforme mostra a Figura 6.9. a) Mostrar que o campo dentro da cavidade ´e o mesmo que existiria se o condutor fosse retirado e uma carga Q0 = −aQ/b fosse colocada `a distˆancia D = a2 /b do centro da cavidade, verificando que o potencial V criado por Q e Q0 sobre a superf´ıcie esf´erica ´e constante; b) Calcular a for¸ca exercida sobre Q; c) Calcular a densidade superficial de carga na superf´ıcie interna de cavidade esf´erica. a O Q Q ' b D Figura 6.9. Cavidade esf´ erica em condutor com carga no seu interior. Resposta Considere-se um ponto P no interior da cavidade, e seja r o raio vector desse ponto relativamente ao centro. Conforme se indica na Figura 6.10, designando por r1 e por r2 as distˆancias das cargas real, Q, e fict´ıcia, Q0 , ao ponto P, o potencial nesse ponto ´e dado por · V = ¸ 1 Q Q0 + . 4π²0 r1 r2 (6.95) a) Designando por b e por D os vectores posicionais das cargas Q e Q0 , respectivamente, em rela¸c˜ao ao centro da cavidade, e sendo θ o ˆangulo que r faz com a direc¸c˜ ao comum destes vectores, tem-se (ver Figura 6.10) donde, r1 = e D + r2 = r , b2 + r2 − 2rb cos θ e r2 = p b + r1 = r p D2 + r2 − 2rD cos θ . ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 185 P r r O r 2 1 q b Q D Q ' Figura 6.10. Esquema vectorial relativo ` a situa¸ c˜ ao apresentada na Figura 6.9. Substituindo estas express˜oes em (6.95) e usando para D e Q0 os valores dados no enunciado, isto ´e, aQ Q0 = − (6.96) b e a2 , (6.97) D= b vem · V = a/b Q 1 √ −√ 2 2 2 2 4π²0 b + r − 2rb cos θ D + r − 2rD cos θ ¸  = Q  1 √ −r  2 2 4π²0 b + r − 2rb cos θ  .  1 a2 + ³ br a ´2  (6.98) − 2rb cos θ Fazendo r = a na express˜ao anterior, obt´em-se V = 0, para qualquer valor de θ, que ´e exactamente o valor que o potencial deve ter sobre a superf´ıcie da cavidade esf´erica. Fica assim provado que a carga fict´ıcia Q0 , com o valor (6.96), localizada no ponto determinado por (6.97), “simula” o efeito da cavidade do condutor ligado `a terra; b) A for¸ca que a superf´ıcie esf´erica condutora exerce sobre Q pode ser obtida calculando a for¸ca que a carga Q0 exerce sobre a carga Q. Tal for¸ca ´e, em m´odulo, dada por F = Q E0 , sendo E 0 o campo el´ectrico criado pela carga Q0 no ponto onde est´a Q. Assim, F =Q aQ/b Q2 ab = . 4π²0 (D − b)2 4π²0 (a2 − b2 )2 A for¸ca que se exerce em Q tem a direc¸c˜ ao e o sentido dos vectores b ou D ; 186 • ´tico Campo electromagne c) A densidade de carga superficial determina-se a partir da divergˆencia superficial do campo el´ectrico: ˆ · (E2 − E1 ) . σ = ²0 n ˆ = −e ˆ r , o campo E2 ´e o campo na cavidade e E1 ´e o campo no condutor, Escolhendo n o qual ´e nulo. A densidade superficial de carga ´e, pois, σ = −²0 Er (a, θ) , (6.99) sendo Er obtido a partir do gradiente do potencial (6.98):           Er (r, θ) = − ∂V Q r − b cos θ b2 r/a2 − b cos θ = − ¸3/2  . · ³ ´2 ∂r 4π²0    (b2 + r2 − 2rb cos θ)3/2 br     a2 + a − 2rb cos θ Fazendo r = a na express˜ao anterior e substituindo em (6.99), obt´em-se a densidade σ, σ=− Q(a2 − b2 ) . 4πa(a2 + b2 − 2ab cos θ)3/2 (6.100) Refira-se a grande semelhan¸ca entre estes resultados e os obtidos no Exemplo 6.2. 6.6.3 “Iglu” ligado ` a terra Quest˜ ao O condutor que se esquematiza na Figura 6.11 ´e uma superf´ıcie plana infinita, excepto numa zona hemisf´erica de raio a, fazendo lembrar um iglu, e encontra-se ao potencial V = 0. Calcular a for¸ca que o condutor exerce numa carga pontual Q, colocada `a distˆancia d acima do centro do bojo esf´erico. Q a Figura 6.11. Arranjo com um condutor semi-esf´ erico sobre um condutor plano. ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 187 Resposta Comecemos por considerar o bojo esf´erico do condutor. Vimos no Exemplo 6.2 que o condutor esf´erico ligado `a terra na presen¸ca de uma carga Q ` a distˆancia d do centro da esfera pode ser substitu´ıdo por uma carga fict´ıcia de valor −Qa/d, colocada num ponto `a distˆancia d0 = a2 /d do centro e sobre a linha que une o centro `a carga real [Eq. (6.16)]. Na presente situa¸c˜ao, teremos de considerar uma distribui¸c˜ ao de cargas fict´ıcias que anule o potencial, quer sobre a parte plana do condutor, quer sobre o “iglu”. Representa-se na Figura 6.12 essa distribui¸c˜ ao de cargas. Q Q ' Q ''= Q '''= Q ' Q Figura 6.12. Arranjo de cargas, real e fict´ıcias, que permite obter V = 0 sobre a superf´ıcie condutora da Figura 6.11. As cargas Q (real) e Q0 (fict´ıcia) produzem um potencial nulo sobre toda a esfera: sobre a parte de cima (a cheio), que ´e a que corresponde ao condutor real; mas tamb´em sobre a parte de baixo (a tracejado), que diz respeito a uma zona fora da regi˜ao que interessa considerar. Colocando duas outras cargas fict´ıcias de valores Q00 = −Q0 e Q000 = −Q em posi¸c˜ oes sim´etricas das posi¸c˜oes de Q0 e Q, respectivamente, em rela¸c˜ ao ao plano horizontal, ´e evidente que o novo conjunto de cargas produz tamb´em potencial nulo sobre toda a superf´ıcie esf´erica, em particular sobre a parte de cima da esfera, o bojo que design´amos por “iglu”. Al´em disso, pelo facto de terem valores sim´etricos duas a duas e estarem colocadas simetricamente relativamente ao plano horizontal, as quatro cargas produzem igualmente potencial nulo sobre todos os pontos do plano horizontal. Em resumo, dada a carga Q `a distˆancia d do centro e o condutor, com a forma indicada, ao potencial nulo, o efeito deste pode ser substitu´ıdo pelas seguintes cargas-imagem, colocadas fora da regi˜ao onde se pretende calcular o campo el´ectrico, sobre a linha que cont´em Q, e que passa pelo centro do bojo esf´erico: • carga de valor Q0 = −Qa/d colocada `a distˆancia d0 = a2 /d acima do plano horizontal; • carga de valor Q00 = −Q0 = Qa/d colocada `a distˆancia d00 = a2 /d abaixo do plano horizontal; • carga de valor Q000 = −Q colocada `a distˆancia d000 = d abaixo do plano horizontal. 188 • ´tico Campo electromagne A for¸ca que as cargas induzidas na superf´ıcie condutora ligada `a terra exercem sobre a carga real Q ´e obtida a partir das for¸cas exercidas sobre esta carga pelas cargas fict´ıcias: · F = ¸ Q Q0 Q00 Q000 + + . 4π²0 (d − d0 )2 (d + d00 )2 (2d)2 Substituindo as cargas e as distˆancias pelos valores atr´as indicados obt´em-se a express˜ao do m´odulo da for¸ca exercida sobre Q, · ¸ Q Qad Qad Q F = − 2 − 2 , 2 2 2 2 2 4π²0 (d + a ) (d − a ) 4d que aponta para o centro do bojo esf´erico do condutor. 6.6.4 Uma solu¸c˜ ao particular da equa¸c˜ ao de Laplace Quest˜ ao Mostrar que a equa¸c˜ao de Laplace pode admitir solu¸c˜ oes da forma X(x) + Y (y) + Z(z) e explicitar as condi¸c˜oes para que tal aconte¸ca. Resposta A equa¸c˜ao de Laplace ∇2 V = 0 ´e escrita, em coordenadas cartesianas, na forma ∂2V ∂2V ∂2V + + = 0. ∂x2 ∂y 2 ∂z 2 (6.101) Considerando a seguinte forma para o potencial: V (x, y, z) = X(x) + Y (y) + Z(z) , e inserindo-a em (6.101), obt´em-se d2 X d2 Y d2 Z + + = 0. dx2 dy 2 dz 2 Em princ´ıpio, o primeiro termo desta express˜ao s´o pode depender de x; o segundo s´o pode depender de y e o terceiro pode apenas depender de z. Mas, para que a sua soma dˆe zero, nem sequer pode haver dependˆencias nas vari´ aveis indicadas: cada uma das parcelas ter´a de ser uma constante, pelo que a equa¸c˜ ao anterior pode ser escrita na forma c1 + c2 + c3 = 0 , sendo d2 X dx2 d2 Y dy 2 d2 Z dz 2 = c1 = c2 = c3 . (6.102) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 189 Resolvendo cada uma destas equa¸c˜ oes diferenciais, obt´em-se X(x) = Y (y) = Y (z) = c1 2 x + c01 x + c001 2 c2 2 y + c02 y + c002 2 c3 2 z + c03 z + c003 , 2 ao. Est´a, pois, provado que a soma em que c0i , c00i , i = 1, 2, 3, s˜ao constantes de integra¸c˜ X(x) + Y (y) + Z(z) ´e solu¸c˜ao da equa¸c˜ ao de Laplace, desde que as constantes ci , i = 1, 2, 3, satisfa¸cam a condi¸c˜ao (6.102). Quanto `as constantes c0i e c00i , podem ter quaisquer valores. 6.6.5 Resistˆ encia paralelepip´ edica Quest˜ ao Uma resistˆencia paralelepip´edica com bases rectangulares de lados a e b tem comprimento L e ´e feita de um material com condutividade χ0 . Entre as bases aplica-se uma d.d.p. de valor V0 . Calcular a fun¸c˜ao potencial no interior da resistˆencia. Resposta A resistˆencia est´a representada na Figura 6.13. z a b x y L Figura 6.13. Resistˆ encia paralelepip´ edica. A corrente entra pela face y = L e sai pela face y = 0, tendo, portanto, em todo o condutor, a direc¸c˜ao do eixo y. O fluxo de corrente para o exterior atrav´es das faces laterais ´e nulo, pelo que ∂V ˆ · ∇V = = 0, n ∂n ˆ a normal a cada uma das faces laterais. As condi¸c˜ sendo n oes de fronteira s˜ao, pois: y=0 → V =0 y = L → V = V0 ∂V x=0ex=a → =0 ∂x ∂V z=0ez=b → = 0. ∂z (6.103) (6.104) (6.105) (6.106) 190 • ´tico Campo electromagne Este conjunto de condi¸c˜oes de fronteira sugere que se procure para o potencial uma solu¸c˜ ao do tipo5 (6.35): V = (A + Bx) (C + Dy) (E + F z) . Para se satisfazerem as duas u ´ltimas condi¸c˜ oes de fronteira, as constantes B e F tˆem de ser nulas. A solu¸c˜ao ter´a, pois, a forma mais restrita V (y) = C 0 + D0 y , sendo C 0 e D0 novas constantes. A Eq. (6.103) imp˜oe C 0 = 0. Finalmente, para que se verifique (6.104), ter´a de ser D0 = V0 /L. Ent˜ ao, V (y) = V0 y, L na regi˜ao 0 ≤ x ≤ a, 0 ≤ y ≤ L e 0 ≤ z ≤ b. O campo el´ectrico ´e dado por E=− 6.6.6 dV ˆ V j = − 0 jˆ . dy L Potencial num condutor plano Quest˜ ao Uma folha rectangular de material condutor com condutividade χs tem dois lados ligados `a terra, como se mostra na Figura 6.14. Estes lados do rectˆangulo s˜ao constitu´ıdos por um metal perfeitamente condutor (χ → ∞). Aplicam-se aos outros lados da folha os potenciais: x a y V (y) = V0 b V (x) = V0 para y=b e 0≤x≤a para x = a e 0 ≤ y ≤ b. Calcular a fun¸c˜ao potencial em todos os pontos da folha. Resposta As condi¸c˜oes de fronteira s˜ao: V (x = 0, y) = 0 (6.107) V (x, y = 0) = 0 (6.108) V (x, y = b) = V0 x/a (6.109) V (x = a, y) = V0 y/b . (6.110) A solu¸c˜ao para o potencial, sugerida por estas condi¸c˜ oes de fronteira, ´e da forma V (x, y) = (A + Bx) (C + Dy) . 5 Na Sec¸ca ˜o 6.3 foram apresentadas algumas solu¸co ˜es particulares da equa¸ca ˜o de Laplace, em coordenadas cartesianas, com as vari´ aveis separadas. Essas n˜ ao s˜ ao as solu¸co ˜es mais gerais da equa¸c˜ ao diferencial, de segunda ordem, ` as derivadas parciais. N˜ ao h´ a propriamente uma regra que permita saber qual ´e o tipo de solu¸ca ˜o que deve ser procurado. Conhecidas as condi¸co ˜es de fronteira, s´ o a intui¸ca ˜o e uma pr´ atica de abordagem destas quest˜ oes podem ajudar na busca da solu¸ca ˜o. Note-se que, partindo de um dado tipo de solu¸ca ˜o, se for poss´ıvel satisfazer todas as condi¸co ˜es de fronteira, ent˜ ao a solu¸ca ˜o assim encontrada ´e u ´nica, de acordo com o teorema da unicidade. ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 191 y b a x Figura 6.14. Condutor plano do Problema 6.6.6. De (6.107) conclui-se que A = 0 e de (6.108) conclui-se que C = 0. O potencial ´e, pois, da forma V (x, y) = E x y . A constante E = BD ´e determinada a partir das condi¸c˜ oes de fronteira (6.109) e (6.110), e ´e dada por V0 /(ab). A express˜ao para o potencial assume, ent˜ ao, a forma V (x, y) = V0 xy ab na regi˜ao 0 ≤ x ≤ a e 0 ≤ y ≤ b. 6.6.7 Cavidade em U num condutor Quest˜ ao Considerar uma lˆamina espessa de um condutor infinito, ligado `a terra, contendo uma cavidade de sec¸c˜ao rectangular, como mostra a Figura 6.15. Aplica-se, em y = b e 0 ≤ x ≤ a o potencial Vap (x) = V0 sin(πx/a). Calcular a fun¸c˜ ao potencial no interior da cavidade. y b 0 a Figura 6.15. Condutor com cavidade em forma de U. x 192 • ´tico Campo electromagne Resposta As condi¸c˜oes de fronteira s˜ao: V (x = 0, y) = 0 para 0 ≤ y ≤ b (6.111) V (x, y = 0) = 0 para 0 ≤ x ≤ a (6.112) V (x = a, y) = 0 πx V (x, y = b) = V0 sin a para 0 ≤ y ≤ b (6.113) para 0 ≤ x ≤ a . (6.114) As trˆes primeiras condi¸c˜oes de fronteira dizem respeito `as paredes laterais e `a base da cavidade. O potencial no interior da cavidade dever´ a ter uma forma semelhante a (6.36), que ´e uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao de Laplace em coordenadas cartesianas com vari´ aveis separadas e sem dependˆencia em z: V (x, y) = ∞ X [An cos(βn x) + Bn sin(βn x)] β y × (Cn e n + Dn e−βn y ) . (6.115) n=1 Relativamente a (6.36), estamos agora a considerar a dependˆencia exponencial na vari´ avel y e a oscilat´oria na vari´avel x, como ´e sugerido pela condi¸c˜ ao (6.114). A condi¸c˜ao de fronteira (6.111), que se refere a x = 0, implica que todas as constantes An em (6.115) se anulem: An = 0 . A condi¸c˜ao de fronteira (6.112) — para y = 0 — conduz a X Bn sin(βn x) (Cn + Dn ) = 0 , n donde, Dn = −Cn . A condi¸c˜ao de fronteira (6.113) — para x = a — conduz `a express˜ao X ³ ´ En sin(βn a) eβn y − e−βn y = 0 , n onde se introduziu a constante En = Bn Cn . A equa¸c˜ ao anterior implica sin(βn a) = 0 , donde, nπ . a O potencial pode, ent˜ao, ser escrito na forma βn = V (x, y) = X n µ En sin nπ x a ¶³ e nπ y a − e− nπ y a ´ = X µ En sin n ¶ nπ x a µ 2 sinh nπ y a ¶ . (6.116) Falta implementar a condi¸c˜ao de fronteira (6.114) — para y = b —, a qual permite escrever µ V0 sin πx a ¶ = X n µ En sin ¶ nπ x a µ 2 sinh ¶ nπ b a . (6.117) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 193 Esta express˜ao deixa antever que apenas o termo n = 1 ´e diferente de zero e, portanto, E1 = V0 ³ 2 sinh πb a ´. Utilizando estes resultados em (6.116), tem-se, finalmente, µ V0 πx ³ ´ sin V (x, y) = πb a sinh a ¶ µ ¶ πy sinh a , que ´e o potencial na regi˜ao definida por 0 ≤ x ≤ a, 0 ≤ y ≤ b e, evidentemente, qualquer valor de z. O resultado n = 1, sugerido pela igualdade (6.117), pode ser obtido formalmente multiplicando ambos os membros dessa equa¸c˜ ao por sin(mπx/a), integrando sobre x de 0 a a, e usando a rela¸c˜ao de ortogonalidade (6.43). 6.6.8 Potencial numa cavidade Quest˜ ao Uma cavidade infinita segundo o eixo z ´e delimitada pelas superf´ıcies indicadas na Figura 6.16. Determinar o potencial no interior da cavidade, sabendo que as condi¸c˜ oes de fronteira a que obedece s˜ao as seguintes: V ∂V ∂x ∂V ∂x = 0 = 0 µ = V0 sin πy b para y = 0 e y = b , (6.118) para x = 0 , (6.119) para x = a . (6.120) ¶ y b 0 a x Figura 6.16. Cavidade do Problema 6.6.8. 194 • ´tico Campo electromagne Resposta Vai ser considerada a solu¸c˜ao da equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas cartesianas, com vari´aveis x e y separadas e sem dependˆencia em z, dada por (6.36), que escrevemos: V (x, y) = X [ An cos(βn y) + Bn sin(βn y) ] × (Cn e−βn x + Dn eβn x ) . (6.121) n A escolha da parte oscilante na vari´avel y e da dependˆencia exponencial em x ´e sugerida pela condi¸c˜ao de fronteira (6.120). Poder-se-ia igualmente ter escolhido uma express˜ao da forma (6.115) mas, nesse caso, as quantidades βn seriam imagin´arios puros. A condi¸c˜ao de fronteira (6.118) s´o se pode verificar se em (6.121) se tiver, para qualquer n, (6.122) An = 0 , e X Bn sin(βn b) × (Cn e −βn x + Dn eβn x ) = 0 , n donde se conclui que sin(βn b) = 0 , ou seja, nπ . b βn = (6.123) Usando os resultados (6.122) e (6.123) em (6.121), o potencial passa a ser escrito na forma V (x, y) = X n µ nπ y Bn sin b ¶³ C n e− nπ x b + Dn e nπ x b ´ . (6.124) A derivada parcial desta fun¸c˜ao em ordem a x ´e µ X nπ nπ ∂V = Bn sin y ∂x b b n ¶³ Dn e nπ x b − Cn e− nπ x b ´ . Para x = 0 esta derivada tem de ser nula — ver condi¸c˜ ao de fronteira (6.119) —, ou seja, X nπ n b µ Bn sin nπ y b ¶ (Dn − Cn ) = 0 , donde, Bn Dn = Bn Cn (= En ) . Retomando (6.124), V (x, y) = X µ En sin n nπ y b ¶³ e nπ x b + e− nπ x b ´ . Derivando esta express˜ao em ordem a x, tomando o resultado em x = a, e fazendo uso da condi¸c˜ao de fronteira (6.120), obt´em-se µ ∂V ∂x ¶ µ x=a = V0 sin πy b ¶ = X nπ n b µ En sin nπ y b ¶³ e nπ a b − e− nπ a b ´ . ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 195 As rela¸c˜oes de ortogonalidade (6.43) permitem concluir que no somat´orio do segundo membro apenas o termo n = 1 contribui. A express˜ao anterior passa, pois, a ser escrita na forma µ πy V0 sin b ¶ µ π πy = E1 sin b b donde, E1 = V0 ¶³ e πa b − e− πa b ´ , ´ πa −1 b ³ πa e b − e− b . π A express˜ao do potencial ´e dada por µ V (x, y) = 6.6.9 V0 b πy sin π b ¶ µ πx πx e− b + e b V0 b πy ¡ πa ¢ sin = πa − πa π sinh b b b e −e b ¶ µ cosh πx b ¶ . Potencial no exterior de uma esfera Quest˜ ao A fun¸c˜ao potencial sobre uma superf´ıcie esf´erica n˜ao condutora de raio a ´e da forma 3 Vs = C sin2 θ , 2 (6.125) sendo θ o ˆangulo polar e C uma constante. Calcular a fun¸c˜ ao potencial nos pontos exteriores `a esfera. Resposta Admite-se que no exterior da esfera n˜ao h´a cargas, pelo que o potencial ´e obtido resolvendo a equa¸c˜ao de Laplace. A solu¸c˜ao geral dessa equa¸c˜ ao em coordenadas esf´ericas, no caso em que h´a simetria axial, ´e da forma V (r, θ) = ∞ µ X n=0 Bn An r + n+1 r ¶ n Pn (cos θ) , (6.126) onde {An } e {Bn } s˜ao constantes e Pn (cos θ) s˜ao os polin´omios de Legendre. As condi¸c˜ oes de fronteira que ter˜ao de ser satisfeitas s˜ao: V (r = a) = Vs , V (r → ∞) = 0 . (6.127) (6.128) A ordem dos polin´omios de Legendre ´e dada pelo ´ındice n. Assim, a fun¸c˜ ao sin2 θ em (6.125) pode ser expressa em fun¸c˜ ao dos polin´omios de Legendre at´e ordem 2. De facto, atendendo a que P0 (cos θ) = 1 P1 (cos θ) = cos θ 3 cos2 θ − 1 P2 (cos θ) = , 2 facilmente se verifica que · ¸ 2 1 sin θ = 1 − cos θ = P0 (cos θ) − P2 (cos θ) + P0 (cos θ) 3 3 2 [P0 (cos θ) − P2 (cos θ)] . = 3 2 2 196 • ´tico Campo electromagne A condi¸c˜ao de fronteira (6.127) — v´alida para r = a — implica que se escreva C[P0 (cos θ) − P2 (cos θ)] = ∞ µ X An an + n=0 Bn an+1 ¶ Pn (cos θ) . (6.129) Como os polin´omios de Legendre obedecem `as rela¸c˜ oes de ortogonalidade [ver (6.55)]: Z π 0 Pn (cos θ) Pm (cos θ) sin θ dθ = 2 δnm , 2m + 1 o somat´orio no lado direito de (6.129) s´o pode ter os termos n = 0 e n = 2. Assim, a express˜ao (6.126) passa a ser escrita do seguinte modo: µ B0 B2 V (r, θ) = A0 + + A2 r2 + 3 r r ¶ P2 (cos θ) . (6.130) Atendendo a que V = 0 quando r → ∞ (6.128), vem A0 = A2 = 0 . (6.131) Este resultado permite escrever (6.129) na forma C [1 − P2 (cos θ)] = B0 B2 + 3 P2 (cos θ) , a a donde, B0 = aC e B2 = −a3 C . (6.132) Usando, por fim, (6.131) e (6.132) em (6.130), obtemos a seguinte express˜ao para o potencial: V (r, θ) = Ca 1 Ca3 − (3 cos2 θ − 1) , r 2 r3 v´alida para r ≥ a. 6.6.10 Cilindros coaxiais Quest˜ ao Duas superf´ıcies cil´ındricas coaxiais de raios a e b (a < b) est˜ao aos potenciais V (a) = 0 e V (b) = V0 cos φ, sendo V0 constante e φ a coordenada angular cil´ındrica. Considerando que os cilindros s˜ao muito longos, de modo a poder desprezar os efeitos das extremidades, determinar o potencial em todos os pontos do espa¸co. Obter a distribui¸c˜ ao de carga em cada uma das superf´ıcies cil´ındricas. O potencial ´e nulo quando r → ∞. Resposta A forma geral da solu¸c˜ao da equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas cil´ındricas, quando n˜ao h´a dependˆencia de z, ´e [ver (6.88)] V (r, φ) = A0 + B0 ln r + ∞ X (An rn + Bn r−n ) (Cn cos nφ + Dn sin nφ) . n=1 (6.133) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 197 As condi¸c˜oes de fronteira que tˆem de ser observadas s˜ao: V (r = a, φ) = 0 (6.134) V (r = b, φ) = V0 cos φ (6.135) V (r → ∞) (6.136) = 0. Vamos considerar trˆes regi˜oes: r ≤ a , a ≤ r ≤ b e r ≥ b. Em cada uma das regi˜oes o potencial ´e dado pela express˜ao geral (6.133). Comecemos por analisar a regi˜ao r ≤ a : para que em r = 0 o potencial seja finito, ´e necess´ario que todos os Bn sejam nulos e que B0 seja tamb´em nulo. Por outro lado, ´e necess´ario suprimir a dependˆencia angular em r = a, o que s´o ´e poss´ıvel se todos os coeficientes Cn e Dn em (6.133) se anularem. Finalmente, para garantir potencial nulo em r = a, ´e necess´ario que A0 = 0. Conclui-se assim que o potencial deve ser nulo em toda a regi˜ao considerada: V =0 r ≤ a. Para a regi˜ao entre os dois cilindros, a condi¸c˜ ao de fronteira (6.135) indicia que apenas o termo n = 1 no somat´orio (6.133) deva contribuir para o potencial. Al´em disso, a dependˆencia em seno tem tamb´em de ser suprimida, o que implica que todos os Dn devam ser nulos. Formalmente, estes resultados s˜ao obtidos usando as condi¸c˜ oes de ortogonalidade das fun¸c˜ oes seno e co-seno (6.89) e (6.90): tomando o potencial (6.133) em r = b e igualando a (6.135) obt´em-se A0 + B0 ln b + ∞ X (An bn + Bn b−n ) (Cn cos nφ + Dn sin nφ) = V0 cos φ , n=1 de onde se conclui que, no membro esquerdo, se anulam todos os coeficientes `a excep¸c˜ ao de C1 , ou seja, A0 = B0 = Dn = Cn6=1 = 0. Para a regi˜ao a ≤ r ≤ b podemos, ent˜ ao, reduzir a express˜ao geral do potencial [Eq. (6.133)] a V (r, φ) = (A r + Br−1 ) cos φ . (6.137) Usando novamente as duas condi¸c˜ oes de fronteira (6.134) e (6.135), obt´em-se µ ¶ B cos φ = 0 a µ ¶ B Ab + cos φ = V0 cos φ . b Aa + Da primeira das equa¸c˜oes, A=− e da outra equa¸c˜ao B , a2 µ 1 b B =B − Ab + b b a2 donde, B= (6.138) ¶ V0 a2 b a2 − b2 e, portanto, fazendo uso de (6.138), A=− V0 b . − b2 a2 = V0 , 198 • ´tico Campo electromagne Finalmente, o potencial na regi˜ao entre as superf´ıcies cil´ındricas ´e V0 a2 b V (r, φ) = 2 a − b2 µ 1 r − 2 r a ¶ cos φ a ≤ r ≤ b. Pelos motivos apresentados anteriormente, na regi˜ao r ≥ b o potencial tem de ser da forma (6.137), isto ´e, V (r, φ) = (A0 r + B 0 r−1 ) cos φ , pois s´o assim ´e satisfeita a condi¸c˜ao de fronteira em r = b (A0 e B 0 s˜ao novas constantes a determinar). A constante A0 tem de ser nula para que o potencial n˜ao seja infinito quando r → ∞. Para satisfazer a condi¸c˜ao (6.135), a outra constante ´e B 0 = V0 b. O potencial escreve-se, ent˜ao, V0 b cos φ r ≥ b. V (r, φ) = r Em s´ıntese, o potencial em todo o espa¸co ´e dado por V (r, φ) = 0 µ ¶ V0 a2 b 1 r V (r, φ) = − cos φ a2 − b2 r a2 V0 b cos φ V (r, φ) = r para r ≤ a (6.139) para a ≤ r ≤ b (6.140) para r ≥ b . (6.141) Para se obterem as distribui¸c˜oes de carga nas superf´ıcies cil´ındricas ´e preciso determinar primeiro o campo el´ectrico nas trˆes regi˜oes. • Regi˜ao r < a Nesta regi˜ao o campo ´e nulo, pois o potencial ´e constante. A componente radial do campo el´ectrico, relevante para o c´alculo da distribui¸c˜ ao de cargas, ´e nula na vizinhan¸ca da superf´ıcie cil´ındrica interna: Er (r = a− ) = 0 . (6.142) • Regi˜ao a < r < b Tomando o sim´etrico do gradiente de (6.140), obt´em-se ∂V 1 ∂V ˆr − ˆφ e e ∂r r ∂φ ·µ ¶ µ ¶ ¸ V0 a2 b 1 1 1 1 ˆ ˆ + cos φ er + 2 − 2 sin φ eφ . a2 − b2 r2 a2 r a E = − = As componentes radiais do campo nas vizinhan¸cas das superf´ıcies cil´ındricas, sobre as quais se pretende determinar a distribui¸c˜ ao superficial de cargas, s˜ao Er (r = a+ ) = e Er (r = b− ) = 2V0 b cos φ − b2 a2 V0 (a2 + b2 ) cos φ . b(a2 − b2 ) (6.143) ˜o da equac ˜ o de Laplace Soluc ¸a ¸a • 199 • Regi˜ao r > b O campo el´ectrico ´e obtido a partir de (6.141), resultando E= V0 b ˆ r + sin φ e ˆφ) , (cos φ e r2 pelo que, Er (r = b+ ) = V0 cos φ . b As cargas superficiais s˜ao obtidas a partir da divergˆencia superficial do campo el´ectrico sobre as superf´ıcies cil´ındricas. Sobre r = a, de (6.142) e de (6.143), £ ¤ ˆ r · E (r = a+ ) − E (r = a− ) = ²0 [ Er (a+ ) − Er (a− ) ] σ(r = a) = ²0 e 2 V0 b ²0 cos φ. = a2 − b2 Sobre r = b, σ(r = b) = ²0 [ Er (b+ ) − Er (b− ) ] " # V0 V0 (a2 + b2 ) cos φ − cos φ = ²0 b b(a2 − b2 ) 2 V0 b ²0 = cos φ = −σ(r = a) . b2 − a2 6.6.11 Cabo coaxial Quest˜ ao Um cabo coaxial ´e formado por dois condutores cil´ındricos de raios a e b, `a diferen¸ca de potencial V0 , estando o condutor exterior ligado `a terra. Entre os condutores existe uma substˆancia diel´ectrica de permitividade relativa ²r . Determinar a capacidade por unidade de comprimento do cabo, em fun¸c˜ ao de a, b e ²r . Resposta Come¸camos por obter o potencial na regi˜ao entre os condutores. Esse potencial ´e bem conhecido, pois o sistema ´e um condensador cil´ındrico muito longo. Vamos mostrar que esse resultado pode tamb´em ser obtido a partir da solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas cil´ındricas (note-se que o cabo ´e longo, pelo que n˜ao deve haver dependˆencia do potencial em z): V (r, φ) = A0 + B0 ln r + ∞ X [Cn cos(nφ) + Dn sin(nφ)] (An rn + Bn r−n ) n=1 [cf. Eq. (6.88)]. Al´em de n˜ao depender de z, o potencial tamb´em n˜ao pode depender do ˆangulo φ, pelo que a express˜ao anterior se reduz a V (r) = A0 + B0 ln r . (6.144) O cilindro interior ´e condutor e, por isso, o potencial ´e constante para r ≤ a. Esta constante ´e o valor, V0 , do potencial em r = a: V (a) = V0 = A0 + B0 ln a . (6.145) 200 • ´tico Campo electromagne Em r = b o potencial ´e nulo V (b) = 0 = A0 + B0 ln b , donde, B0 = − A0 . ln b Substituindo em (6.145), obt´em-se µ ¶ V0 = A0 b ln ln b a o que conduz a · A0 = −V0 ln b ln e · , (6.146) µ ¶¸−1 a b µ ¶¸−1 a b B0 = V0 ln . O potencial (6.144) vem, finalmente, µ ¶ r V0 ln V (r) = ln(a/b) b . ˆ r , a qual ´e dada por O campo el´ectrico s´o tem componente segundo o versor e Er = − V0 1 dV =− . dr ln(a/b) r O campo deslocamento, que se relaciona com o campo el´ectrico atrav´es de D = ²0 ²r E , tamb´em s´o tem componente Dr : Dr = −²0 ²r V0 1 . ln(a/b) r A divergˆencia superficial do campo em r = a permite calcular a densidade de carga livre nessa superf´ıcie, obtendo-se V0 1 σ(r = a) = ²0 ²r . ln(b/a) a Na superf´ıcie r = b existe a densidade de carga σ(r = b) = −²0 ²r V0 1 . ln(b/a) b Assim, no comprimento L do cabo, existe, no condutor interior, a carga Q = 2πaLσ(r = a) = 2 π L ²0 ²r V0 ln(b/a) e, no condutor exterior, a carga sim´etrica desta. Como a capacidade do cabo ´e a raz˜ao entre a carga, Q, e a diferen¸ca de potencial, V0 , entre os condutores cil´ındricos, C= 1 Q = 2 π L ²0 ²r , V0 ln(b/a) o valor pretendido para a capacidade do cabo coaxial por unidade de comprimento ´e C 2 π ²0 ²r = . L ln(b/a) (6.147) 202 • ´tico Campo electromagne CAP´ITULO 7 ´ ENERGIA MAGNETICA ´ E MULTIPOLOS MAGNETICOS No Cap´ıtulo 2 foi feita uma breve revis˜ao das leis b´asicas do magnetismo. Na primeira parte deste cap´ıtulo vamos obter a energia associada a um conjunto arbitr´ario de correntes, que s˜ao fonte do campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Os resultados ser˜ao comparados com os que encontr´amos no Cap´ıtulo 3 para a energia do campo electrost´atico. Na segunda parte faremos a decomposi¸c˜ao do potencial vector em multipolos e, tamb´em aqui, confrontaremos os resultados com os que obtivemos antes (Cap´ıtulo 4) para o potencial escalar. 7.1 ENERGIA ARMAZENADA NUM CAMPO ˜ MAGNETICA ´ DE INDUC ¸ AO Consideremos um grupo de N circuitos indeform´aveis ocupando posi¸c˜ oes fixas no espa¸co. Designemos por Cj , j = 1, ..., N cada um desses circuitos e por Ij as respectivas correntes estacion´arias numa situa¸c˜ao final. Usando o m´etodo apresentado no Cap´ıtulo 3, podemos obter a energia armazenada na distribui¸c˜ ao de correntes calculando o trabalho revers´ıvel que ´e necess´ario fornecer ao sistema para que se passe da situa¸c˜ ao em que n˜ao h´a correntes e a energia do sistema ´e considerada nula para a situa¸c˜ ao em que h´a um sistema de correntes no grupo de circuitos. A existˆencia de correntes implica que, na pr´atica, ocorra um aquecimento do sistema devido ao efeito Joule. Para compensar esta energia dissipada ´e necess´ario que as baterias que alimentam os circuitos forne¸cam energia; como n˜ao se trata de trabalho revers´ıvel, n˜ao ser´a considerado, o que equivale a admitir que os circuitos tˆem todos resistˆencia nula, pelo que o efeito Joule n˜ao tem lugar. Designemos por ij a corrente instantˆ anea em cada circuito Cj . Cada uma destas correntes cresce desde zero at´e ao valor final, estacion´ario, Ij . Uma varia¸c˜ ao de ij implica necessariamente uma varia¸c˜ao do fluxo do campo de indu¸c˜ ao magn´etica B atrav´es de uma superf´ıcie 204 • ´tico Campo electromagne que se apoie em Cj . Seja φj esse fluxo e dφj a respectiva varia¸c˜ ao infinitesimal associada ao incremento de corrente dij . A varia¸c˜ ao do fluxo do campo de indu¸c˜ ao magn´etica origina uma corrente induzida no circuito, a qual se op˜oe `a varia¸c˜ ao de ij . Assim, para manter a corrente, a fonte externa tem de criar uma for¸ca electromotriz, Eext , que contrarie a induzida, Eint . Os ´ındices “ext” e “int” significam, respectivamente, “externa” e “interna”. Durante o intervalo de tempo dt o circuito recebe a carga dqj = ij dt e o trabalho que se realiza externamente para contrariar a for¸ca electromotriz induzida, devido `a varia¸c˜ ao de ij , ´e δWext,j = Eext dqj = −Eint dqj = +dqj dφj = ij dφj , dt tendo-se usado a lei de Faraday (2.55). A varia¸c˜ ao infinitesimal da energia magn´etica ´e igual ao trabalho infinitesimal revers´ıvel fornecido ao sistema de circuitos, pelo que podemos escrever, somando sobre todos os circuitos, dUm = N X δWext,j = j=1 N X ij dφj . (7.1) j=1 Note-se que se escreve dUm , pois trata-se de uma diferencial exacta: a energia Um ´e uma fun¸c˜ ao de estado (o ´ındice “m” indica que esta energia ´e magn´etica). Como estamos a admitir que os circuitos s˜ao r´ıgidos e ocupam posi¸c˜ oes fixas, as indutˆancias dos circuitos s˜ao constantes e o fluxo φj apenas pode variar devido `a varia¸c˜ ao das correntes ij , ou seja, dφj = N X Mjk dik , (7.2) k=1 onde Mjk ´e a indutˆancia m´ utua entre os circuitos Cj e Ck , a qual s´o depende das propriedades geom´etricas da distribui¸c˜ao de circuitos e n˜ao das correntes que os percorrem. A Eq. (7.2) pode ser vista como a defini¸c˜ao dos elementos da matriz das indutˆancias. Substituindo (7.2) em (7.1), obtemos dUm = N X Mjk ij dik = j,k=1 N X Ij Mjk Ik f df . (7.3) j,k=1 Para escrever a u ´ltima igualdade da express˜ao anterior, considerou-se que ij (t) = f (t) Ij , sendo f (t) uma fun¸c˜ao que varia entre 0 e 1 e que descreve o aumento das correntes em cada circuito. Considera-se a mesma fun¸c˜ ao para todos os circuitos, o que corresponde a admitir que todas as correntes aumentam da mesma maneira. A dependˆencia temporal de f n˜ao ´e importante, pois a energia do sistema s´o pode depender das correntes que fluem no estado estacion´ario final e n˜ao do modo como esse estado ´e alcan¸cado. Independentemente R da varia¸c˜ao temporal de f (t), verifica-se que 01 f (t)df = 12 , pelo que, por integra¸c˜ ao da express˜ao (7.3), se obt´em Um = Wext = N 1 X Ij Mjk Ik . 2 j,k=1 (7.4) No instante inicial n˜ao h´a correntes e a energia interna ´e considerada nula. O trabalho externo que ´e necess´ario realizar para estabelecer a distribui¸c˜ ao final de correntes ´e igual `a energia magn´etica armazenada no sistema. ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • 205 No caso de um u ´nico circuito, o somat´orio em (7.4) reduz-se a um u ´nico termo, obtendo-se a conhecida express˜ao da energia armazenada numa bobina de indutˆancia L = M11 : Um = 1 L I2 . 2 (7.5) A energia magn´etica pode ainda ser escrita em termos dos fluxos φj , se integrarmos a Eq. P (7.2) e substituirmos o resultado, φj = N k=1 Mjk Ik , em (7.4) Um = N 1X Ij φj . 2 j=1 (7.6) Sublinhamos que n˜ao importa a forma como as correntes finais s˜ao alcan¸cadas: a varia¸c˜ ao da energia do sistema s´o depende do estado inicial (ausˆencia de correntes nos circuitos) e do estado final (N correntes Ij ). No Cap´ıtulo 2 verific´amos que o campo de indu¸c˜ ao magn´etica se podia obter do potencial vector A [ver (2.29)], o que permite escrever sucessivamente Z φj = Z Sj B · dS = I Sj ∇ × A · dS = Cj A · dlj , sendo a u ´ltima igualdade resultante da aplica¸c˜ ao do teorema de Stokes. Usando este resultado em (7.6), N I 1X Ij A(rj ) · dlj , (7.7) Um = 2 j=1 Cj onde A(rj ) ´e o potencial vector no ponto rj pertencente ao circuito Cj . Podemos ainda exprimir a energia magn´etica armazenada no sistema em termos da denao entre a corrente e a densidade de corrente ´e dada por sidade de corrente livre j` 1 . A rela¸c˜ (2.22) e, na express˜ao (7.7), podemos substituir o somat´orio e os integrais de linha por um u ´nico integral de volume estendido ao espa¸co v onde fluem correntes, isto ´e, onde j` 6= 0: 1 Um = 2 Z v j` (r ) · A(r ) dv . (7.8) Este integral pode ser estendido a todo o espa¸co, uma vez que fora de v as correntes s˜ao nulas e, por isso, n˜ao resulta da´ı qualquer contribui¸c˜ ao para (7.8). Assim 1 Um = 2 Z j` (r ) · A(r ) dv , (7.9) subentendendo-se sempre integra¸c˜ ao sobre todo o espa¸co, quando n˜ao se indica explicitamente qualquer dom´ınio de integra¸c˜ao. No caso de distribui¸c˜ oes de corrente superficiais, descritas pela densidade κ` (r ), a energia magn´etica ´e escrita do seguinte modo: 1 Um = 2 Z S κ` (r ) · A(r ) dS . (7.10) Repare-se na semelhan¸ca entre as express˜oes (7.9) e (7.10) e as obtidas para a energia de distribui¸c˜oes de cargas est´aticas [ver (3.3) e (3.4)]. 1 Por agora, estaremos sempre a referir-nos a “correntes livres” e da´ı o ´ındice “`”; no pr´ oximo cap´ıtulo ser´ a introduzido o conceito de “correntes de magnetiza¸ca ˜o”. 206 • ´tico Campo electromagne Exemplo 7.1: Energia armazenada num solen´ oide longo de comprimento L A um solen´oide longo, de comprimento L e raio a, percorrido por uma corrente i, corresponde uma densidade superficial de corrente livre (ver Figura 2.8) ˆφ , κ` = n i e (7.11) onde n ´e o n´ umero de espiras por unidade de comprimento, n = N/L, sendo N o n´ umero total de espiras. O campo de indu¸c˜ao magn´etica no interior do solen´oide ´e dado por (2.50), sendo nulo no exterior. O potencial vector A, do qual este campo deriva, ´e dado por (2.109) pelo que, sobre a superf´ıcie do solen´oide, A= µ0 nia ˆφ . e 2 (7.12) Usando as eqs. (7.11) e (7.12) em (7.10) obt´em-se Z Um = = 1 µ0 n2 i2 a 1 µ0 n2 i2 a dS = 2πaL 2 2 2 2 1 µ0 n2 πa2 i2 L . 2 (7.13) Do resultado anterior e da express˜ao (7.5), conclui-se que a indutˆancia de um solen´oide longo ´e dada por (7.14) L = µ0 n2 πa2 L = µ0 n2 AL , sendo A a ´area da sec¸c˜ao do solen´oide. 7.2 ˜ DA INDUC ˜ MAGNETICA ´ ENERGIA EM FUNC ¸ AO ¸ AO B Tal como fizemos com a energia electrost´atica, podemos exprimir a energia magn´etica, Um , em termos do campo B . Vamos admitir que n˜ao existem materiais magn´eticos presentes e que o regime ´e estacion´ario, isto ´e, que o fen´omeno transit´orio j´a foi ultrapassado, de modo que apenas a corrente de condu¸c˜ao est´a presente. Aplica-se, neste caso, a lei dos circuitos de Amp`ere, ∇ × B = µ0 j` , Eq. (2.40), e n˜ao a express˜ao local mais geral (2.56) para o rotacional do campo de indu¸c˜ao magn´etica. Usando (2.40) em (7.9) 1 Um = 2µ0 Z ∇ × B · A dv . (7.15) Esta express˜ao pode ser escrita de outra forma, se tivermos em conta a igualdade vectorial (B.43): ∇ · (A × B ) = B · (∇ × A) − A · (∇ × B ) = B 2 − A · (∇ × B ) , tendo-se utilizado a rela¸c˜ao (2.29) entre o potencial vector e o campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Substituindo em (7.15), resulta Z Um = = 1 B 2 dv − 2µ0 Z 1 B 2 dv − 2µ0 Z 1 ∇ · (A × B ) dv 2µ0 I 1 (A × B ) · dS . 2µ0 (7.16) O integral de superf´ıcie resulta do integral de volume por aplica¸c˜ ao do teorema de Gauss. Note-se que, em (7.9), o integral ´e sobre todo o espa¸co, pelo que, na express˜ao anterior, o ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • 207 integral de volume ´e tamb´em sobre todo o espa¸co e o integral de superf´ıcie ´e ent˜ ao sobre uma superf´ıcie infinita. Como veremos mais adiante neste cap´ıtulo, o campo A admite um desenvolvimento multipolar semelhante ao que se obteve no Cap´ıtulo 4 para o potencial escalar, sendo o termo dominante, em pontos afastados das fontes, o termo dipolar que varia com 1/r2 . Assim, a grandes distˆancias, a contribui¸c˜ ao dominante para o campo B criado 3 pela distribui¸c˜ao dipolar varia com 1/r . Como dS ´e proporcional a r2 o integral de superf´ıcie em (7.16) varia com r−3 e, portanto, anula-se. Tem-se, finalmente, a express˜ao da energia em termos do campo de indu¸c˜ao magn´etica Um = 1 2µ0 Z B 2 dv , (7.17) numa forma correspondente a (3.10). A energia armazenada no campo de indu¸c˜ ao magn´etica distribui-se continuamente no espa¸co com uma densidade um = 2µ1 0 B 2 [cf. Eq. (3.11)]. Acrescente-se que as eqs. (7.17) e (3.10) s˜ao ainda v´alidas para campos el´ectricos e de indu¸c˜ao magn´etica vari´aveis no tempo. J´a as express˜oes da energia el´ectrica e magn´etica em termos dos potenciais — eqs. (3.3) e (7.9), respectivamente — s˜ao v´alidas apenas para campos est´aticos. Utilizando a Eq. (7.17) pode encontrar-se a express˜ao da energia magn´etica armazenada no solen´oide obtida no Exemplo 7.1. Substituindo (2.50) e (2.51) em (7.17), obt´em-se 1 Um = 2µ0 Z (µ0 ni)2 dv = µ0 2 2 n i π a2 L , 2 que ´e o resultado (7.13). Exemplo 7.2: Energia armazenada num cabo coaxial Considere-se um cabo coaxial muito longo, de comprimento L, formado por condutores perfeitos. O raio do condutor interior ´e a e o do condutor exterior — que ´e uma superf´ıcie cil´ındrica — ´e b. A corrente, i, num condutor ´e igual e oposta `a corrente no outro condutor. O campo de indu¸c˜ao magn´etica ´e nulo para r < a, pois trata-se do interior de um condutor perfeito2 . Assim, a corrente flui no condutor interior apenas `a superf´ıcie, sendo o campo de indu¸c˜ao magn´etica dado ainda por (2.48) na regi˜ao a < r < b. No exterior do cabo, o campo ´e nulo, pois a corrente na superf´ıcie cil´ındrica de raio a ´e, como se disse, igual e oposta `a corrente na superf´ıcie cil´ındrica de raio b. Utilizando ent˜ ao a express˜ao (2.48) em (7.17), obt´em-se µ Um = = ¶ Z 1 µ0 i 2 dv 2µ0 2π r2 µ ¶ Z b dr µ0 i2 L b µ0 i2 L = ln . 4π 4π a a r Deste resultado e de (7.5) obt´em-se a indutˆancia do cabo coaxial: µ ¶ L= 2 µ0 L b ln 2π a . (7.18) Veremos, no Cap´ıtulo 9, que os campos el´ectrico e de indu¸ca ˜o magn´etica n˜ ao penetram no interior de condutores perfeitos. 208 • ´tico Campo electromagne 7.3 ˆ ´ ˆ ´ INDUTANCIA PROPRIA E INDUTANCIA MUTUA Qualquer circuito possui uma indutˆancia pr´opria L. A aplica¸c˜ ao de uma diferen¸ca de potencial constante traduz-se na existˆencia de uma corrente no circuito, a qual varia continuamente desde o valor zero at´e um valor final quando se atinge o estado estacion´ario. A rela¸c˜ao entre a for¸ca electromotriz externa (que ´e sim´etrica da for¸ca electromotriz induzida) e a corrente induzida resulta directamente da lei de Faraday, e ´e Eext = L di . dt (7.19) A potˆencia fornecida ao circuito ´e i Eext , ou seja, dUm di = Li . dt dt Integrando, obt´em-se o resultado (7.5). No caso de se terem dois circuitos, a energia magn´etica Um , dada por (7.4), vem Um = ´ 1³ M11 I12 + M12 I1 I2 + M21 I1 I2 + M22 I22 . 2 O primeiro e o u ´ltimo termo tˆem apenas a ver com cada um dos circuitos 1 e 2. As quantidades M11 e M22 s˜ao, respectivamente, as indutˆancias L1 e L2 . Os segundo e terceiro termos assinalam o facto de uma varia¸c˜ao do fluxo do campo de indu¸c˜ ao magn´etica atrav´es de uma superf´ıcie que se apoia num dos circuitos poder produzir uma for¸ca electromotriz no outro circuito. Veremos j´a a seguir que a indutˆancia m´ utua depende apenas das caracter´ısticas geom´etricas dos dois circuitos e que M12 = M21 , pelo que a energia de interac¸ca ˜o pode ser escrita na forma (int) Um = M12 I1 I2 . Consideremos dois solen´oides, S1 e S2 , estando o segundo solen´oide enrolado em torno do primeiro. Uma corrente vari´avel em S1 induz uma for¸ca electromotriz E2 em S2 e uma corrente vari´avel em S2 induz uma for¸ca electromotriz E1 em S1 . Consideramos que as correntes variam lentamente com o tempo, de tal modo que o campo de indu¸c˜ ao magn´etica por elas produzido ´e igual ao que seria produzido se as correntes fossem estacion´arias. No interior do solen´oide Sj (j = 1, 2) a grandeza do campo de indu¸c˜ ao magn´etica ´e [ver (2.50)] Nj umero de espiras do solen´oide Sj . A lei de Faraday permite Bj = µ0 L ij , sendo Nj o n´ escrever para a for¸ca electromotriz induzida em S2 (que se considera em circuito aberto): E2 = − dφ2 d µ0 N1 i1 µ0 N2 N1 A di1 di1 = − N2 A=− = −M21 , dt dt L L dt dt (7.20) onde A ´e a ´area da sec¸c˜ao recta dos solen´oides e M21 apenas depende das caracter´ısticas P geom´etricas do sistema. O u ´ltimo termo de (7.20) resulta de derivar φj = N k=1 Mjk ik em ordem ao tempo. Analogamente, a corrente vari´ avel i2 induz uma for¸ca electromotriz em S1 (que est´a em circuito aberto) dada por E1 = −M12 di2 . dt Esta ´e uma express˜ao geral, estando a informa¸c˜ ao sobre as caracter´ısticas dos circuitos contida no elemento de matriz M12 . A forma de M12 (ou de M21 ) pode ser obtida da u ´ltima igualdade em (7.20), confirmando este exemplo o caso geral de simetria dos elementos de matriz. ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • 209 Considerem-se agora dois circuitos arbitr´arios. A for¸ca electromotriz no circuito 1 produzida pela corrente vari´avel no circuito 2 escreve-se, por aplica¸c˜ ao do teorema de Stokes, d E1 = − dt Z d B · dS1 = − dt S1 I C1 A(r1 ) · dl1 , (7.21) onde A(r1 ) ´e o potencial vector correspondente ao campo B (r1 ) criado pelo circuito 2 no circuito 1. O primeiro integral na express˜ao anterior ´e de superf´ıcie, sendo S1 a superf´ıcie aberta que se apoia no circuito 1, e o segundo ´e um integral de caminho ao longo do circuito 1. O potencial vector da express˜ao (7.21) ´e dado por [ver (2.33)] A(r1 ) = µ0 4π I i2 dl2 , |r1 − r2 | C2 resultando, ent˜ao, para a for¸ca electromotriz induzida no circuito 1, E1 = − d µ0 dt 4π I C1 I C2 i2 dl2 · dl1 µ0 =− |r1 − r2 | 4π I I C1 C2 dl1 · dl2 di2 di2 = −M12 . |r1 − r2 | dt dt Daqui pode obter-se a forma expl´ıcita da indutˆancia m´ utua — equa¸c˜ ao de Neumann — que, no SI, se exprime em weber por ampere (ou henry): M12 = µ0 4π I I C1 C2 dl1 · dl2 . |r1 − r2 | Esta express˜ao mostra explicitamente que M12 = M21 . As indutˆancias, pr´opria ou m´ utua, s´o dependem das caracter´ısticas geom´etricas dos circuitos, tendo-se, em geral, Mij = Mji . 7.4 DESENVOLVIMENTO MULTIPOLAR DO POTENCIAL VECTOR Apresentaremos nesta sec¸c˜ao o desenvolvimento multipolar do potencial vector A, cujo formalismo segue de perto o do Cap´ıtulo 4 quando se considerou o desenvolvimento em multipolos do potencial escalar V . Seja v a regi˜ao do espa¸co onde existem correntes, caracterizadas pela densidade j (r 0 ), e seja O um ponto de v tomado para origem de um sistema de coordenadas. Pretende-se obter o potencial vector A num ponto P, cujo vector posicional ´e r relativamente `a origem O. Mantendo a nota¸c˜ao que tem vindo a ser utilizada, introduz-se o vector a = r − r 0 , cujo m´odulo ´e a distˆancia da fonte ao ponto P (Figura 7.1). O potencial vector ´e dado por [cf. (2.31)] A(r ) = µ0 4π Z v j (r 0 ) a dv . (7.22) Designando por θ o ˆangulo entre r 0 e r , e introduzindo em (7.22) o desenvolvimento de 1/a, dado por (4.26), obtemos para o potencial vector um desenvolvimento em multipolos do tipo (4.28), ou seja, Z ∞ µ X 1 A(r ) = 0 j (r 0 ) P` (cos θ) r0 ` dv . (7.23) 4π `=0 r`+1 v Os primeiros dois termos deste desenvolvimento s˜ao o monopolar AM (r ) e o dipolar AD (r ), que v˜ao ser discutidos a seguir. Os termos de ordem superior n˜ao tˆem tanto interesse pr´atico. 210 • ´tico Campo electromagne z ' r P a d v r q O y v x Figura 7.1. Distribui¸ c˜ ao de correntes no volume v, que produzem o potencial vector A no ponto P. Termo monopolar (` = 0) Verifica-se que o primeiro termo do desenvolvimento (7.23) ´e sempre nulo. De facto, se considerarmos uma corrente filamentar i num circuito C, o termo monopolar que resulta de (7.23) anula-se, I µ AM (r ) = 0 i dl = 0 , 4πr C pois o integral ´e sobre um caminho fechado. Mesmo n˜ao sendo a corrente filamentar, em R regime estacion´ario v j (r 0 ) dv ´e equivalente `a contribui¸c˜ ao de um conjunto de correntes H P fechadas, de modo que j ij Cj dlj = 0. Pode mostrar-se, de modo mais formal, que o Rtermo monopolar se anula, considerando cada uma das componentes cartesianas do integral v j (r 0 ) dv. Assim, para i = x, y, z tem-se: (dv = dx0 dy 0 dz 0 ) Z v Z ji dv = Z v j· ∇0 x0i dv = Z 0 v ∇ · (j x0i ) dv − v x0i ∇0 · j dv . Em regime estacion´ario, a divergˆencia da corrente anula-se, pelo que o u ´ltimo integral ´e igual a zero. Aplicando o teorema de Gauss ao primeiro integral, obt´em-se a igualdade Z v I ji dv = S x0i j · dS = 0 , (7.24) dado que as correntes est˜ao limitadas no espa¸co e n˜ao atravessam S; se existirem correntes em S, estas s˜ao tangenciais e, de novo, o fluxo de j ´e nulo. Em conclus˜ao, o termo monopolar n˜ao contribui para a express˜ao do potencial vector A. Termo dipolar (` = 1) ˆ · rˆ0 , o termo dipolar pode ser escrito na forma Recordando que P1 (cos θ) = cos θ = r AD = µ0 4πr3 Z v j (r 0 ) r · r 0 dv . Usando (B.46), r × (r 0 × j ) = r 0 (r · j ) − j (r · r 0 ) , (7.25) ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • 211 obt´em-se para (7.25) Z µ AD = 0 3 4πr £ 0 ¤ r (r · j ) − r × (r 0 × j ) dv . (7.26) Comecemos por considerar o primeiro termo do lado direito e analisar apenas a sua componente cartesiana k: A0D, k = Z Z µ0 X µ0 X 0 j dv = x x x x0k j · ∇0 x0i dv . i i k i 4πr3 i 4πr3 i v v Integrando por partes e tendo em conta que, sobre a superf´ıcie S que limita v, a corrente j ou se anula ou ´e tangente a essa superf´ıcie, vem Z µ0 X x ∇0 · (x0k j ) x0i dv . i 4πr3 i v A0D, k = − Em regime estacion´ario, a divergˆencia da densidade de corrente ´e nula, pelo que A0D, k Z µ0 X =− xi jk x0i dv . 4πr3 i v Em termos vectoriais, Z µ0 =− j r · r 0 dv , 4πr3 v que ´e precisamente a express˜ao sim´etrica da do termo dipolar do potencial vector dada por (7.25), isto ´e, A0D = −AD . Introduzindo o resultado que acab´amos de obter em (7.26), tem-se Z µ 1 (7.27) AD = − 0 3 r × r 0 × j dv . 4πr 2 v A0D O integral em (7.27) depende apenas das caracter´ısticas da distribui¸c˜ ao de correntes em v. Definindo o momento dipolar magn´etico da distribui¸c˜ ao de correntes atrav´es de m= 1 2 Z v r 0 × j (r 0 ) dv , (7.28) o termo dipolar (7.27) escreve-se AD = µ0 m × rˆ . 4πr2 (7.29) Repare-se na analogia que se pode estabelecer entre esta express˜ao e a Eq. (4.30) referente ao termo dipolar do potencial escalar. Pode demonstrar-se que o momento dipolar magn´etico ´e independente da escolha da origem O. Se escolhermos uma nova origem O1 , cuja localiza¸c˜ ao relativamente a O seja dada pelo 0 vector R, tem-se r = r1 + R. O momento dipolar magn´etico m1 relativamente `a nova origem ´e Z 1 m1 = r1 × j dv , 2 v ou, ainda, Z Z 1 0 m1 = r × j dv − R × j dv . 2 v v Ou ´ltimo termo ´e nulo [ver (7.24)], pelo que m = m1 , ou seja, o momento dipolar magn´etico ´e independente da escolha da origem. 212 • ´tico Campo electromagne d l d A r' O O d l r' Figura 7.2. Espira de corrente plana e filiforme. A ´ area elementar sombreada ´ e metade da ´ area do paralelogramo, dA = 12 |r 0 × dl|. Exemplo 7.3: Momento magn´ etico de uma espira de corrente Calculemos o momento dipolar magn´etico de uma corrente plana e filiforme (Figura 7.2). A Eq. (7.28) toma a forma de um integral de linha: m= i 2 I C r 0 × dl . ˆ o versor na direc¸c˜ Este vector ´e perpendicular ao plano da espira. Designando por k ao normal ao plano da espira e atendendo a que a ´area elementar dA, indicada na Figura 7.2, ´e dada por dA = 12 |r 0 × dl|, temos Z ˆ ˆ. (7.30) m = ik dA = i A k A No caso de uma espira circular de raio a, ˆ. m = iπa2 k 7.4.1 Campo de indu¸c˜ ao magn´ etica criado por um dipolo Dada a rela¸c˜ao entre B e A, expressa por (2.29), pode obter-se o campo de indu¸c˜ ao magn´etica criado por um dipolo magn´etico, calculando o rotacional de (7.29): µ B =∇×A=∇× ¶ 1 µ m×r 0 . 3 r 4π Usando (B.40), (B.44) e o facto de m ser um vector constante, obt´em-se a seguinte express˜ao: 4π B µ0 µ ¶ 1 1 = ∇ 3 × (m × r ) + 3 ∇ × ( m × r ) r r 3 r 1 = − 4 × (m × r ) + 3 [m (∇ · r ) − (m · ∇) r ] . r r r Utilizando agora (B.46), a express˜ao anterior passa a ser escrita na forma 4π B µ0 = − = i 3 h 2 3 1 r m − ( r · m ) r + 3 m− 3 m r5 r r 1 ˆ · m) r ˆ − m] . [3 (r r3 ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • 213 O campo de indu¸c˜ao magn´etica ´e, pois, B= µ0 ˆ · m) r ˆ − m] . [3 (r 4πr3 Escolhendo para eixo dos z a direc¸c˜ ao do vector m, a coordenada esf´erica θ ´e o ˆangulo entre ˆ = cos θ e ˆ r − sin θ e ˆ θ ): r e m e o vector B ainda pode ser escrito na forma3 (recorde-se que k B= µ0 m ˆ ) = µ0 m ( 2 cos θ e ˆr − k ˆ r + sin θ e ˆθ) . ( 3 cos θ e 3 4πr 4πr3 (7.31) Este resultado pode ser obtido mais facilmente se, logo de in´ıcio, introduzirmos em (7.29) a ˆ . Como k ˆ ×r ˆ = sin θ e ˆ φ , o potencial vector vem dado por escolha m = m k A= µ0 m ˆφ . sin θ e 4πr2 Calculando o rotacional de A, em coordenadas esf´ericas, obt´em-se o resultado (7.31) para o campo de indu¸c˜ao magn´etica. As superf´ıcies ao longo das quais |A| ´e constante s˜ao definidas pela equa¸c˜ ao C sin θ = r2 , µ0 m com C = 4π| ancias s˜ao idˆenticas `as que se obtiveram A| . As linhas do campo B a grandes distˆ na Sec¸c˜ao 4.2 para o campo el´ectrico produzido por um dipolo.4 Note-se, de resto, a similitude entre as express˜oes (7.31) para o campo de indu¸c˜ ao magn´etica produzido por um dipolo magn´etico e (4.12) para o campo el´ectrico produzido por um dipolo el´ectrico. 7.5 MOMENTO SOBRE UMA ESPIRA PERCORRIDA POR UMA CORRENTE Vamos calcular nesta sec¸c˜ao o momento das for¸cas que actuam numa espira de corrente colocada numa regi˜ao onde existe um campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Por raz˜oes de simplicidade, consideremos uma espira plana, quadrada, de lado `, que cont´em o eixo y, tendo dois dos seus lados (3 e 4) paralelos a esse eixo (ver Figura 7.3). Escolhe-se a origem das coordenadas coincidente com o centro do quadrado. O plano da espira forma com o plano xy um ˆangulo θ. ˆ ´e perpendicular ao plano da espira e aponta no sentido da progress˜ao de um O versor n saca-rolhas rodando no sentido da corrente i que percorre a espira. De acordo com (7.30), o momento magn´etico da espira percorrida pela corrente i ´e ˆ, m = i `2 n ˆ dado por com o versor n ˆ. ˆ = sin θ ˆi + cos θ k n Em cada um dos lados da espira, os versores que apontam no sentido da corrente s˜ao: ˆ = −ˆt2 ˆt1 = cos θ ˆi − sin θ k ˆt3 = jˆ = −ˆt4 . (7.32) (7.33) r = eˆ r . 3ˆ 4 No caso dos dipolos el´ectrico e magn´etico f´ısicos, as linhas s˜ ao diferentes junto ` as fontes: relembre-se que as linhas do campo B s˜ ao fechadas e que as do campo E tˆem origem nas cargas positivas e terminam nas negativas. Contudo, as linhas dos dipolos el´ectrico e magn´etico coincidem no caso ideal de as fontes n˜ ao terem dimens˜ ao. 214 • ´tico Campo electromagne z ^ t4 B 4 ^ t2 F z y 4 ^ 2 x 1 ^ t1 q t2 y q ^ n^ t1 F 3 ^ x 3 t3 Figura 7.3. Espira de corrente e for¸ cas que sobre ela actuam. Vamos considerar que a espira est´a colocada numa regi˜ao onde existe um campo de indu¸c˜ ao ˆ . A for¸ca que este campo exerce sobre a espira ´e a soma das magn´etica uniforme, B = B k quatro for¸cas, Fj = i ` ˆtj × B (j = 1, 2, 3, 4), exercidas sobre cada um dos lados: ³ ´ F = F1 + F2 + F3 + F4 = i ` ˆt1 × B + ˆt2 × B + ˆt3 × B + ˆt4 × B , a qual ´e igual a zero, atendendo `as express˜oes (7.32) e (7.33) para os versores. Contudo, o momento das for¸cas n˜ao ´e zero. Relativamente ao centro da espira (e, portanto, em rela¸c˜ao a qualquer ponto, pois a for¸ca resultante ´e nula), esse momento ´e M = r3 × F3 + r4 × F4 . (7.34) Nesta express˜ao, r3 e r4 s˜ao os vectores posicionais dos pontos m´edios dos lados 3 e 4, respectivamente. Em (7.34) n˜ao se incluiu a contribui¸c˜ ao para o momento das for¸cas sobre os lados 1 e 2: essa contribui¸c˜ao ´e nula, pois as duas for¸cas e os respectivos vectores posicionais s˜ao colineares. A for¸ca sobre o lado 3 ´e F3 = i ` B ˆi e a for¸ca no lado 4 ´e sim´etrica desta. Atendendo agora a que r3 = 2` ˆt1 = −r4 , podemos escrever i i `2 B hˆ t1 × ˆi + (−ˆt1 ) × (−ˆi) 2 = −i `2 B sin θ jˆ . M = (7.35) ˆ ) = −i `2 B sin θ jˆ , a express˜ao (7.35) pode ser escrita na ˆ ×k Como m × B = i `2 B (n seguinte forma: (7.36) M =m×B. O primeiro coment´ario que importa fazer sobre esta express˜ao ´e que ela continua v´alida para qualquer espira e n˜ao apenas para a espira que foi considerada. A Eq. (7.36) ´e, de facto, a express˜ao geral para o momento das for¸cas que se exercem sobre um dipolo magn´etico colocado numa regi˜ao de campo de indu¸c˜ ao magn´etica constante. Um outro aspecto que importa focar ´e a semelhan¸ca entre (7.36) e (4.50), referindo-se esta u ´ltima ao momento do bin´ario exercido sobre um dipolo el´ectrico situado numa regi˜ao onde o campo el´ectrico ´e constante. ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • 215 Tal como para o dipolo el´ectrico, pode calcular-se a energia de interac¸c˜ ao campo - dipolo magn´etico atrav´es do trabalho que ´e necess´ario fornecer ao dipolo para lhe dar uma determinada orienta¸c˜ao final, partindo de uma dada orienta¸c˜ ao inicial a que se atribui energia zero. No caso da espira quadrada, atendendo ao bin´ario formado por F3 e F4 , conclui-se que a ˆ alinha com a posi¸c˜ao mais est´avel ocorre quando a espira est´a no plano xy e a normal n ˆ e B direc¸c˜ao do campo de indu¸c˜ao magn´etica. Se a corrente fosse em sentido inverso, n seriam antiparalelos. Neste caso a for¸ca e o momento seriam nulos, mas a situa¸c˜ ao seria de equil´ıbrio inst´avel. Tomando para posi¸c˜ao de energia zero aquela em que o plano da espira ´e paralelo ao campo B (θ = 90◦ ), obt´em-se, recorrendo, por exemplo, ao m´etodo do trabalho virtual, (ver Sec¸c˜ao 4.6), que a energia de interac¸c˜ ao campo - dipolo ´e Uint = −m · B , (7.37) an´aloga a (4.48) para a energia de interac¸c˜ ao campo - dipolo el´ectrico. Reforce-se a ideia de que (7.37) ´e uma energia de interac¸c˜ ao: ela n˜ao leva em conta nem a energia da pr´opria espira, nem a dos circuitos que ´e necess´ario utilizar para criar o campo uniforme B . Por outro lado, na obten¸c˜ ao da express˜ao (7.37) pelo m´etodo do trabalho virtual, pressup˜oe-se que a corrente na espira se mant´em constante durante o processo quase est´atico de rota¸c˜ao, desde a orienta¸c˜ao de referˆencia at´e `a posi¸c˜ ao final. A espira ´e indeform´avel, pelo que o valor do momento magn´etico, m, permanece constante. 7.6 7.6.1 PROBLEMAS RESOLVIDOS Energia de um sistema de duas correntes Quest˜ ao Um sistema ´e constitu´ıdo por dois condutores cil´ındricos coaxiais muito longos (comprimento L). O cilindro interior tem raio a e o cilindro exterior tem raio interno b e raio externo c (L À a, b, c), como mostra a Figura 7.4. Os condutores s˜ao percorridos por correntes I, iguais mas de sentidos opostos, uniformemente distribu´ıdas. Na regi˜ao entre os condutores fez-se o vazio. Calcular a energia magn´etica armazenada por unidade de comprimento nas regi˜oes do espa¸co: r < a, a < r < b, b < r < c e r > c. Resposta A Figura 7.4 representa uma sec¸c˜ ao transversal dos condutores cil´ındricos descritos no problema. O campo de indu¸c˜ao magn´etica s´o depende da coordenada cil´ındrica r e aponta na direc¸c˜ ao ˆ φ . A distribui¸c˜ao de correntes existente no cilindro interior origina o campo B1 (ver de e Exemplo 2.3):  µ0 i r ˆ  r≤a  φ  2 π a2 e B1 =    µ0 i ˆ r ≥ a. 2 π r eφ Usando a lei de Amp`ere, conclui-se que o cilindro exterior produz um campo de indu¸c˜ ao magn´etica nulo no seu interior, isto ´e, para r < b. A lei de Amp`ere permite igualmente obter 216 • ´tico Campo electromagne a c b Figura 7.4. Esquema de uma sec¸ c˜ ao transversal do sistema de dois condutores descrito no Problema 7.6.1. o campo nas outras regi˜oes do espa¸co. O campo B2 produzido pelo cilindro exterior ´e  0         µ0 i B2 = − 2πr         µ0 i r≤b r2 − b2 e ˆφ c2 − b2 ˆφ − 2πr e b≤r≤c r ≥ c. O campo de indu¸c˜ao magn´etica, nas v´arias regi˜oes do espa¸co, ´e a soma dos campos produzidos por cada um dos cilindros: B = B1 + B2 =                µ0 ir e ˆφ 2πa2 r≤a µ0 i ˆ 2πr eφ a≤r≤b    µ0 i    2πr         c2 − r2 e ˆφ c2 − b2 0 b≤r≤c r ≥ c. A energia armazenada em cada uma das regi˜oes ´e obtida a partir da express˜ao (7.17) que passa agora a ser escrita na forma Um 1 = 2π L 2µ0 Z r1 r0 B 2 r dr , onde r0 e r1 s˜ao, respectivamente, os limites inferior e superior da regi˜ao onde estamos a calcular a energia. A energia por unidade de comprimento, para cada uma das regi˜oes, ´e: • Regi˜ao r ≤ a Um µ0 i2 = . L 16π ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • Regi˜ao a ≤ r ≤ b • 217 µ ¶ Um µ0 i2 b = ln L 4π a . • Regi˜ao b ≤ r ≤ c Um µ0 i2 2 = (c − b2 )−2 L 4π • Regi˜ao r ≥ c 7.6.2 ( · 4 c µ ¶ c ln b ¸ 3 b4 − + c2 b2 − 4 4 ) . Um = 0. L Momento dipolar magn´ etico de uma esfera carregada a rodar Quest˜ ao Uma esfera de raio a tem distribu´ıda sobre a sua superf´ıcie uma carga cuja densidade ´e constante e igual a σ. A esfera roda em torno de um diˆametro com velocidade angular constante, ω. A distribui¸c˜ao de carga n˜ao ´e afectada pela rota¸c˜ ao. Calcular o momento magn´etico dipolar do sistema. Resposta Devido `a rota¸c˜ao, passa a haver sobre a esfera uma densidade superficial de corrente dada por κ = σv, (7.38) sendo v = ω × R a velocidade de um ponto da superf´ıcie e R o vector do eixo de rota¸c˜ ao da esfera ao ponto P (ver Figura 7.5). z R d i q P a Figura 7.5. Superf´ıcie esf´ erica carregada a rodar. 218 • ´tico Campo electromagne Pelo ponto P da superf´ıcie da esfera faz-se passar um plano perpendicular ao eixo de rota¸c˜ao da esfera. O m´odulo de R ´e o raio da circunferˆencia que se obt´em por intersec¸c˜ ao desse plano com a esfera. O m´odulo da velocidade linear do ponto P ´e v = ω R = ω a sin θ e a densidade superficial de corrente (7.38) escreve-se ˆφ . κ = σ ω a sin θ e Esta ´e a densidade de corrente sobre uma “espira” de raio R e largura d` = adθ. A corrente que percorre esta espira ´e igual `a densidade de corrente κ multiplicada pela sec¸c˜ ao da espira perpendicular `a corrente, d`, ou seja di = κ d`, pelo que di = σ ω a2 sin θ dθ . Uma espira de ´area πR2 = πa2 sin2 θ percorrida pela corrente di possui o momento dipolar magn´etico elementar ˆz , dm = σ π ω a4 sin3 θ dθ e (7.39) sendo z a direc¸c˜ao do eixo de rota¸c˜ ao da esfera. Para se escrever a express˜ao anterior, utilizou-se o facto de o momento dipolar magn´etico produzido por uma espira de corrente ser dado, em m´odulo, pelo produto da ´area da espira pela corrente que a percorre, ter a direc¸c˜ao perpendicular ao plano que cont´em a espira e ter o sentido da progress˜ao de um saca-rolhas que roda no sentido da corrente na espira. O momento dipolar magn´etico total produzido pela esfera em rota¸c˜ ao ´e obtido por integra¸c˜ao de (7.39): 4 ˆz σ π ω a m=e Z π 0 sin3 θ dθ . O valor do integral angular ´e 43 , pelo que m= 7.6.3 4 ˆz . σ π ω a4 e 3 Disco carregado a rodar Quest˜ ao Um disco de raio a uniformemente carregado com uma carga Q ´e posto a rodar com velocidade angular constante, ω, sem que a distribui¸c˜ ao de cargas seja alterada. O eixo de rota¸c˜ao ´e o eixo de simetria, perpendicular ao plano do disco. a) Determinar o momento dipolar magn´etico desta distribui¸c˜ ao de correntes; b) Obter o potencial vector A e o campo de indu¸c˜ ao magn´etica B no ponto P (x, y, z) (tomar para origem das coordenadas o centro do disco e considerar pontos tais que r À a). ´tica e multipolos magne ´ticos Energia magne • 219 y z x r r + d r Figura 7.6. Disco uniformemente carregado a rodar em torno do eixo z. Resposta a) A densidade superficial de carga ´e σ= Q . πa2 (7.40) Quando o disco roda, gera-se uma densidade superficial de corrente dada por ˆφ = σ ω r e ˆφ . κ = σve Considere-se agora uma “espira” de raio compreendido entre r e r + dr. A corrente que percorre essa espira ´e di = σ ω r dr , `a qual corresponde o momento dipolar magn´etico elementar ˆ z = σ π ω r3 dr e ˆz , dm = π r2 di e sendo z o eixo de rota¸c˜ao (ver Figura 7.6). Integrando sobre r, de 0 a a, obt´em-se o momento dipolar magn´etico total: m= σπωa4 ˆz , e 4 ou, considerando a carga total do disco [ver (7.40)], m= Qωa2 ˆz ; e 4 (7.41) b) No c´alculo do potencial vector a distˆancias grandes (comparadas com o raio do disco) o termo dominante ´e o termo dipolar, dado por (7.29). Introduzindo (7.41) nessa express˜ao, obt´em-se µ Q ω a2 ˆφ , A= 0 sin θ e 16 π r2 220 • ´tico Campo electromagne onde θ ´e o ˆangulo que a direc¸c˜ao z faz com a direc¸c˜ ao do raio-vector r . O campo de indu¸c˜ao magn´etica ´e o rotacional do potencial vector. Utilizando coordeˆ φ ´e nadas esf´ericas, o rotacional de um vector s´o com componente segundo e B =∇×A= 1 ∂ 1 ∂ ˆr − ˆθ , (sin θAφ ) e (rAφ ) e r sin θ ∂θ r ∂r obtendo-se, finalmente [cf. Eq. (7.31)], B= µ0 Qωa2 ˆ r + sin θ e ˆθ ) . ( 2 cos θ e 16πr3 222 • ´tico Campo electromagne CAP´ITULO 8 MAGNETISMO EM MEIOS MATERIAIS Em substˆancias como o ferro, o n´ıquel e o cobalto, determinadas propriedades magn´eticas revelam-se com grande destaque. Referimo-nos, por exemplo, `a atrac¸c˜ ao a que ficam sujeitas na presen¸ca de campos magn´eticos. No entanto, a maioria das substˆancias apresenta propriedades magn´eticas menos intensas. ´ poss´ıvel classificar os diferentes materiais de acordo com o seu comportamento na preE sen¸ca de campos magn´eticos. Assim, h´a alguns — os ferromagn´eticos — que s˜ao fortemente atra´ıdos por campos magn´eticos; outros s˜ao-no apenas levemente e dizem-se paramagn´eticos; finalmente, h´a materiais que s˜ao repelidos, embora pouco intensamente, e dizem-se diamagn´eticos. O comportamento magn´etico dos materiais tem origem na sua estrutura microsc´opica. Na verdade, os ´atomos possuem momento dipolar magn´etico, devido n˜ao s´o ao movimento orbital dos electr˜oes, mas tamb´em ao facto de os electr˜oes possu´ırem um momento dipolar magn´etico intr´ınseco. H´a ainda uma contribui¸ca˜o para o momento magn´etico do ´atomo com origem no n´ ucleo, mas esta ´e muito pequena. Existe uma rela¸c˜ao directa entre o momento dipolar magn´etico e o momento angular, quer para o electr˜ao, quer para o ´atomo. O momento angular intr´ınseco do electr˜ao designa-se por spin. Como atr´as se referiu, a causa microsc´opica do magnetismo da mat´eria encontra-se na existˆencia de momentos magn´eticos ao n´ıvel at´omico que resultam da soma dos momentos magn´eticos dos electr˜oes de cada ´atomo. Esta situa¸c˜ ao deixa antever que o magnetismo s´o pode ser descrito cabalmente no quadro da Mecˆanica Quˆantica. Embora seja poss´ıvel encontrar um an´alogo cl´assico para o momento magn´etico do electr˜ao de origem orbital, o mesmo n˜ao sucede quanto ao seu momento magn´etico de spin, que ´e uma propriedade intr´ınseca daquela part´ıcula (tal como a massa ou a carga). Para justificar o spin, ou o ´ errado, momento magn´etico de spin do electr˜ao, n˜ao ´e poss´ıvel recorrer a modelos cl´assicos. E 224 • ´tico Campo electromagne por exemplo, atribuir o momento magn´etico de spin do electr˜ao a correntes que circulem no seu interior, embora seja for¸coso reconhecer que ´e o pr´oprio significado da palavra spin o respons´avel por este tipo de interpreta¸c˜ ao err´onea. Embora as propriedades magn´eticas dos materiais sejam de origem quˆantica, a abordagem do problema pode ser feita classicamente, numa base fenomenol´ogica, e ´e esta a atitude que aqui se adopta. Sup˜oe-se que a mat´eria neutra ´e equivalente a um conjunto de dipolos magn´eticos e que estes, como veremos, podem ser considerados como tendo origem em correntes efectivas. Estas distribui¸c˜oes de dipolos representam valores m´edios no espa¸co e no tempo dos momentos dipolares dos ´atomos, considerando regi˜oes “pequenas” (ou volumes elementares) `a escala macrosc´opica. Contudo, esses volumes ter˜ao de ser suficientemente “grandes” `a escala microsc´opica para que haja um grande n´ umero de momentos dipolares magn´eticos at´omicos a contribuir para as referidas m´edias, minimizando-se assim eventuais flutua¸c˜oes estat´ısticas. No caso do ferromagnetismo, existem momentos magn´eticos permanentes alinhados em regi˜oes finitas do material (dom´ınios). Nas substˆancias paramagn´eticas, os momentos dipolares magn´eticos de cada “volume elementar” apontam para direc¸c˜ oes arbitr´arias, mas h´a uma tendˆencia para um alinhamento quando se aplica um campo externo. Este alinhamento ser´a tanto maior quanto menor for a temperatura, pois a agita¸c˜ ao t´ermica n˜ao favorece a tendˆencia para o alinhamento. Ser´a not´orio, ao longo deste cap´ıtulo, que o estudo do magnetismo em meios materiais segue um formalismo pr´oximo do exposto no Cap´ıtulo 5 para o caso dos meios diel´ectricos. 8.1 ˜ ˜ VECTOR MAGNETIZAC ¸ AO. CORRENTES DE MAGNETIZAC ¸ AO O an´alogo do vector polariza¸c˜ao, introduzido na Sec¸c˜ ao 5.2, ´e o vector magnetiza¸c˜ ao. Assim, designando por dm o momento dipolar magn´etico no volume elementar dv, define-se o vector magnetiza¸c˜ao, M , atrav´es de M= dm . dv (8.1) A unidade SI de magnetiza¸c˜ao ´e A/m. O momento dipolar magn´etico total de uma amostra de volume v ´e Z mtotal = M dv . v Calculemos o potencial vector A criado por um corpo com magnetiza¸c˜ ao M (r 0 ) e volume v, limitado por uma superf´ıcie S, num ponto P de vector posicional r (ver Figura 8.1). Utilizando a express˜ao (7.29), o potencial criado em P pela distribui¸c˜ ao de dipolos magn´eticos contida no volume v ´e [note-se que, de (8.1), se obt´em dm = M dv] µ A(r ) = 0 4π Z v M (r 0 ) × a a3 dv . Mas, atendendo a (2.28) e a (2.39), podemos escrever A(r ) = µ0 4π µ ¶ Z v 1 dv , a M (r 0 ) × ∇0 (8.2) onde ∇0 ´e o operador gradiente relativamente `a vari´ avel r 0 . Refira-se que at´e aqui se seguiu pari passu o formalismo apresentado na Sec¸c˜ ao 5.3. A express˜ao (B.40) permite que se escreva µ ¶ M (r 0 ) × ∇0 1 a µ = −∇0 × M (r 0 ) a ¶ + ∇0 × M (r 0 ) a . (8.3) Magnetismo em meios materiais S 225 P a d v • v r O r' Figura 8.1. O material magnetizado, de volume v, produz no ponto P um campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica. Inserindo em (8.2) e usando a igualdade [ver Apˆendice A, Eq. (A.2)] Z I v vem ∇ × F dv = − S F × dS , Z I ˆ µ0 µ ∇0 × M M ×n dv + dS . (8.4) A= 0 4π v a 4π S a ˆ ´e normal `a superf´ıcie elementar dS e aponta para fora. As duas parcelas na O versor n express˜ao (8.4) tˆem a estrutura do potencial vector (2.31) e (2.32), respectivamente. Pode, pois, concluir-se que, num ponto exterior, o potencial devido a um material magnetizado ´e equivalente ao que seria criado por uma distribui¸c˜ ao volum´etrica de correntes no volume v mais uma distribui¸c˜ao superficial de correntes na superf´ıcie S. A compara¸c˜ ao com (2.31) e (2.32) permite obter as chamadas densidades de corrente equivalentes: jm = ∇ × M (8.5) ˆ κm = M × n (8.6) para a distribui¸c˜ao volum´etrica; e para a distribui¸c˜ao superficial. Estas correntes tamb´em se designam por correntes de magnetiza¸c˜ ao, da´ı o ´ındice “m” nas express˜oes anteriores, ou correntes amperianas. Pode, igualmente, mostrar-se que o potencial vector A num ponto pertencente ao material ´e ainda dado por (8.4), o que significa que, tamb´em neste caso, A ´e equivalente ao potencial que seria obtido se o material magnetizado fosse substitu´ıdo pelas densidades de correntes volum´etrica, jm , e superficial, κm . De um modo geral, o potencial vector com origem em distribui¸c˜ oes volum´etricas e superficiais de correntes livres ou de magnetiza¸c˜ ao ´e dado por A= µ0 4π ·Z v j` + jm a Z dv + κ` + κm S a ¸ dS . O campo B devido `as correntes de magnetiza¸c˜ ao pode ser obtido a partir de B = ∇ × A, sendo A o potencial devido apenas `as correntes de magnetiza¸c˜ ao, ou directamente a partir da lei de Biot-Savart, escrevendo-se, neste caso, Z Z ˆ ˆ µ0 jm × a µ0 κm × a dv + dS . 2 2 4π v a 4π S a O campo de indu¸ca˜o magn´etica total obt´em-se adicionando a este o campo produzido pelas correntes livres. B= 226 • ´tico Campo electromagne Exemplo 8.1: Campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica criado por cilindro uniformemente magnetizado ˆ a magnetiza¸c˜ao (uniforme) de um cilindro infinito de raio a com o seu Seja M = M0 k eixo segundo o eixo z. A partir das express˜oes (8.5) e (8.6) obtˆem-se as correspondentes correntes de magnetiza¸c˜ao: ˆ =0 jm = M0 ∇ × k ˆ ×e ˆ r = M0 e ˆφ . κm = M0 k Esta corrente superficial ´e formalmente idˆentica `a de um solen´oide infinito [ver (2.49)]. No ˆ φ , que produz, caso do solen´oide infinito, h´a uma densidade de corrente superficial, κ = n i e ˆ no interior do solen´oide, um campo de indu¸c˜ ao magn´etica B = µ0 n i k [ver (2.50)]. Considerando esta analogia entre o cilindro magnetizado e o solen´oide e comparando as densidades superficiais de corrente, basta fazer a correspondˆencia M0 ↔ n i para se obter o campo: ˆ = µ0 M , B = µ0 M0 k no interior do cilindro magnetizado. 8.2 ´ CAMPO INTENSIDADE MAGNETICA H Havendo correntes de magnetiza¸c˜ ao e, simultaneamente, correntes livres, o campo de indu¸c˜ao magn´etica B tem a sua origem em ambas. No caso estacion´ario, a equa¸c˜ ao de Maxwell (2.60) ´e ∇ × B = µ0 ( j` + jm ) . (8.7) Mesmo na presen¸ca de meios materiais continua a verificar-se ∇ · B = 0, (8.8) o que significa que n˜ao h´a monopolos magn´eticos. O conhecimento das correntes de magnetiza¸c˜ ao jm e κm depende do conhecimento do ´ vector magnetiza¸c˜ao. E conveniente dispor de express˜oes onde intervenham apenas correntes livres, que s˜ao aquelas sobre as quais se pode ter algum tipo de controlo directo. Atendendo a (8.5), a Eq. (8.7) pode ser escrita na forma ∇ × B = µ0 (j` + ∇ × M ) , ou ainda µ ∇× ¶ B − M = j` . µ0 Esta express˜ao mostra que o campo H , definido atrav´es de H= B µ0 −M , (8.9) (8.10) ´e determinado pelas correntes livres. Na express˜ao do campo de indu¸c˜ ao magn´etica, B = µ0 ( H + M ) , (8.11) identifica-se uma contribui¸c˜ao devida `as correntes livres, µ0 H , e outra devida `as correntes de magnetiza¸c˜ao, µ0 M . O campo H designa-se por intensidade magn´etica ou simplesmente campo magn´etico e o seu rotacional ´e, de acordo com (8.9), dado por ∇ × H = j` em regime estacion´ario. (8.12) Magnetismo em meios materiais 8.3 • 227 ˜ CONDIC ¸ OES DE FRONTEIRA PARA OS CAMPOS B, H E M Comecemos por analisar o comportamento da componente normal de B numa superf´ıcie de separa¸c˜ao de dois meios com caracter´ısticas magn´eticas diferentes. O fluxo de B atrav´es da superf´ıcie cil´ındrica fechada de altura infinitesimal dh e ´area de base δS, representada na Figura 8.2 ´e, de acordo com (8.8), igual a zero: I S ˆ 1 δS + B2 · n ˆ 2 δS = 0 . B · dS = B1 · n (8.13) Em (8.13) omitiu-se j´a a contribui¸c˜ ao do fluxo de B atrav´es da ´area lateral do cilindro, a qual ´e nula no limite em que dh → 0. Quando as bases do cilindro ficam infinitamente ˆ 2 = −n ˆ1 = n ˆ , pelo que pr´oximas s˜ao coincidentes com a superf´ıcie de separa¸c˜ ao, tendo-se n a Eq. (8.13) pode, neste caso, ser escrita na forma (B2n − B1n ) δS = 0, ou seja, a componente normal de B ´e cont´ınua: B2n = B1n . Por outras palavras, mesmo na presen¸ca de meios materiais, a equa¸c˜ ao superficial (2.44) continua v´alida: ˆ · (B2 − B1 ) = 0 . divS B = n Desta express˜ao e de (8.11) resulta ainda ˆ · (H2 − H1 ) = −divS M = −n ˆ · (M2 − M1 ) . divS H = n (8.14) Analisemos o comportamento da componente tangencial de H . Considere-se o circuito fechado C da Figura 8.3, com dois lados de comprimento infinitesimal ds e os outros dois, C1 e C2 , de comprimento δ`. Tome-se o fluxo dos vectores em ambos os membros de (8.12) atrav´es de uma superf´ıcie S que se apoia em C. O primeiro membro pode ser transformado, usando o teorema de Stokes, na circula¸c˜ ao de H ao longo de C; o fluxo da densidade de corrente livre, j` , ´e simplesmente a corrente livre i` que atravessa S. No limite em que ds → 0, a circula¸c˜ao de H s´o recebe contribui¸c˜ oes dos lados C1 e C2 . Assim, I C Z H · dl = C2 H2 · ˆt2 d` + Z C1 H1 · ˆt1 d` = i` . Notando que ˆt2 = −ˆt1 = ˆt, tem-se I C H · dl = (H2t − H1t ) δ` = i` = κ` δ` , n^ n ^ d h 2 d S m e io 2 m e io 1 n^ 1 Figura 8.2. Cilindro infinitesimal na superf´ıcie de separa¸ c˜ ao de dois meios. 228 • ´tico Campo electromagne C t^ 2 d l 2 d s ^ t m e io 1 C t1 ^ m e io 2 C 1 Figura 8.3. Caminho rectangular de altura infinitesimal na superf´ıcie de separa¸ c˜ ao de dois meios. considerando uma densidade superficial de corrente, κ` perpendicular `a superf´ıcie que cont´em C e que aponta para dentro. Se n˜ao existir corrente livre sobre a superf´ıcie de separa¸c˜ ao dos dois meios, a componente tangencial de H ´e cont´ınua (H2t = H1t ). Em geral, tem-se, para o campo intensidade magn´etica, a seguinte equa¸c˜ ao superficial: ˆ × ( H 2 − H1 ) = κ ` , rotS H = n em que κ` ´e a densidade de corrente livre sobre a superf´ıcie de separa¸c˜ ao dos dois meios. O campo de magnetiza¸c˜ao M , que tem origem nas correntes equivalentes, verifica uma equa¸c˜ao superficial semelhante: ˆ × ( M 2 − M 1 ) = κm . rotS M = n Finalmente, tem-se para B a seguinte equa¸c˜ ao superficial: ˆ × ( B2 − B1 ) = µ0 (κ` + κm ) = µ0 κ , rotS B = n que ´e, afinal, a Eq. (2.45). 8.4 ´ ´ MATERIAIS MAGNETICOS HOMOGENEOS, LINEARES ´ E ISOTROPICOS Pretendemos conhecer a rela¸c˜ao entre a magnetiza¸c˜ ao, M , e o campo intensidade magn´etica, H , ou seja, obter a fun¸c˜ ao M = M (H ). Esta rela¸c˜ao pode ser obtida experimentalmente ou com base em modelos te´oricos. Em muitos materiais de interesse pr´atico a dependˆencia n˜ao ´e linear e nem sequer ´e definida univocamente, mas h´a outros materiais em que a situa¸c˜ ao ´e relativamente simples, uma vez que se verifica uma varia¸c˜ao linear de M com H . Os materiais com este comportamento dizem-se lineares e isotr´ opicos e, neste caso, M = χm H , (8.15) sendo χm a susceptibilidade magn´etica do meio, que ´e uma grandeza adimensional. Se a susceptibilidade for constante, ou seja, a mesma em todos os pontos do material, este, al´em de linear e isotr´opico, diz-se homog´eneo. A express˜ao (8.11) para este tipo de materiais pode ser reescrita, tirando partido da rela¸c˜ ao (8.15), na forma B = µ0 ( H + χm H ) = µ0 ( 1 + χm ) H = µ0 µr H = µ H . (8.16) Magnetismo em meios materiais • 229 Introduziu-se nesta express˜ao a quantidade µr = µ/µ0 , que ´e a permeabilidade relativa, sendo µ a permeabilidade absoluta do material. A permeabilidade relativa tamb´em se designa muitas vezes por κm . A rela¸c˜ao B = µH mostra que, nos meios lineares e isotr´opicos, B e H s˜ao paralelos. Como se disse, esta express˜ao verifica-se aproximadamente nestes materiais, mas est´a longe de ser uma rela¸c˜ao universal. Para os materiais com comportamento linear e isotr´opico, tem-se sempre |χm | ¿ 1. Mas h´a que distinguir entre os materiais diamagn´eticos, para os quais χm < 0, da ordem de grandeza de −10−5 , e os materiais paramagn´eticos, cuja susceptibilidade magn´etica ´e positiva, χm > 0, variando a sua grandeza entre 10−5 e 10−2 . Nos materiais diamagn´eticos, os momentos magn´eticos elementares n˜ao s˜ao permanentes, mas sim induzidos por um campo externo aplicado. Nestes materiais, µr < 1 e a permeabilidade relativa n˜ao depende da temperatura. A magnetiza¸c˜ao do material d´a origem a uma diminui¸c˜ ao de B relativamente ao vazio. Nos ´atomos dos materiais paramagn´eticos, os momentos magn´eticos orbital e de spin n˜ao se cancelam e existe um momento magn´etico dipolar residual que permanece. Na presen¸ca de um campo externo, estes momentos dipolares tendem a alinhar-se e µr > 1. Nos materiais ferromagn´eticos n˜ao h´a simples proporcionalidade entre M e H . O primeiro destes vectores ´e, por vezes, um milh˜ao de vezes maior do que o segundo. A magnetiza¸c˜ ao ´e muito forte, devido ao facto de os momentos magn´eticos elementares estarem alinhados. Nos meios onde se observa a rela¸c˜ ao linear (8.15) as correntes livres, j` , e de magnetiza¸c˜ ao, jm , s˜ao tamb´em proporcionais. Tomando o rotacional de ambos os membros de (8.15) e utilizando (8.5) e (8.12) obt´em-se (8.17) jm = χm j` . Atendendo a que a permeabilidade relativa ´e dada por µr = 1 + χm , da express˜ao (8.17) vem, para a corrente total, j = jm + j` = µr j` . Para materiais paramagn´eticos, j > j` e para materiais diamagn´eticos, j < j` . De qualquer modo, verifica-se sempre µr > 0, pelo que j e j` apontam no mesmo sentido. Exemplo 8.2: Solen´ oide enrolado em torno de um cilindro magnetizado O campo de indu¸c˜ao magn´etica no interior de um solen´oide infinito com n espiras por unidade de comprimento e percorrido por uma corrente i ´e dado por (2.50). Dessa express˜ao ˆ . Se o enrolamento for feito conclui-se, de imediato, que a intensidade magn´etica ´e H = n i k em torno de um material magnetiz´avel de permeabilidade relativa µr , o campo de indu¸c˜ ao magn´etica vem ˆ. B = µ0 µr n i k A indutˆancia do circuito obt´em-se dividindo o fluxo do campo de indu¸c˜ ao magn´etica, φ, pela corrente: BAnL µ0 µr An2 iL φ = = µr µ0 n2 AL , L= = i i i em que A designa a ´area de cada espira e L o comprimento do solen´oide. Atendendo `a Eq. (7.14), e designando a indutˆancia de um solen´oide sem n´ ucleo de material magnetiz´avel por L0 , conclui-se que L = µr L0 . 230 • ´tico Campo electromagne 8.5 ´ POTENCIAL ESCALAR MAGNETICO No caso de n˜ao haver dependˆencia no tempo e de n˜ao existirem correntes livres, a Eq. (8.12) ´e escrita simplesmente na forma ∇ × H = 0, (8.18) ou seja, o campo H ´e, neste caso, um campo irrotacional e, por isso, pode sempre ser escrito como o gradiente de uma fun¸c˜ao escalar: H = −∇Vm . (8.19) Nesta express˜ao Vm ´e o potencial escalar magn´etico que desempenha um papel, do ponto de vista da obten¸c˜ao do campo magn´etico, semelhante ao do potencial electrost´atico no caso da determina¸c˜ao do campo el´ectrico. A rela¸c˜ ao expressa por (8.19) ´e an´aloga a (2.9). Por outro lado, para materiais homog´eneos, lineares e isotr´opicos, verifica-se a Eq. (8.16), com µ constante. Usando a equa¸c˜ao de Maxwell ∇ · B = 0, conclui-se que, nestas circunstˆancias, ∇ · H = 0. (8.20) Esta equa¸c˜ao, combinada com (8.19), permite obter a seguinte equa¸c˜ ao para o potencial magn´etico: (8.21) ∇2 Vm = 0 , que ´e a equa¸c˜ao de Laplace. Note-se que, sempre que se verifique a equa¸c˜ ao ∇ · M = 0, a Eq. (8.20) tamb´em ´e verificada e, portanto, a Eq. (8.21) aplica-se. Em situa¸c˜oes para as quais (8.18) e (8.20) se verifiquem, a obten¸c˜ ao de H (ou de B ) pode ser feita partindo do conhecimento de Vm . Este potencial ´e determinado resolvendo a equa¸c˜ao de Laplace, usando as t´ecnicas apresentadas para o potencial escalar (Cap´ıtulo 6). A t´ıtulo de exemplo, refira-se que, para determinar o campo H em todo o espa¸co, quando uma esfera de permeabilidade magn´etica constante, µ, ´e colocada numa regi˜ao onde existe um campo de indu¸c˜ao magn´etica uniforme, podem aplicar-se os racioc´ınios desenvolvidos no Exemplo 6.7 (ver tamb´em Problema 8.9.5). 8.6 ´ MODELO DAS CARGAS MAGNETICAS O estudo do magnetismo em meios magn´eticos pode tamb´em ser feito seguindo de perto o formalismo que se utiliza para os diel´ectricos. Assim, em analogia com a carga de polariza¸c˜ ao nos diel´ectricos, postula-se a existˆencia de densidades de carga magn´etica e desenvolve-se um formalismo que, do ponto de vista dos resultados, ´e equivalente ao modelo das correntes de Amp`ere. Definem-se as densidades volum´etrica e superficial de carga magn´etica atrav´es de ρ∗ = −∇ · (µ0 M ) ˆ · ( µ0 M2 − µ0 M1 ), σ ∗ = −divS (µ0 M ) = −n (8.22) (8.23) ˆ ´e a normal `a superf´ıcie, apontando para o meio 2. Note-se que a correspondˆencia onde n com o vector polariza¸c˜ao ´e µ0 M ↔ P . Tomando a divergˆencia de ambos os membros de (8.10) e utilizando (8.8) e (8.22), escreve-se ∇·H = ρ∗ . µ0 (8.24) Magnetismo em meios materiais • 231 Por outro lado, usando a defini¸c˜ao (8.23) em (8.14), tem-se divS H = σ∗ . µ0 (8.25) Estas equa¸c˜oes s˜ao an´alogas `as que se tˆem para o campo el´ectrico. Por integra¸c˜ ao da Eq. (8.24) e utilizando o teorema de Gauss, obt´em-se I S H · dS = Q∗ , µ0 (8.26) sendo Q∗ a “carga magn´etica” total contida no volume v delimitado pela superf´ıcie fechada S. A principal vantagem do formalismo das cargas magn´eticas reside no facto de poderem ser aplicadas `a determina¸c˜ao de H as t´ecnicas desenvolvidas para a determina¸c˜ ao do campo el´ectrico a partir das distribui¸c˜oes de carga el´ectrica. 8.7 ´ ENERGIA ARMAZENADA NO CAMPO MAGNETICO ´ NA PRESENC ¸ A DE MEIOS MAGNETICOS Verific´amos no Cap´ıtulo 7 que, no vazio, a energia magn´etica armazenada numa distribui¸c˜ao de correntes livres pode ser escrita na forma [Eq. (7.9)] Z 1 j` · A dv . (8.27) 2 Vejamos agora como se exprime a energia magn´etica armazenada numa distribui¸c˜ ao de correntes livres numa regi˜ao do espa¸co que cont´em materiais magnetiz´aveis. Essa energia, igual ao trabalho revers´ıvel para construir a distribui¸c˜ ao de correntes livres, ´e, ainda, dada pela Eq. (8.27), mas, neste caso, A cont´em tamb´em os efeitos provenientes da magnetiza¸c˜ ao do 1 meio. Utilizando a rela¸c˜ao (8.12), v´alida para regimes estacion´arios (admitimos situa¸c˜ oes em que o regime estacion´ario j´a foi alcan¸cado), a Eq. (8.27) ´e escrita na forma Um = Z 1 ∇ × H · A dv . Um = 2 Utilizando, novamente, a argumenta¸c˜ ao que, na Sec¸c˜ ao 7.2, permitiu obter (7.17) a partir de (7.15), tem-se: Z Z 1 1 Um = ∇ × A · H dv − ∇ · (A × H ) dv 2 2 Z I 1 1 = B · H dv − (A × H ) · dS . 2 2 Como se concluiu naquela sec¸c˜ao, o integral de superf´ıcie ´e nulo e, portanto, Z 1 Um = B · H dv , 2 sendo a densidade de energia magn´etica dada por 1 um = B · H . 2 No caso de meios lineares, homog´eneos e isotr´opicos, a energia magn´etica ´e Z µ Um = H 2 dv , (8.28) 2 sendo o integral estendido a todo o espa¸co. A express˜ao (8.28) ´e v´alida tanto em regime estacion´ario como em regime n˜ao estacion´ario. 1 De facto, tal como (5.31), tamb´em (8.27) pressup˜ oe a linearidade do meio magn´etico. 232 • ´tico Campo electromagne 8.8 ´ MATERIAIS FERROMAGNETICOS J´a referimos anteriormente algumas caracter´ısticas dos materiais ferromagn´eticos, para os quais n˜ao se verifica uma rela¸c˜ao simples entre o campo de indu¸c˜ ao magn´etica, B , e o campo magn´etico, H . Como veremos em pormenor nesta sec¸c˜ ao, em geral, o comportamento do material depende da “hist´oria” da amostra em quest˜ao. Microscopicamente, o ferromagnete ´e caracterizado pela existˆencia de dom´ınios que s˜ao regi˜oes nas quais os spins est˜ao espontaneamente alinhados numa dada direc¸c˜ ao. No material n˜ao magnetizado os spins dos v´arios dom´ınios apontam para direc¸c˜oes arbitr´arias e o campo macrosc´opico resultante ´e nulo. Contudo, por aplica¸c˜ao de um campo externo, os spins dos dom´ınios tendem a alinhar com a direc¸c˜ao do campo. Digamos que a magnetiza¸c˜ ao corresponde a um desaparecimento das paredes dos v´arios dom´ınios do material. Vejamos de que modo se pode estabelecer uma rela¸c˜ ao entre o campo B num meio ferromagn´etico e o campo H devido `as correntes livres. Considere-se um solen´oide toroidal formado por N espiras de um fio percorrido pela corrente i enrolado em torno de um n´ ucleo de um material ferromagn´etico, por exemplo, ferro macio. A situa¸c˜ ao est´a esquematizada na Figura 8.4. C r a b i (a ) (b ) Figura 8.4. (a) Enrolamento de espiras em torno de um tor´ oide de material ferromagn´ etico. (b) Caracter´ısticas geom´ etricas do tor´ oide e caminho C referido no integral em (8.29). As linhas do campo H s˜ao circunferˆencias com centro no eixo do tor´oide e raio r, vari´ avel entre a e b. O campo magn´etico est´a confinado no interior do enrolamento (fora do tor´oide ´e nulo) e pode ser calculado facilmente usando a forma integral da express˜ao (8.12), I Z C H · dl = j` · dS , (8.29) a b: o campo resultante ´e nulo nesta regi˜ao, pois o campo (8.43) ´e anulado por um de igual valor e sentido contr´ ario com origem no condutor exterior, o qual ´e percorrido pela corrente −I0 . De facto, considerando um contorno C, de raio r > b, a corrente total que flui atrav´es da superf´ıcie S ´e nula, pois as correntes nos condutores exterior e interior s˜ao sim´etricas. Por outro lado, a circula¸c˜ ao de H ´e dada por 2πrH = 0, de onde se conclui que H = 0. O campo magn´etico est´a representado no gr´afico da Figura 8.9 e apresenta uma descontinuidade para r = b. H (r) I0 2 p a I 0 2 p b a b r Figura 8.9. Valor do campo magn´ etico em fun¸ c˜ ao da distˆ ancia ao eixo do cilindro. Magnetismo em meios materiais • 239 ´ um exerc´ıcio u E ´til confirmar que o rotacional superficial de H em r = b ´e igual `a densidade de corrente superficial, κ0 . Esta corrente superficial pode ser expressa em termos da corrente I0 : I ˆz . κ0 = − 0 e (8.44) 2πb O rotacional superficial de H ´e dado por [ver (8.43)] µ I0 2πb ˆr × e ˆφ 0 − e ¶ =− I0 ˆz , e 2πb que ´e, de facto, a express˜ao de κ0 [cf. Eq. (8.44)]. Nas regi˜oes onde n˜ao h´a material magn´etico, o campo de indu¸c˜ ao magn´etica B ´e simplesmente B = µ0 H , donde, µ I r ˆφ B = 0 02 e para r < a (8.45) 2πa e B=0 para r > b . (8.46) No material magnetizado, B = µH , obtendo-se µ I0 ˆφ e para a < r < b . (8.47) 2πr A Figura 8.10 apresenta o gr´afico do campo de indu¸c˜ ao magn´etica em fun¸c˜ ao da coordenada cil´ındrica r. H´a descontinuidades em r = a e em r = b relacionadas com a existˆencia de distribui¸c˜oes superficiais de correntes nessas superf´ıcies. B= B (r) m I0 2 p a m 0 I0 2 p a m I0 2 p b a b r Figura 8.10. Valor do campo de indu¸ c˜ ao magn´ etica em fun¸ c˜ ao da distˆ ancia ao eixo do cilindro. A magnetiza¸c˜ao M ´e nula para as regi˜oes r < a e r > b, pois n˜ao existe a´ı material magnetiz´avel. Na regi˜ao entre os dois condutores, a < r < b, tem-se [cf. (8.15) e (8.16)], M = χm H = (µr − 1) H , 240 • ´tico Campo electromagne onde χm ´e a susceptibilidade magn´etica do material e µr = µ/µ0 a sua permeabilidade relativa. Em termos da permeabilidade magn´etica, µ, µ M= obtendo-se µ M= ¶ µ −1 µ0 H, ¶ I0 µ ˆφ −1 e µ0 2πr para a < r < b . A grandeza do vector magnetiza¸c˜ao, em fun¸c˜ ao da coordenada cil´ındrica r, est´a representada na Figura 8.11. Tamb´em o vector M apresenta descontinuidades sobre as superf´ıcies r = a e r = b, o que significa que existem correntes superficiais de magnetiza¸c˜ ao nessas superf´ıcies. M (r) (m - m 0)I 0 2 p m 0a (m - m 0)I 2 p m 0b 0 a b r Figura 8.11. M´ odulo da magnetiza¸ c˜ ao em fun¸ c˜ ao da distˆ ancia ao eixo do cilindro. As densidades de correntes de magnetiza¸c˜ ao s˜ao obtidas a partir do vector magnetiza¸c˜ ao. Para as correntes volum´etricas jm = ∇ × M = 1∂ ˆz = 0 ; (rMφ )e r ∂r para as correntes superficiais, em r = b, µ ˆr × e ˆ φ [0 − M (b)] = − κm = rotS M = e e, em r = a, µ ˆr × e ˆ φ [0 − M (a)] = κm = −e ¶ I0 µ ˆz , −1 e µ0 2πb (8.48) ¶ µ I0 ˆz . −1 e µ0 2πa (8.49) Podemos, finalmente, calcular o rotacional superficial do campo de indu¸c˜ ao magn´etica e assim confirmar que se obtˆem as correntes totais (livres e de magnetiza¸c˜ ao). A corrente superficial total em r = a ´e apenas a corrente de magnetiza¸c˜ ao (8.49), pois n˜ao h´a a´ı correntes livres: µ ¶ µ I0 ˆz . κtotal (r = a) = −1 e (8.50) µ0 2πa Magnetismo em meios materiais • 241 Em r = b, a densidade total de corrente ´e a soma de (8.48) e de (8.44): κtotal (r = b) = − µ I0 ˆz . e µ0 2πb (8.51) A partir de (8.45), (8.46) e (8.47) pode obter-se o rotacional superficial do campo de indu¸c˜ ao magn´etica, que ´e igual ao produto de µ0 pela densidade total de corrente superficial: rotS B = µ0 κtotal . Calculando explicitamente este rotacional superficial, para r = a, e, para r = b, obtˆem-se, a menos do factor µ0 , as express˜oes (8.50) e (8.51), respectivamente. 8.9.3 Fatia magnetizada Quest˜ ao A regi˜ao do espa¸co definida por 0 < x < d est´ a preenchida com uma substˆancia magnetizada de magnetiza¸c˜ao M = M0 ˆi. Determinar os campos H e B em todo o espa¸co. Resposta A Figura 8.12 mostra, em esquema, a situa¸c˜ ao descrita no enunciado. M = 0 0 M d M = 0 x Figura 8.12. Representa¸ c˜ ao esquem´ atica de uma “fatia” de material magnetizado. ´ conveniente usar o formalismo das cargas magn´eticas (Sec¸c˜ E ao 8.6). As densidades volum´etrica e superficial de carga magn´etica s˜ ao dadas, respectivamente, por (8.22), ρ∗ = −∇ · (µ0 M ) e por (8.23), σ ∗ = −divS (µ0 M ). As eqs. (8.24) e (8.25) s˜ao formalmente idˆenticas `as que relacionam o campo el´ectrico, E , com as densidades de carga el´ectrica que o originam. Esta analogia sugere a determina¸c˜ ao do 242 • ´tico Campo electromagne campo H a partir de ρ∗ e σ ∗ , exactamente como se determinaria o campo el´ectrico a partir de densidades de carga el´ectrica3 . No problema em quest˜ao a magnetiza¸c˜ ao ´e constante e, por isso, a densidade de carga ∗ magn´etica, ρ , ´e nula. As distribui¸c˜oes superficiais de carga s˜ao [ver Eq. (8.23)]: i) em x = 0, h i σ ∗ (x = 0) = −µ0 −ˆi · (0 − M0ˆi) = −µ0 M0 ; ii) em x = d, h i σ ∗ (x = d) = −µ0 ˆi · (0 − M0ˆi) = µ0 M0 . O campo magn´etico devido a esta distribui¸c˜ ao de carga magn´etica ´e da forma do campo el´ectrico criado por duas distribui¸c˜oes superficiais e sim´etricas de carga nos planos x = 0 e x = d (condensador plano). Assim, na regi˜ao entre os planos, H =− σ∗ ˆ i = −M0ˆi = −M , µ0 (8.52) com σ ∗ = σ ∗ (x = d). O campo magn´etico ´e constante entre 0 < x < d e nulo fora dessa regi˜ao. Recorde-se que, no caso do condensador plano ideal, o campo el´ectrico entre as placas tamb´em ´e constante, igual a σ/²0 , e as linhas de campo apontam das cargas positivas para as negativas. O campo de indu¸c˜ao magn´etica relaciona-se com M e H atrav´es de [ver (8.11)] B = µ0 (H + M ) , sendo, por isso, nulo na regi˜ao 0 < x < d, de acordo com (8.52). Fora dessa regi˜ao o campo de indu¸c˜ao magn´etica tamb´em ´e nulo, pois M e H s˜ao nulos. O facto de B e de H se anularem em todo o espa¸co fora do material magnetizado tem a ver com a extens˜ao infinita deste. Na pr´atica, porque os sistemas s˜ao finitos, os campos magn´etico ou de indu¸c˜ ao magn´etica n˜ao ser˜ao nulos fora da regi˜ao onde existe meio magn´etico. Este ´e um exemplo de um material que n˜ao ´e linear, pois B = 0 e H 6= 0. 8.9.4 Esfera uniformemente magnetizada Quest˜ ao ˆ z . Calcular B e H e Uma esfera de raio a possui uma magnetiza¸c˜ ao uniforme M = M0 e fazer um esbo¸co das linhas destes campos em todo o espa¸co. (Sugest˜ao: utilizar o formalismo do potencial escalar magn´etico.) Resposta Trata-se de uma situa¸c˜ao em que n˜ao h´a correntes livres, nem correntes de deslocamento, pois n˜ao h´a varia¸c˜oes temporais. O campo magn´etico H ´e, neste caso, irrotacional, ∇ × H = 0, podendo ser escrito, como vimos na Sec¸c˜ ao 8.5, como o gradiente de uma fun¸c˜ ao escalar, H = −∇Vm , sendo Vm o potencial escalar magn´etico. Como se tem, na presente situa¸c˜ao, ∇ · M = 0, tamb´em ∇ · H = 0 e, portanto, o potencial escalar obedece `a equa¸c˜ao de Laplace [ver (8.21)], ∇2 Vm = 0. 3 A correspondˆencia que se faz ´e H ↔ E, ρ∗ ↔ ρ , σ ∗ ↔ σ e µ0 ↔ ²0 . Magnetismo em meios materiais • 243 Em coordenadas esf´ericas, havendo simetria axial, como ´e o caso, a solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace, tanto no interior como no exterior da esfera, ´e da forma (6.54): ∞ µ X Vm (r, θ) = An rn + n=0 Bn rn+1 ¶ Pn (cos θ) . Os coeficientes An e Bn s˜ao determinados a partir das seguintes condi¸c˜ oes de fronteira4 : 1) Vme ´e nulo quando r → ∞; 2) Vmi ´e finito para r = a; 3) H´a continuidade do potencial sobre a superf´ıcie da esfera: Vmi (r = a, θ) = Vme (r = a, θ) ; 4) O rotacional superficial de H ´e nulo sobre a superf´ıcie da esfera, pois n˜ao h´a correntes livres, ou seja, ˆ r × (H e − H i ) = 0 , em r = a ; (8.53) e 5) A partir da magnetiza¸c˜ao define-se a carga magn´etica superficial [ver (8.23)], ˆr · e ˆ z = µ0 M0 cos θ . σ ∗ = −divS (µ0 M ) = µ0 M0 e Dado que divS H = −divS M , o campo H deve satisfazer a condi¸c˜ ao ˆ r · (H e − H i ) = M0 cos θ . e (8.54) Vejamos o que resulta da aplica¸c˜ ao das condi¸c˜ oes de fronteira acima enumeradas. Passaremos a designar por An e Bn os coeficientes no potencial interior e por A0n e Bn0 os do potencial exterior. Para satisfazer a primeira condi¸c˜ ao de fronteira, o potencial no exterior deve assumir a forma ∞ X Bn0 (8.55) Pn (cos θ) . Vme (r, θ) = rn+1 n=0 Da segunda condi¸c˜ao de fronteira resulta, para o potencial no interior, Vmi (r, θ) = ∞ X An rn Pn (cos θ) . (8.56) n=0 A descontinuidade da componente normal do campo H , expressa em (8.54), pode ser escrita em termos das derivadas em ordem a r do potencial: µ ∂Vme − ∂r à ¶ + r=a ∂Vmi ∂r ! = M0 cos θ . r=a Derivando (8.55) e (8.56) em ordem a r, a express˜ao anterior conduz a ∞ · X n=0 4 ¸ Bn0 + nan−1 An Pn (cos θ) = M0 cos θ , (n + 1) n+2 a Nas express˜ oes seguintes os ´ındices “i” e “e” indicam interior e exterior da esfera, respectivamente. Assim, Vmi ´e o potencial interior e Vme o exterior. 244 • ´tico Campo electromagne igualdade que s´o se verifica, para qualquer θ, desde que (n + 1) e Bn0 + nan−1 An = 0 , an+2 2B10 + A1 = M0 , a3 n 6= 1 n = 1. (8.57) (8.58) A continuidade do potencial, para r = a, introduz as seguintes condi¸c˜ oes: Bn0 = an An , an+1 e B10 = aA1 , a2 n 6= 1 (8.59) n = 1. (8.60) As eqs. (8.57) e (8.59) s´o se podem verificar simultaneamente se Bn0 = An = 0, para qualquer n 6= 1. Por outro lado, combinando (8.60) com (8.58), obt´em-se A1 = M0 3 e B10 = M0 a3 . 3 Os potenciais interior e exterior tomam as formas, respectivamente, Vmi = M0 M0 r cos θ = z 3 3 Vme = M0 a3 cos θ . 3 r2 e Como se poder´a verificar, as express˜oes obtidas para o potencial satisfazem necessariamente a condi¸c˜ao de fronteira que traduz a continuidade da componente tangencial do campo H , Eq. (8.53). O campo magn´etico ´e obtido tomando o sim´etrico do gradiente de Vm . No interior, conv´em usar a express˜ao do gradiente em coordenadas cartesianas, obtendo-se H i = −∇Vmi = − dVmi M M ˆz = − 0 e ˆz = − e . dz 3 3 Note-se a analogia formal entre este resultado e a express˜ao obtida para o campo el´ectrico no interior de uma esfera uniformemente polarizada (ver Exemplo 5.2). No exterior, ´e mais f´acil utilizar coordenadas esf´ericas, obtendo-se µ ¶ 1 ∂Vme ∂Vme ˆr + ˆθ e e ∂r r ∂θ M0 a3 ˆ r + sin θ e ˆθ ) . ( 2 cos θ e 3r3 He = − = As dependˆencias radial e angular encontradas s˜ao t´ıpicas de um campo dipolar, observandose, tamb´em neste caso, uma analogia formal com o campo el´ectrico no exterior de uma esfera uniformemente polarizada (ver Exemplo 5.2). Magnetismo em meios materiais • 245 Calculemos, finalmente, o campo de indu¸c˜ ao magn´etica nas duas regi˜oes: a interior e a exterior. i) Regi˜ao interior: µ B i = µ0 (H i + M ) = µ0 − M0 ˆ z + M0 e ˆz e 3 ¶ = 2 ˆz ; µ0 M0 e 3 ii) Regi˜ao exterior: B e = µ0 H e = µ0 M0 a3 ˆ r + sin θ e ˆθ ) . ( 2 cos θ e 3r3 De resto, este resultado tamb´em podia ser obtido a partir da express˜ao geral do campo de indu¸c˜ao magn´etica dipolar [Eq. (7.31)], Be = µ0 m ˆ r + sin θ e ˆθ ) , ( 2 cos θ e 4πr3 usando o valor do momento dipolar da esfera uniformemente magnetizada: 4 m = M0 πa3 . 3 As linhas dos campos B , H e M est˜ao esbo¸cadas na Figura 8.13. B M H B ,H Figura 8.13. Linhas dos campos B , H e M. 8.9.5 Esfera magn´ etica em campo uniforme Quest˜ ao Uma esfera de raio a e permeabilidade magn´etica µ constante ´e colocada numa regi˜ao ˆ . Calcular os campos B onde existe um campo de indu¸c˜ao magn´etica uniforme B0 = B0 k e H em todo o espa¸co. Resposta N˜ao h´a correntes livres nem dependˆencias temporais. O material ´e linear, homog´eneo e isotr´opico e podemos ent˜ao adoptar o formalismo do potencial escalar magn´etico, Vm , o qual obedece `a equa¸c˜ao de Laplace, ∇2 Vm = 0, e obter o campo magn´etico a partir de H = −∇Vm . 246 • ´tico Campo electromagne Pode estabelecer-se uma analogia entre a presente situa¸c˜ ao e o Exemplo 6.7 relativo a uma esfera diel´ectrica colocada numa regi˜ao onde existia um campo el´ectrico uniforme. Remetese, pois, o leitor para esse exemplo, devendo notar-se o seguinte: o potencial electrost´atico deve ser substitu´ıdo pelo potencial escalar magn´etico; a permitividade relativa, ²r , deve ser substitu´ıda pela permeabilidade relativa µr = µ/µ0 ; o valor do campo el´ectrico, E0 , deve ser substitu´ıdo por H0 = B0 /µ0 . O potencial escalar Vm ´e dado, no interior e no exterior da esfera, por [ver (6.74) e (6.75)] Vmi = − 3H0 r cos θ µr + 2 Vme = −H0 r cos θ + r≤a µr − 1 a3 H0 cos θ µr + 2 r2 r ≥ a. (8.61) (8.62) Atendendo a que z = r cos θ, ´e mais f´acil utilizar coordenadas cartesianas, na determina¸c˜ao do campo H no interior da esfera: H i = −∇Vmi = 3H0 ˆ k. µr + 2 (8.63) O campo de indu¸c˜ao magn´etica ´e B i = µ H i = µr µ0 ou ainda Bi = 3H0 ˆ k, µr + 2 3µr ˆ. B0 k µr + 2 A magnetiza¸c˜ao da esfera ´e dada pelo vector M , M = = Bi µ0 µ − Hi = ¶ 3H0 3µr B0 ˆ − k µr + 2 µ0 µr + 2 3 (µr − 1) ˆ. H0 k µr + 2 Como χm = µr − 1 e H i ´e dado por (8.63), verifica-se a rela¸c˜ ao M = χm H i , o que ´e coerente com o facto de se tratar de um material linear, homog´eneo e isotr´opico. A partir das express˜oes obtidas para B i , H i e M , ´e f´acil mostrar que B i = B0 + 2 µ0 M 3 e H i = H0 − M . 3 No exterior, o campo magn´etico ´e obtido calculando −∇Vme , com Vme dado por (8.62), H e = H0 + µr − 1 µr + 2 µ ¶3 a r ˆ r + sin θ e ˆθ) , H0 (2 cos θ e ou seja, ´e a soma do campo que existia inicialmente com um campo dipolar [ver Eq. (7.31)]. O campo de indu¸c˜ao magn´etica, B e , ´e simplesmente µ0 H e , uma vez que a magnetiza¸c˜ ao no exterior ´e nula. Magnetismo em meios materiais 8.9.6 • 247 Cilindro magnetizado Quest˜ ao Um cilindro de comprimento L e raio R ´e constitu´ıdo por um material permanentemente magnetizado, cuja magnetiza¸c˜ao ´e dada por ( ˆz M = M0 e 0 L/2, o sentido de k ˆ . O disco inferior cria um campo que, para z > −L/2, tem o sentido de −k ˆ e sentido de −k o sentido contr´ario para z < −L/2. Tal significa que H =0 para z < − L L e z> 2 2 e L L b; • Na regi˜ao a < r < b o campo ´e dado por µ 1 −4 π µ0 M0 a − 4 π 4πr H = µ0 2 ¶ Z r µ0 M0 2 r dr = −4 π M0 r , 2 a r donde H =− M0 ˆ r = −M , e r resultado j´a anteriormente obtido [cf. (8.67)]. 8.9.8 Esfera com magnetiza¸c˜ ao n˜ ao uniforme Quest˜ ao Uma esfera de raio a tem uma magnetiza¸c˜ ao n˜ao uniforme dada por ˆ, M = (αz 2 + β)k onde α e β s˜ao constantes. A origem dos eixos ´e o centro da esfera. Calcular as correntes equivalentes de Amp`ere e as densidades de “carga magn´etica”. Explicitar as condi¸c˜oes que as componentes normais e tangenciais de H , M e B devem satisfazer sobre a superf´ıcie da esfera. 252 • ´tico Campo electromagne z ^ k ^e z q r a x y Figura 8.18. Esquema da esfera magnetizada do Problema 8.9.8 Resposta A densidade volum´etrica de corrente ´e jm = ∇ × M = ˆi ∂Mz ˆ ∂Mz −j = 0. ∂y ∂x Sobre a superf´ıcie (ver Figura 8.18) a densidade superficial de corrente ´e dada por ˆ] , ˆ r × (M2 − M1 ) = e ˆ r × [0 − (αz 2 + β) k κm = e (8.68) ˆ = −e ˆr × k ˆ φ sin θ, pelo que com z = a cos θ. Por outro lado, e ˆφ . κm = (α a2 cos2 θ + β) sin θ e As densidades de carga magn´etica s˜ao: i) volum´etrica ρ∗ = −∇ · (µ0 M ) = −µ0 dMz = −µ0 2 α z dz = −2 µ0 α r cos θ ; ii) superficial ˆ · (µ0 M2 − µ0 M1 ) σ ∗ = −n ˆ ] = µ0 (α a2 cos2 θ + β) cos θ . ˆ r · [0 − µ0 (α a2 cos2 θ + β) k = −e (8.69) Magnetismo em meios materiais • 253 Vejamos agora quais s˜ao as condi¸c˜ oes que as componentes normais e tangenciais dos campos devem satisfazer. • Campo H As componentes tangenciais do campo magn´etico satisfazem a equa¸c˜ ao rotS H = κ` = 0 , pois, no caso presente, n˜ao h´a correntes livres. As componentes tangenciais de H s˜ ao cont´ınuas sobre a superf´ıcie da esfera: H2t − H1t = 0 . (8.70) Quanto `as componentes normais, a condi¸c˜ ao que devem satisfazer resulta da equa¸c˜ ao ˆ · (H2 − H1 ) = divS H = n σ∗ , µ0 donde se obt´em [ver tamb´em (8.70)] H2n − H1n = (αa2 cos2 θ + β) cos θ ; (8.71) • Campo M As componentes tangenciais da magnetiza¸c˜ ao satisfazem a condi¸c˜ ao expressa por (8.68), tendo-se [ver tamb´em (8.69)] M2t − M1t = (αa2 cos2 θ + β) sin θ . (8.72) Para as componentes normais a condi¸c˜ ao ´e expressa por (8.70), que aqui se volta a escrever na forma (8.73) M2n − M1n = −(αa2 cos2 θ + β) cos θ ; • Campo B Sendo B = µ0 (H + M ), as condi¸c˜ oes que as componentes de B tˆem de satisfazer resultam directamente das condi¸c˜ oes obtidas para o campo magn´etico e para a magnetiza¸c˜ao. Assim, de (8.70) e de (8.72), B2t − B1t = µ0 (αa2 cos2 θ + β) sin θ ; e, de (8.71) e de (8.73), B2n − B1n = 0 . 254 • ´tico Campo electromagne CAP´ITULO 9 ´ ONDAS ELECTROMAGNETICAS No in´ıcio do cap´ıtulo apresentam-se, em jeito de sum´ario, as equa¸c˜ oes de Maxwell. Estudam-se depois as equa¸c˜oes de onda para os campos E e B no vazio e suas solu¸c˜ oes de onda plana. No ˆambito de considera¸c˜ oes energ´eticas relativas ao campo electromagn´etico, define-se o vector de Poynting e apresenta-se o teorema de Poynting. Analisam-se seguidamente as solu¸c˜oes das equa¸c˜oes de onda para os campos el´ectrico e magn´etico em meios est´aticos, lineares, isotr´opicos e homog´eneos (meios n˜ao condutores e meios condutores). Estuda-se a mudan¸ca de meio de uma onda electromagn´etica para se deduzirem as leis da reflex˜ao e da refrac¸c˜ao. O problema dos guias de ondas ´e abordado no final do cap´ıtulo. 9.1 ˜ EQUAC ¸ OES DE MAXWELL — RESUMO As equa¸c˜oes de Maxwell mais gerais, no sentido em que s˜ao v´alidas quer no vazio, quer em meios materiais, s˜ao escritas na forma: ρ ²0 ∂B ∇×E+ =0 ∂t ∇·B =0 1 ∂E = µ0 j , ∇×B− 2 c ∂t ∇·E = onde (entre parˆentesis rectos apresenta-se a respectiva unidade SI): • E ´e o campo el´ectrico [V/m]; • B ´e o campo de indu¸c˜ao magn´etica [T]; (9.1) (9.2) (9.3) (9.4) 256 • ´tico Campo electromagne • ρ ´e a densidade de carga [C/m3 ]; • j ´e a densidade de corrente [A/m2 ]; • ²0 = 8, 85×10−12 F/m ´e a permitividade do vazio; • µ0 = 4 π ×10−7 H/m ´e a permeabilidade do vazio; • c = (²0 µ0 )−1/2 = 3×108 m/s ´e a velocidade da luz. As densidades de carga e de corrente s˜ao dadas, respectivamente, por ρ = ρ` + ρp j = j` + jm + ∂P , ∂t onde • ρ` ´e a densidade de carga livre; • j` ´e a densidade de corrente livre; • ρp ´e a densidade de carga de polariza¸c˜ ao; • jm ´e a densidade de corrente de magnetiza¸c˜ ao; • P ´e o vector polariza¸c˜ao [C/m2 ]; • ∂P ∂t ´e a densidade de corrente de polariza¸c˜ ao [A/m2 ]. A densidade de carga de polariza¸c˜ ao relaciona-se com o vector polariza¸c˜ ao e a densidade de corrente de magnetiza¸c˜ao relaciona-se com o vector magnetiza¸c˜ ao, M [A/m], atrav´es de ρp = −∇ · P jm = ∇ × M . Em meios em repouso, com comportamento linear e isotr´opico, tem-se j` = σ E P = ²0 χe E M = χm H , onde • σ ´e a condutividade [1/(Ω·m)]; • χe ´e a susceptibilidade el´ectrica (sem dimens˜oes); • χm ´e a susceptibilidade magn´etica (sem dimens˜oes); • H ´e a intensidade magn´etica [A/m]. (9.5) (9.6) (9.7) ´ticas Ondas electromagne • 257 Define-se a permitividade relativa, ²r , e a permeabilidade relativa, µr , dos meios atrav´es de ² ²0 µ µr = 1 + χm = µ0 ²r = 1 + χe = ⇒ ² = ²0 ²r ⇒ µ = µ0 µr , sendo ² e µ, respectivamente, a permitividade e a permeabilidade absolutas. H´a outras maneiras equivalentes de escrever as equa¸c˜ oes de Maxwell mas, insistimos, nada contˆem de novo. Uma delas ´e a formula¸c˜ ao amperiana que considera os vectores E , B , P , M e as densidades de carga e corrente livres, tendo-se ρ` − ∇ · P ²0 ∂B ∇×E+ =0 ∂t ∇·B =0 µ ¶ 1 ∂E ∂P ∇×B− 2 = µ 0 j` + +∇×M . c ∂t ∂t ∇·E = (9.8) (9.9) (9.10) (9.11) No caso de meios homog´eneos, lineares e isotr´opicos, ρ` = ²r ρ, P = ²0 (²r − 1) E , M = (µr − 1) B /(µr µ0 ); as equa¸c˜oes de Maxwell s˜ao dadas por ρ` ² ∂B ∇×E+ =0 ∂t ∇·B =0 ∂E = µ j` . ∇ × B − ²µ ∂t ∇·E = A formula¸c˜ao de Minkowski das equa¸c˜ oes de Maxwell utiliza os vectores E , D = ²0 E + P (que ´e o vector deslocamento [C/m2 ]), B e H . O conjunto anterior de equa¸c˜ oes ´e escrito ent˜ao na forma ∇ · D = ρ` (9.12) ∂B =0 ∂t ∇·B =0 ∂D ∇×H − = j` . ∂t ∇×E+ (9.13) (9.14) (9.15) D ´ O termo ∂∂t e a corrente de deslocamento (Sec¸c˜ ao 2.3) ou, mais apropriadamente, densidade de corrente de deslocamento. As equa¸c˜oes de Maxwell contˆem a lei de conserva¸c˜ ao da carga, como se pode verificar tomando a divergˆencia de (9.4) e usando (9.1) e a igualdade c−2 = ²0 µ0 : ∇·j =− ∂ρ . ∂t Esta forma da equa¸c˜ao de continuidade ´e geral: ρ cont´em as contribui¸c˜ oes de cargas livres e de polariza¸c˜ao, se existirem, e j as correntes livres, de polariza¸c˜ ao e de magnetiza¸c˜ ao. 258 • ´tico Campo electromagne Fa¸camos, finalmente, um resumo das condi¸c˜ oes de fronteira: ˆ · (D2 − D1 ) = σ` divS D = n ˆ × (E2 − E1 ) = 0 rotS E = n (9.16) ˆ · (B2 − B1 ) = 0 divS B = n ˆ × (H2 − H1 ) = κ` rotS H = n (9.18) ˆ · (P2 − P1 ) = −σp divS P = n ˆ × (M2 − M1 ) = κm , rotS M = n (9.20) (9.17) (9.19) (9.21) ˆ ´e o versor perpendicular `a superf´ıcie que aponta para o meio 2, e onde n • σ` ´e a densidade superficial de carga livre [C/m2 ]; • κ` ´e a densidade superficial de corrente livre [A/m]; • σp ´e a densidade superficial de carga de polariza¸c˜ ao [C/m2 ]; • κm ´e a densidade superficial de corrente de magnetiza¸c˜ ao [A/m]. B , em (9.13), nem ∂ D , em (9.15), contribuem para estas condi¸c˜ Note-se que nem ∂∂t oes ∂t de fronteira. Na verdade, o fluxo destes vectores, atrav´es de uma superf´ıcie que se apoia no contorno fechado C da Figura 8.3, tende necessariamente para zero, porque a ´area dessa superf´ıcie tende para zero (nessa mesma figura, ds → 0). 9.2 ´ CAMPO ELECTROMAGNETICO NO VAZIO No Cap´ıtulo 2 (Sec¸c˜ao 2.5) obtiveram-se equa¸c˜ oes n˜ao acopladas para os campos E e B no caso em que existiam fontes, cargas e correntes livres, mas na ausˆencia de meios materiais. O estudo das equa¸c˜oes de onda em meios materiais ser´a deixado para mais tarde. Analisamos agora as solu¸c˜oes das equa¸c˜oes para os campos E e B no vazio. Fora das regi˜oes onde se localizam as fontes, tem-se j` = 0 e ρ` = 0, pelo que as eqs. (2.83) e (2.84) se reduzem `as seguintes equa¸c˜ oes diferenciais homog´eneas lineares `as derivadas parciais: 1 c2 1 ∇2 B − 2 c ∇2 E − ∂2E ∂t2 ∂2B ∂t2 = 0 (9.22) = 0. (9.23) Estas s˜ao equa¸c˜ oes de onda, cujas solu¸c˜ oes s˜ao ondas que se propagam com velocidade c. Consideremos o caso particular de ondas planas que se propagam na direc¸c˜ ao do eixo z. Designando por Φ qualquer das componentes dos campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica, tem-se para Φ a seguinte dependˆencia no espa¸co e no tempo: Φ(r , t) = Φ(z, t). A solu¸c˜ao mais geral da equa¸c˜ao 1 ∂2Φ ∂2Φ = (9.24) ∂z 2 c2 ∂t2 ´e da forma Φ(z, t) = f− (z − ct) + f+ (z + ct) , (9.25) sendo f− e f+ fun¸c˜oes arbitr´arias dos respectivos argumentos indicados em (9.25). A fun¸c˜ ao f− representa uma onda progressiva que se propaga no sentido positivo do eixo z e a fun¸c˜ao ´ticas Ondas electromagne • 259 f+ uma onda que se propaga no sentido negativo desse mesmo eixo (ver Problema 9.9.6). Dado o car´acter linear da equa¸c˜ ao de onda (9.24), qualquer combina¸c˜ ao linear de solu¸c˜ oes do tipo (9.25) ´e ainda uma solu¸c˜ao. Como a equa¸c˜ao de Maxwell ∇ · E = 0 se verifica em qualquer ponto do espa¸co, pode concluir-se que ∂Ez /∂z = 0, uma vez que n˜ao h´a dependˆencias em x ou em y no caso de uma onda plana. Pelo mesmo motivo, e dado que ∇ · B = 0, tamb´em ∂Bz /∂z = 0, pois o campo de indu¸c˜ao magn´etica tamb´em n˜ao depende de x nem de y. Por outro lado, da equa¸c˜ ao de Maxwell ∇ × E = −∂ B /∂t, pode concluir-se que ∂Bz /∂t = 0. De facto, no primeiro membro ˆ , o que ´e uma consequˆencia de o daquela equa¸c˜ao de Maxwell n˜ao h´a componente segundo k campo el´ectrico n˜ao depender de x nem de y. Aplicando a mesma argumenta¸c˜ ao ao campo de indu¸c˜ao magn´etica, ou seja, fazendo agora uso da equa¸c˜ ao de Maxwell ∇ × B = ²0 µ0 ∂ E /∂t, conclui-se que ∂Ez /∂t = 0. Sumariando, podemos escrever ∂Ez ∂Ez ∂Bz ∂Bz = 0, = 0, = 0, = 0, ∂z ∂t ∂z ∂t (9.26) e concluir que as componentes segundo a direc¸c˜ ao de propaga¸c˜ ao n˜ao variam nem no espa¸co nem no tempo. Tem-se, de facto, Ez = 0 e Bz = 0, pois interessam unicamente solu¸c˜ oes com car´acter ondulat´orio e n˜ao campos uniformes. Pode afirmar-se que o campo el´ectrico e o campo de indu¸c˜ao magn´etica (ou, seja, o campo electromagn´etico) s˜ao transversos, quer dizer, n˜ao tˆem componente segundo a direc¸c˜ ao de propaga¸c˜ ao da onda. Fixada a direc¸c˜ao z de propaga¸c˜ ao da onda e, tendo-se mostrado que os campos E e B se encontram no plano perpendicular a esta direc¸c˜ ao, vamos supor que a direc¸c˜ ao do campo el´ectrico ´e sempre a mesma. Seja essa a direc¸c˜ ao do eixo x: E = Ex (z, t) ˆi . (9.27) Quando o campo el´ectrico mant´em fixa a sua direc¸c˜ ao diz-se que a onda plana est´a polarizada linearmente (Sec¸c˜ao 9.3). A partir das equa¸c˜ oes de Maxwell no vazio, (9.2) e (9.4) com j = 0, conclui-se, usando (9.26), que, para o campo el´ectrico da forma (9.27), se tem necessariamente um campo de indu¸c˜ao magn´etica, tal que ∂Bx ∂Bx = 0, = 0. ∂z ∂t Reafirmando que n˜ao importa considerar campos uniformes, mas sim campos que variem no espa¸co e no tempo, faz-se Bx = 0, de modo que o campo de indu¸c˜ ao magn´etica compat´ıvel com (9.27) ´e perpendicular ao campo el´ectrico, sendo da forma B = By (z, t) jˆ . (9.28) Vamos continuar a considerar ondas linearmente polarizadas, que se propagam no sentido positivo do eixo z, mas agora com uma dependˆencia esp´acio-temporal bem definida do tipo sinusoidal. A fun¸c˜ao · µ ¶ ¸ z Ex = E0x cos ω t − +θ (9.29) c representa uma onda progressiva deste tipo. Trata-se de uma solu¸c˜ ao da componente x da equa¸c˜ao de onda (9.22), mas n˜ao ´e, evidentemente, a sua solu¸c˜ ao geral. Relembre-se, por´em, que a an´alise de Fourier permite sempre decompor uma onda progressiva qualquer, que se propaga na direc¸c˜ao positiva do eixo z, numa combina¸c˜ ao linear de fun¸c˜ oes sinusoidais do tipo (9.29) e da´ı a sua utilidade, pois constituem uma base completa de fun¸c˜ oes. A quantidade 260 • ´tico Campo electromagne real e positiva E0x ´e a amplitude da onda; o ˆangulo θ ´e a sua fase na origem; e ω ´e a frequˆencia angular. O campo B associado a (9.29) ´e obtido atendendo a (9.28) e `a equa¸c˜ ao de Maxwell ∇ × E = −∂ B /∂t. Esta equa¸c˜ao fica reduzida `a sua componente segundo a direc¸c˜ao jˆ , passando a ser escrita do seguinte modo: ∂Ex ∂By =− . ∂z ∂t Usando (9.29), a equa¸c˜ao anterior fica · µ ω z E0x sin ω t − c c ¶ ¸ +θ =− ∂By ∂t e, integrando em ordem ao tempo e fazendo nula a constante de integra¸c˜ ao por n˜ao interessarem campos constantes, vem · µ E0x z By = cos ω t − c c ¶ ¸ +θ . (9.30) A equa¸c˜ao ∇ × B = c−2 ∂ E /∂t ´e tamb´em satisfeita por (9.29) e (9.30), como pode ser comprovado directamente. Comparando (9.30) com (9.29) conclui-se que, em cada instante, a componente x do campo el´ectrico e a componente y do campo de indu¸c˜ ao magn´etica se relacionam atrav´es de Ex By = . (9.31) c Os campos el´ectrico e de indu¸c˜ao magn´etica, al´em de serem sempre ortogonais entre si, est˜ao em fase. A Figura 9.1 representa um esquema dos campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica de uma onda electromagn´etica plana, sinusoidal, linearmente polarizada, que se propaga no sentido positivo do eixo z. Note-se que o sentido de propaga¸c˜ ao da onda ´e o do vector E × B , cujo significado f´ısico vai ser explorado na pr´oxima sec¸c˜ao. A direc¸c˜ao do campo E ´e designada por direc¸ca ˜o de polariza¸c˜ ao e o plano definido por esta direc¸c˜ ao e pela direc¸c˜ao de propaga¸c˜ao da onda ´e o plano de vibra¸c˜ ao. 9.2.1 Representa¸c˜ ao exponencial ´ contudo, habitual Os campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica s˜ao campos reais. E, introduzir a nota¸c˜ ao exponencial, tendo-se, no caso do campo el´ectrico, a express˜ao z E = E0x ei[ ω(t− c )+θ ] ˆi (9.32) para representar o campo f´ısico (9.29). Quando se utiliza a nota¸c˜ ao (9.32) subentende-se sempre que se est´a a tomar a parte real desta fun¸c˜ ao, a qual corresponde ao campo f´ısico (9.29). Quando for necess´ario, usaremos o s´ımbolo “Re” para designar o operador “parte real de”, mas este operador ´e muitas vezes suprimido por raz˜oes de economia de nota¸c˜ ao. Na nota¸c˜ao exponencial as derivadas em ordem ao tempo e em ordem a z podem ser substitu´ıdas por simples factores num´ericos: ∂ → iω ∂t e ∂ ω → −i , ∂z c (9.33) o que constitui um aspecto muito u ´til de tal nota¸c˜ ao. Para melhor ilustrar as vantagens da nota¸c˜ao exponencial vamos obter os resultados anteriores para os campos el´ectrico e de indu¸c˜ao magn´etica usando o novo formalismo. ´ticas Ondas electromagne • 261 y B x E x B E z Figura 9.1. Onda electromagn´ etica plana sinusoidal linearmente polarizada a propagar-se no vazio. As equa¸c˜oes de onda (9.22) e (9.23) admitem solu¸c˜ oes da forma E (r , t) = E0 e−i (k·r−ωt) (9.34) B (r , t) = B0 e−i (k·r−ωt) , (9.35) que s˜ao ondas planas com frequˆencia angular ω e n´ umero de onda k; para simplificar a nota¸c˜ao, faz-se nula a fase na origem, θ. O sentido do vector k indica, no caso destas solu¸c˜ oes, o sentido da propaga¸c˜ao da onda. Se considerarmos, em (9.34) e (9.35), k → −k as express˜oes resultantes s˜ao ondas progressivas que se propagam em sentido contr´ ario. Em (9.34) e (9.35), E0 e B0 s˜ao vectores constantes e ´e patente, nessas express˜oes, que a dependˆencia temporal e espacial est˜ao factorizadas. O vector k e a frequˆencia ω n˜ao s˜ao quantidades independentes. Introduzindo (9.34) e (9.35), respectivamente, nas eqs. (9.22) e (9.23), obt´em-se a seguinte express˜ao: ω (9.36) k= . c O n´ umero de onda tamb´em pode ser escrito em fun¸c˜ ao do comprimento de onda, λ, k= 2π , λ sendo esta uma rela¸c˜ao an´aloga `a que se tem entre a frequˆencia angular e o per´ıodo, T , ω= 2π . T Outras rela¸c˜oes u ´teis s˜ao λ = cT 262 • ´tico Campo electromagne e, por defini¸c˜ao, λ= ¯ λ c 1 = = . 2π ω k (9.37) Vamos mostrar que E e B est˜ao no mesmo plano, o qual ´e perpendicular a k. Na ausˆencia de cargas livres, a divergˆencia do campo el´ectrico ´e nula e o mesmo se passa, em qualquer circunstˆancia, com a divergˆencia do campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Notando que ∇ e−i (k·r−ωt) = −i k e−i (k·r−ωt) , resultado que, de resto, j´a foi usado para obter (9.36), basta tomar a divergˆencia de (9.34) e de (9.35) e igualar a zero para se concluir que k · E0 = k · B0 = 0 e que, portanto, k·E =0 , k · B = 0. Os campos el´ectrico e de indu¸c˜ao magn´etica da onda electromagn´etica que se propagam na direc¸c˜ao de k “vibram” no plano perpendicular a essa direc¸c˜ ao. Obtˆem-se solu¸c˜ oes mais gerais das eqs. (9.22) e (9.23) tomando combina¸c˜ oes lineares com v´arios k (pacotes de ondas) das solu¸c˜oes (9.34) e (9.35). Para a an´alise que se segue escolhe-se o eixo z a coincidir com a direc¸c˜ ao de k. A solu¸c˜ ao (9.34) pode ent˜ao ser escrita na forma mais simples E = E0 e−i (k z−ωt) , (9.38) tendo-se para B uma express˜ao idˆentica. A onda do mesmo tipo que se propaga no sentido de −z ´e dada por E = E0 ei (k z+ωt) . Se o campo E mantiver fixa a sua direc¸c˜ ao (eixo x), escrevemos E0 = E0 ˆi e temos uma polariza¸c˜ao linear, como atr´as se referiu. Tomando, nestas circunstˆancias, o rotacional de E , obt´em-se ∇ × E = −i k E0 e−i (k z−ω t) jˆ . (9.39) Por outro lado, e porque para B se tem tamb´em uma solu¸c˜ ao do tipo (9.38), vem ∂B = i ω B0 e−i (k z−ω t) . ∂t (9.40) Inserindo (9.39) e (9.40) na equa¸c˜ao de Maxwell (9.2), conclui-se de imediato que B0 e, portanto, B , tem a direc¸c˜ao do eixo y, resultado que j´a se tinha obtido no quadro da nota¸c˜ao anterior. Os campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica s˜ao n˜ao s´o perpendiculares `a direc¸c˜ao de propaga¸c˜ao da onda, mas tamb´em perpendiculares entre si. De (9.39) e (9.40), conclui-se tamb´em que ωB = kE ⇒ E = cB . [Cf. Eq. (9.31) obtida no outro formalismo]. ´ticas Ondas electromagne 9.3 • 263 ˜ POLARIZAC ¸ AO O conceito de polariza¸c˜ao linear foi introduzido na sec¸c˜ ao anterior. Considerem-se agora duas ondas electromagn´eticas, linearmente polarizadas, propagando-se no sentido positivo do eixo z. Designemos por (E1 , B1 ) os campos de uma das ondas e por (E2 , B2 ) os campos da outra onda. Como as equa¸c˜oes de Maxwell s˜ao lineares, se (E1 , B1 ) e (E2 , B2 ) satisfazem separadamente as equa¸c˜oes de Maxwell, tamb´em os campos (E , B ), onde E = E1 + E2 e B = B1 + B2 , satisfazem as equa¸c˜oes de Maxwell. Mas, ainda que a frequˆencia das ondas 1 e 2 seja a mesma, se for nula a diferen¸ca de fase entre os campos de cada esp´ecie, a nova onda electromagn´etica ´e linearmente polarizada, ou seja, nestas condi¸c˜ oes E (e tamb´em B ) mant´em fixa a sua direc¸c˜ao no plano xy. Para melhor analisarmos a situa¸c˜ ao consideremos duas ondas sinusoidais, linearmente polarizadas, com a mesma frequˆencia, que se propagam no sentido positivo do eixo z. Uma ´e descrita por E1 = Ex ˆi e a outra por E2 = Ey jˆ . Para um observador colocado em z =Cte , ( Ex = E0x cos ωt Ey = E0y cos(ωt + α) , (9.41) sendo α a diferen¸ca de fase entre as duas ondas.1 O campo segundo y pode ser escrito na forma Ey = E0y cos ωt cos α − E0y sin ωt sin α . (9.42) A primeira equa¸c˜ao de (9.41), cos ωt = Ex E0x (9.43) inserida em (9.42), permite obter uma express˜ao para sin ωt: sin ωt = Ex E0x cos α − Ey E0y sin α . (9.44) Quadrando e somando membro a membro (9.43) e (9.44), obt´em-se µ Ex E0x à ¶2 + Ey E0y !2 −2 Ex Ey cos α = sin2 α . E0x E0y (9.45) Esta ´e a equa¸c˜ao de uma elipse inscrita no interior de um rectˆangulo de lados 2E0x e 2E0y . Concluiu-se, assim, que da sobreposi¸c˜ ao de duas ondas sinusoidais com a mesma frequˆencia e com direc¸c˜oes de polariza¸c˜ao ortogonais, resulta uma onda electromagn´etica cujo campo E descreve uma elipse no plano z =Cte . Vejamos alguns casos especiais da equa¸c˜ ao anterior. • α=0 Resulta a equa¸c˜ao Ey = E0y Ex E0x e a polariza¸c˜ao ´e linear; 1 Podiam ser consideradas duas fases diferentes, uma para cada uma das ondas, mas, para a discuss˜ ao que se segue, apenas importa considerar a diferen¸ca de fase entre elas. 264 • ´tico Campo electromagne • α=π A polariza¸c˜ao ´e ainda linear mas agora Ey = − • α= E0y Ex ; E0x π 2 A Eq. (9.45) vem agora µ Ex E0x à ¶2 + Ey E0y !2 = 1, (9.46) que ´e a equa¸c˜ao de uma elipse referida aos eixos. A extremidade do vector campo el´ectrico descreve a elipse no sentido retr´ogrado para um observador que olhe para o plano z =Cte a partir de um ponto do eixo z com z >Cte . No caso de E0x = E0y , a elipse degenera numa circunferˆencia e a polariza¸c˜ ao diz-se circular. Para a diferen¸ca de fase considerada, a polariza¸c˜ao diz-se circular inversa ou esquerda; • α= 3π 2 A equa¸c˜ao resultante ´e a Eq. (9.46) mas agora a elipse ´e descrita no sentido directo para um observador nas condi¸c˜ oes atr´as indicadas. Tal como atr´as, se E0x = E0y , a elipse degenera numa circunferˆencia e a polariza¸c˜ ao diz-se circular directa ou direita. Da sobreposi¸c˜ao de duas ondas polarizadas circularmente, uma directa e a outra inversa, resulta uma onda polarizada linearmente. Assim, considere-se a onda 1 com polariza¸c˜ao circular directa (α = − π2 ), · µ E1 = E0 cos(ωt − kz) ˆi + cos ωt − kz − π 2 ¶ ¸ jˆ , e a onda 2 com polariza¸c˜ao circular inversa (α = π2 ), · µ E2 = E0 cos(ωt − kz) ˆi + cos ωt − kz + π 2 ¶ ¸ jˆ . Quando se somam estas duas ondas, as componentes segundo ˆi refor¸cam-se e as componentes segundo jˆ anulam-se exactamente: E = E1 + E2 = 2 E0 cos(ωt − kz) ˆi , e a polariza¸c˜ao ´e linear. 9.4 TEOREMA DE POYNTING Define-se o vector de Poynting por S =E×H. O vector de Poynting tem a direc¸c˜ao e o sentido da propaga¸c˜ ao da onda electromagn´etica — como vimos na Sec¸c˜ao 9.2 (ver Figura 9.1) — e dimens˜oes de energia por unidade de tempo e por unidade de ´area [no SI, J·s−1 ·m−2 ou W·m−2 ]. ´ticas Ondas electromagne • 265 Atendendo a (B.43), a divergˆencia do vector de Poynting ´e dada por ∇ · (E × H ) = H · ∇ × E − E · ∇ × H . (9.47) Comecemos por considerar meios lineares, homog´eneos e isotr´opicos para os quais B = µH (9.48) D = ²E . (9.49) e Nestes meios, as eqs. (9.13) e (9.15) passam a ser escritas, respectivamente, ∂H ∂t (9.50) ∂E + j` . ∂t (9.51) ∇ × E = −µ e ∇×H =² A Eq. (9.47) vem ent˜ao ∇ · S = −µ H · ∂H ∂E − ²E · − E · j` . ∂t ∂t Integrando num volume v, tem-se · Z d µ ∇ · S dv = − dt 2 v Z ² H dv + 2 v ¸ Z 2 Z 2 v E dv − v E · j` dv . Aplicando o teorema de Gauss ao primeiro membro e recordando as express˜oes (5.34) e (8.28) das energias armazenadas nos campos el´ectrico e magn´etico, respectivamente Ue e Um , podemos escrever2 Z I d ( Ue + Um ) + E · j` dv . − S · dΣ = dt v Σ No membro esquerdo, o fluxo do vector de Poynting representa a energia por unidade de tempo que entra (notar o sinal negativo!) no volume v atrav´es da fronteira Σ. O primeiro termo do lado direito representa a varia¸c˜ ao com o tempo da energia armazenada no campo electromagn´etico no volume v. Finalmente, o u ´ltimo termo representa a energia dissipada por efeito Joule, por unidade de tempo, no volume v. Na situa¸c˜ao mais geral de os meios materiais n˜ao serem lineares, isotr´opicos nem homog´eneos, ter˜ao de se substituir (9.48) e (9.49) pelas express˜oes gerais B = µ0 (H + M ) e D = ²0 E + P e usar (9.13) e (9.15) para reescrever (9.50) e (9.51). Neste caso, ∂ ∇·S =− ∂t µ ¶ ²0 µ ∂P ∂ E · E + 0 H · H − E · j` − E · − H · (µ0 M ) . 2 2 ∂t ∂t (9.52) Esta ´e a express˜ao local do teorema de Poynting, sendo a correspondente forma integral dada por I d dt Z µ ¶ ²0 µ − S · dΣ = E · E + 0 H · H dv 2 2 Σ v ¸ Z · ∂(µ0 M ) ∂P +H · dv . + E · j` + E · ∂t ∂t v (9.53) E habitual designar o vector de Poynting por S . Ora, temos vindo a designar uma superf´ıcie por S e um elemento infinitesimal orientado dessa superf´ıcie por dS . Para que n˜ ao haja confus˜ ao com o vector de Poynting, usaremos neste cap´ıtulo e no Cap´ıtulo 11 o s´ımbolo Σ para designar superf´ıcie e dΣ para designar o elemento de superf´ıcie infinitesimal orientado. 2´ 266 • ´tico Campo electromagne Este resultado exprime a conserva¸c˜ao da energia associada a uma onda electromagn´etica: a energia que, por unidade de tempo, entra numa regi˜ao limitada pela fronteira Σ pode dar origem a uma varia¸c˜ao da energia armazenada no campo electromagn´etico ou ser absorvida pela mat´eria. Os trˆes u ´ltimos termos em (9.53) representam efectivamente as potˆencias absorvidas pelos materiais: potˆencia dissipada por efeito Joule, j´a referida anteriormente, ou potˆencia absorvida em processos de polariza¸c˜ ao e de magnetiza¸c˜ ao. Quando a polariza¸c˜ ao ou a magnetiza¸c˜ao variam com o tempo, o campo electromagn´etico fornece ou recebe do material potˆencias dadas por Z Pp = v E· ∂P dv ∂t H· ∂(µ0 M ) dv . ∂t Z Pm = v Refira-se, por fim, que se o volume v contiver fontes, tem de se acrescentar ao membro esquerdo de (9.53) um termo da forma Z Pf = − v E · jf dv , que representa a potˆencia fornecida ao sistema por essas fontes internas (por exemplo, geradores de corrente ou de tens˜ao). Exemplo 9.1: Teorema de Poynting para onda plana Para uma onda plana polarizada linearmente, de frequˆencia ω, a propagar-se no vazio no sentido positivo do eixo z, os campos el´ectrico e magn´etico s˜ao, como vimos na Sec¸c˜ ao 9.2, E = Ex ˆi = E0 cos(ωt − kz) ˆi H = Hy jˆ = E0 cos(ωt − kz) jˆ . µ0 c (9.54) (9.55) Assim, independentemente da posi¸c˜ao z e do tempo t, H= E , µ0 c (9.56) pois os campos est˜ao sempre em fase. A express˜ao (9.52), que traduz o teorema de Poynting, reduz-se, neste caso, a ∂u ∇ · S + EM = 0 , (9.57) ∂t onde ²0 µ0 uEM = E · E + H · H 2 2 ´e a densidade de energia electromagn´etica. A Eq. (9.57) ´e uma equa¸c˜ ao de continuidade que traduz a conserva¸c˜ao da energia electromagn´etica. A densidade de energia electromagn´etica para a onda plana polarizada linearmente que est´a a ser considerada ´e, atendendo a (9.56), uEM = ²0 2 µ0 1 ²0 ²0 E + E 2 = E 2 + E 2 = ²0 E 2 , 2 2 2 2 c µ0 2 2 ´ticas Ondas electromagne • 267 concluindo-se que a densidade de energia el´ectrica ´e igual `a densidade de energia magn´etica, em cada ponto do espa¸co e para qualquer instante. O vector de Poynting para a onda plana linearmente polarizada ´e ˆ= S =E×H =EHk E2 ˆ ˆ = uEM c k ˆ. k = c ²0 E 2 k cµ0 (9.58) Este exemplo ilustra claramente o significado f´ısico do vector de Poynting: ´e o vector “densidade de corrente de energia electromagn´etica” na equa¸c˜ ao de continuidade (9.57), dado pelo produto da densidade de energia electromagn´etica pela velocidade de propaga¸c˜ ao da onda. 9.4.1 Valor m´ edio do vector de Poynting para onda plana polarizada linearmente Vamos considerar agora o campo electromagn´etico dado por (9.54) e (9.55) num dado ponto do espa¸co (com z = z0 ) e determinar o valor m´edio no tempo do vector de Poynting. A m´edia temporal ´e definida por < S >= 1 T Z t+T t S dt , (9.59) onde se considerou um per´ıodo da onda, T . Utilizando (9.58) e (9.54), obt´em-se ˆ ²0 < S > = ck 1 T Z t+T t ˆ ²0 E 2 = ck 0 1 T E 2 dt Z t+T t cos2 (ωt − kz0 ) dt . O valor do integral ´e T /2, pelo que, < S >= ²0 E02 ˆ 2 ˆ. c k = ²0 Eef ck 2 (9.60) Introduziu-se nesta express˜ao o campo el´ectrico eficaz definido atrav´es de E0 Eef = √ . 2 (9.61) Na pr´atica, a m´edia temporal do vector de Poynting ´e muitas vezes obtida de outro modo. Assim, considera-se a representa¸c˜ ao exponencial para os campos el´ectrico e magn´etico, E = E0 e−i(k z−ωt) ˆi H = E0 −i(k z−ωt) ˆ e j, cµ0 e calcula-se [Re(E × H ∗ )]/2, obtendo-se imediatamente (9.60). A express˜ao < S >= 1 Re (E × H ∗ ) , 2 (9.62) cuja validade foi agora confirmada para uma onda plana polarizada a propagar-se no vazio, permanece v´alida para meios materiais (condutores ou n˜ao)3 . 3 Para o caso do vazio, que acaba de ser considerado, o operador “Re” nem sequer era necess´ ario; mas, para meios materiais condutores, o operador “parte real de” ´e indispens´ avel, como iremos ver na pr´ oxima sec¸ca ˜o. 268 • ´tico Campo electromagne Apontam-se agora duas raz˜oes para preferir o vector H em vez de B , quando se estudam ondas electromagn´eticas. A primeira prende-se com o facto de E × H ser uma densidade de fluxo de energia (energia × velocidade). A segunda ´e que E/H tem as dimens˜oes de uma impedˆancia. De facto, a express˜ao (9.56) pode ser escrita na forma E Zc = = µ0 c = H r µ0 = 377 Ω , ²0 (9.63) valor que ´e designado por impedˆ ancia caracter´ıstica do vazio. 9.5 ´ ONDAS ELECTROMAGNETICAS EM MEIOS MATERIAIS Em meios materiais est´aticos, homog´eneos, lineares e isotr´opicos as equa¸c˜ oes para os campos el´ectrico e de indu¸c˜ao magn´etica s˜ao formalmente idˆenticas a (2.83) e (2.84), devendo fazer-se apenas as substitui¸c˜oes µ0 → µ, ²0 → ² e c−2 = ²0 µ0 → ²µ. As densidades ρ e j que em (2.83) e (2.84) se referiam, respectivamente, a cargas e correntes livres mantˆem esse mesmo car´acter. Assim, as equa¸c˜oes para E e para B em meios materiais s˜ao (cf. aquelas duas equa¸c˜oes) ∂2E ∂t2 ∂2B ∇2 B − ² µ ∂t2 ∇2 E − ² µ = ∂j 1 ∇ ρ` + µ ` ² ∂t = −µ∇ × j` . (9.64) Pode agora fazer-se uso de (9.5) e (9.9) e, no caso de a condutividade σ ser constante, as equa¸c˜oes anteriores passam a ser escritas do seguinte modo: ∂2E ∂E −σµ 2 ∂t ∂t 2B ∂ ∂ B ∇2 B − ² µ −σµ 2 ∂t ∂t ∇2 E − ² µ 9.5.1 = 1 ∇ ρ` ² = 0. (9.65) (9.66) Meios n˜ ao condutores No caso de ausˆencia de fontes externas, j` = 0 e ρ` = 0, e, para meios n˜ao condutores, σ = 0, as equa¸c˜oes para E e B reduzem-se `as seguintes equa¸c˜ oes diferenciais homog´eneas: 1 v2 1 ∇2 B − 2 v ∇2 E − A quantidade, ∂2E ∂t2 ∂2B ∂t2 = 0 (9.67) = 0. (9.68) 1 v=√ , µ² ´e a velocidade de propaga¸c˜ao da onda (c, no caso do vazio). No caso de se procurarem solu¸c˜ oes do tipo onda plana que se propaga na direc¸c˜ ao do eixo z, as duas equa¸c˜ oes anteriores ficam formalmente idˆenticas `a Eq. (9.24) e, por isso, o formalismo a desenvolver ´e semelhante ao exposto para a propaga¸c˜ao no vazio. Em particular, as solu¸c˜ oes das equa¸c˜ oes de onda em meios materiais n˜ao condutores que importa considerar, por formarem um conjunto completo ´ticas Ondas electromagne • 269 de fun¸c˜oes de base, s˜ao ondas planas transversas sinusoidais. A frequˆencia e o n´ umero de onda destas ondas relacionam-se atrav´es de [ver Eq. (9.36)]4 k= ω . v Para uma onda plana polarizada linearmente a raz˜ao entre os campos el´ectrico e magn´etico ´e agora dada por [cf. (9.63)] E = µv = H r µ = 377 ² r µr ²r (Ω) , (9.69) que ´e a impedˆ ancia caracter´ıstica do meio. ´ habitual definir uma outra propriedade do meio — o seu ´ındice de refrac¸ca E ˜o, n — como a raz˜ao entre a velocidade de fase da onda electromagn´etica no vazio e nesse meio: c √ = ²r µr . (9.70) v √ Em meios n˜ao magn´eticos, µr = 1 e n = ²r . O ´ındice de refrac¸c˜ ao depende, em geral, da frequˆencia da onda, pois os parˆametros do meio podem depender da frequˆencia. Por exemplo, no caso da ´agua, que ´e um l´ıquido polar, quando a frequˆencia ´e pr´oxima de zero, tem-se ²r = 81; para frequˆencias da ordem de 1015 Hz, verifica-se que ²r = 1,8. As mol´eculas de ´agua tˆem uma grande in´ercia e, no caso de frequˆencias elevadas, n˜ao h´a tempo suficiente para que a orienta¸c˜ao dos dipolos acompanhe o campo, resultando uma polariza¸c˜ ao pequena. ´ a dependˆencia do ´ındice de refrac¸c˜ E ao com a frequˆencia que est´a na base dos fen´omenos de dispers˜ao de que a decomposi¸c˜ao da luz solar por um prisma ´e um exemplo bem conhecido. Continuando a fazer o paralelismo com a situa¸c˜ ao no vazio, tamb´em agora as densidades de energia el´ectrica e magn´etica s˜ao iguais, n= ² µ uEM = E 2 + H 2 = ²E 2 , 2 2 como se pode concluir utilizando (9.69). O valor m´edio no tempo do vector de Poynting da onda plana polarizada que se propaga no meio na direc¸c˜ ao positiva do eixo z ´e [cf. (9.60)] < S >= E02 ˆ = E2 ² v k ˆ, ²vk ef 2 (9.71) onde E0 ´e a amplitude da onda el´ectrica e Eef ´e introduzido tal como em (9.61). 9.5.2 Meios condutores Consideramos, como anteriormente, meios lineares, homog´eneos, isotr´opicos e estacion´arios. Come¸camos por notar que as eqs. (9.65) e (9.66) n˜ao s˜ao totalmente an´alogas devido `a presen¸ca do termo contendo o gradiente da densidade de carga na primeira. Contudo, na situa¸c˜ao que importa considerar, veremos que esse termo ´e nulo, pelo que as equa¸c˜ oes para E e para B ficam, de facto, com formas an´alogas. De novo, procuramos solu¸c˜oes ondulat´ orias da forma E (r , t) = E (z, t) que se propagam na direc¸c˜ao z. Nestas condi¸c˜oes, ρ` = ² ∇ · E = ² 4 ∂Ez . ∂z (9.72) A velocidade de fase ´e v = ω/k. A velocidade de grupo ´e, por defini¸ca ˜o, a derivada de ω em ordem a k, isto ´e, vg = dω/dk. No caso de meios n˜ ao dispersivos, v = vg . Em particular, para o vazio, v = vg = c. 270 • ´tico Campo electromagne O termo do lado direito da Eq. (9.65) toma a forma ∇ρ` ² = ∂ 2 Ez ˆ k, ∂z 2 pelo que a componente z da Eq. (9.65) fica simplesmente ² cuja solu¸c˜ao n˜ao trivial ´e ∂ 2 Ez ∂Ez +σ = 0, 2 ∂t ∂t (9.73) Ez (z, t) = a(z) + b(z) e−σ t/² . Uma solu¸c˜ao deste tipo n˜ao corresponde a nenhum fen´omeno ondulat´orio (fen´omeno persistente no tempo) e, por isso, n˜ao interessa, no presente contexto. Pode, pois, tomar-se a solu¸c˜ao trivial de (9.73), ou seja, Ez = 0, tal como se fez anteriormente para todas as componentes dos campos que n˜ao apresentavam car´acter ondulat´orio. De (9.72) conclui-se, ent˜ao, que a densidade de carga livre ´e nula, ρ` = 0, e as eqs. (9.65) e (9.66) tˆem, de facto, a mesma forma. Para os campos E e H (H , tal como E , s´o depende de z e de t) as equa¸c˜ oes no condutor s˜ao: ∂2E ∂2E ∂E = 0 (9.74) − ² µ −σµ 2 2 ∂z ∂t ∂t ∂2H ∂2H ∂H = 0. (9.75) − ² µ −σµ 2 2 ∂z ∂t ∂t O campo magn´etico e o campo el´ectrico s˜ao transversos. No caso do campo el´ectrico, vimos que ´e a sua transversalidade que permite chegar `a equa¸c˜ ao (9.74). Quanto ao campo ∂Hz H e de 5 magn´etico, de ∇ · H = 0, resulta ∂z = 0. Por outro lado, de ∇ × E = −µ ∂∂t z E = Ex (z, t) ˆi + Ey (z, t) jˆ , conclui-se que ∂H oes anteriormente expostas, ∂t = 0. Pelas raz˜ faz-se Hz = 0. A Eq. (9.74) admite solu¸c˜oes do tipo onda plana sinusoidal, linearmente polarizada, mas atenuada, que podem ser escritas na forma E = E0 cos(ωt − kr z) e−ki z , (9.76) sendo ki e kr reais. O factor exponencial ´e o respons´avel pela atenua¸c˜ ao no espa¸co (n˜ ao no tempo!) da onda e o vector E0 est´a no plano xy: E0 = E0x ˆi + E0y jˆ . Inserindo (9.76) em (9.74), encontram-se rela¸c˜ oes entre ki , kr , por um lado, e ω e os parˆametros na equa¸c˜ ao de onda, por outro lado. S˜ao essas rela¸c˜ oes — que iremos obter na Sec¸c˜ ao 9.6 — que garantem que (9.76) seja efectivamente solu¸c˜ ao de (9.74). Mas, antes de estabelecermos essa rela¸c˜ao, conv´em conhecer a orienta¸c˜ ao relativa dos campos B e H . Em nota¸c˜ ao exponencial o campo el´ectrico (9.76) ´e dado por E = E0 ei (ωt−kz) , (9.77) sendo agora o n´ umero de onda k a quantidade complexa k = kr − i ki . (9.78) Note-se que a parte real de (9.77) ´e (9.76) e, ao introduzir a quantidade complexa k, mant´emse uma analogia entre a nota¸c˜ao da onda atenuada e a da onda plana sinusoidal. 5 Recorda-se que a divergˆencia do campo de indu¸ca ˜o magn´etica ´e nula e que estamos a considerar meios homog´eneos, lineares e isotr´ opicos, para os quais B = µH , com µ constante. ´ticas Ondas electromagne 9.5.3 • 271 Ortogonalidade dos campos E e H Da mesma maneira que (9.77) ´e solu¸c˜ ao de (9.74), tamb´em a solu¸c˜ ao de (9.75) ´e da mesma forma de (9.77), isto ´e, apresenta o mesmo tipo de dependˆencia esp´acio-temporal. Em particular, a dependˆencia temporal do campo magn´etico ´e da forma H ∼ eiωt . Vamos ver que o campo magn´etico ´e ortogonal ao campo el´ectrico explorando a equa¸c˜ ao de Maxwell H. ∇ × E = −µ ∂∂t Fazendo as substitui¸c˜oes (9.33) (adaptadas ao caso de meios materiais), a equa¸c˜ ao de Maxwell referida vem, em coordenadas cartesianas, −i k(Ex jˆ − Ey ˆi) = −i ω µH . ˆ com o sentido da propaga¸c˜ Introduzindo o vector k = k k ao da onda, H= k µω ×E. (9.79) Esta equa¸c˜ao parece mostrar que os campos H e E (j´a atr´as se mostrou serem estes dois campos transversos) s˜ao perpendiculares entre si. Esta conclus˜ao ´e v´alida para os campos complexos, mas ´e conveniente analisar a situa¸c˜ ao para os campos f´ısicos que s˜ao reais6 . A Eq. (9.79) confirma que Hz = 0 e, al´em disso, permite escrever: k Ex ωµ k = − Ey . ωµ Hy = (9.80) Hx (9.81) Tomando a parte real de (9.80), e tendo em aten¸c˜ ao (9.77) e (9.78), vem · Re Hy ¸ k Ex = Re ωµ E0x e−ki z = Re {(kr − i ki ) [cos(ωt − kr z) + i sin(ωt − kr z)]} µω E0x e−ki z = [kr cos(ωt − kr z) + ki sin(ωt − kr z)] . µω (9.82) Designando por θ o argumento do n´ umero complexo k, θ = Arg k , pode escrever-se (9.78) na forma q k = kr2 + ki2 ei θ (9.83) e, portanto, kr cos θ = p 2 kr + ki2 e ki . kr2 + ki2 sin θ = − p Usando as duas equa¸c˜oes anteriores e a rela¸c˜ ao trigonom´etrica cos(α + β) = cos α cos β − sin α sin β, a express˜ao (9.82) reduz-se a p E0x e−ki z ki2 + kr2 Re Hy = cos(ωt − kr z + θ) . µω 6 (9.84) No lado direito da Eq. (9.79), h´ a opera¸co ˜es entre complexos e, por isso, a conclus˜ ao de ortogonalidade dos campos f´ısicos pode suscitar d´ uvidas e, portanto, conv´em analisar a situa¸ca ˜o mais em pormenor. 272 • ´tico Campo electromagne Como a parte real da componente x do campo el´ectrico ´e Re Ex = E0x e−ki z cos(ωt − kr z) , (9.85) a compara¸c˜ao com (9.84) mostra que h´a uma diferen¸ca de fase entre as componentes dos campos f´ısicos Ex e Hy , de valor θ, que ´e precisamente o argumento de k. Esta conclus˜ao podia, ali´as, ser obtida logo de (9.80), escrevendo k na nota¸c˜ ao exponencial (9.83), dado que ωµ ´e real. A parte real da componente y do campo E ´e Re Ey = E0y e−ki z cos(ωt − kr z) e a parte real da componente x do campo H obt´em-se de (9.81), seguindo um racioc´ınio idˆentico ao que se acabou de apresentar. O resultado ´e p E0y e−ki z ki2 + kr2 Re Hx = − cos(ωt − kr z + θ) , µω tendo-se a mesma diferen¸ca de fase θ entre o novo par de componentes. As componentes reais dos campos el´ectrico e magn´etico observam, pois, as rela¸c˜ oes Ex Ey ωµ cos(ωt − kr z) =− =p 2 , 2 Hy Hx ki + kr cos(ωt − kr z + θ) (9.86) que permitem concluir que os vectores reais E e H s˜ao, efectivamente, ortogonais entre si: E · H = Ex Hx + Ey Hy = 0. Claro que, se Ey = 0, ent˜ao Hx = 0 e, se Ex = 0, ent˜ao Hy = 0. Quando θ = 0 tem-se a rela¸c˜ao Ex Ey ωµ =− = , Hy Hx k j´a que ki = 0 e kr = k. Esta ´e a situa¸c˜ ao dos meios materiais n˜ao condutores: os campos el´ectrico e magn´etico da onda linearmente polarizada est˜ao em fase. 9.6 ˜ DO CAMPO ELECTROMAGNETICO ´ PROPAGAC ¸ AO EM CONDUTORES Vamos obter as rela¸c˜oes entre as partes real e imagin´aria do n´ umero de onda, a frequˆencia e os parˆametros do meio (permitividade, permeabilidade e condutividade). Inserindo a express˜ao (9.77) em (9.74), vem (−ik)2 E = ² µ (iω)2 E + i σ µω E , ou ainda µ k2 E = ² µ ω2 1 − i σ ω² ¶ E. (9.87) Consideremos a derivada em ordem ao tempo do vector deslocamento, que ´e a densidade de corrente de deslocamento, ∂D = i ωD = i ω ² E ∂t ´ticas Ondas electromagne • 273 e a densidade de corrente livre, j` = σ E . A raz˜ao entre os m´odulos destas duas densidades de corrente ´e denominada factor de qualidade ou simplesmente factor Q, e depende quer das caracter´ısticas do meio, quer da frequˆencia da onda: Q= ¯ ¯ ¯ ∂D ¯ ¯ ∂t ¯ |j` | Introduzindo Q na Eq. (9.87), vem = ω² . σ µ k2 = ² µ ω2 1−i 1 Q (9.88) ¶ . (9.89) Se a onda electromagn´etica se propagasse no vazio, Q → ∞, e o seu comprimento de onda, λ0 , seria λ0 = 2πc/ω. Assim, e usando a quantidade λ ¯ 0 definida tal como em (9.37), o factor em evidˆencia em (9.89) ´e escrito da seguinte forma: ²r µr ² µ ω2 = 2 (9.90) λ0 ¯ e a Eq. (9.89) vem µ ¶ ²r µ r 1 1−i . 2 Q λ0 ¯ Igualando as partes real e imagin´aria de ambos os membros, obtˆem-se express˜oes para kr e para ki :  ²r µr   kr2 − ki2 = 2   λ0 ¯  k 2 = (kr − i ki )2 =  ²r µr     2 kr ki = 2 , λ0 Q ¯ cuja solu¸c˜ao ´e kr = 1 λ0 ¯ ki = 1 λ0 ¯ r r ²r µr 2 ²r µr 2 "µ 1 1+ 2 Q "µ 1 1+ 2 Q #1/2 ¶1/2 +1 (9.91) #1/2 ¶1/2 −1 . (9.92) Podemos finalmente escrever o n´ umero de onda complexo, q k = kr − i ki = kr2 + ki2 ei arctan (−ki /kr ) , em fun¸c˜ao dos parˆametros do meio e do factor Q: k= 1√ ²r µ r ¯λ0 µ 1+ 1 Q2 ¶1 4      1/2    1  − 1   1 + Q2  exp −i arctan  ´1 ³  .    1 2   1 + Q2 +1   ³ ´1 2 O ´ındice de refrac¸c˜ao do meio ´e definido como a raz˜ao entre a velocidade da luz no vazio e a velocidade de fase da onda electromagn´etica no meio. Esta ´e dada por7 v= 7 ω = kr λ−1 ¯ 0 q ²r µr 2 ·³ c¯ λ−1 0 1+ 1 Q2 ´1/2 ¸1/2 , (9.93) +1 Quando o meio n˜ ao ´e condutor, v = ω/k. No caso de um condutor, kr ´e o parˆ ametro que governa a oscila¸ca ˜o (juntamente com ω). O parˆ ametro ki determina a atenua¸c˜ ao da onda [ver (9.76)]. 274 • ´tico Campo electromagne tendo-se ent˜ao para o ´ındice de refrac¸c˜ ao c n= = v r ²r µr 2 "µ 1 1+ 2 Q ¶1 2 #1/2 +1 . Note-se que o ´ındice de refrac¸c˜ao depende da frequˆencia, pois Q depende explicitamente de ω [ver (9.88)]. Al´em disso, tamb´em as propriedades do meio (por exemplo, a permitividade) dependem, em geral, da frequˆencia, como afirm´amos anteriormente. Vejamos seguidamente qual ´e a express˜ao do campo magn´etico. Se escolhermos E0 = E0 ˆi em (9.76), a Eq. (9.86) permite obter as componentes do campo magn´etico: Hx = 0 e [ver (9.76)] p ki2 + kr2 cos(ωt − kr z + θ) E0 cos(ωt − kr z) e−ki z ωµ cos(ωt − kr z) Hy = µ ¶1 µ = ² µ 2 1 1+ 2 Q ¶1 4 E0 cos(ωt − kr z + θ) e−ki z , onde, recorda-se, θ ´e o argumento de k. O campo magn´etico real ´e dado por H = H0 cos(ωt − kr z + θ) e−ki z jˆ , com µ ¶1 µ H0 = ² µ 2 1+ 1 Q2 (9.94) ¶1 4 E0 . Na nota¸c˜ao exponencial, H = H0 ei (ωt−kz+θ) jˆ = H0 ei (ωt−kr z+θ) e−ki z jˆ . (9.95) Exemplo 9.2: Valor m´ edio no tempo do vector de Poynting em meio condutor A Eq. (9.95) ´e particularmente u ´til para obter a m´edia temporal do vector de Poynting associado `a onda electromagn´etica de frequˆencia bem determinada que se propaga no meio condutor. Essa m´edia ´e obtida a partir da express˜ao geral (9.62) e das express˜oes (9.77) e (9.95) dos campos el´ectrico e magn´etico, respectivamente: = = = 1 Re (E × H ∗ ) 2 1 ˆ E0 H0 e−2 ki z Re (e−i θ ) k 2 1 ˆ. E0 H0 e−2 ki z cos θ k 2 (9.96) Partindo de (9.76) e de (9.94), pode o leitor obter a m´edia temporal do vector de Poynting a partir da sua defini¸c˜ao (9.59) e chegar `a express˜ao (9.96), confirmando assim, tamb´em neste caso, a validade de (9.62). ´ticas Ondas electromagne 9.6.1 • 275 Caso de um bom condutor Um bom condutor tem uma condutividade da ordem de 107 S/m (siemens por metro) ou superior. Para um bom condutor, o denominador em (9.88), ou seja, a condutividade, ´e, na regi˜ ao de baixas frequˆencias, muito maior do que o numerador dessa express˜ao. Quando tal se verifica, Q ¿ 1. (9.97) Dito de outro modo, a regi˜ao de baixas frequˆencias ´e dada por ω ¿ σ/². A condutividade do cobre ´e σ ≈ 5, 99×107 S/m e a da prata σ ≈ 6, 23×107 S/m. A regi˜ao de baixas frequˆencias para estes metais (para os quais ² = ²0 ) e para outros de condutividades semelhantes ´e ent˜ ao 18 f = 2πω ¿ 10 Hz. No limite (9.97), as partes real (kr ) e imagin´aria (ou melhor, o sim´etrico da parte imagin´aria, ki ) coincidem. De facto, os parˆentesis rectos nas express˜oes (9.91) e (9.92) reduzem-se √ ambos a 1/ Q. O factor que multiplica esses parˆentesis pode ser escrito, atendendo a (9.90), noutra forma: r ²µ 1 √ , kr ' ki ' ω 2 Q ou, ainda, atendendo `a defini¸c˜ao de Q dada pela Eq. (9.88), r kr ' ki ' ωσµ . 2 O argumento de k para um bom condutor ´e, pois, −π/4. Para a velocidade de fase da onda obt´em-se, relativamente a (9.93), uma express˜ao mais simples: ω v= = kr s 2ω . σµ (9.98) ´ habitual introduzir o comprimento δ = v/ω = λ/(T ω) = λ/(2π), que pode tamb´em ser E escrito na forma s 2 1 1 δ = ¯λ = = = . (9.99) ωσµ kr ki Em fun¸c˜ao do parˆametro δ, e para um bom condutor, os campos el´ectrico e magn´etico passam a ser dados por [ver (9.76) para o campo el´ectrico e (9.94) para o magn´etico] µ E = E0 e −z/δ r H = E0 z cos ωt − δ µ ¶ ˆi z π σ −z/δ e cos ωt − − ωµ δ 4 (9.100) ¶ jˆ . (9.101) Deste estudo podem ser retiradas algumas conclus˜oes importantes. Assim, das express˜oes para os campos el´ectrico e magn´etico pode concluir-se que as ondas s˜ao atenuadas por um factor e−1 numa distˆancia igual a δ, ou seja, por um factor e−2π = 2×10−3 num comprimento de onda, λ. O valor m´edio no tempo do vector de Poynting ´e mais atenuado ainda pois < S >∼ e−2z/δ [ver (9.96)]. A quantidade δ ´e designada por profundidade de penetra¸c˜ ao ou profundidade da pele. Esta profundidade, como mostra a Eq. (9.99), diminui quando a condutividade, a permeabilidade ou a frequˆencia aumentam (resultado que apenas se aplica no limite de baixas frequˆencias). Para o cobre e para a prata, p δ ≈ 0, 03/ω. Para frequˆencias da ordem de 1010 Hz (micro-ondas) a profundidade da pele ´e da ordem de 10−6 m. Na zona do vis´ıvel (frequˆencias ∼ 1015 Hz), que ainda pode ser 276 • ´tico Campo electromagne considerada na regi˜ao das baixas frequˆencias, os condutores como o cobre ou a prata s˜ao muito opacos `a radia¸c˜ao electromagn´etica. A raz˜ao entre as amplitudes dos campos el´ectrico e magn´etico nos condutores ´e profundamente alterada relativamente ao seu q valor no vazio. No caso do vazio, recorda-se que a impedˆancia caracter´ıstica ´e E/H = µ²00 = 377 Ω [ver (9.63)]. No caso do cobre, que ´e um bom condutor, o valor desta raz˜ao ´e 3, 7×10−4 Ω, para uma frequˆencia de 1 MHz. A raz˜ao das densidades de energia el´ectrica e magn´etica ´e ²E 2 ω² ∼ = Q ¿ 1, 2 µH σ ou seja, a energia de ondas electromagn´eticas propagando-se em bons condutores ´e essencialmente magn´etica. A velocidade de fase, como se pode concluir de (9.98), ´e proporcional `a raiz quadrada da frequˆencia e, tipicamente, ´e muito pequena: tomando de novo o exemplo do cobre e uma frequˆencia de 1 MHz, a velocidade de fase ´e de apenas 415 m/s! O ´ındice de refrac¸c˜ ao ´e ent˜ao da ordem de 7×105 . Nos condutores h´a grande dispers˜ a o devido ` a forte dependˆ e ncia √ do ´ındice de refrac¸c˜ao com a frequˆencia: n ∼ 1/ f . Consideremos agora a regi˜ao de altas frequˆencias definida por ω À σ/²0 , ou seja, Q À 1. Neste limite, as eqs. (9.91) e (9.91) conduzem a kr ∼ 1√ ²r µr , λ0 ki ∼ 0 , ou seja, deixa de haver amortecimento e o metal torna-se transparente `a radia¸c˜ ao. Na verdade, metais como o cobre ou a prata j´a s˜ao razoavelmente transparentes aos raios X, cujas frequˆencias se situam num intervalo em torno de 1018 Hz. 9.6.2 Efeito Joule em bons condutores J´a vimos que a intensidade do vector de Poynting decresce rapidamente no caso de um bom condutor e ´e f´acil antever o que acontece `a energia perdida pela onda electromagn´etica: passa para o meio devido ao efeito Joule. Determinando explicitamente o valor m´edio no tempo do vector de Poynting, usando a express˜ao (9.62) e a forma exponencial dos campos dados por (9.100) e (9.101), ou tomando o limite de (9.96) no caso de bons condutores, obt´em-se r < S >= σ −2z/δ 2 ˆ e Eef k 2ωµ √ (Eef = E0 / 2) . Considere-se a Figura 9.2, que representa um paralelep´ıpedo do material condutor, de largura a, altura b e espessura ∆z ¿ δ. A energia electromagn´etica transferida para o material por unidade de tempo ´e a diferen¸ca entre os fluxos do valor m´edio < S > atrav´es das duas faces do paralelep´ıpedo perpendiculares `a direc¸c˜ ao de propaga¸c˜ ao da onda: ∆PEM = a b ( < S >z=0 − < S >z=∆z ) r r σ σ 2∆z 2 −2∆z/δ 2 = a b Eef (1 − e ) ' a b Eef , 2ωµ 2ωµ δ tendo-se efectuado um desenvolvimento em s´erie da exponencial e retido apenas termos at´e primeira ordem, uma vez que ∆z ¿ δ. Atendendo `a express˜ao (9.99), a perda de potˆencia electromagn´etica pode ser escrita do seguinte modo: 2 ∆PEM = a b σ ∆z Eef . ´ticas Ondas electromagne • 277 x b E S H a y z D z Figura 9.2. Paralelep´ıpedo de material condutor. Por outro lado, a tens˜ao eficaz ´e o produto do campo el´ectrico eficaz por b, isto ´e, Vef = Eef b, e a resistˆencia ´e dada por 1 b R= ; σ a ∆z de facto, como se mostra na Figura 9.2, a direc¸c˜ ao do campo el´ectrico ´e segundo o eixo x e a corrente tem a direc¸c˜ao do campo el´ectrico. A potˆencia dissipada no paralelep´ıpedo por efeito Joule ´e PJ = Vef2 2 = a b σ ∆z Eef = ∆PEM . R A energia perdida pela onda electromagn´etica manifesta-se no correspondente aumento da energia interna do meio condutor por realiza¸c˜ ao de trabalho dissipativo (efeito Joule). 9.7 ˜ E REFRACC ˜ DE ONDAS ELECTROMAGNETICAS ´ REFLEXAO ¸ AO EM INTERFACES PLANAS Vamos abordar o problema da reflex˜ao e da refrac¸c˜ ao de ondas electromagn´eticas quando incidem na superf´ıcie de separa¸c˜ ao de dois meios. Por raz˜oes de simplicidade de exposi¸c˜ ao, vamos considerar que a onda incidente se propaga inicialmente no vazio, designado por meio 1, e que a superf´ıcie de separa¸c˜ao desse meio do meio 2, diel´ectrico de permitividade relativa constante ²r e permeabilidade igual `a do vazio (µr = 1), ´e plana. O tratamento geral em que se consideram dois meios materiais usa um formalismo semelhante ao que ir´a ser desenvolvido. Consideremos uma onda plana incidente, linearmente polarizada, como se indica na Figura 9.3. Nessa figura mostra-se, em corte, a superf´ıcie de separa¸c˜ ao dos dois meios, ˆ tem a direc¸c˜ que ´e o plano yz. O versor n ao e o sentido do vector de Poynting, S , da onda incidente. A linha do campo S ´e designada por raio luminoso (neste caso, raio incidente) em ´optica geom´etrica. A onda, ao incidir na superf´ıcie de separa¸c˜ ao dos dois meios (plano x = 0), reflecte-se e refracta-se. S˜ao justamente as leis que regem estes dois fen´omenos — da reflex˜ao e da refrac¸c˜ao — conhecidas na ´optica geom´etrica como leis de Snell-Descartes, 278 • ´tico Campo electromagne x n^ ' n^ q ' q m e io 1 m e io 2 O q " n^ " Figura 9.3. Esquema da reflex˜ ao e da refrac¸ c˜ ao de uma onda plana quando incide na superf´ıcie (plana) de separa¸ c˜ ao de dois meios. que iremos obter a partir das equa¸c˜oes de Maxwell. Essas leis tˆem de ser, evidentemente, independentes do ponto (y, z) que se considere no plano separador yz. Considerando frentes ˆ a incidir na superf´ıcie de separa¸c˜ de onda perpendiculares a n ao, ir˜ao emergir, como ondas ˆ 0 , no caso da reflex˜ao e a n ˆ 00 , no caso da reflectidas, frentes de onda perpendiculares a n refrac¸c˜ao, ou seja, ondas planas. Note-se que n˜ao se est´a a fazer qualquer suposi¸c˜ ao sobre ˆ, n ˆ0 e os ˆangulos θ0 e θ00 relativamente a θ, nem relativamente `as direc¸c˜ oes dos versores n ˆ 00 , n˜ao se pressupondo sequer que estes versores estejam no mesmo plano!8 Note-se que se n ˆ 0 e refractado ao “raio incidente”9 considerado na Figura 9.3 corresponde o raio reflectido n 00 ˆ , a um qualquer outro raio incidente paralelo a n ˆ corresponder˜ao raios reflectidos e refracn tados paralelos aos raios reflectido e refractado apresentados nessa figura. S´o assim haver´ a independˆencia relativamente `as coordenadas y e z do ponto de incidˆencia dos raios. Para uma onda plana sinusoidal incidente, linearmente polarizada, os campos de indu¸c˜ ao magn´etica e el´ectrico s˜ao dados por  i (ωt−k n·r )   B=be   E = c (b × n ˆ ) ei (ωt−k n·r) , (9.102) sendo ω = k c a frequˆencia angular e k o n´ umero de onda da onda incidente. As ondas reflectida e refractada s˜ao dadas pelos seguintes pares de campos de indu¸c˜ ao magn´etica e el´ectrico:  0 0 i (ω 0 t−k0 n0 ·r )   B =b e (9.103)   E 0 = c (b0 × n 0 i (ω 0 t−k 0 n0 ·r ) ˆ)e , 8 Provaremos a seguir que, efectivamente, os trˆes versores est˜ ao no mesmo plano. Na Figura 9.3 utilizaˆ, n ˆ0 se j´ a este resultado, pois mostram-se os trˆes versores no mesmo plano. Sublinha-se que, ` a partida, n ˆ 00 s˜ e n ao quaisquer e que a sua representa¸ca ˜o complanar na Figura 9.3 serve apenas para n˜ ao complicar desnecessariamente o esquema. 9´ E muito c´ omoda a utiliza¸ca ˜o da linguagem da ´ optica geom´etrica e n˜ ao tira rigor ` a exposi¸ca ˜o. ´ticas Ondas electromagne • 279 para a onda reflectida; e  00 00 i (ω 00 t−k00 n00 ·r )   B =b e  00 00 00  E 00 = v (b00 × n ˆ 00 ) ei (ω t−k n ·r) , (9.104) para a onda refractada. Nestas express˜oes b, b0 e b00 s˜ao vectores constantes e c c ω 00 =√ = 00 k ²r n v= (9.105) ´e a velocidade de propaga¸c˜ao da onda no meio 2, meio diel´ectrico cujo ´ındice de refrac¸c˜ ao ´e n. Note-se que as frequˆencias e, portanto, os n´ umeros de onda est˜ao a ser considerados como quantidades independentes nas trˆes ondas electromagn´eticas. Cada uma das ondas consideradas satisfaz, separadamente, as equa¸c˜ oes de Maxwell, devendo, na superf´ıcie de separa¸c˜ao dos meios, verificar-se as condi¸c˜ oes de fronteira para os campos, que decorrem das equa¸c˜oes de Maxwell [eqs. (9.16) a (9.21)]. Em particular, h´a continuidade da componente tangencial do campo el´ectrico e da componente normal do campo de indu¸c˜ao magn´etica, o que se pode traduzir pelas equa¸c˜ oes E1t = E2t (9.106) B1n = B2n , (9.107) e onde, como habitualmente, n designa componente normal `a superf´ıcie e t tangencial. Por outro lado, como na superf´ıcie de separa¸c˜ ao dos meios n˜ao h´a distribui¸c˜ oes de cargas nem de correntes livres, h´a continuidade da componente normal do vector deslocamento e da componente tangencial do campo magn´etico: D1n = D2n ⇒ E1n = ²r E2n (9.108) H1t = H2t ⇒ B1t = B2t . (9.109) e Repare-se agora que toda a dependˆencia esp´acio-temporal das trˆes ondas electromagn´eticas est´a contida num factor exponencial e que, em x = 0, se pode escrever explicitamente para cada uma delas: onda incidente ˆ ˆ ei [ωt−k n·(yj +z k)] onda reflectida ˆ ˆ 0 0 0 ei [ω t−k n ·(yj +z k)] onda refractada ei [ω 00 t−k 00 ˆ )] n00 ·(yjˆ +z k . As condi¸c˜oes de continuidade em x = 0 acima expressas s´o se podem verificar para qualquer t e quaisquer (y, z) se os trˆes factores exponenciais para as trˆes ondas forem iguais, ou seja, se (9.110) ω = ω 0 = ω 00 e se e ˆ · jˆ = k 0 n ˆ 0 · jˆ = k 00 n ˆ 00 · jˆ kn (9.111) ˆ = k0 n ˆ = k 00 n ˆ. ˆ ·k ˆ0 · k ˆ 00 · k kn (9.112) 280 • ´tico Campo electromagne A express˜ao (9.110) mostra que as trˆes ondas tˆem todas a mesma frequˆencia angular, quer dizer, a frequˆencia da onda incidente determina a frequˆencia das outras duas ondas. Este resultado ´e plaus´ıvel para a onda reflectida, que se propaga no mesmo meio da onda incidente, mas poderia parecer surpreendente para a onda refractada, que se propaga noutro meio. De facto n˜ao o ´e, pois as part´ıculas carregadas no meio 2 executam oscila¸c˜ oes for¸cadas com a frequˆencia da onda que for¸ca essas oscila¸c˜ oes e s˜ao, elas pr´oprias, fonte de campo electromagn´etico, cuja frequˆencia ´e a da sua pr´opria oscila¸c˜ ao10 . 0 Dado que ω = ω , segue-se imediatamente que k = k0 , isto ´e, os n´ umeros de onda das ondas incidente e reflectida s˜ao iguais. De ω = ω 00 resulta a seguinte rela¸c˜ao entre o n´ umero de onda da onda refractada e o da onda incidente — [ver (9.105)]: ω 00 ω k 00 = (9.113) = n = nk. v c 9.7.1 Leis de Snell-Descartes Ainda nada se disse quanto `a orienta¸c˜ ao dos eixos y e z. Sem perda de generalidade, ˆ e pelo eixo x (o plano do podemos considerar o eixo z perpendicular ao plano definido por n papel, no caso da Figura 9.3). Nestas condi¸c˜ oes, de (9.112) resulta ˆ =0 ˆ ·k n e, consequentemente, tamb´em se verifica: ˆ =n ˆ = 0, ˆ0 · k ˆ 00 · k n ˆ, n ˆ0 e n ˆ 00 s˜ o que permite concluir que os versores n ao complanares. Esta conclus˜ao ´e afinal a primeira lei da reflex˜ ao e a primeira lei da refrac¸c˜ ao, que afirmam: o raio incidente, o raio reflectido (ou refractado) e a normal no ponto de incidˆencia (eixo x no caso considerado) s˜ao complanares. Da primeira igualdade em (9.111) obt´em-se a segunda lei da reflex˜ ao. Com efeito, como k = k 0 , segue-se que ˆ · jˆ = n ˆ 0 · jˆ , n donde sin θ = sin θ0 ⇒ θ = θ0 , (9.114) uma vez que o eixo y coincide com a linha que, no esquema da Figura 9.3, representa a superf´ıcie de separa¸c˜ao dos meios e escolhe-se o sentido positivo para a direita. A Eq. (9.114) traduz, pois, a segunda lei da reflex˜ ao: o ˆangulo de incidˆencia ´e igual ao ˆangulo de reflex˜ao. As primeiras leis da reflex˜ao e da refrac¸c˜ ao e a segunda lei da reflex˜ao s˜ao conhecidas por leis de Descartes. A segunda lei da refrac¸c˜ ao, ou lei de Snell, est´a tamb´em contida na express˜ao (9.111). De facto, combinando a u ´ltima igualdade dessa express˜ao com (9.113), obt´em-se imediatamente k sin θ = k n sin θ00 , donde a raz˜ao entre os senos do ˆangulos de incidˆencia e de refrac¸c˜ ao ´e sin θ = n, sin θ00 que ´e, como se sabe, a segunda lei da refrac¸c˜ ao11 . 10 (9.115) Recorde-se, da Mecˆ anica, que a frequˆencia de oscila¸ca ˜o de um oscilador harm´ onico que executa oscila¸co ˜es for¸cadas ´e a frequˆencia da for¸ca externa. 11 Esta lei escreve-se na forma sin θ/ sin θ00 = n2 /n1 , em que n1 e n2 s˜ ao, respectivamente, os ´ındices de refrac¸ca ˜o dos meios 1 e 2; no caso considerado, o meio 1 ´e o vazio e n1 = 1. ´ticas Ondas electromagne 9.7.2 • 281 Equa¸c˜ oes de Fresnel Vamos escrever de forma mais expl´ıcita as condi¸c˜ oes de fronteira (9.106) a (9.109) para x = 0. As exponenciais n˜ao intervˆem, pois tˆem sempre o mesmo valor em ambos os membros das quatro equa¸c˜oes que exprimem as condi¸c˜ oes de fronteira, qualquer que seja o ponto da superf´ıcie de separa¸c˜ao e o instante que se considere. Como a normal `a superf´ıcie de separa¸c˜ ao ˆ ´e o versor i, as eqs. (9.106) a (9.109) podem ser escritas respectivamente, e fazendo uso de (9.102) a (9.104), na seguinte forma: ˆi × [c (b × n ˆ ) + c (b0 × n ˆ 0 ) − v (b00 × n ˆ 00 )] = 0 ˆi · (b + b0 − b00 ) = 0 ˆi · [c (b × n ˆ ) + c (b0 × n ˆ 0 ) − v ²r (b00 × n ˆ 00 )] = 0 (9.116) ˆi × (b + b0 − b00 ) = 0 . (9.119) (9.117) (9.118) x p ^ b n b n ^ p q 2 p ^ 2 q ^ q b 'p n ' ^ b 'n ^ q m e io 1 y m e io 2 q " p 2 b "n ^ q " b p" ^ n " ^ Figura 9.4. Esquema mais pormenorizado da Figura 9.3, mostrando as componentes “paralelas” e “normais” referidas no texto. Os vectores b, b0 e b00 podem ser decompostos, como mostra a Figura 9.4, nas suas (i) (i) componentes12 normais, bn , e paralelas, bp , ao plano de incidˆencia, que ´e o plano definido ˆ e pela normal `a superf´ıcie de separa¸c˜ pelo versor n ao dos meios (direc¸c˜ ao x no caso da Figura 9.4). ˆ, ou seja, ˆ, n ˆ0 e i O ´ındice “n” significa “normal” ao plano de incidˆencia (plano formado pelos versores n o plano do papel, no caso da Figura 9.4). O ´ındice “p” significa “paralelo” a esse plano (mas perpendicular ` a direc¸ca ˜o de propaga¸ca ˜o da onda). 12 282 • ´tico Campo electromagne Em fun¸c˜ao das suas componentes cartesianas, ˆ = − cos θ ˆi + sin θ jˆ n ˆ 0 = cos θ ˆi + sin θ jˆ n ˆ 00 = − cos θ00 ˆi + sin θ00 jˆ n e ˆ b = bp sin θ ˆi + bp cos θ jˆ + bn k b 0 b00 (9.120) ˆ = bp sin θ ˆi − b0p cos θ jˆ + b0n k ˆ, = b00p sin θ00 ˆi + b00p cos θ00 jˆ + b00n k 0 (9.121) (9.122) o que permite escrever (9.116) a (9.119) na forma c bn cos θ − c b0n cos θ − v b00n cos θ00 = 0 0 00 c bp + c bp − v bp = 0 0 (9.124) 00 00 bp sin θ + bp sin θ − bp sin θ = 0 0 00 (9.125) 00 c bn sin θ + c bn sin θ − v ²r bn sin θ = 0 0 00 00 bp cos θ − bp cos θ − bp cos θ = 0 0 (9.123) 00 bn + bn − bn = 0 . (9.126) (9.127) (9.128) As duas primeiras equa¸c˜oes resultam de (9.116), a terceira de (9.117), a quarta de (9.118) e as duas u ´ltimas de (9.119). Note-se que estas equa¸c˜oes n˜ao misturam as componentes “normais” com as componentes “paralelas”. Eliminando b00p de entre as eqs. (9.124) e (9.127), obt´em-se b0p = −c cos θ00 + v cos θ bp ; c cos θ00 + v cos θ de modo an´alogo, eliminando agora b0p nas mesmas duas equa¸c˜ oes, b00p = 2 c cos θ bp . c cos θ00 + v cos θ Procedendo da mesma maneira, mas agora tomando as eqs. (9.123) e (9.128) e eliminando primeiro b00n e depois b0n , obt´em-se b0n = e c cos θ − v cos θ00 bn ; c cos θ + v cos θ00 2 c cos θ bn . c cos θ + v cos θ00 As quatro express˜oes que acab´amos de obter s˜ao as f´ormulas de Fresnel, as quais podem ainda ser escritas unicamente em termos dos ˆangulos de incidˆencia e de refrac¸c˜ ao e das amplitudes “normal” e “paralela” da onda incidente. Para isso, tira-se partido da lei de Snell — Eq. (9.115) — e da defini¸c˜ao de ´ındice de refrac¸c˜ ao, n = c/v — ver (9.105) — o que permite escrever: sin θ00 . v=c sin θ b00n = ´ticas Ondas electromagne • 283 Substituindo nas f´ormulas de Fresnel, obt´em-se, respectivamente, b0p = b00p = b0n = b00n = sin(θ00 − θ) bp sin(θ00 + θ) sin 2θ bp sin(θ00 + θ) sin θ cos θ − sin θ00 cos θ00 tan(θ − θ00 ) b = bn n sin θ cos θ + sin θ00 cos θ00 tan(θ + θ00 ) sin 2θ sin 2θ bn = bn . sin θ cos θ + sin θ00 cos θ00 sin(θ + θ00 ) cos(θ − θ00 ) Para se escreverem as formas finais das duas u ´ltimas express˜oes utilizaram-se as seguintes rela¸c˜oes trigonom´etricas: sin θ cos θ − sin θ00 cos θ00 = sin(θ − θ00 ) cos(θ + θ00 ) sin θ cos θ + sin θ00 cos θ00 = cos(θ − θ00 ) sin(θ + θ00 ) . 9.7.3 ˆ Angulo de Brewster Uma situa¸c˜ao interessante ocorre quando os ˆangulos de incidˆencia e de refrac¸c˜ ao s˜ao complementares: π θ + θ00 = . (9.129) 2 Nestas condi¸c˜oes, o raio refractado e o raio reflectido s˜ao perpendiculares e b0n = 0 e b0p 6= 0 . Este resultado significa que o raio reflectido ´e polarizado sempre na mesma direc¸c˜ ao. Mas se a onda incidente for linearmente polarizada e tal que bp = 0 — o plano de vibra¸c˜ ao (ver Sec¸c˜ao 9.2) ´e ent˜ao o plano de incidˆencia — e se se verificar a condi¸c˜ ao expressa por (9.129) haver´a onda refractada mas n˜ao haver´ a onda reflectida! O ˆangulo θB para o qual esta situa¸c˜ ao ocorre chama-se ˆ angulo de Brewster e a sua determina¸c˜ ao experimental permite obter o ´ındice de refrac¸c˜ao de um material. De facto, o ´ındice de refrac¸c˜ ao ´e a tangente desse ˆangulo: n= sin θB sin θB sin θB ¡π ¢ = = tan θB . = 00 sin θ sin 2 − θB cos θB (9.130) Em geral, para ˆangulos tais que tan(θ − θ00 ) ∼ sin(θ − θ00 ) e tan(θ + θ00 ) À sin(θ − θ00 ), a luz reflectida ´e fortemente polarizada. 9.7.4 Coeficientes de reflex˜ ao e de transmiss˜ ao Consideremos uma onda electromagn´etica a incidir na superf´ıcie plana de separa¸c˜ ao de dois meios diel´ectricos. Designando por S o vector de Poynting desta onda incidente, a energia m´edia que, por unidade de tempo, chega a uma ´area unit´aria da superf´ıcie separadora ´e ˆS |, J = | < S > ·n (9.131) ˆ S ´e o versor normal `a superf´ıcie. Na Figura 9.4 este versor ´e ˆi, pois a superf´ıcie que onde n separa os dois meios ´e o plano yz. De modo an´alogo, a energia que, por unidade de tempo, ˆ S | para emerge da unidade de ´area da mesma superf´ıcie separadora ´e J 0 = | < S 0 > · n 284 • ´tico Campo electromagne ˆ S | para a onda refractada, onde S 0 e S 00 s˜ a onda reflectida e J 00 = | < S 00 > · n ao os 0 00 respectivos vectores de Poynting. A conserva¸c˜ ao de energia implica que J = J + J . Definem-se os coeficientes de reflex˜ao, R, e de transmiss˜ao, T, atrav´es de R= J0 , J T = J 00 . J (9.132) Para uma onda plana, o valor m´edio do vector de Poynting ´e dado por (9.71), pelo que se tem, para o coeficiente de reflex˜ao, E 02 (9.133) R= 2 . E Supondo que a onda incidente se propaga no vazio e a refractada num meio de permitividade relativa ²r (e permeabilidade igual `a do vazio), o coeficiente de transmiss˜ao vem T = ²r E 002 v cos θ00 E 002 cos θ00 = n , E 2 c cos θ E 2 cos θ (9.134) tendo-se tamb´em utilizado (9.70) para obter a u ´ltima igualdade. Considere-se agora que a onda incidente est´a polarizada perpendicularmente ao plano de incidˆencia (na nota¸c˜ao da Figura 9.4, bn = 0). Usando (9.102), (9.103) e (9.116) em (9.133), obt´em-se à 0 !2 µ ¶ bp sin2 (θ00 − θ) cos θ − n cos θ00 2 R⊥ = = = . bp cos θ + n cos θ00 sin2 (θ00 + θ) De modo idˆentico, usando agora (9.102), (9.104) e (9.117) em (9.134), encontra-se T⊥ = sin2 2θ 4 n cos θ cos θ00 cos θ00 = . (cos θ + n cos θ00 )2 n sin2 (θ00 + θ) cos θ Para uma onda polarizada paralelamente ao plano de incidˆencia (bp = 0), os coeficientes de reflex˜ao e transmiss˜ao s˜ao calculados usando (9.102) a (9.104), (9.118) e (9.119) nas express˜oes (9.133) e (9.134), obtendo-se µ Rk = Tk = ¶ tan2 (θ − θ00 ) n cos θ − cos θ00 2 = tan2 (θ + θ00 ) n cos θ + cos θ00 cos θ00 4 n cos θ cos θ00 sin2 2θ = . n (sin θ cos θ + sin θ00 cos θ00 )2 cos θ (n cos θ + cos θ00 )2 (9.135) (9.136) Em ambas as situa¸c˜oes de polariza¸c˜ao se verifica R + T = 1, que decorre da conserva¸c˜ ao da energia. Repare-se, finalmente, que no caso de polariza¸c˜ ao paralela ao plano de incidˆencia se tem, para o ˆangulo de Brewster, à Rk = sin θB − cos( π2 − θB ) sin θB + cos( π2 − θB ) !2 = 0, como seria de esperar. Para escrever (9.137) utilizou-se (9.129) e (9.130) em (9.135). (9.137) ´ticas Ondas electromagne 9.8 • 285 GUIAS DE ONDAS Nas sec¸c˜oes 9.2, 9.5 e 9.6 trat´amos o problema da propaga¸c˜ ao do campo electromagn´etico em meios ilimitados. Na Sec¸c˜ao 9.7 abord´amos a quest˜ao da reflex˜ao e da refrac¸c˜ ao de ondas na superf´ıcie plana de separa¸c˜ao de dois meios. Vamos agora considerar o problema da propaga¸c˜ao do campo electromagn´etico em guias de ondas, ou seja, em regi˜oes confinadas do espa¸co. A baixas frequˆencias, a liga¸c˜ ao entre objectos via campo electromagn´etico pode ser feita atrav´es de fios condutores, mas, a altas frequˆencias, tal j´a n˜ao ´e vi´avel, pois os circuitos irradiam para todo o espa¸co (ver Cap´ıtulo 11). Por´em, a liga¸c˜ ao pode ser feita atrav´es de certos tipos de guias de ondas. O assunto, que tem grande interesse tecnol´ogico, ´e aqui abordado de um ponto de vista marcadamente conceptual, deixando de lado as in´ umeras aplica¸c˜oes. x y z Figura 9.5. Guia de onda rectil´ıneo com sec¸ c˜ ao recta de forma arbitr´ aria. Considera-se que o guia de ondas ´e rectil´ıneo, estendendo-se ao longo da direc¸c˜ ao z e podendo ter uma sec¸c˜ao recta (plano xy) de forma arbitr´aria, mas independente de z (Figura 9.5). Vamos ainda considerar que o material que constitui o guia (diel´ectrico e/ou magn´etico) ´e linear, homog´eneo e isotr´opico. A velocidade de propaga¸c˜ ao da onda nesse meio √ ´e v = 1/ ²µ. As equa¸c˜oes de propaga¸c˜ ao dos campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica s˜ao dadas por (9.67) e (9.68), as quais podem ser escritas na forma gen´erica ∇2 Φ − 1 ∂2Φ = 0, v 2 ∂t2 (9.138) onde Φ designa qualquer das componentes cartesianas do campo el´ectrico ou do campo de indu¸c˜ao magn´etica. Ao escrever (9.138) estamos a admitir que no material n˜ao h´a cargas nem correntes livres. Como o guia ´e infinito segundo z, n˜ao h´a reflex˜oes nas suas extremidades. Uma forma poss´ıvel para a onda que se propaga neste meio no sentido positivo do eixo z ´e (9.139) Φ(x, y, z, t) = φ(x, y) ei(ωt−kg z) , onde φ ´e a amplitude, que pode depender de x e y mas n˜ao de z (n˜ao se trata, pois, de uma onda plana). A quantidade kg ´e, em princ´ıpio, diferente de k = ω/v, que ´e o n´ umero de onda no espa¸co ilimitado para a onda de frequˆencia angular ω. Directamente relacionado com kg , 286 • ´tico Campo electromagne pode definir-se um “comprimento de onda no guia”, λg , que fixa o per´ıodo espacial da onda: kg = 2π/λg . Inserindo (9.139) em (9.138), obt´em-se a seguinte equa¸c˜ ao diferencial: ∂2Φ ∂2Φ + + (k 2 − kg2 )Φ = 0 . ∂x2 ∂y 2 (9.140) Trata-se de uma equa¸c˜ao de valores pr´oprios, cuja solu¸c˜ ao s´o fica determinada uma vez conhecidas as condi¸c˜oes de fronteira para as componentes dos campos E e B . No caso de as paredes do guia serem condutores perfeitos (σ → ∞), o campo electromagn´etico n˜ao penetra no seu interior [ver eqs. (9.100) e (9.101) com δ → 0], pelo que as condi¸c˜ oes de fronteira para os campos el´ectrico e magn´etico s˜ao: ˆ · D = σ` , n ˆ ×E = 0 , n ˆ · B = 0, n ˆ ×H = κ` , n (9.141) ˆ ´e o versor normal `a superf´ıcie do guia. Em particular, sublinhe-se que o campo onde n el´ectrico n˜ao pode ter componente tangencial e que o campo de indu¸c˜ ao magn´etica n˜ao pode ter componente normal junto das paredes do guia. Tal como em muitos problemas de valores pr´oprios em v´arios campos da F´ısica (cl´assica ou quˆantica) a Eq. (9.140), juntamente com as condi¸c˜ oes de fronteira, s´o tem solu¸c˜ ao para determinados valores pr´oprios, q (9.142) kc = k 2 − kg2 , o que significa que apenas certos tipos (ou modos) de ondas se podem propagar no guia. Claro que s´o tˆem interesse solu¸c˜oes a que correspondam valores reais de kg . De outro modo, a fun¸c˜ ao (9.139), embora persistente no tempo, deixa de o ser no espa¸co, decaindo exponencialmente para valores crescentes de z. Assim, s´o haver´ a onda a propagar-se quando k > kc , ou seja, quando λ < λc = 2π/kc , sendo λc o comprimento de onda cr´ıtico acima do qual deixa de haver solu¸c˜oes ondulat´orias do tipo (9.139). De resto, todos sabemos que uma onda electromagn´etica na regi˜ao do vis´ıvel se propaga no interior de um tubo direito e oco com alguns cent´ımetros de diˆametro: espreita-se de um lado e vˆe-se do outro lado! Mas uma onda de r´adio j´a n˜ao se propaga nesse tubo... Iremos, mais `a frente, considerar o caso particular de um guia de ondas com sec¸c˜ ao recta rectangular. Mas, para j´a, vamos explorar as equa¸c˜ oes de Maxwell no interior do guia para caracterizarmos os tipos de onda que nele se podem propagar. Como estamos a admitir ausˆencia de cargas e correntes livres, o conjunto de equa¸c˜ oes de Maxwell escreve-se ∇·E =0 (9.143) ∂H ∇ × E = −µ ∂t ∇·H =0 ∂E ∇×H =² . ∂t (9.144) (9.145) (9.146) De um modo mais expl´ıcito, a forma (9.139) para cada uma das componentes dos campos ˆ e H = Hxˆi + Hy jˆ + Hz k ˆ , ´e escrita do seguinte modo: E = Exˆi + Ey jˆ + Ez k Ex = ex (x, y) ei (ωt−kg z) Hx = hx (x, y) ei (ωt−kg z) (9.147) Ey = ey (x, y) e i (ωt−kg z) i (ωt−kg z) (9.148) Ez = ez (x, y) e i (ωt−kg z) Hy = hy (x, y) e i (ωt−kg z) Hz = hz (x, y) e . (9.149) ´ticas Ondas electromagne • 287 Substituindo os campos el´ectrico e magn´etico dados por estas express˜oes nas eqs. (9.143) a (9.146), obtˆem-se oito equa¸c˜oes escalares (duas resultantes das equa¸c˜ oes com o operador divergˆencia e as restantes resultantes das equa¸c˜ oes com o operador rotacional): ∂ex ∂ey + − i kg ez = 0 ∂x ∂y ∂ez + i kg ey = −i ω µ hx ∂y ∂ez i kg ex + = i ω µ hy ∂x ∂ey ∂ex − = −i ω µ hz ∂x ∂y ∂hx ∂hy + − i kg hz = 0 ∂x ∂y ∂hz + i kg hy = i ω ² ex ∂y ∂hz i kg hx + = −i ω ² ey ∂x ∂hy ∂hx − = i ω ² ez . ∂x ∂y (9.150) (9.151) (9.152) (9.153) (9.154) (9.155) (9.156) (9.157) Vamos verificar que cada uma das componentes transversas, ex , ey , hx e hy pode ser escrita em fun¸c˜ao das componentes longitudinais ez e hz . Eliminando hy de entre (9.152) e (9.155) e fazendo uso da defini¸c˜ao (9.142), µ i ∂hz ∂ez ex = − 2 kg + µω kc ∂x ∂y De (9.151) e (9.156), µ ey = − i ∂hz ∂ez − µω kg 2 kc ∂y ∂x ¶ . (9.158) . (9.159) ¶ De novo de (9.151) e (9.156), µ hx = − i ∂ez ∂hz −²ω + kg 2 kc ∂y ∂x ¶ . (9.160) Finalmente, usando novamente o par de equa¸c˜ oes (9.152) e (9.155), conclui-se que µ hy = − i ∂ez ∂hz ²ω + kg 2 kc ∂x ∂y ¶ . (9.161) As outras quatro equa¸c˜oes do grupo (9.150) a (9.157), que n˜ao foram utilizadas para obter as eqs. (9.158) a (9.161), podem ser combinadas, da´ı resultando equa¸c˜ oes para ez e hz do tipo (9.140). Note-se que cada uma das eqs. (9.158) a (9.161) ´e a soma de dois termos: um que tem directamente a ver com a componente longitudinal do campo el´ectrico, ez ; o outro que tem directamente a ver com a componente longitudinal do campo magn´etico, hz . Se ez = 0, o campo el´ectrico ´e transverso e a onda diz-se “el´ectrica transversa” (ou, abreviadamente, TE). Se hz = 0, a onda denomina-se “magn´etica transversa” (TM). Quando ez = 0 ez = 0 e hz = 0 simultaneamente, a onda ´e “electromagn´etica transversa” (TEM). Quer se trate de uma onda 288 • ´tico Campo electromagne TM, quer se trate de uma onda TE, de (9.158) a (9.161) pode, em qualquer caso, concluir-se que ey ex =− . (9.162) hy hx Usando (9.147) a (9.149) pode obter-se uma rela¸c˜ ao semelhante a (9.162) para as componentes dos campos f´ısicos: Re Ex Re Ey =− (9.163) Re Hy Re Hx [cf. (9.86)], que permite concluir que as componentes transversas dos campos f´ısicos E e H s˜ao ortogonais: Re Ex Re Hx + Re Ey Re Hx = 0. Para ondas TEM, as eqs. (9.158) a (9.161) implicam que kc se anule, o que permite concluir, de (9.142), que kg = k, ou seja, a velocidade de propaga¸c˜ ao de uma onda TEM guiada ´e igual `a da onda plana no mesmo meio. De kc = 0 resulta ainda λc → ∞, quer dizer, uma onda com qualquer frequˆencia (ou comprimento de onda) pode, em princ´ıpio, propagarse num guia, desde que seja do tipo TEM. Contudo, os modos TEM n˜ao se propagam num tubo oco de paredes condutoras. Na verdade, das eqs. (9.150) e (9.153) temos ∇ · eTEM = 0, ∇ × eTEM = 0 . (9.164) A solu¸c˜ao destas equa¸c˜oes ´e equivalente a um problema de electrost´atica em duas dimens˜oes. Se a parede do guia de ondas for um condutor perfeito, toda a superf´ıcie est´a ao mesmo potencial e, nestas condi¸c˜oes, o campo eTEM ´e perpendicular `a superf´ıcie condutora e, no interior do guia, obedece a ∇2 φTEM = 0 eTEM = −∇φTEM . com (9.165) O problema ´e em tudo semelhante ao referido na Sec¸c˜ ao 6.1. Em particular as eqs. (6.3) e (6.4) podem ser reescritas na forma Z ³ V ´ I φTEM ∇2 φTEM + ∇φTEM · ∇φTEM dv = S φTEM ∂φTEM dS = 0 , ∂n sendo a primeira igualdade a express˜ao do teorema de Green [Eq. (6.5)] e a igualdade a zero resultante de o campo ser perpendicular `a superf´ıcie de fronteira. Atendendo `a express˜ao (9.165), conclui-se que Z V (∇φTEM )2 dv = 0 , de onde resulta eTEM = −∇φTEM = 0, pois a fun¸c˜ ao integranda ´e n˜ao negativa. Conclu´ımos assim que, num guia de ondas oco, uma onda TEM n˜ao se pode propagar. No entanto, em linhas de transmiss˜ao (ver Sec¸c˜ ao 9.8.2) quer do tipo cabo coaxial, quer de fios paralelos, uma onda TEM propaga-se sem qualquer restri¸c˜ ao nas frequˆencias. ´ E interessante notar ainda, de (9.151) e (9.152), que r hTEM = ² ˆ k × eTEM . µ Comparando agora com a Eq. (9.31), verificamos que a rela¸c˜ ao entre h = hx (x, y )^ i + hy (x, y )^ y e e = ex (x, y )^ i + ey (x, y )^ y para ondas do tipo TEM ´e equivalente `a rela¸c˜ao entre os campos el´ectrico e de indu¸c˜ao magn´etica de uma onda plana que se propaga num meio infinito de permitividade ² e permeabilidade µ. ´ticas Ondas electromagne 9.8.1 • 289 Guia de sec¸c˜ ao rectangular Como exemplo de um guia de ondas vamos considerar um tubo met´alico de sec¸c˜ ao rectangular, com o interior preenchido por material de permitividade constante ² e permeabilidade tamb´em constante µ (Figura 9.6). Esta geometria do guia simplifica a an´alise da situa¸c˜ ao. x y b y z a x Figura 9.6. Guia de onda rectil´ıneo de sec¸ c˜ ao rectangular. ´ u Vamos considerar ondas TE13 , ou seja, ondas tais que ez = 0. E ´til discutir o caso em que ex = 0 em qualquer ponto da sec¸c˜ ao do guia, situa¸c˜ ao que ´e compat´ıvel com as condi¸c˜oes de fronteira (9.141), as quais exigem que o campo el´ectrico sobre as faces do guia n˜ao tenha qualquer componente tangencial. Naturalmente que a escolha ex = 0 n˜ao ´e, de facto, geral, mas o tipo de onda que se obt´em, neste caso, cont´em o essencial dos aspectos f´ısicos, mantendo-se os aspectos matem´aticos a n´ıveis elementares. Com ex = ez = 0 resta encontrar a componente y do campo el´ectrico. Para x = 0 e x = a, a segunda condi¸c˜ ao de fronteira (9.141) exige que ey (x = 0, y) = ey (x = a, y) = 0 . (9.166) Um campo el´ectrico da forma Ey = E0 sin(kx x) ei(ωt−kg z) , sendo E0 uma amplitude real e kx uma quantidade tamb´em real, ´e do tipo (9.139), satisfaz a Eq. (9.140) desde que se verifique kx2 − k 2 + kg2 = 0 , (9.167) e cumpre as condi¸c˜oes de fronteira exigidas para Ey [eqs. (9.166)] desde que nπ kx = n = ±1, ±2, ... a Esta equa¸c˜ao mostra que kx tem valores discretos e, em virtude de (9.167), tamb´em s´o determinados valores de kg s˜ao admiss´ıveis. Estas restri¸c˜ oes significam que apenas certos comprimentos de onda no guia s˜ao permitidos: λg = 13 λ 2π 2π =q ¡ nπ ¢2 = r ³ ´2 , kg k2 − a 1 − nλ 2a (9.168) S˜ ao as ondas TE as que mais interesse podem ter. As ondas TEM n˜ ao se propagam em guias ocos e as ondas TM exigem, na pr´ atica, guias largos. 290 • ´tico Campo electromagne onde λ ´e o comprimento da onda plana de frequˆencia ω que se propaga no espa¸co ilimitado. Em (9.168) tomou-se apenas o valor positivo de kg , pois a onda propaga-se no sentido positivo do eixo z. Para valores de λ muito pequenos, λg ' λ, de onde se conclui que a velocidade de propaga¸c˜ao da onda guiada ´e igual `a da onda plana no espa¸co ilimitado. Quando λ aumenta, atinge um valor para o qual o denominador de (9.168) se anula e deixa de haver propaga¸c˜ao no guia. Para n = 1 o comprimento de onda limite ´e 2a. Acima deste comprimento de onda n˜ao h´a propaga¸c˜ao (a onda n˜ao “cabe” no guia). e x n = 1 a a 2 x n = 2 Figura 9.7. Representa¸ c˜ ao da “amplitude” do campo el´ ectrico numa dada sec¸ c˜ ao recta do guia [fun¸ c˜ ao (9.169), com n = 1 e n = 2]. Vejamos agora com mais pormenor a forma do campo electromagn´etico. Em cada sec¸c˜ao do guia rectangular (ou seja, para um dado z e para um dado t) a amplitude do campo el´ectrico depende de x da maneira que se indica na Figura 9.7, onde se representam os dois primeiros modos (n = 1, 2) do campo el´ectrico µ ¶ nπ x ey = E0 sin a . (9.169) A semelhan¸ca com o problema da corda vibrante ou de uma part´ıcula quˆantica confinada numa caixa a uma dimens˜ao ´e evidente. Como vimos anteriormente [Eq. (9.162)], a componente transversa do campo magn´etico ´e perpendicular ao campo el´ectrico e, por isso, hy = 0. A componente hz ´e obtida directamente de (9.153), tendo-se, para n = 1, µ hz = i ∂ey π π =i E0 cos x ω µ ∂x aωµ a ¶ , que ´e tamb´em apenas fun¸c˜ao de x. A componente segundo x ´e obtida a partir de (9.151) e tem-se (tamb´em para n = 1): µ hx = − ¶ kg kg π ey = − E0 sin x ωµ ωµ a . Estes resultados permitem concluir que as componentes transversas est˜ao em fase e que a componente longitudinal do campo magn´etico est´a desfasada de π destas duas. A Figura 9.8 representa esquematicamente os campos el´ectrico e magn´etico ao longo do guia. A representa¸c˜ao gr´afica diz respeito a um corte no guia por um plano y = Cte . Para ´ticas Ondas electromagne • 291 x E = 0 a H H E 0 z 1 E E = 0 H H H E z E z 2 l H E 3 z 4 E E z 5 z g Figura 9.8. Esquema (corte por plano y = Cte ) do campo el´ ectrico (perpendicular ao plano do papel) e magn´ etico (linhas fechadas) do modo TE1 ao longo do guia, num dado instante. z1 , z2 , z3 , z4 e z5 os diferentes tamanhos dos s´ımbolos que representam o campo el´ectrico referem-se a diferentes intensidades do campo. Para z1 e z5 a intensidade ´e m´axima e o campo aponta para fora. Para z3 a intensidade ´e tamb´em m´axima, mas o campo aponta para dentro. Em z2 e z4 o campo el´ectrico anula-se. Nas regi˜oes z1 < z < z2 e z4 < z < z5 o campo aponta para fora. Na regi˜ao z2 < z < z4 o campo aponta para dentro. Trat´amos o problema dos modos TE num guia met´alico de sec¸c˜ ao rectangular, tendo admitido que Ex = 0, e vimos, em particular, o caso em que o campo el´ectrico n˜ao tem nodos no interior do guia (tais ondas s˜ao designadas por ondas TE1 ). O problema geral com Ex 6= 0 no interior do guia poderia igualmente ser considerado. A Eq. (9.140) teria de ser resolvida, sendo Φ cada uma das componentes Ex e Ey , utilizando, por exemplo, o m´etodo da separa¸c˜ ao de vari´aveis desenvolvido no Cap´ıtulo 6. Assinale-se, de resto, que a solu¸c˜ ao representada por (9.169) ´e um caso particular das solu¸c˜ oes encontradas na Sec¸c˜ ao 6.3. As condi¸c˜ oes de fronteira iriam impor, de novo, valores discretos para kx e tamb´em para ky . O tratamento matem´atico seria mais complexo, embora os aspectos f´ısicos n˜ao fossem inovadores relativamente ao tipo de onda guiada que estud´amos em pormenor. Consider´amos guias de paredes met´alicas. Outros tipos de guias n˜ao tˆem esse tipo de paredes e, tal como nas fibras ´opticas, a propaga¸c˜ ao faz-se por reflex˜ao total. Tal como no caso analisado, para estudar a propaga¸c˜ ao nesses meios importa considerar as equa¸c˜ oes de Maxwell e as condi¸c˜oes de fronteira, mas o formalismo matem´atico necess´ario ´e, normalmente, intrincado. 9.8.2 Linhas de transmiss˜ ao Em sistemas de comunica¸c˜ao, como o telefone, a TV-cabo, a Internet, a transmiss˜ao dos sinais ´e muitas vezes realizada atrav´es das chamadas linhas de transmiss˜ ao que s˜ao dois fios paralelos, dois fios entrela¸cados, um cabo coaxial, etc. Numa das extremidades da linha de transmiss˜ao est´a a fonte que emite o sinal e no outro extremo o receptor do sinal, como mostra esquematicamente a Figura 9.9. 292 • ´tico Campo electromagne R E Figura 9.9. Esquema gen´ erico da linha de transmiss˜ ao. Vamos aqui considerar o cabo coaxial (ver Figura 8.8) como linha de transmiss˜ao. No entanto, a primeira parte do estudo, que conduz `as eqs. (9.172) a (9.175), ´e completamente geral e aplica-se a linhas de transmiss˜ao com outras formas, nomeadamente a linha de transmiss˜ao com dois fios paralelos. Consideramos que a linha de transmiss˜ao tem a direc¸c˜ ao do eixo dos z e que o espa¸co compreendido entre as duas superf´ıcies cil´ındricas do cabo coaxial ´e preenchido por um material de permeabilidade µ e permitividade ². Supomos, ainda, que as superf´ıcies interna e externa do cabo s˜ao condutores perfeitos. A linha de transmiss˜ao ´e percorrida por uma corrente vari´ avel I(z, t). A diferen¸ca de potencial entre os dois fios do cabo, V , ´e tamb´em uma fun¸c˜ ao de z e t: V = V (z, t). Podemos imaginar a linha de transmiss˜ao como uma cadeia de indutˆancias e condensadores. Na verdade, como a linha de transmiss˜ao ´e formada por dois fios (superf´ıcies cil´ındricas no caso do cabo coaxial), havendo uma queda de tens˜ao entre ambos, esta comporta-se como se fosse um condensador. Al´em disso, se a tens˜ao varia ao longo da linha de transmiss˜ao, cuja resistˆencia ´e nula como estamos a supor, a linha dever´ a ter uma indutˆancia n˜ao nula. Podemos, assim, representar a linha de transmiss˜ao ideal por uma cadeia de elementos constitu´ıdos por uma indutˆancia L e por um condensador C, como mostra a Figura 9.10 (a). Mas, na pr´atica, uma linha de transmiss˜ao ´e representada mais realisticamente por uma sucess˜ao de elementos de circuito do tipo representado na Figura 9.10 (b). Estes, al´em de inclu´ırem a indutˆancia L e o condensador C, contˆem uma resistˆencia R (que deve ser pequena) em s´erie com a indutˆancia, a qual tem em conta o facto de haver perdas de energia por efeito de Joule ao longo da linha de transmiss˜ao, e uma resistˆencia R0 (que deve ser grande) em paralelo com o condensador, que representa a possibilidade de passagem directa de corrente de um fio para o outro. L L R C C (a ) R ' (b ) Figura 9.10. Circuito equivalente de um elemento de uma linha de transmiss˜ ao; (a) caso ideal, (b) caso real. Vamos designar por l0 e c0 , respectivamente, a indutˆancia e a capacidade por unidade de comprimento da linha de transmiss˜ao. A queda de tens˜ao, dV , entre os extremos do elemento ´ticas Ondas electromagne • 293 do cabo dz, de indutˆancia l0 dz, est´a relacionada com l0 e com a varia¸c˜ ao da corrente por unidade de tempo em dz, atrav´es da lei de Faraday [ver Eq. (7.19)]: dV = −l0 dz ∂I . ∂t Assim, a varia¸c˜ao da tens˜ao por unidade de comprimento pode ser escrita do seguinte modo: ∂I ∂V = −l0 . ∂z ∂t (9.170) Al´em disso, como a diferen¸ca de potencial entre os dois fios do cabo varia com z, a carga sobre as superf´ıcies do cabo varia ao longo da linha de transmiss˜ao. Em particular, no elemento dz a carga ´e dq = c0 dz V (z, t) . Ora, a corrente que sai em z + dz, I(z + dz), deve ser igual `a que entra, I(z), menos a carga que fica depositada por unidade de tempo em dz, isto ´e, I(z + dz) = I(z) − c0 dz ∂V . ∂t Conclu´ımos que a varia¸c˜ao de corrente no elemento de linha dz ´e dI = I(z + dz) − I(z) = −c0 dz ∂V , ∂t e que a varia¸c˜ao da corrente por unidade de comprimento ´e ∂V ∂I = −c0 . ∂z ∂t (9.171) As eqs. (9.170) e (9.171) s˜ao duas equa¸c˜ oes diferenciais de primeira ordem acopladas. Se ∂2V derivarmos a primeira em ordem a t e a segunda em ordem a z e eliminarmos ∂z∂t , obtemos ∂2I 1 ∂2I = . ∂t2 l0 c0 ∂z 2 (9.172) Analogamente, se derivarmos (9.170) em ordem a z e (9.171) em ordem a t e eliminarmos ∂2I c˜ao do mesmo tipo para V : ∂z∂t , obtemos uma equa¸ ∂2V 1 ∂2V = . ∂t2 l0 c0 ∂z 2 (9.173) As equa¸c˜oes desacopladas (9.172) e (9.173) s˜ao equa¸c˜ oes de uma onda que se propaga na direc¸c˜ao do eixo dos z com velocidade 1 v=√ . l0 c0 (9.174) Admitindo para I e V solu¸c˜oes da forma f− (u) = f− (z − vt) [ver Eq. (9.25)], resulta, de (9.171), dI dV = v c0 . du du Integrando, resulta: 1 V = I = z0 I , c0 v 294 • ´tico Campo electromagne onde s z0 = l0 c0 (9.175) ´e a impedˆancia caracter´ıstica da linha de transmiss˜ao. A Eq. (6.147) d´a a capacidade por unidade de comprimento do cabo coaxial de raios interno e externo, respectivamente a e b: c0 = 2π² . ln(b/a) Por outro lado, a indutˆancia, por unidade de comprimento, do mesmo cabo ´e [ver (7.18), notando que agora o meio tem permeabilidade magn´etica µ] µ ¶ µ b l0 = ln 2π a . Usando estes resultados, podemos calcular a velocidade de propaga¸c˜ ao da onda na linha (9.174) e a sua impedˆancia caracter´ıstica (9.175), dadas, respectivamente, por 1 1 v=√ =√ , µ² l0 c0 e s z0 = µ ¶ 1 b l0 = ln c0 2π²v a . Verifica-se, assim, que a velocidade de propaga¸c˜ ao da onda n˜ao depende da forma da linha de transmiss˜ao, mas apenas do material que existe entre os fios que a formam, enquanto que a impedˆancia caracter´ıstica depende da forma e das dimens˜oes consideradas. Se tiv´essemos tido em conta a resistˆencia da linha de transmiss˜ao, ter´ıamos obtido para I e V solu¸c˜oes do tipo onda sinusoidal atenuada no espa¸co, da forma (9.76). Por este motivo, o envio de sinais a distˆancias muito longas atrav´es de linhas de transmiss˜ao pode n˜ao ser poss´ıvel devido `a atenua¸c˜ao do sinal, sendo necess´ario recorrer, por exemplo, a fibras ´opticas. 9.9 9.9.1 PROBLEMAS RESOLVIDOS Efeito Joule em fio longo Quest˜ ao Considerar um fio condutor cil´ındrico, longo, n˜ao magnetiz´avel, de condutividade σ, comprimento L e sec¸c˜ao A = π a2 , percorrido por uma corrente I distribu´ıda uniformemente. Determinar a energia que entra atrav´es da superf´ıcie do condutor por unidade de tempo e mostrar que essa potˆencia est´a relacionada com o efeito Joule. ´ticas Ondas electromagne • 295 Resposta A densidade de corrente livre, j , o campo el´ectrico, E , e a condutividade, σ, relacionam-se atrav´es de [cf. Eq. (9.5)] j = σE. (9.176) Se o fio longo se estender ao longo do eixo z, o campo el´ectrico ´e dado por E= j ˆ k σ (9.177) e, portanto, as linhas de campo coincidem com as da corrente (fora do condutor o campo el´ectrico ´e nulo). Como a densidade de corrente ´e uniforme, a corrente I relaciona-se com j atrav´es de I = j A. O campo el´ectrico (9.177) ´e ent˜ao I ˆ k. (9.178) σA Quanto ao campo de indu¸ca˜o magn´etica no interior e no exterior do fio, ´e dado por (ver Exemplo 2.3) E= µ0 I r ˆφ e 2 π a2 µ0 I ˆφ e 2πr B = B = r≤a r≥a (9.179) (9.180) e, portanto, sobre a superf´ıcie do condutor, o campo magn´etico H = B /µ0 ´e H= I ˆφ . e 2πa (9.181) O vector de Poynting `a superf´ıcie do fio pode agora ser calculado a partir de (9.178) e (9.181): S = E×H = = − I ˆ I ˆφ k×e Aσ 2πa I2 ˆr . e 2πaσA (9.182) O fluxo do vector de Poynting existe unicamente atrav´es da superf´ıcie lateral do condutor, pois, como se constata a partir de (9.182), n˜ao h´a fluxo atrav´es das bases. Como o vector de Poynting tem a mesma intensidade em todos os pontos da superf´ıcie lateral do condutor e ´e perpendicular a esta, o fluxo desse vector que entra no condutor ´e a seguinte potˆencia14 : I PS = − Σ S · dΣ = I2 L . σA (9.183) De acordo com o teorema de Poynting, n˜ao havendo varia¸c˜ oes com o tempo da energia do campo electromagn´etico (nem fontes, nem materiais polariz´aveis ou magnetiz´aveis no interior do cilindro que est´a a ser considerado), I − 14 Z S · dΣ = v E · j` dv. O sinal negativo na express˜ ao seguinte leva em conta o facto de se pretender o fluxo que “entra” (ver Sec¸ca ˜o 9.4). 296 • ´tico Campo electromagne O lado direito desta equa¸c˜ao representa a potˆencia dissipada no cilindro condutor por efeito Joule e o seu c´alculo expl´ıcito conduz ao resultado (9.183). De facto, Z PJ = v E · j` dv = I2 I2 L AL = = PS , σA2 σA (9.184) tendo-se usado (9.176) e (9.178). Ora, a resistˆencia do condutor relaciona-se com a condutividade, com a sua sec¸c˜ ao e o seu comprimento atrav´es de L R= . σA Deste modo, a express˜ao (9.183) [ou a (9.184)] ´e dada por P = R I2 , que ´e a express˜ao habitual da potˆencia dissipada num condutor por efeito Joule. A energia por unidade de tempo que entra no cilindro de altura L ´e, pois, igual `a potˆencia dissipada no condutor por efeito Joule. 9.9.2 Corrente n˜ ao uniforme em cilindro infinito Quest˜ ao Um condutor rectil´ıneo muito longo, dirigido ao longo do eixo z, tem sec¸c˜ ao circular de ˆ , sendo raio a e ´e percorrido por uma corrente cont´ınua de densidade n˜ao uniforme j = j0 r k j0 constante. A condutividade do material ´e n˜ao uniforme, σ = σ0 r. a) Calcular os campos E e B em todo o espa¸co; b) Calcular o fluxo do vector de Poynting atrav´es da superf´ıcie cil´ındrica fechada, de comprimento L, que limita um tro¸co de condutor; Comparar o resultado obtido com a potˆencia dissipada por efeito Joule na referida por¸c˜ao de condutor. Resposta O problema tem semelhan¸cas com o Problema 9.9.1, mas agora a corrente no fio condutor n˜ao ´e uniforme. A densidade de corrente e a condutividade dependem da distˆancia ao eixo do condutor atrav´es de: ˆ j = j0 r k (9.185) e σ = σ0 r . a) O campo el´ectrico, a densidade de corrente e a condutividade relacionam-se, em geral, atrav´es da express˜ao E = j /σ, pelo que o campo el´ectrico no interior do condutor ´e constante e dado por j ˆ r ≤ a. E= 0k (9.186) σ0 Fora do condutor, o campo el´ectrico ´e nulo. ´ticas Ondas electromagne • 297 O campo de indu¸c˜ao magn´etica obt´em-se da lei de Amp`ere, que se escreve (o regime ´e estacion´ario) I Z B · dl = µ0 j · dS . C S ˆ φ . Para r < a e escolhendo O campo de indu¸c˜ao magn´etica ´e da forma B = Bφ (r)e para C uma circunferˆencia de raio r com centro no eixo do cilindro, 2πrBφ = µ0 j0 2 π donde B= Z r r2 dr , 0 µ0 j0 r2 ˆφ e 3 r ≤ a. Fora do condutor, e de novo por aplica¸c˜ ao da lei de Amp`ere, obt´em-se B= µ0 j0 a3 ˆφ e 3r r ≥ a; b) O vector de Poynting, sendo dado por S = E × B /µ0 , vem, para r = a (mas do lado de dentro do condutor!), j2 ˆr . S (r = a) = − 0 a2 e 3σ0 O sim´etrico do fluxo de S atrav´es de uma superf´ıcie cil´ındrica fechada de raio r = a contendo um tro¸co do condutor de comprimento L ´e I S · dΣ = 2 π a L S = − 2 π j02 a3 L . 3 σ0 (9.187) Como o regime ´e estacion´ario, n˜ao h´a varia¸c˜ ao temporal da energia UEM do campo electromagn´etico no tro¸co cil´ındrico considerado. Contudo, h´a nesse tro¸co dissipa¸c˜ ao de energia por efeito Joule. Vejamos que a potˆencia dissipada por efeito Joule ´e, de facto, dada por (9.187). A diferen¸ca de potencial entre a base e o topo do tro¸co cil´ındrico ´e o produto do campo constante (9.186) pelo comprimento L: V =EL= j0 L σ0 (9.188) e a corrente no condutor ´e Z I= S j · dS = j0 2 π Z a 0 r2 dr = 2 π j0 a3 . 3 (9.189) Ora, a potˆencia dissipada por efeito Joule ´e P = V I e, atendendo a (9.188) e (9.189), dada por 2 π j02 L a3 PJ = , 3 σ0 que coincide com (9.187). Esta potˆencia dissipada podia ser calculada a partir de (9.184), usando (9.185) e (9.186). 298 • ´tico Campo electromagne 9.9.3 Condensador com placas oscilantes Quest˜ ao Um condensador plano ´e formado por duas placas circulares de ´area A = πa2 separadas, no instante inicial, por uma distˆancia d0 (d0 ¿ a) e est´a ligado a uma fonte de tens˜ao que mant´em uma diferen¸ca de potencial constante V0 entre as placas. a) As placas come¸cam a oscilar, muito lentamente, mantendo-se paralelas mas passando a distˆancia entre elas a ser dada por d = d0 + d1 sin(ωt) . Calcular o campo magn´etico H que se estabelece entre as placas; b) Calcular o campo H se as placas forem postas a oscilar como se referiu na al´ınea anterior, mas depois de terem sido desligadas da bateria e isoladas. Resposta a) A capacidade de um condensador plano ´e dada por C = ²0 A/d, pelo que a carga no condensador, q = CV , ´e a seguinte fun¸c˜ ao do tempo (admite-se que a distribui¸c˜ ao de carga nas placas do condensador se faz instantaneamente): q(t) = ²0 A V0 . d0 + d1 sin(ωt) A densidade superficial de carga15 ´e σ(t) = q(t)/A e o campo el´ectrico entre as placas do condensador, que se mantˆem perpendiculares ao eixo z, vem E= V0 σ(t) ˆ ˆ. k= k ²0 d0 + d1 sin(ωt) Entre as placas do condensador n˜ao h´a correntes livres, isto ´e, j` = 0, mas h´a uma corrente de deslocamento: ²0 ∂E cos(ωt) ˆ. = −V0 ²0 ω d1 k ∂t [d0 + d1 sin(ωt)]2 (9.190) A equa¸c˜ao de Maxwell ∇ · B = 0 pode ser escrita, nas condi¸c˜ oes do problema, como ∇ · H = 0. Por outro lado, dado o sentido da corrente de deslocamento e havendo simetria axial, o campo magn´etico s´o pode ter componentes Hr e Hφ , as quais s´o podem depender de r. Assim, ∇·H = 1∂ (rHr ) = 0 , r ∂r donde se conclui que Hr = 0 (de outro modo, o campo tornar-se-ia infinito para r = 0). A outra equa¸c˜ao de Maxwell para o campo magn´etico ´e ∇ × H = ²0 15 ∂E . ∂t O s´ımbolo σ tamb´em ´e usado para designar condutividade. N˜ ao confundir as duas grandezas. (9.191) ´ticas Ondas electromagne • 299 ˆ φ , de (9.191) e de (9.190) obt´em-se Como o campo ´e da forma H (r ) = Hφ (r) e cos(ωt) 1∂ (rHφ ) = −V0 ²0 ω d1 , r ∂r [d0 + d1 sin(ωt)]2 donde resulta, por integra¸c˜ ao, Hφ = − V0 ²0 ω d1 r cos(ωt) C + . 2 2 [d0 + d1 sin(ωt)] r A constante de integra¸c˜ao ´e nula para que H seja finito em r = 0. Finalmente, H =− V0 ²0 ω d1 r cos(ωt) ˆφ ; e 2 [d0 + d1 sin(ωt)]2 b) Se o condensador ´e desligado da bateria, fica carregado com uma carga Q. O valor do campo el´ectrico entre as placas do condensador ´e sempre E = Q/(A²0 ), independentemente da distˆancia entre as placas. N˜ao havendo dependˆencia temporal do campo el´ectrico, tamb´em n˜ao h´a corrente de deslocamento e, consequentemente, o campo magn´etico ´e nulo. 9.9.4 Condensador plano com carga vari´ avel Quest˜ ao Um gerador de corrente alternada est´a ligado a um condensador plano, cujas placas s˜ao discos de ´area A = πa2 separadas de uma distˆancia d; a carga no condensador ´e q = q0 sin ωt. Calcular os campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica no espa¸co entre as placas. Calcular a varia¸c˜ao, por unidade de tempo, da energia associada ao campo electromagn´etico no espa¸co entre as placas. Relacionar a express˜ao obtida com o fluxo do vector de Poynting atrav´es da superf´ıcie que delimita o volume considerado. Nota: ω pode ser considerado pequeno e os efeitos dos bordos podem ser desprezados. Resposta Supondo que a carga se distribui instantaneamente e de maneira uniforme, a densidade superficial de carga num dado instante ´e dada por σ(t) = q0 sin(ωt) . A O campo el´ectrico entre as placas do condensador ´e (considera-se que as placas do condensador s˜ao perpendiculares ao eixo z — ver Figura 9.11) E=− σ ˆ q ˆ. k = − 0 sin(ωt) k ²0 ²0 A (9.192) Como o regime n˜ao ´e estacion´ario, mesmo n˜ao existindo correntes livres entre as placas do condensador h´a uma corrente de deslocamento. De facto, em ∇ × B = µ0 j + µ0 ²0 ∂E , ∂t 300 • ´tico Campo electromagne z Figura 9.11. Condensador plano cujas placas s˜ ao perpendiculares ao eixo z. o primeiro termo do membro direito ´e nulo, mas o segundo n˜ao ´e. Atendendo a (9.192), a equa¸c˜ao anterior pode ser escrita do seguinte modo: ∇×B =− q0 µ0 ω ˆ. cos(ωt) k A Esta equa¸c˜ao ´e semelhante `a que se tem no caso de um cilindro de corrente vertical distribu´ıda uniformemente, mas agora h´a uma dependˆencia temporal. O campo de indu¸c˜ ao magn´etica ´e ˆ φ e a integra¸c˜ da forma gen´erica B (r ) = Bφ (r) e ao da equa¸c˜ ao anterior conduz a16 µ0 q0 ω ˆφ r cos(ωt) e 2 π a2 µ q ω ˆφ B = − 0 0 cos(ωt) e 2πr B = − r≤a r ≥ a. A densidade de energia do campo electromagn´etico entre as placas do condensador ´e: i) contribui¸c˜ao do campo el´ectrico ue = ²0 2 q02 E = sin2 (ωt) ; 2 ²0 2 π 2 a4 ii) contribui¸c˜ao do campo de indu¸c˜ ao magn´etica um = 1 2 q02 µ0 ω 2 2 B = r cos2 (ωt) . 2µ0 8 π 2 a4 A densidade total ´e, pois, " uEM # q02 r2 ω2 2 = sin (ωt) + cos2 (ωt) ²0 2 π 2 a4 4 c2 e, integrando em todo o volume entre as placas, a energia total vem " UEM # a2 ω 2 q02 d 2 sin (ωt) + cos2 (ωt) . = ² 0 2 π a2 16 c2 (9.193) 16 Omitem-se aqui os pormenores, pois, como se disse, a situa¸ca ˜o dada ´e em tudo semelhante a uma distribui¸ca ˜o uniforme de correntes dirigidas segundo o eixo de um cilindro estudada no Exemplo 2.3. Tamb´em j´ a foi encontrada uma situa¸ca ˜o an´ aloga no Problema 9.9.3. ´ticas Ondas electromagne • 301 A varia¸c˜ao temporal desta energia ´e à dUEM q2 d ω a2 ω 2 = 0 2 sin(ωt) cos(ωt) 1 − dt ²0 π a 16 c2 ! . (9.194) O vector de Poynting, sendo dado pelo produto vectorial do campo el´ectrico pelo campo ˆ r . O seu fluxo atrav´es das placas do condensador ´e, magn´etico, tem a direc¸c˜ao do versor e por isso, nulo. O fluxo de S atrav´es da superf´ıcie cil´ındrica que delimita a regi˜ao entre as placas do condensador ´e dado unicamente pelo fluxo atrav´es da superf´ıcie lateral de raio a. O vector de Poynting sobre essa superf´ıcie ´e q q ω ˆ ×e ˆφ S (a) = E (a) × H (a) = 0 sin(ωt) 0 cos(ωt) k ²0 A 2πa q2 ω ˆr = − 20 3 sin(2ωt) e 4π a ²0 e o fluxo deste vector que sai atrav´es da superf´ıcie lateral do cilindro cujas bases s˜ao as placas do condensador ´e I Z S · dΣ = = − ˆ r dΣ S (a) · e q02 ω d sin(2ωt) . 2 π a2 ² 0 (9.195) Ora, se ωa ¿ c, o segundo termo dentro do parˆentesis na express˜ao (9.194) ´e pequeno em compara¸c˜ao com a unidade e pode, por isso, ser desprezado. Nestas circunstˆancias, I S · dΣ ≈ − dUEM . dt Aparentemente, o teorema de Poynting n˜ao se verifica rigorosamente, o que tem a ver com o facto de os campos estarem a ser calculados supondo que a informa¸c˜ ao sobre a distribui¸c˜ ao de cargas nas placas chega instantaneamente a qualquer ponto da regi˜ao entre as placas do condensador. Ora, tal viola claramente o princ´ıpio da causalidade e portanto, em rigor, os campos teriam de ser calculados usando o formalismo dos potenciais retardados (Cap´ıtulo 11). A aproxima¸c˜ao que se utilizou ´e, contudo, justific´avel se ω for pequeno. De resto, quanto maior for ωa/c, maior ser´a a discrepˆancia entre a varia¸c˜ ao temporal da energia electromagn´etica e o fluxo do vector de Poynting. 9.9.5 Campo electromagn´ etico em cilindro infinito Quest˜ ao No interior de um cilindro infinito de raio a ´e mantido um campo de indu¸c˜ ao magn´etica ˆ que varia muito lentamente com o tempo. No exterior o campo ´e nulo. B = B0 cos(ωt) k N˜ao h´a distribui¸c˜oes de carga. a) Calcular as densidades volum´etricas e superficiais de corrente; b) Obter o campo el´ectrico induzido em todo o espa¸co; c) Calcular o fluxo do vector de Poynting atrav´es de uma superf´ıcie cil´ındrica fechada correspondente a um segmento de altura unit´aria do cilindro e relacionar o resultado obtido com a energia do campo electromagn´etico armazenada no volume limitado por esta superf´ıcie. 302 • ´tico Campo electromagne Resposta a) Como o campo de indu¸c˜ao magn´etica no interior do cilindro n˜ao depende da posi¸c˜ ao e aponta na direc¸c˜ao do seu eixo pode considerar-se que o cilindro ´e afinal um solen´oide infinito percorrido por uma corrente que varia no tempo. Essa corrente superficial sobre a superf´ıcie cil´ındrica pode ser formalmente obtida a partir do rotacional superficial do campo de indu¸c˜ao magn´etica: ˆ × (B2 − B1 ) = µ0 κ . rotS B = n Esta express˜ao permite escrever, para r = a, κ= h i 1 ˆ = B0 cos(ωt) e ˆφ . ˆ r × −B0 cos(ωt) k e µ0 µ0 O campo de indu¸c˜ao magn´etica n˜ao depende das coordenadas espaciais e, por isso, o seu rotacional ´e nulo. Nesse caso, a corrente livre e a corrente de deslocamento s˜ao sim´etricas. Mas, se ω ´e pequeno, a corrente de deslocamento tamb´em ´e pequena (veremos na pr´oxima al´ınea que o campo el´ectrico ´e, tamb´em ele, pequeno), e pode ent˜ao escrever-se j ' 0; b) O campo el´ectrico induzido pode ser calculado a partir da equa¸c˜ ao de Maxwell ∇×E =− ∂B ˆ. = ω B0 sin(ωt) k ∂t (9.196) Tratando-se de um cilindro infinito (segundo o eixo z), n˜ao pode haver dependˆencia dos campos na coordenada z e, atendendo `a simetria axial, tamb´em n˜ao pode haver dependˆencia no ˆangulo φ. O campo el´ectrico em todo o espa¸co s´o pode depender da coordenada cil´ındrica r e, al´em disso, n˜ao tem componente segundo o eixo z, pois ´e perpendicular ao campo de indu¸c˜ ao magn´etica B . Com todas estas restri¸c˜ oes, o rotacional do campo el´ectrico, dado em coordenadas cil´ındricas, reduz-se a um s´o termo e (9.196) vem 1∂ ˆ = ω B0 sin(ωt) k ˆ, (rEφ ) k (9.197) r ∂r no interior do cilindro. Por integra¸c˜ ao, Eφ = ωB0 C r sin(ωt) + , 2 r sendo ´obvio que a constante de integra¸c˜ ao C se anula para que o campo el´ectrico se mantenha finito sobre o eixo do cilindro. Ent˜ ao, Eφ = ωB0 r sin(ωt) 2 r ≤ a. No exterior do cilindro a equa¸c˜ ao correspondente (9.197) fica mais simples, pois o campo de indu¸c˜ao magn´etica ´e nulo no exterior: ∇×E = 1∂ ˆ = 0, (rEφ ) k r ∂r ´ticas Ondas electromagne • 303 donde C . r A constante C ´e calculada a partir da condi¸c˜ ao de continuidade da componente tangencial do campo el´ectrico sobre a superf´ıcie do cilindro, obtendo-se C= 12 ω a2 B0 sin(ωt). Falta ainda obter a componente radial do campo el´ectrico. A divergˆencia do campo el´ectrico ´e nula, pois n˜ao h´a distribui¸c˜ oes de cargas. Para um campo da forma E = ˆ ˆ Er (r)er + Eφ (r)eφ a divergˆencia (que ´e nula) em coordenadas cil´ındricas fica reduzida a 1∂ (rEr ) = 0 , r ∂r donde Er = C/r, sendo C uma constante de integra¸c˜ ao. Para o campo n˜ao se tornar infinito em r = 0, ter´a de ser C = 0. A componente radial do campo el´ectrico ´e nula n˜ao s´o dentro do cilindro mas tamb´em fora (recorde-se que a componente radial do campo el´ectrico tem de ser cont´ınua sobre a superf´ıcie cil´ındrica, pois n˜ao h´a distribui¸c˜ oes superficiais de carga em r = a). Em conclus˜ao, o campo el´ectrico em todo o espa¸co ´e dado pela seguinte express˜ao: Eφ = E=  ω B0 r   ˆφ sin ωt e    2     ω B0 a2   ˆφ sin ωt e  2r r≤a r ≥ a; c) O vector de Poynting em r = a ´e 1 E (a) × B (a) µ0 ω a B02 ˆr = sin(ωt) cos(ωt) e 2 µ0 e o fluxo deste vector de Poynting que entra no volume cil´ındrico de altura ` = 1 ´e unicamente o fluxo atrav´es da superf´ıcie cil´ındrica lateral, pois S ´e paralelo `as bases. Assim, I ω a B02 − S · dΣ = − sin(ωt) cos(ωt) 2π a . (9.198) 2 µ0 S = A energia do campo electromagn´etico num volume cil´ındrico de altura unit´aria ´e UEM = = B02 ²0 ω 2 B02 cos2 (ωt) πa2 + sin2 (ωt) 2 π 2µ0 2 4 B02 πa2 2µ0 " Z a # 0 r3 dr ω 2 a2 cos2 (ωt) + sin2 (ωt) . 8 c2 A derivada em ordem ao tempo desta express˜ao ´e dada por à dUEM B 2 πa2 ω ω 2 a2 =− 0 cos(ωt) sin(ωt) 1 − dt µ0 8 c2 ! . Se ω for muito pequeno, o segundo termo dentro do parˆentesis ´e desprez´avel comparado com o primeiro e, nestas condi¸c˜ oes, a express˜ao resultante coincide com a express˜ao (9.198). (A raz˜ao da n˜ao-coincidˆencia da derivada temporal da energia do campo electromagn´etico com o fluxo do vector de Poynting foi j´a discutida no final do Problema 9.9.4.) 304 • ´tico Campo electromagne 9.9.6 Solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de onda para onda plana Quest˜ ao Mostrar que a solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ ao de ondas para uma onda plana que se propaga na direc¸c˜ao do eixo x ´e ϕ(x, t) = f− (x − ct) + f+ (x + ct) . Resposta A equa¸c˜ao de propaga¸c˜ao de uma onda ´e da forma ∇2 ϕ = 1 ∂2ϕ . c2 ∂t2 (9.199) No caso de uma onda plana que se propaga na direc¸c˜ ao x, n˜ao h´a dependˆencias em y e em z, ou seja, ϕ(r , t) = ϕ(x, t) e a express˜ao anterior reduz-se a ∂2ϕ 1 ∂2ϕ = . ∂x2 c2 ∂t2 Fazendo a mudan¸ca de vari´aveis, ( (9.200) u = x − ct v = x + ct , tem-se, para as primeiras derivadas, ∂ϕ ∂x ∂ϕ ∂t = = ∂ϕ ∂u ∂ϕ ∂u ∂u ∂ϕ ∂v ∂ϕ ∂ϕ + = + ∂x ∂v ∂x ∂uµ ∂v ¶ ∂u ∂ϕ ∂v ∂ϕ ∂ϕ + = −c − ∂t ∂v ∂t ∂u ∂v e para as segundas derivadas ∂2ϕ ∂x2 ∂2ϕ ∂t2 ∂2ϕ ∂2ϕ ∂2ϕ + + 2 ∂uÃ2 ∂u∂v ∂v 2 ! 2 2 ∂ ϕ ∂2ϕ 2 ∂ ϕ + . = c −2 ∂u2 ∂u∂v ∂v 2 = Substituindo em (9.200), ∂2ϕ ∂2ϕ ∂2ϕ ∂2ϕ ∂2ϕ ∂2ϕ + 2 + = − 2 + , ∂u2 ∂u∂v ∂v 2 ∂u2 ∂u∂v ∂v 2 donde ∂2ϕ = 0. ∂u∂v A solu¸c˜ao desta equa¸c˜ao, a menos de uma constante arbitr´aria, ´e uma combina¸c˜ ao linear de duas fun¸c˜oes arbitr´arias: uma, que designamos por f− , fun¸c˜ ao apenas de u; a outra, f+ , fun¸c˜ao apenas de v. A solu¸c˜ao que se procura ´e, pois, da forma ϕ(u, v) = f− (u) + f+ (v) ou, em fun¸c˜ao das vari´aveis x e t, ϕ(x, t) = f− (x − ct) + f+ (x + ct) . (9.201) ´ticas Ondas electromagne 9.9.7 • 305 Onda plana a propagar-se em direc¸c˜ ao arbitr´ aria Quest˜ ao Mostrar que a solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ ao de ondas para uma onda plana que se propaga na direc¸c˜ao ˆ, rˆ = l ˆi + m jˆ + n k ˆ , ´e uma fun¸c˜ onde l, m, n s˜ao os co-senos directores de r ao do tipo ϕ(x, y, z, t) = f− (lx + my + nz − ct) + f+ (lx + my + nz + ct) . Resposta ´ conveniente considerar um outro referencial Seja S o referencial cujos eixos s˜ao x, y e z. E 0 0 0 ˆ. de eixos x , y e z , e escolher o sentido positivo do eixo x0 coincidente com a direc¸c˜ ao r Neste referencial ´e sabido que a solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de ondas para uma onda plana que se propaga na direc¸c˜ao x0 ´e [ver Eq. (9.201)] S0, ϕ(x0 , t) = f− (x0 − ct) + f+ (x0 + ct) . (9.202) Ora, por defini¸c˜ao de co-seno director, tem-se ˆ = n, ˆi0 · ˆi = l , ˆi0 · jˆ = m , ˆi0 · k pelo que, r · ˆi0 = x0 = l x + m y + n z . Substituindo em (9.202), obt´em-se ϕ(x, y, z, t) = f− (lx + my + nz − ct) + f+ (lx + my + nz + ct) , como se queria mostrar. 9.9.8 Solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de ondas para onda esfericamente sim´ etrica Quest˜ ao Determinar a solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ ao de ondas no caso de haver simetria esf´erica. Resposta N˜ao havendo dependˆencias nas coordenadas esf´ericas θ e φ, ou seja, com ϕ(r , t) = ϕ(r, t), a equa¸c˜ao de ondas (9.199) toma a forma µ 1 ∂ ∂ϕ r2 r2 ∂r ∂r ¶ = 1 ∂2ϕ , c2 ∂t2 que ainda pode ser escrita na seguinte forma: 1 ∂2ϕ ∂ 2 ϕ 2 ∂ϕ + = . ∂r2 r ∂r c2 ∂t2 (9.203) 306 • ´tico Campo electromagne Sem perda de generalidade, podem procurar-se solu¸c˜ oes da forma17 ϕ= S , r onde S ´e uma fun¸c˜ao de r e t. As primeiras derivadas vˆem ∂ϕ ∂r ∂ϕ ∂t = = 1 r 1 r ∂S 1 − 2S ∂r r ∂S ∂t e as segundas derivadas ∂2ϕ ∂r2 ∂2ϕ ∂t2 2 ∂S 1 ∂ 2 S 2 + + 3S 2 2 r ∂r r ∂r r 1 ∂2S . r ∂t2 = − = Substituindo agora em (9.203), obt´em-se ∂2S 1 ∂2S = , ∂r2 c2 ∂t2 cuja solu¸c˜ao j´a foi obtida no Problema 9.9.6: S(r, t) = f− (r − ct) + f+ (r + ct) . Finalmente, ϕ(r, t) = 1 [ f− (r − ct) + f+ (r + ct) ] . r O primeiro termo do lado direito corresponde a uma onda que se propaga no sentido de r crescente e, por isso, ´e uma onda divergente; o segundo termo ´e uma onda convergente. 9.9.9 Onda plana no vazio Quest˜ ao Uma onda electromagn´etica plana, harm´onica e com polariza¸c˜ ao linear propaga-se no vazio. A amplitude do campo el´ectrico ´e 50 mV/m e a frequˆencia angular da onda ´e 108 rad/s. Determinar a grandeza e a direc¸c˜ao dos vectores E , H e S . 17 H´ a, de facto, raz˜ oes de ordem f´ısica que sugerem a procura de solu¸co ˜es deste tipo da equa¸ca ˜o de onda. A densidade de energia, que ´e proporcional ao quadrado da amplitude da onda, ϕ2 , deve variar com 1/r2 : supondo uma fonte colocada na origem, a energia que atravessa uma qualquer superf´ıcie esf´erica centrada na origem ´e sempre a mesma e, por isso, a sua densidade — energia a dividir pela ´ area dessa superf´ıcie — ´e inversamente proporcional ao raio da esfera. ´ticas Ondas electromagne • 307 Resposta Como a onda ´e plana, o campo el´ectrico ´e um vector da forma (adoptando a nota¸c˜ ao do Problema 9.9.6), E (r , t) = E0 f− (y − ct) , estando j´a a escolher-se o sentido positivo do eixo y como sendo o da propaga¸c˜ ao da onda electromagn´etica. Como a onda ´e polarizada linearmente, E0 tem uma direc¸c˜ ao fixa no espa¸co (no plano xz) e escolhe-se ˆ = 50 k ˆ (mV/m) . E0 = E0 k Tratando-se de uma onda harm´onica, podemos escrever, fazendo agora uso da nota¸c˜ ao expo18 nencial , ω ˆ. E = E0 e−i c (y−ct) k (9.204) Est´a a fazer-se nula a fase na origem (esta fase depende da origem do referencial e fazˆe-la nula n˜ao retira generalidade ao tratamento). Na nota¸c˜ ao exponencial a express˜ao do campo E pode ser factorizada numa parte espacial e noutra temporal: E = Ee (y) eiωt , onde ˆ. Ee (y) = E0 e−iωy/c k (9.205) A onda magn´etica ´e transversa (tal como a el´ectrica) e E e H s˜ao perpendiculares entre si. Al´em disso, o sentido da propaga¸c˜ ao da onda ´e dado pelo vector de Poynting S = E × H . ˆ × ˆi = jˆ , tem-se Como k H = H(y, t) ˆi . Tamb´em o campo H , na nota¸c˜ao exponencial, se pode factorizar numa parte espacial e numa parte temporal: H = He (y) eiωt . Se usarmos a equa¸c˜ao de Maxwell, ∇ × E = −µ0 ∂H , ∂t obtemos a seguinte equa¸c˜ao que relaciona as partes espaciais dos vectores campo el´ectrico e magn´etico: ∇ × Ee = −i µ0 ω He . (9.206) O rotacional de Ee ´e [ver (9.205)] ∇ × Ee = −i ωy ω E0 e−i c ˆi , c vindo ent˜ao, de (9.206), He (y) = 18 E0 −i ωy ˆ e c i. cµ0 Relembra-se que na nota¸ca ˜o exponencial para os campos sinusoidais subentende-se sempre a presen¸ca do operador “parte real de” — ver Sec¸ca ˜o 9.2.1. 308 • ´tico Campo electromagne Deste resultado e de (9.205) verifica-se que o factor de proporcionalidade entre He e Ee ´e o inverso da impedˆancia caracter´ıstica do vazio (Zc ): He = onde r Zc = 1 Ee , Zc µ0 = 377 Ω . ²0 O campo magn´etico, de amplitude H0 = E0 /Zc = 50/377 mA/m, escreve-se em nota¸c˜ao exponencial ω H = H0 e−i c (y−ct) ˆi . (9.207) O vector de Poynting ´e obtido a partir do produto vectorial dos campos f´ısicos el´ectrico e magn´etico. Assim, depois de se tomarem as partes reais de (9.204) e de (9.207), obt´em-se · S= ¸ E02 ω cos2 (y − ct) jˆ . Zc c Nas express˜oes dos vectores campo el´ectrico, campo magn´etico e de Poynting deve introduzir-se, finalmente, o valor da frequˆencia angular ω = 108 rad/s. 9.9.10 Campo electromagn´ etico entre dois planos Quest˜ ao Entre dois planos paralelos definidos por y = 0 e y = a existe um campo el´ectrico dado por (9.208) E = E0 cos(kx − ωt) jˆ , sendo E0 , k e ω constantes. O campo ´e nulo fora da regi˜ao limitada pelos planos. Calcular o campo de indu¸c˜ao magn´etica B associado e obter as distribui¸c˜ oes de carga e de corrente existentes. Calcular o vector de Poynting e relacion´a-lo com a energia transportada pela onda. Resposta O campo ´e da forma E (r , t) = Ey (x, t) jˆ , pelo que o rotacional deste vector ´e simplesmente ∇×E = ∂Ey ˆ ˆ. k = −E0 k sin(kx − ωt) k ∂x A equa¸c˜ao de Maxwell, ∇×E =− (9.209) ∂B , ∂t ˆ , tendo-se ainda juntamente com (9.209), permite concluir que B = Bz (x, t) k ∂Bz = E0 k sin(kx − ωt) , ∂t donde E0 k ˆ. cos(kx − ωt) k ω Claro que esta express˜ao, tal como (9.208), ´e v´alida na regi˜ao 0 ≤ y ≤ a. B= (9.210) ´ticas Ondas electromagne • 309 Vejamos, seguidamente, quais s˜ao as distribui¸c˜ oes de carga e de corrente que d˜ao origem aos campos (9.208) e (9.210). Atendendo a que E = Ey (x, t) jˆ , a densidade volum´etrica de carga ´e nula, pois ρ = ²0 ∇ · E = 0. H´a uma descontinuidade do campo el´ectrico nas superf´ıcies y = 0 e y = a, pelo que existem a´ı as seguintes distribui¸c˜ oes superficiais de cargas: ˆ · (E2 − E1 ) = σ(y = 0) = ²0 n h i = −²0 jˆ · 0 − E0 cos(kx − ωt) jˆ = ²0 E0 cos(kx − ωt) h σ(y = a) = ²0 jˆ · 0 − E0 cos(kx − ωt) jˆ i = −²0 E0 cos(kx − ωt) . Atendendo a (9.208) e a (9.210), ´e f´acil verificar que ∇ × B = ²0 µ0 ∂E , ∂t donde se conclui que j = 0. As correntes superficiais s˜ao obtidas a partir de ˆ × (B2 − B1 ) = µ0 κ . rotS B = n Em y = 0, κ(y = 0) = E0 k cos(kx − ωt) ˆi µ0 ω e, em y = a, κ(y = a) = − E0 k cos(kx − ωt) ˆi . µ0 ω ˆ = ˆi e que c = ω/k) O vector de Poynting ´e (recorde-se que jˆ × k S= 1 E2 E × B = 0 cos2 (kx − ωt) ˆi . µ0 µ0 c (9.211) Para se relacionar o vector de Poynting com a energia transportada pela onda, consideremos um paralelep´ıpedo limitado pelos planos y = 0 e y = a, x = 0 e x = `1 , e z = 0 e z = `2 (ver Figura 9.12). S´o h´a fluxo do vector de Poynting a entrar neste paralelep´ıpedo atrav´es das faces x = 0 e x = `1 , podendo, pois, escrever-se I − Σ S · dΣ = = i E02 a `2 h 2 cos (ωt) − cos2 (k`1 − ωt) µ0 c E02 a `2 [cos(2ωt) − cos(2k`1 − 2ωt)] , 2 µ0 c (9.212) tendo-se utilizado a rela¸c˜ao cos2 α = (1 + cos 2α)/2. √ A densidade de energia no volume do paralelep´ıpedo ´e (note-se que c = ω/k = 1/ µ0 ²0 ) ²0 2 1 E02 E0 cos2 (kx − ωt) + cos2 (kx − ωt) 2 2µ0 c2 = ²0 E02 cos2 (kx − ωt) , uEM = (9.213) 310 • ´tico Campo electromagne z a l l x 2 y 1 S Figura 9.12. Paralelep´ıdedo referido na resposta ao Problema 9.9.10. e a varia¸c˜ao temporal desta densidade de energia ´e ∂uEM = ²0 ωE02 sin [2(kx − ωt)] . ∂t O integral desta express˜ao estendido ao volume do paralelep´ıpedo, que se pode designar por dUEM c˜ ao em ordem ao espa¸co comutam, ´e dt , pois a derivada em ordem ao tempo e a integra¸ dado por dUEM dt = ²0 ω a `2 E02 = ²0 a `2 E02 = Z `1 0 sin [2(kx − ωt)] dx ω [cos(2ωt) − cos(2k`1 − 2ωt)] 2k E02 a `2 [cos(2ωt) − cos(2k`1 − 2ωt)] , 2 µ0 c que coincide com a express˜ao (9.212), donde I − Σ S · dΣ = dUEM . dt De (9.211) e de (9.213) pode encontrar-se a rela¸c˜ ao entre o m´odulo do vector de Poynting e a densidade de energia do campo electromagn´etico v´alida para qualquer ponto e em qualquer instante [cf. Eq. (9.58)]: S = uEM c ˆi . 9.9.11 Onda plana em meio diel´ ectrico Quest˜ ao Uma onda electromagn´etica harm´onica plana, de amplitude E0 e de comprimento de onda λ propaga-se no espa¸co ilimitado cheio de um meio diel´ectrico de condutividade nula e permitividade ². A direc¸c˜ao de propaga¸c˜ ao forma com os eixos coordenados os ˆangulos α, β e γ, respectivamente. Escrever, em nota¸c˜ ao complexa, as express˜oes das amplitudes complexas dos vectores campo el´ectrico e campo magn´etico num ponto cujo vector posicional ˆ . A onda ´e linearmente polarizada e a direc¸c˜ ´e R = xˆi + y jˆ + z k ao do vector E faz com os 0 0 0 eixos x, y e z os ˆangulos α , β e γ . ´ticas Ondas electromagne • 311 Resposta Considere-se um referencial S 0 e seja a direc¸c˜ ao do campo el´ectrico a direc¸c˜ ao do eixo z 0 0 e a direc¸c˜ao de propaga¸c˜ao a do eixo y (ver Figura 9.13). z' E z g ' a ' g b ' a x x ' S b y ' y Figura 9.13. Campo el´ ectrico, vector de Poynting e os dois referenciais referidos na resposta ao Problema 9.9.11. No referencial S 0 as express˜oes dos campos el´ectrico e magn´etico s˜ao (em nota¸c˜ ao exponencial e considerando nula a fase na origem) 2π 0 2π ˆ0 E = E0 e−i λ y ei λ ct k H = q E0 −i 2π y0 i 2π ct ˆ0 e λ e λ i , Zc0 onde Zc0 = µ²0 ´e a impedˆancia caracter´ıstica do meio. Exprimindo y 0 em termos das vari´ aveis x, y e z, tem-se y 0 = cos α x + cos β y + cos γ z . (9.214) Os versores do referencial S 0 relacionam-se com os versores de S por meio de: ˆ jˆ 0 = cos α ˆi + cos β jˆ + cos γ k ˆ 0 = cos α0 ˆi + cos β 0 jˆ + cos γ 0 k ˆ k ˆ0 ˆi0 = jˆ 0 × k = (cos β cos γ 0 − cos γ cos β 0 ) ˆi + (cos γ cos α0 − cos α cos γ 0 ) jˆ ˆ. +(cos α cos β 0 − cos β cos α0 ) k Finalmente, os campos (complexos) no ponto de coordenadas (x, y, z) s˜ao dados, no referencial S, por ˆ) E = E0 e−i λ (cos α x+cos β y+cos γ z−ct) (cos α0 ˆi + cos β 0 jˆ + cos γ 0 k 2π H = E0 −i 2π (cos α x+cos β y+cos γ z−ct) h (cos β cos γ 0 − cos γ cos β 0 ) ˆi e λ Zc0 i ˆ . + (cos γ cos α0 − cos α cos γ 0 ) jˆ + (cos α cos β 0 − cos β cos α0 ) k 312 • ´tico Campo electromagne 9.9.12 Onda plana mudando de meio Quest˜ ao Uma onda electromagn´etica plana, harm´onica e linearmente polarizada, propaga-se na direc¸c˜ao do eixo y. Em y = 0 passa do vazio (meio 1, y < 0) para um meio diel´ectrico para o qual ²2 = 4²0 , µ2 = µ0 e σ2 = 0. O eixo z ´e paralelo `a direc¸c˜ ao do vector campo el´ectrico e 8 a frequˆencia angular ´e ω = 3×10 rad/s. A amplitude do vector campo el´ectrico, para y > 0 ´e E0 = 1 mV/m. Obter as express˜oes dos campos el´ectrico e magn´etico em todo o espa¸co. Resposta Em nota¸c˜ao exponencial, no meio 2 o campo el´ectrico ´e dado por ˆ E2 = 10−3 e−ik2 y ei ω t k (V/m) , sendo k2 = ω/v2 e v2 a velocidade de propaga¸c˜ ao da onda electromagn´etica no meio 2: c 1 = . v2 = √ µ0 ²2 2 Recorda-se que ω1 = ω2 = ω, isto ´e, a frequˆencia da onda ´e a mesma em ambos os meios. O n´ umero de onda no meio 2 ´e k2 = ω 2ω 2×3×108 = = = 2 rad/m v2 c 3×108 e o campo el´ectrico real no meio 2 ´e dado por (y em metros e t em segundos) ˆ E2 = 10−3 cos(3×108 t − 2 y) k (V/m). (9.215) A impedˆancia caracter´ıstica do meio 2, Zc2 , ´e metade da impedˆancia caracter´ıstica do vazio, Zc : r r µ0 µ0 Zc 377 Zc2 = = = = = 188, 5 Ω , ²2 4²0 2 2 e o campo magn´etico nesse meio vem H2 = 10−3 cos(3×108 t − 2 y) ˆi 188, 5 = 5, 32×10−6 cos(3×108 t − 2 y) ˆi (A/m). (9.216) No meio 1 — que ´e o vazio — para al´em da onda incidente h´a tamb´em uma onda reflectida que se propaga no sentido de −y. Seja C1 a amplitude da onda incidente e C01 a da onda reflectida. Voltando a usar a nota¸c˜ao exponencial, podemos escrever para os campos el´ectrico e magn´etico (recorde-se que a frequˆencia ´e a mesma em ambos os meios) ˆ E1 = ( C1 e−ik1 y + C01 eik1 y ) ei ω t k µ H1 = C1 −ik1 y C01 ik1 y e − e Zc Zc ¶ ei ω t ˆi . ´ticas Ondas electromagne • 313 ´ importante notar que o segundo termo na express˜ao de H1 dever´ E a ter sinal contr´ ario ao termo correspondente na express˜ao de E1 : s´o assim se garante que a onda reflectida se propaga segundo −jˆ . Como k1 = ωc = 1 rad/m podemos escrever para os campos reais E1 = h · H1 = i ˆ C1 cos(3×108 t − y) + C01 cos(3×108 t + y) k (9.217) C0 C1 cos(3×108 t − y) − 1 cos(3×108 t + y) ˆi . Zc Zc (9.218) ¸ Os coeficientes C1 e C01 s˜ao determinados a partir das condi¸c˜ oes de fronteira que se imp˜oem na superf´ıcie de separa¸c˜ao dos dois meios, isto ´e, em y = 0. Essas condi¸c˜ oes s˜ao: • componentes normais do vector deslocamento: D1n = D2n ⇒ E1n = 4 E2n , (9.219) pois n˜ao h´a distribui¸c˜oes de cargas livres na superf´ıcie, ²1 = ²0 e ²2 = 4²0 ; • componentes tangenciais do campo el´ectrico: E1t = E2t (9.220) (a componente tangencial do campo el´ectrico ´e sempre cont´ınua); • componentes normais do campo de indu¸c˜ ao magn´etica: B1n = B2n ⇒ H1n = H2n , (9.221) pois a componente normal do campo de indu¸c˜ ao magn´etica ´e sempre cont´ınua e µ1 = µ2 = µ0 ; • componentes tangenciais do campo magn´etico: H1t = H2t , (9.222) pois n˜ao h´a distribui¸c˜oes de correntes livres sobre a superf´ıcie. As condi¸c˜oes de fronteira (9.219) e (9.221) s˜ao satisfeitas automaticamente, pois os campos el´ectrico e magn´etico n˜ao tˆem componente segundo jˆ (a normal `a superf´ıcie): E1n = E2n = 0 e H1n = H2n = 0. As duas outras condi¸c˜ oes, que tˆem de ser observadas em qualquer instante t, permitem determinar os coeficientes C1 e C01 nas eqs. (9.217) e (9.218). Em particular, para t = 0, a Eq. (9.220) implica que [ver (9.215) e (9.217)] C1 + C01 = 10−3 V/m . A Eq. (9.222) implica [ver (9.216) e (9.218)] que C1 − C01 = 2×10−3 V/m . Destas duas equa¸c˜oes resulta C1 = 1, 5×10−3 V/m , C01 = −0, 5×10−3 V/m . Substituindo em (9.217) (9.218), vem, finalmente, h i h i ˆ E1 = 0, 5×10−3 3 cos(3×108 t − y) − cos(3×108 t + y) k H1 = 0, 5×10−3 377 3 cos(3×108 t − y) + cos(3×108 t + y) ˆi (V/m) (A/m) . 314 • ´tico Campo electromagne 9.9.13 Antena quadrada Quest˜ ao Considerar uma onda electromagn´etica com as caracter´ısticas indicadas no Problema 9.9.9. Calcular a for¸ca electromotriz gerada numa antena quadrada de lado igual a 3 m colocada no plano definido pelo vector E e pela direc¸c˜ ao de propaga¸c˜ ao, como mostra a Figura 9.14. z 3 m D C E H 3 m A B S y x Figura 9.14. Antena quadrada do Problema 9.9.13. Resposta Os campos el´ectrico e magn´etico s˜ao (ver Problema 9.9.9, substituindo E0 e ω pelos valores indicados no enunciado desse problema e H0 = E0 /Zc = 0, 133 mA/m) µ y E = 50 cos 10 t − 3 ¶ 8 µ H = 0, 133 cos 108 t − ˆ k y 3 (mV/m) ¶ ˆi (mA/m) , sendo t em segundos e y em metros. A for¸ca electromotriz (f.e.m.) induzida na espira ´e a circula¸c˜ao do campo el´ectrico ao longo da espira19 : I Ei = C E · dl . Atendendo `a direc¸c˜ao do campo el´ectrico (ver Figura 9.14) esta circula¸c˜ ao ´e nula ao longo dos lados AB e CD. As circula¸c˜oes de B para C e de D para A s˜ao dadas, respectivamente, pelos termos do lado direito da express˜ao seguinte: Ei = Z 3 0 50 cos(108 t − 1) dz − h Z 3 0 50 cos(108 t) dz i = 150 cos(108 t − 1) − cos(108 t) 19 For¸ca electromotriz induzida: Ei ; grandeza do campo el´ectrico: E. (mV) . (9.223) ´ticas Ondas electromagne • 315 Um processo equivalente de determinar a f.e.m. ´e atrav´es da varia¸c˜ ao temporal do fluxo do campo de indu¸c˜ao magn´etica: dΦ Ei = − . (9.224) dt No vazio, o campo de indu¸c˜ao magn´etica relaciona-se com o campo magn´etico atrav´es de B = µ0 H (no SI, µ0 = 4π ×10−7 H/m), pelo que µ −7 B = 1, 67×10 y cos 10 t − 3 ¶ 8 ˆi (mT) . O fluxo deste vector atrav´es do quadrado delimitado pela espira ´e Z Φ = S B · ˆi dS = 1, 67×10−7 Z 3 = 5, 01×10−7 −8 = −150×10 h0 Z 3 µ cos 108 t − 0 dz Z 3 ¶ 0 µ y cos 10 t − 3 y dy 3 sin(108 t − 1) − sin 108 t ¶ 8 dy i (mV s) , e a for¸ca electromotriz que daqui resulta, obtida a partir de (9.224), conduz ao resultado (9.223). 9.9.14 Onda plana incidente numa lˆ amina diel´ ectrica Quest˜ ao Uma onda electromagn´etica plana, harm´onica, de frequˆencia f = 106 Hz, propaga-se na direc¸c˜ao do eixo x em diferentes meios (todos com condutividade nula, σi = 0, e permeabilidade igual `a do vazio, µi = µ0 ): meio 1: meio 2: meio 3: −∞ < x < 0 , 0 < x < d, 0 < x < ∞, ²1 = ²0 ; ²2 = 9²0 ; ²3 = ²0 . A amplitude do campo magn´etico ´e, para x = d = 2 cm, igual a 2 mA/m. Obter o campo el´ectrico, o campo magn´etico e o vector de Poynting em todo o espa¸co. Resposta A express˜ao geral da onda plana que se propaga na direc¸c˜ ao do eixo x ´e, como se sabe, da forma f− (x − vt) + f+ (x + vt), designando v a velocidade da luz no meio. A Figura 9.15 representa os meios onde se propaga a onda e a orienta¸c˜ ao do campo magn´etico para x = 2 cm. No meio 3 (vazio) s´o h´a onda transmitida que se propaga no sentido de ˆi. Usando a nota¸c˜ao exponencial, em qualquer meio, a onda (el´ectrica ou magn´etica) ´e dada pelo produto de uma parte espacial e de uma parte temporal. Por exemplo, para o campo el´ectrico, tem-se E = Ee eiωt , onde ω = 2π ×106 rad/s (independentemente do meio, a frequˆencia angular tem sempre este valor). No que se segue vamos considerar apenas, e sempre em nota¸c˜ ao exponencial, a parte espacial dos campos. Os campos el´ectrico e magn´etico no meio 3 s˜ao ˆ He,3 = H0 e−ik3 x k Ee,3 = H0 Zc e−ik3 x jˆ , 316 • ´tico Campo electromagne z m e io 1 (v a z io ) m e io 2 (d ie lé c tric o ) m e io 3 (v a z io ) H x = 0 0 = 2 x 1 0 -3 A / m x = d x Figura 9.15. Lˆ amina diel´ ectrica (meio 2) do Problema 9.9.14. com Zc = 377 Ω e H0 = 2×10−3 A/m. Nestas express˜oes, k3 = ω 2πf 2π −2 = = 10 rad m−1 . c c 3 Nos meios 1 e 2 as ondas propagam-se nos dois sentidos: Ee,2 = ³ ´ A2 e−ik2 x + B2 eik2 x jˆ µ (9.225) ¶ A2 −ik2 x B2 ik2 x ˆ e − 0 e k Zc0 Zc ³ ´ = A1 e−ik1 x + B1 eik1 x jˆ He,2 = Ee,1 µ He,1 = Nestas express˜oes = (9.227) ¶ A1 −ik1 x B1 ik1 x ˆ e − e k. Zc Zc r Zc0 (9.226) µ0 1 = ²2 3 r µ0 Zc = ²0 3 (9.228) (9.229) e 2π −2 k1 = k3 = ×10 rad m−1 3 √ ²r2 ω k2 = = 3×k1 = 2π ×10−2 rad m−1 . c A componente tangencial do campo el´ectrico ´e sempre cont´ınua e, neste caso, a do campo magn´etico tamb´em o ´e, pois n˜ao h´a correntes livres. Assim, na superf´ıcie x = d = 0, 02 m, temos: A2 e−i 4π×10 −4 + B2 ei 4π×10 −4 A2 e−i 4π×10 −4 − B2 ei 4π×10 −4 4π ×10−4 3 = 377×2×10−3 e−i V/m −4 377 −3 −i 4π×310 ×2×10 e V/m . = 3 ´ticas Ondas electromagne • 317 Resolvendo o sistema de equa¸c˜oes, obt´em-se A2 = 0, 502 ei 8π ×10−4 3 B2 = 0, 252 e−i (V/m) , 16π ×10−4 3 V/m , (9.230) e os campos no meio 2 (dependˆencia espacial apenas) s˜ao µ Ee,2 = 0, 502 ei µ He,2 = 0, 004 ei 8π ×10−4 3 8π ×10−4 3 e−i2π×10 e−i2π×10 −2 −2 x + 0, 252 e−i x − 0, 002 e−i 16π ×10−4 3 16π ×10−4 3 ei2π×10 ei2π×10 ¶ −2 −2 x ¶ x jˆ (V/m) ˆ (A/m) . k As condi¸c˜oes de fronteira para x = 0 imp˜oem [ver (9.225) a (9.228)] A1 + B1 = A2 + B2 Zc A1 − B1 = (A2 − B2 ) = 3 (A2 − B2 ) . Zc0 Resolvendo o sistema de equa¸c˜oes em ordem a A1 e B1 , obt´em-se A1 = 2 A2 − B2 e B1 = 2 B2 − A2 ; substituindo A2 e B2 pelos valores antes obtidos [eqs. (9.230)] encontram-se as express˜oes A1 = 1, 004 ei 8π ×10−4 3 − 0, 252 e−i −4 −i 16π×310 B1 = 0, 504 e 16π ×10−4 3 V/m 8π ×10−4 i 3 V/m . − 0, 502 e Basta agora inserir estes valores em (9.227) e (9.228) para se encontrarem, em nota¸c˜ ao exponencial, os campos el´ectrico e magn´etico no meio 1. Os campos f´ısicos s˜ao obtidos multiplicando as express˜oes assim obtidas por eiωt e tomando a suas partes reais. Em cada meio o vector de Poynting ´e obtido a partir de S = E × H . Nesta express˜ao intervˆem os campos f´ısicos nesse meio, ou seja, os campos reais. 9.9.15 Onda plana em meio condutor Quest˜ ao Uma onda electromagn´etica plana, harm´onica, linearmente polarizada, propaga-se num meio condutor. Obter o campo el´ectrico e o campo magn´etico nesse meio, sabendo que as caracter´ısticas do meio s˜ao σ = 10−2 (Ω·m)−1 , ² = 10²0 e µ = µ0 , que a frequˆencia angular da onda ´e ω = 108 rad/s e que a amplitude do campo el´ectrico na origem do sistema de referˆencia ´e E0 = 5×10−3 V/m. Resposta O estudo da propaga¸c˜ao de ondas electromagn´eticas em meios condutores est´a descrito, para um caso geral, na Sec¸c˜ao 9.6. O problema presente pode ser resolvido utilizando directamente as express˜oes que a´ı foram obtidas. No entanto, volta a abordar-se aqui a quest˜ao geral antes de se considerar o problema espec´ıfico colocado, utilizando um formalismo um pouco diferente (embora equivalente). Considera-se que o meio ´e linear, isotr´opico e homog´eneo. As equa¸c˜ oes de Maxwell s˜ao escritas sob as formas ∂H (9.231) ∇ × E = −µ ∂t 318 • ´tico Campo electromagne e (recorde-se que j = σ E ) ∂E + σE . (9.232) ∂t Para uma onda sinusoidal, o campo el´ectrico pode ser escrito na seguinte forma exponencial: ∇×H =² E = Ee eiωt e a sua derivada temporal ´e ∂E = iωE . ∂t Quer dizer, o campo e a sua derivada relacionam-se atrav´es de E=− i ∂E . ω ∂t O rotacional do campo magn´etico — Eq. (9.232) — pode ent˜ ao ser escrito na forma ∇ × H = ²ω ∂E , ∂t (9.233) onde σ . ω As eqs. (9.233) e (9.231) s˜ao formalmente an´alogas `as equa¸c˜ oes de Maxwell para meios materiais (quando n˜ao h´a correntes livres), mas agora com uma permitividade complexa. Uma onda plana de frequˆencia bem definida a propagar-se neste meio segundo o eixo x, polarizada linearmente e com o campo el´ectrico a apontar na direc¸c˜ ao y ´e descrita, em nota¸c˜ao exponencial, por E = E0 e−ikx eiωt jˆ . (9.234) ²ω = ² − i Notemos que o n´ umero de onda k em (9.234) ´e agora uma quantidade complexa, q √ k = ω ²ω µ = µ (² ω 2 − i ω σ) , que pode ser separ´avel numa parte real, kr , e numa parte imagin´aria, −ki : k = kr − i ki . ´ conveniente introduzir a quantidade E sµ φ= σ ω² ¶2 +1 (9.235) e escrever as partes imagin´aria e real de k na forma ki kr r 1 (φ − 1) r2 1 √ = ω ²µ (φ + 1) . 2 √ = ω ²µ Introduzindo nestas express˜oes gerais os dados do problema, vem (φ = 1, 504) k = kr − i ki = 1, 18 − i 0, 53 rad/m ´ticas Ondas electromagne • 319 e, inserindo em (9.234), obt´em-se E = 5×10−3 e−0,53x e−i1,18x eiωt jˆ (V/m) . Tomando a parte real, E = 5×10−3 e−0,53x cos(108 t − 1, 18 x) jˆ (V/m) . A velocidade de propaga¸c˜ao da onda ´e v = ω/kr = 108 /1, 18 ' 8, 5×107 m/s. O campo magn´etico ´e obtido a partir de H= E0 −ikx iωt ˆ e e k, Zc0 (9.236) onde a impedˆancia Zc0 ´e, agora, complexa: r Zc0 = r = µ = ²ω r µ ² s 1 σ = 1 − i ²ω r µ 1 √ ² φ e i 12 arctan[−σ/(²ω)] µ 1 i 1 arctan[σ/(²ω)] √ e 2 = 96, 9 ei 0,42 Ω . ² φ Introduzindo este valor em (9.236), o campo magn´etico vem dado por H= 5×10−3 −0,53x −i(1,18x+0,42) iωt ˆ e e e k 96, 9 (A/m) . A parte real desta express˜ao — que ´e o campo f´ısico — ´e dada por ˆ H = 5, 15×10−5 e−0,53x cos(108 t − 1, 18x − 0, 42) k (A/m) . 320 • ´tico Campo electromagne 9.9.16 Fluxo do vector de Poynting Quest˜ ao De acordo com as express˜oes obtidas no Problema 9.9.15, calcular o fluxo do vector de Poynting atrav´es de uma superf´ıcie fechada S cujas dimens˜oes se indicam na Figura 9.16. Mostrar que o valor m´edio desse fluxo num per´ıodo ´e igual `a potˆencia dissipada no volume limitado pela superf´ıcie considerada. z l = 1 m l = 1 m l = 1 m y x Figura 9.16. Representa¸ c˜ ao do cubo referido no Problema 9.9.16. Resposta A partir das express˜oes dos campos el´ectrico e magn´etico obtidas no Problema 9.9.15, E = 5×10−3 e−0,53x cos(108 t − 1, 18 x) jˆ (V/m) (9.237) e ˆ (A/m) , H = 5, 15×10−5 e−0,53x cos(108 t − 1, 18x − 0, 42) k obt´em-se o vector de Poynting, S = E × H : S = 25, 75×10−8 e−1,06x C(x, t) ˆi , onde C(x, t) = cos(108 t − 1, 18 x) cos(108 t − 1, 18x − 0, 42) . Esta express˜ao pode ser simplificada se se utilizar a rela¸c˜ ao trigonom´etrica cos(α − β) = cos α cos β + sin α sin β (9.238) ´ticas Ondas electromagne • 321 e considerando α = 108 t − 1, 18 x e β = 0, 42. Assim, C(x, t) = cos2 (108 t − 1, 18 x) cos 0, 42 + cos(108 t − 1, 18 x) sin(108 t − 1, 18 x) sin 0, 42 . Usando agora as rela¸c˜oes trigonom´etricas, cos2 α = 1 + cos(2α) 2 e 2 sin α cos α = sin(2α) , obt´em-se a express˜ao C(x, t) = i 1 h cos 0, 42 + cos( 2×108 t − 2, 36 x − 0, 42 ) . 2 Substituindo em (9.238), vem (unidades SI) h i S = 1, 174×10−7 e−1,06x + 1, 288×10−7 e−1,06x cos( 2×108 t − 2, 36 x − 0, 42 ) ˆi . (9.239) Calculemos o valor m´edio (no tempo) deste vector para um per´ıodo: Z T 1 < S >= T S dt 0 com 2π (9.240) 108 (recorde-se que a frequˆencia angular da onda ´e ω = 108 rad/s). O vector de Poynting (9.239) ´e a soma de dois termos: o primeiro n˜ao depende do tempo e por isso ´e uma constante do ponto de vista da sua dependˆencia temporal; o segundo ´e uma fun¸c˜ ao peri´odica de per´ıodo T 0 = 2π/(2×108 ), ou seja, metade do per´ıodo da onda (9.240). A contribui¸c˜ ao do segundo termo para o valor m´edio no tempo de S ´e, pois, nula. Quanto `a contribui¸c˜ ao do primeiro termo, sendo uma constante, o seu valor m´edio ´e ele pr´oprio. Assim, T = < S >= 1, 174×10−7 e−1,06x ˆi . (9.241) Este valor m´edio podia ser obtido a partir da express˜ao geral < S >= 12 Re(E × H ∗ ), que considera as amplitudes complexas para os campos el´ectrico e magn´etico. O fluxo do vector (9.241) que entra atrav´es da superf´ıcie do cubo da Figura 9.16, de aresta ` = 1 m, s´o ´e diferente de zero para as faces paralelas ao plano yOz, ou seja, para as faces nos planos x = 1 e x = 0, obtendo-se I − cubo < S > · dΣ = 1, 174×10−7 Z 1 0 dy = 1, 174×10−7 (1 − e Z 1 dz − 1, 174×10−7 ×e−1,06 0 −1,06 ) = 7, 69×10−8 W . Z 1 0 dy Z 1 0 dz (9.242) Falta agora mostrar que este fluxo ´e sim´etrico da potˆencia m´edia dissipada por efeito Joule no interior do cubo ao longo de um per´ıodo. Essa potˆencia ´e dada por Z PJ = v Z E · j` = σ e a sua m´edia no tempo ´e < PJ >= 1 T Z T 0 v E 2 dv PJ dt , (9.243) (9.244) 322 • ´tico Campo electromagne onde T ´e o per´ıodo da onda (9.240). Comecemos por calcular (9.243). Atendendo `a express˜ao do campo el´ectrico (9.237), PJ (t) = 10−2 ×25×10−6 Z 1 0 e−1.06x cos2 (108 t − 1, 18 x) dx . Ora, como 1 [1 + cos(2×108 t − 2, 36 x)] , 2 quando se faz a m´edia no tempo ao longo de um per´ıodo da onda, o segundo termo desta express˜ao n˜ao contribui, pois trata-se de uma fun¸ca˜o sinusoidal de per´ıodo igual a metade do per´ıodo da onda. Apenas o termo constante 21 contribui para o integral temporal (9.244). Podemos, pois, escrever Z cos2 (108 t − 1, 18 x) = < PJ >= 12, 5×10−8 1 0 e−1,06x dx e, resolvendo o integral ¯1 ³ 12, 5 ¯ −8 ×10 −e−1,06x ¯ 0 1, 064 −8 −1,06 = 11, 75×10 (1 − e ) = 7, 69×10−8 W , < PJ > = que coincide com (9.242). 9.9.17 Ondas estacion´ arias num ressoador Quest˜ ao Obter as express˜oes gerais para as componentes do campo electromagn´etico num ressoador de forma paralelepip´edica de lados a, b e d como mostra a Figura 9.17. Deduzir a express˜ao para as frequˆencias de ressonˆancia. Supor que as paredes do ressoador s˜ao condutores perfeitos e que existe o vazio na cavidade. Considere que n˜ao h´a componente do campo el´ectrico segundo a direc¸c˜ao x. z y b a x d Figura 9.17. Paralelep´ıpedo oco cujas paredes s˜ ao condutores perfeitos. ´ticas Ondas electromagne • 323 Resposta O campo electromagn´etico no interior da cavidade obedece `a equa¸c˜ ao de onda ∇2 ψ = 1 ∂2ψ , c2 ∂t2 (9.245) onde ψ designa cada uma das componentes dos campos el´ectrico e magn´etico. A onda electromagn´etica no interior da cavidade j´a n˜ao pode ter a forma de uma onda progressiva devido ao tamanho finito da cavidade e `a reflex˜ao das ondas nas suas paredes condutoras. O problema ´e, de resto, an´alogo ao problema da determina¸c˜ ao dos modos normais de vibra¸c˜ ao de uma corda vibrante com as pontas fixas. No caso agora considerado, os modos normais de vibra¸c˜ ao s˜ao ondas estacion´arias resultantes da sobreposi¸c˜ ao de ondas progressivas que se propagam em direc¸c˜oes opostas, devido `as reflex˜oes nas faces. No caso da vibra¸c˜ ao em modo normal da corda vibrante, h´a certos pontos (nodos) que tˆem deslocamento nulo qualquer que seja o instante considerado; os comprimentos de onda poss´ıveis s˜ao tais que a distˆancia entre as extremidades fixas da corda ´e um m´ ultiplo de semicomprimentos de onda. Um deslocamento arbitr´ario da corda vibrante pode sempre ser expresso em termos de uma combina¸c˜ ao linear de ondas estacion´arias com comprimentos de onda diferentes. No caso do campo electromagn´etico, as solu¸c˜ oes da Eq. (9.245) podem ser procuradas de entre fun¸c˜oes da forma ψ(r , t) = Φ(r )e−iωt , obtendo-se a seguinte equa¸c˜ao para o campo Φ(r ): ∇2 Φ + k02 Φ = 0 , com k02 = (ω/c)2 . Em coordenadas cartesianas esta equa¸c˜ ao admite solu¸c˜ oes com as vari´ aveis separadas, isto ´e, solu¸c˜oes da forma Φ(r ) = X(x) Y (y) Z(z) , (9.246) em que X(x) = A1 sin k1 x + B1 cos k1 x Y (y) = A2 sin k2 y + B2 cos k2 y Z(z) = A3 sin k3 z + B3 cos k3 z , com as quantidades ki sujeitas `a restri¸c˜ ao k12 + k22 + k32 = k02 = µ ¶2 ω c . (9.247) O m´etodo que se utiliza para encontrar este tipo de solu¸c˜ oes ´e semelhante ao exposto na Sec¸c˜ao 6.3 para a obten¸c˜ao da solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Laplace em coordenadas cartesianas. Vamos procurar solu¸c˜oes do tipo (9.246) para as componentes y e z do campo el´ectrico (afirma-se no enunciado que o campo n˜ao tem componente x). Podemos escrever (os campos f´ısicos s˜ao a parte real destas fun¸c˜ oes complexas) Ey = (A1,y sin k1 x + B1,y cos k1 x) (A2,y sin k2 y + B2,y cos k2 y) (A3,y sin k3 z + B3,y cos k3 z) e−iωt Ez = (A1,z sin k1 x + B1,z cos k1 x) (A2,z sin k2 y + B2,z cos k2 y) (A3,z sin k3 z + B3,z cos k3 z) e−iωt . 324 • ´tico Campo electromagne Consideremos, em primeiro lugar, a componente y. Como o campo el´ectrico n˜ao pode ter componente tangencial sobre as faces da cavidade, a componente Ey tem de ser nula nas faces x = 0 e x = b, e z = 0 e z = a (ver Figura 9.17). Estas condi¸c˜ oes de fronteira implicam que B1,y = B3,y = 0 e que k1 = `π b k3 = nπ a `, n inteiros . Quanto `a componente Ez , a condi¸c˜ ao de o campo n˜ao ter componente tangencial sobre as faces implica que B1,z = B2,z = 0 e imp˜oe a seguinte condi¸c˜ ao para k2 : k2 = mπ d m inteiro . As componentes do campo el´ectrico (introduzem-se novas constantes redefinindo as anteriores) passam a ser escritas na forma 0 Ey = sin k1 x (A02,y sin k2 y + B2,y cos k2 y) sin k3 z e−iωt 0 Ez = sin k1 x sin k2 y (A03,z sin k3 z + B3,z cos k3 z) e−iωt . No interior da cavidade n˜ao h´a cargas, pelo que se verifica ∇ · E = 0. Daqui resulta 0 0 k2 (A02,y cos k2 y − B2,y sin k2 y) sin k3 z + k3 sin k2 y(A03,z cos k3 z − B3,z sin k3 z) = 0 , que s´o se verifica para qualquer y e z se A02,y = A03,z = 0 e 0 0 k2 B2,y + k3 B3,z = 0. 0 B2,y (9.248) 0 B3,z Fazendo E2m = e E3m = = −(k2 /k3 ) E2m , as componentes do campo el´ectrico podem finalmente ser escritas (partes reais) da seguinte forma: Ey = E2m sin k1 x cos k2 y sin k3 z cos ωt Ez = E3m sin k1 x sin k2 y cos k3 z cos ωt . Definindo um vector k de componentes (k1 , k2 , k3 ) e um vector Em de componentes (0, E2m , E3m ), a express˜ao (9.248) fica, simplesmente, k · Em = 0 , semelhante `a que se encontra para o caso de ondas planas. A express˜ao anterior significa tamb´em que o vector Em deve ser perpendicular ao vector `π ˆ mπ ˆ nπ ˆ i+ j+ k. b d a k= As frequˆencias de ressonˆancia s˜ao obtidas de (9.247) e das componentes deste vector: s µ ¶2 ω = cπ ` b µ + m d ¶2 µ ¶2 + n a . ´ticas Ondas electromagne • 325 Note-se que pode haver v´arios conjuntos de n´ umeros inteiros (`, m, n) que, dependendo da geometria da cavidade, conduzam a um mesmo valor de ω. O campo magn´etico ´e obtido a partir da equa¸c˜ ao de Maxwell ∇ × E = −µ0 ∂H = i ω µ0 H . ∂t Consideremos, por exemplo, a componente y do campo magn´etico. A componente y da equa¸c˜ao anterior escreve-se ∂Ez i ω µ0 Hy = − , ∂x donde E3m k1 cos k1 x sin k2 y cos k3 z e−iωt . Hy = i ωµ0 O campo f´ısico ´e a parte real desta fun¸c˜ ao complexa: Hy = E3m k1 cos k1 x sin k2 y cos k3 z sin ωt . ωµ0 As componentes x e z do campo magn´etico s˜ao obtidas de forma semelhante. CAP´ITULO 10 O ELECTROMAGNETISMO E A TEORIA DA RELATIVIDADE Segundo o Princ´ıpio da Relatividade, as leis f´ısicas s˜ao as mesmas em todos os referenciais de in´ercia. Quanto `a Mecˆanica Cl´assica, as suas leis s˜ao invariantes perante as transforma¸c˜ oes de Galileu, mas o mesmo n˜ao acontece relativamente `as leis de Maxwell do Electromagnetismo. A pertinˆencia desta quest˜ao, j´a apontada e discutida no Cap´ıtulo 1, acabaria por conduzir `a formula¸c˜ao da Teoria da Relatividade Restrita. Reconheceu-se que as leis de Maxwell ficavam invariantes sob transforma¸c˜ oes de Lorentz e que eram estas as transforma¸c˜ oes correctas que permitiam relacionar as coordenadas esp´acio-temporais relativas a dois referenciais de in´ercia. Por isso, eram elas que, do mesmo modo, teriam de deixar invariantes as equa¸c˜ oes da Mecˆanica. Quando se passa de um referencial para outro referencial de in´ercia h´a quantidades que ficam inalteradas — s˜ao os chamados invariantes ou escalares de Lorentz. A carga el´ectrica ´e um exemplo de uma dessas quantidades: a carga el´ectrica de uma part´ıcula tem o mesmo valor independentemente do referencial de onde est´a a ser observada. A invariˆ ancia da carga de uma part´ıcula, independentemente da sua velocidade, ´e um resultado experimental. Considere-se, por exemplo, que um bloco de um dado material est´a a ser aquecido. Como a massa do electr˜ ao ´e muito menor do que a do prot˜ao, ´e de supor que os electr˜oes adquiram velocidades maiores do que os prot˜oes, `a medida que a temperatura aumente. O bloco aquecido ficaria com uma carga total diferente de zero se a carga variasse com a velocidade! N˜ao ´e isso que se verifica, concluindo-se que a carga de uma part´ıcula ´e independente do seu estado de movimento. O mesmo j´a n˜ao sucede com a densidade de carga. Sabemos que os comprimentos na direc¸c˜ao do movimento s˜ao diferentes em sistemas de in´ercia diferentes e, por isso, as densidades variam. 328 • ´tico Campo electromagne 10.1 ˜ DE LORENTZ A TRANSFORMAC ¸ AO A transforma¸c˜ao de Lorentz relaciona as coordenadas esp´acio-temporais de um acontecimento no sistema S, dadas por (ct, x, y, z) ≡ (x0 , x1 , x2 , x3 ), com as coordenadas do mesmo acontecimento no sistema S0 , (ct0 , x0 , y 0 , z 0 ) ≡ (x00 , x01 , x02 , x03 ). y S y ' r S ' v r' x x ' z' z Figura 10.1. Referenciais de in´ ercia S e S0 . Se o sistema S se move com velocidade constante v = v ˆi relativamente a S, como se mostra na Figura 10.1, essa rela¸c˜ao ´e expressa por: x00 = γ(x0 − βx1 ) 01 x 02 x 1 (10.1) 0 = γ(x − βx ) (10.2) 2 = x (10.3) x03 = x3 , (10.4) onde β = v/c γ = 1 . 1 − β2 p Os intervalos infinitesimais, relativos a cada uma das coordenadas, obedecem a leis de transforma¸c˜ao semelhantes: dx00 = γ(dx0 − βdx1 ) 01 dx 02 dx 03 dx 1 0 = γ(dx − βdx ) (10.5) (10.6) 2 (10.7) 3 (10.8) = dx = dx . Em geral, se a velocidade de S0 relativamente a S for v (constante mas n˜ao necessariamente segundo o eixo x), pode sempre fazer-se a decomposi¸c˜ ao r = rk + r⊥ , (10.9) O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 329 onde os vectores rk e r⊥ s˜ao, respectivamente, paralelo e perpendicular a v . Tem-se ent˜ ao, e numa forma compacta,   r 0 = r⊥ + γ (rk − v t) (10.10)  ct0 = γ (c t − v r /c) . k 10.1.1 Contravariˆ ancia e covariˆ ancia Introduz-se habitualmente o tetravector posi¸c˜ ao, xµ , no referencial S (x0 µ no referencial S0 ), que designa o conjunto de quatro quantidades (x0 , x1 , x2 , x3 ). O tetravector xµ localiza um acontecimento num espa¸co quadridimensional (uma dimens˜ao temporal e trˆes espaciais). A rela¸c˜ao das componentes de xµ com as componentes de x0µ ´e expressa pelas transforma¸c˜ oes de Lorentz (10.1) a (10.4), podendo, equivalentemente, ser expressa na seguinte forma matricial: x0µ = Lµν xν . (10.11) A matriz de transforma¸c˜ao,Lµν , ´e dada por     ( Lµν ) =  γ −βγ 0 0 −βγ γ 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1    .  (10.12) Em (10.11) est´a a usar-se a conven¸c˜ ao de soma sobre ´ındices repetidos, a qual ´e muito usual no formalismo da Teoria da Relatividade. Sempre que um ´ındice apare¸ca repetido (um ´ındice “em cima” e o outro “em baixo”) subentende-se soma sobre ele. No caso do membro direito da express˜ao (10.11) essa soma ´e sobre o ´ındice ν (ν = 0, 1, 2, 3) que ´e, obviamente, um ´ındice mudo. O ´ındice ν = 0 refere-se `a componente temporal e ν = 1, 2, 3 `as componentes espaciais. Faz tamb´em parte da conven¸c˜ao o seguinte: se o ´ındice ´e uma letra grega, pode tomar os valores 0, 1, 2, 3; quando se querem referir apenas as componentes espaciais, utiliza-se para ´ındice uma letra do alfabeto latino (exemplo: ai pode significar ax , ay , az dependendo do valor de i = 1, 2, 3). O facto de em xµ se colocar o ´ındice “em cima” e n˜ao “em baixo” n˜ao ´e, de todo, irrelevante, como veremos j´a a seguir! O tetravector xµ (´ındice em cima), cuja lei de transforma¸c˜ao ´e (10.11), diz-se contravariante. Define-se o correspondente tetravector covariante, e designa-se por xµ o tetravector que se relaciona com xµ do modo seguinte: a componente temporal (ou componente zero, segundo a nota¸c˜ ao que estamos a adoptar) ´e a mesma em ambos os tetravectores; as componentes espaciais de xµ s˜ao sim´etricas das de xµ . Assim, como1 xµ ≡ (x0 , r ), ent˜ao xµ ≡ (x0 , −r ). Mais explicitamente, podemos escrever x0 = = ct (10.13) = −x1 =x (10.14) x2 = −x2 =y (10.15) = z. (10.16) 1 x 3 x x0 = −x3 Formalmente, transforma-se um tetravector contravariante num tetravector covariante mediante a opera¸c˜ao xµ = gµν xν , (10.17) 1´ E habitual utilizar esta nota¸ca ˜o compacta para as componentes espaciais. 330 • ´tico Campo electromagne onde gµν = g µν s˜ao os elementos do tensor da m´etrica:     ( gµν ) = ( g µν ) =  1 0 0 0 0 −1 0 0 0 0 −1 0 0 0 0 −1    .  Esta matriz estabelece uma m´etrica no espa¸co quadridimensional — espa¸co de Minkowski — que n˜ao ´e definida positiva.2 Note-se que se trata de um tensor sim´etrico e que gµα g αν = δµν , sendo este o s´ımbolo de Kronecker a quatro dimens˜oes. Podemos dizer que xµ ´e o tetravector contravariante por excelˆencia. Mas, em geral, tetravector contravariante ´e qualquer entidade com quatro componentes que observam uma lei de transforma¸c˜ao semelhante a (10.11) quando se passa do referencial S (onde a entidade ´e designada por aµ ) para o referencial S0 (onde a entidade ´e designada por a0µ ): a0µ = Lµν aν . (10.18) A express˜ao (10.17) indica o m´etodo de “subir” ou baixar “´ındices”, ou melhor, o m´etodo de transformar vectores contravariantes em covariantes e vice-versa. Assim, do vector aµ obt´em-se o respectivo vector covariante atrav´es de aµ = gµν aν e, inversamente, aµ = g µν aν . Fazendo subir e baixar ´ındices em (10.18) de forma conveniente, chega-se a gαµ a0µ = gαµ Lµν g νβ aβ , pelo que (passamos a designar α por µ e β por ν) a0µ = Lµν aν , onde ou, explicitando, (10.19) Lµν = gµα Lαβ g βν     ( Lµν ) =  γ βγ 0 0 βγ γ 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1    .  (10.20) A Eq. (10.19) ´e a lei de transforma¸c˜ ao de vectores covariantes, que ´e diferente da lei de transforma¸c˜ao (10.18) dos vectores contravariantes. Veremos mais `a frente (Sec¸c˜ ao 10.3) qual ´e o vector covariante por excelˆencia. As transforma¸c˜oes inversas de (10.18) e de (10.19), que permitem passar das componentes dos tetravectores contravariantes e covariantes em S0 para S, s˜ao aµ = Lνµ a0ν aµ = 2 Lνµ a0ν (10.21) . (10.22) Por vezes, em Relatividade, utiliza-se uma m´etrica euclidiana para o espa¸co quadridimensional, mas, ent˜ ao, a vari´ avel temporal ´e imagin´ aria pura. O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 331 Note-se que as matrizes (10.12) e (10.20) s˜ao a inversa uma da outra: multiplicando uma pela outra, em qualquer ordem, obt´em-se a matriz identidade a quatro dimens˜oes. Em nota¸c˜ ao simb´olica, Lµα Lµβ = δαβ . (10.23) Observando (10.19) e (10.21), por um lado, e (10.18) e (10.22), por outro lado, constata-se que a lei de transforma¸c˜ao de S0 para S de um vector contravariante ´e a lei de transforma¸c˜ ao 0 de S para S de um vector covariante, e vice-versa. Vejamos agora como se pode calcular o produto escalar de dois tetravectores. Designemos por aµ ≡ (a0 , a) e bµ ≡ (b0 , b) dois tetravectores contravariantes no espa¸co de Minkowski. O seu produto escalar, que se representa por a · b, ´e, por defini¸c˜ ao, a · b = aµ gµν bν = aµ g µν bν = aµ bµ = aµ bµ = a0 b0 − a · b . O produto escalar mant´em-se invariante em qualquer referencial (escalar de Lorentz), como se pode mostrar a partir de (10.18) e de (10.19): a0µ b0µ = Lµα Lµβ aα bβ = aα bβ δαβ = aα bα , tendo-se utilizado a express˜ao (10.23). Portanto, para dois tetravectores quaisquer, a · b = a0 b0 − a · b = a00 b00 − a0 · b0 = a0 · b0 . Em geral, a norma de um vector num espa¸co de dimens˜ao arbitr´aria ´e a raiz quadrada do produto escalar do vector por si pr´oprio. O quadrado da norma do tetravector aµ ´e, pois, aµ aµ = (a0 )2 − |a|2 , tendo o mesmo valor em qualquer referencial de in´ercia. Em particular, para o tetravector posi¸c˜ao, (x0 )2 − |r |2 = (x00 )2 − |r 0 |2 , ou, numa nota¸c˜ao mais expl´ıcita, (ct)2 − (x2 + y 2 + z 2 ) = (ct0 )2 − (x02 + y 02 + z 02 ) . (10.24) Esta igualdade, que pode ser confirmada explicitamente a partir das transforma¸c˜oes de Lorentz (10.1) a (10.4), exprime o quadrado do intervalo entre os acontecimentos descritos por (0, 0, 0, 0) e (ct, x, y, z) no referencial S. Este intervalo ´e o mesmo em qualquer referencial de in´ercia. Em geral, o quadrado do intervalo entre dois acontecimentos (ct, x, y, z) e (cT, X, Y, Z) quaisquer, ´e um invariante (ou escalar) de Lorentz: c2 (t − T )2 − (x − X)2 − (y − Y )2 − (z − Z)2 = c2 (t0 − T 0 )2 − (x0 − X 0 )2 − (y 0 − Y 0 )2 − (z 0 − Z 0 )2 . Repare-se que na apresenta¸c˜ao sucinta que agora conclu´ımos poderia ter sido seguida uma estrat´egia diferente. Assim, poder-se-ia ter primeiro reconhecido a invariˆ ancia expressa pela Eq. (10.24) directamente a partir das transforma¸c˜ oes de Lorentz, surgindo ent˜ ao a necessidade de introdu¸c˜ao de uma m´etrica n˜ao definida positiva e de considera¸c˜ ao de dois tipos de tetravectores no espa¸co de Minkowski — covariantes e contravariantes. 332 • ´tico Campo electromagne 10.1.2 Transforma¸c˜ ao de comprimentos e de intervalos de tempo Considere-se que, no sistema S0 que se move em rela¸c˜ ao a S com velocidade v = v ˆi (Figura 10.1), ´e colocada uma r´egua ao longo do eixo x (ou x0 , pois s˜ao coincidentes as direc¸c˜oes dos dois eixos dos dois referenciais). No referencial S0 (referencial pr´oprio) a r´egua tem um comprimento L0 (comprimento pr´oprio). O comprimento da mesma r´egua medida no referencial S ´e L, que se relaciona com L0 atrav´es de L= q L0 = L0 1 − v 2 /c2 , γ (10.25) ou seja, em S o comprimento da r´egua ´e menor. Este fen´omeno, eminentemente relativista, ´e conhecido por contrac¸c˜ ao do espa¸co. Na direc¸c˜ ao perpendicular ao movimento — na situa¸c˜ ao que estamos a considerar qualquer direc¸c˜ ao no plano yz (ou y 0 z 0 ) — n˜ao h´a modifica¸c˜ ao no comprimento. Em virtude ainda das transforma¸c˜ oes de Lorentz, os intervalos de tempo tamb´em sofrem modifica¸c˜oes. Designemos por τ0 o intervalo de tempo medido no referencial pr´oprio de um objecto, que ´e o referencial no qual ele est´a em repouso. Este intervalo de tempo, τ0 , decorre entre dois acontecimentos que tˆem lugar num mesmo ponto espacial do referencial pr´oprio. O correspondente intervalo de tempo, τ , entre os mesmos acontecimentos, medido num referencial que se desloca relativamente ao referencial pr´oprio com velocidade v segundo o eixo dos x ´e maior e dado por τ0 , 1 − v 2 /c2 τ = γτ0 = p (10.26) express˜ao que traduz quantitativamente o fen´omeno da dilata¸c˜ ao do tempo. A contrac¸c˜ ao do espa¸co e a dilata¸c˜ao do tempo s˜ao dos resultados mais sui generis da Teoria da Relatividade Restrita. Exemplo 10.1: Transforma¸ c˜ ao da densidade de carga Vejamos, como exemplo de aplica¸c˜ ao de (10.25), como se transforma a densidade de carga el´ectrica. Consideremos um segmento de um fio de comprimento L0 , de sec¸c˜ ao A0 e carregado com uma carga q uniformemente distribu´ıda. A densidade de carga ρ0 no referencial S0 em que o fio se encontra em repouso (referencial pr´oprio) relaciona-se com as outras grandezas referidas atrav´es de q = ρ0 L0 A0 . (10.27) Relativamente a S, o fio move-se com uma velocidade v ˆi e, neste referencial de in´ercia, q = ρLA. (10.28) A sec¸c˜ao do fio A n˜ao ´e alterada, pois ´e perpendicular `a direc¸c˜ ao do movimento (A = A0 ); por outro lado, o comprimento do fio varia, sofrendo uma contrac¸c˜ ao, de acordo com (10.25). Como a carga el´ectrica ´e um invariante, podemos igualar (10.27) e (10.28) e, usando (10.25), escrever ρ0 ρ = γ ρ0 = p . (10.29) 1 − v 2 /c2 A densidade de carga ´e maior no referencial S, relativamente ao qual o fio est´a em movimento. O electromagnetismo e a teoria da relatividade 10.1.3 • 333 Lei de transforma¸c˜ ao das velocidades No referencial S a velocidade de uma part´ıcula ´e definida atrav´es de u= dr . dt Da mesma maneira, no referencial S0 , que se move relativamente a S segundo o eixo dos x com velocidade constante v, a velocidade ´e u0 = dr 0 . dt0 As componentes de u podem relacionar-se com as componentes de u0 . Usando as transforma¸c˜oes de Lorentz (10.6) a (10.8), obt´em-se directamente a lei de transforma¸c˜ ao das velocidades: ux = u0x + v 1 + βu0x /c uy = u0y uz = u0z p 1 − β2 1 + βu0x /c p 1 − β2 . 1 + βu0x /c Em nota¸c˜ao vectorial pode escrever-se u= u0k + v + u0⊥ /γ 1 + u0k v/c2 , (10.30) tendo-se considerado, como em (10.9), u0 = u0k + u0⊥ , sendo u0k paralelo a v , e u0⊥ perpendicular a v . A transforma¸c˜ao inversa de (10.30) ´e escrita do seguinte modo: u0 = uk − v + u⊥ /γ 1 − uk v/c2 . Estas express˜oes continuam v´alidas mesmo que u n˜ ao seja constante. Se a velocidade no referencial S0 for ao longo do eixo x, isto ´e, se u0x = u0 , u0y = u0z = 0, ent˜ao uy = uz = 0 e, fazendo ux = u, vem u= u0 + v , 1 + vu0 /c2 (10.31) que substitui a express˜ao cl´assica, resultante da transforma¸c˜ ao de Galileu, u = u0 + v. O limite cl´assico obt´em-se, considerando em (10.31) v ¿ c. Note-se que quando u0 = c tem-se, necessariamente, u = c. Quando u0 = 0, ent˜ ao u = v, como seria de esperar. Retomemos o Exemplo 10.1 relativo a um fio carregado. No referencial pr´oprio (S0 ), a densidade de corrente ´e nula porque as cargas est˜ao em repouso (u0 = 0). Mas, no referencial S, as cargas deslocam-se com velocidade u = v = v ˆi e, por isso, existe neste referencial uma corrente j = ρv . Esta, atendendo a (10.29), ´e dada por ρ0 v . 1 − v 2 /c2 j = γ ρ0 v = p (10.32) 334 • ´tico Campo electromagne Vamos mostrar que as quatro quantidades j 0 = cρ e (j 1 = jx , j 2 = jy , j 3 = jz ) s˜ao as componentes temporal e espaciais, respectivamente, de um tetravector contravariante. Considere-se de novo a densidade de carga e a densidade de corrente no referencial S0 , isto ´e, as quatro quantidades j 00 = cρ0 e (j 01 = 0, j 02 = 0, j 03 = 0). Ora, verifica-se que a rela¸c˜ao entre as quatro quantidades num e no outro referencial se exprime pela equa¸c˜ ao matricial  j 00 j 01 j 02 j 03           =   γ −βγ 0 0 −βγ γ 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1      j0 j1 j2 j3    .  (10.33) Como a matriz de transforma¸c˜ao ´e precisamente (10.12), conclui-se que os elementos das matrizes coluna s˜ao as componentes de tetravectores contravariantes. A equa¸c˜ ao matricial (10.33) pode ser escrita na seguinte forma compacta: j 0µ = Lµν j ν , (10.34) que ´e a lei geral (10.18) de transforma¸c˜ ao de tetravectores contravariantes. Em (10.34) introduziu-se o tetravector densidade de corrente no referencial S0 , j 0µ ≡ (j 00 , j 0 ) = (cρ0 , 0) , (10.35) e no referencial S, à µ 0 j ≡ (j , j ) = (cρ, j ) = (c γ ρ0 , γ ρ0 v ) = c ρ0 ρ0 v p ,p 2 2 1 − v /c 1 − v 2 /c2 ! , (10.36) tendo-se usado (10.29) e (10.32) para escrever as duas u ´ltimas igualdades em (10.36). 10.2 TETRAVECTOR MOMENTO LINEAR Uma part´ıcula de massa m possui uma energia E0 = m c2 no seu referencial pr´oprio S0 . Vista de um referencial relativamente ao qual se desloca com velocidade v (referencial S), a part´ıcula possui uma energia m c2 E = γ E0 = p . (10.37) 1 − v 2 /c2 Quanto ao momento linear, poder-se-ia pensar em defini-lo a partir da express˜ao m dr /dt = m v , pois as componentes de dr s˜ao as componentes espaciais de um tetravector; mas, embora m seja um invariante, dt n˜ao o ´e. De facto, as componentes de m v n˜ao se transformam como as componentes espaciais de um tetravector (o que est´a patente nas express˜oes de transforma¸c˜ao das velocidades obtidas em 10.1.3). Um invariante de Lorentz ´e a norma do tetravector dxµ , para a qual se obt´em à µ 1/2 (dx dxµ ) 2 2 1/2 = [(c dt) − |dr | ] à = c dt v2 1− 2 c = dt !1/2 = ¯ ¯ !1/2 ¯ dr ¯2 c − ¯¯ ¯¯ dt 2 c dt = c dt0 , γ (10.38) O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 335 onde dt0 ´e o intervalo de tempo pr´oprio. Utilizou-se, para escrever a u ´ltima igualdade, a express˜ao (10.26). Define-se ent˜ ao o tetravector momento linear atrav´es de pµ = m dxµ , dt0 (10.39) o qual, visto m e dt0 serem invariantes, possui as propriedades de transforma¸c˜ ao de dxµ , ou seja, as de um tetravector, como se pretende. Efectuando a opera¸c˜ao de deriva¸c˜ ao envolvida em (10.39), tem-se µ d dt dr dt p ≡m ( ct, r ) = c m ,m dt0 dt0 dt dt0 ¶ µ ou, dado que dt = γ dt0 , , pµ ≡ (γ m c , γ m v ) . (10.40) O quadrado da norma deste tetravector ´e pµ pµ = γ 2 m2 (c2 − v 2 ) = m2 c2 , (10.41) que ´e um invariante. De (10.37) e introduzindo o vector (tridimensional) momento linear atrav´es de p = γ m v , obt´em-se à µ p ≡ mc mv p ,p 2 2 1 − v /c 1 − v 2 /c2 ! µ 0 = (p , p) = ¶ E ,p c . (10.42) A componente zero ou temporal do tetramomento linear ´e a energia dividida por c. No referencial S0 a part´ıcula est´a em repouso e o seu tetravector momento linear ´e p0µ ≡ (m c , 0) . (10.43) Note-se que : • O quadrado da norma deste tetravector conduz ao resultado (10.41), como ´e natural: p0µ p0µ = m2 c2 = pµ pµ ; • A partir de (10.43) e de (10.42) pode confirmar-se, explicitamente que se tem, de acordo com (10.18), p0µ = Lµν pν . Note-se a semelhan¸ca da express˜ao de pµ com a de j µ [ver (10.36)] e a de p0µ com a de (10.35). A estrutura dos tetravectores ´e a mesma, mas no momento linear surge o invariante m e na densidade de corrente o invariante ρ0 ; • De (10.42) e (10.41) ainda se pode obter a rela¸c˜ ao entre o momento linear tridimensional (cujo m´odulo se designa por p) e a energia: E 2 = m2 c4 + p2 c2 . A transforma¸c˜ao geral do tetravector momento linear (part´ıcula com momento linear p0 6= 0 no referencial S0 ) pode ser expressa de uma forma semelhante a (10.10):   p0 = p⊥ + γ (pk − v E/c2 )  E 0 = γ (E − v p ) . k 336 • ´tico Campo electromagne 10.3 TETRAVECTOR GRADIENTE O tetravector gradiente ou tetragradiente µ ∂µ ≡ (∂0 , ∂1 , ∂2 , ∂3 ) = ∂ ∂ ∂ ∂ , 1, 2, 3 0 ∂x ∂x ∂x ∂x ¶ µ = 1∂ ∂ ∂ ∂ , , , c ∂t ∂x ∂y ∂z ¶ (10.44) ´e um operador cujas propriedades de transforma¸c˜ ao s˜ao, como veremos nesta sec¸c˜ ao, as de um tetravector covariante, facto que j´a se est´a a antecipar ao colocar o ´ındice em baixo em ∂µ . Consideremos uma fun¸c˜ao escalar dependente apenas de x e de t, φ(t, x). Devido ao car´acter escalar da fun¸c˜ao, φ(t, x) = φ(t0 , x0 ). A varia¸c˜ ao desta fun¸c˜ ao no referencial S, quando se mant´em x fixo e se varia t de dt, ´e ∂φ dt . ∂t (10.45) ∂φ 0 ∂φ 0 dt + 0 dx . ∂t0 ∂x (10.46) dφ = Em S0 a varia¸c˜ao infinitesimal da fun¸c˜ ao ´e dφ = Como dx = 0, de (10.5) e (10.6) tem-se dt0 = γdt e dx0 = −γ β c dt. Substituindo estas rela¸c˜oes em (10.46), obt´em-se µ dφ = γ ¶ ∂φ ∂φ − β c 0 dt . 0 ∂t ∂x Desta express˜ao, e de (10.45), pode concluir-se que 1 ∂φ =γ c ∂t µ ¶ 1 ∂ ∂ − β 0 φ. 0 c ∂t ∂x (10.47) De modo an´alogo, pode estudar-se a varia¸c˜ ao de φ(x, t) em S, quando se mant´em t constante e se varia x de dx; recorrendo novamente a (10.5) e (10.6), agora com dt = 0, obt´em-se ∂φ =γ ∂x µ β ∂ ∂ − 0 ∂x c ∂t0 ¶ φ. (10.48) ∂ ∂ ∂ ∂ Quanto `as restantes derivadas, tem-se ∂y = ∂y 0 e ∂z = ∂z 0 . Usando este facto juntamente com (10.47) e (10.48) resumimos a lei de transforma¸c˜ ao do tetravector gradiente do modo seguinte:      ∂/∂x00 γ −βγ 0 0 ∂/∂x0   ∂/∂x1   −βγ 01  γ 0 0    ∂/∂x     = .       ∂/∂x2   0 0 1 0   ∂/∂x02  ∂/∂x03 0 0 0 1 ∂/∂x3 De uma forma mais sint´etica, fazendo uso da nota¸c˜ ao introduzida em (10.44), escreve-se ∂µ = Lνµ ∂ν0 . A transforma¸c˜ao inversa ´e ∂µ0 = Lµν ∂ν . O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 337 Esta ´e a lei de transforma¸c˜ao de um vector covariante [ver (10.19)]! O tetravector gradiente ´e, por excelˆencia, covariante. Repare-se que, se as derivadas do operador tetragradiente se referirem `as componentes do vector covariante xµ , resulta um tetravector contravariante. Podemos escrever, atendendo a (10.13) a (10.16), ∂µ ≡ (∂0 , ∇) ∂ µ ≡ (∂0 , −∇) . Quando o tetragradiente, ∂µ , actua num escalar, transforma-o num tetravector. Mas, `a semelhan¸ca do operador ∇ em trˆes dimens˜oes, o tetra-operador diferencial que estamos a considerar pode igualmente actuar num tetravector. Dado um tetravector aµ , definimos a sua tetradivergˆencia atrav´es de ∂ · a = ∂µ aµ . A tetradivergˆencia de um vector ´e um escalar de Lorentz3 : ∂µ aµ = ∂µ0 a0µ (tamb´em se tem, evidentemente, ∂ µ aµ = ∂ 0µ a0µ ). Em particular, se se considerar o tetravector densidade de corrente j µ ≡ (cρ, j ), a sua tetradivergˆencia ´e ∂µ j µ = ∂j µ ∂ρ = +∇·j. ∂xµ ∂t Esta express˜ao ´e igual a zero, pois trata-se da equa¸c˜ ao de continuidade, a qual pode ser escrita na forma ∂µ j µ = ∂ · j = 0 , v´alida em qualquer referencial de in´ercia. 10.3.1 Operador d’alembertiano O d’alembertiano, que se representa por , ´e o operador que se obt´em efectuando o produto escalar do tetra-operador diferencial ∂µ por si pr´oprio: = ∂µ ∂ µ = ∂0 ∂ 0 + ∂1 ∂ 1 + ∂2 ∂ 2 + ∂3 ∂ 3 = ∂0 ∂0 − ∂1 ∂1 − ∂2 ∂2 − ∂3 ∂3 1 ∂2 ∂2 ∂2 ∂2 = 2 2− 2− 2− 2 c ∂t ∂x ∂y ∂z 2 1 ∂ = 2 2 − ∇2 . c ∂t (10.49) Atendendo `a sua defini¸c˜ao, o operador d’alembertiano ´e um escalar de Lorentz. 10.4 O TETRAPOTENCIAL Aµ Na Sec¸c˜ao 2.5 obtivemos as eqs. (2.79) e (2.80) para os potenciais escalar e vector, respectivamente. Essas equa¸c˜oes resultaram directamente da pr´opria defini¸c˜ ao dos potenciais V e A a partir da sua rela¸c˜ao com os campos f´ısicos E e B [ver (2.70) e (2.71)], das equa¸c˜oes de Maxwell e da imposi¸c˜ao da chamada gauge de Lorentz (2.78), que voltamos aqui a escrever: 1 ∂V + ∇ · A = 0. c2 ∂t 3 (10.50) No espa¸co euclidiano tridimensional tamb´em a divergˆencia de um vector ´e um escalar e, por isso, independente do referencial. 338 • ´tico Campo electromagne Escrevamos tamb´em de novo as equa¸c˜ oes para V e A: 1 ∂2V ρ − ∇2 V = 2 2 c ∂t ²0 1 ∂2A − ∇2 A = µ0 j . c2 ∂t2 Utilizando o operador d’alembertiano (10.49), as equa¸c˜ oes anteriores podem ser escritas numa forma mais sucinta: ρ V = (10.51) ²0 A = µ0 j . (10.52) Usando ²0 = (c2 µ0 )−1 no segundo membro de (10.51) e atendendo a (10.36), obtemos V c A = µ0 (c ρ) = µ0 j 0 (10.53) = µ0 j . (10.54) Os segundos membros destas equa¸c˜ oes s˜ao (a menos de um factor constante µ0 ), respectivamente, as componentes temporal e espacial do tetravector contravariante j µ . Como o operador d’alembertiano ´e um escalar de Lorentz, segue-se que V /c e A devem ser as componentes temporal e espacial de um tetravector contravariante, ou seja, µ µ A ≡ V ,A c ¶ . As eqs. (10.53) e (10.54) podem ent˜ ao ser resumidas numa u ´nica equa¸c˜ ao: Aµ = µ0 j µ . (10.55) Relembre-se que esta equa¸c˜ao ´e v´alida na gauge de Lorentz (10.50), condi¸c˜ ao que se pode ainda expressar por ∂µ Aµ = ∂ · A = 0 e que ´e manifestamente invariante sob transforma¸c˜ oes de Lorentz. Fazendo uma transµ 0µ µ forma¸c˜ao de Lorentz em (10.55), A → A , j → j 0µ e o d’alembertiano n˜ao se modifica, pelo que, no referencial inercial S0 , a Eq. (10.55) toma a forma A0µ = µ0 j 0µ . Conclui-se que as leis do electromagnetismo — as quatro equa¸c˜ oes de Maxwell est˜ao contidas em (10.55) — tˆem a mesma forma em todos os referenciais de in´ercia. Veja-se como a nota¸c˜ ao relativista ´e econ´omica, informativa e elegante! Conhecido o tetrapotencial num dado referencial, digamos no referencial S0 , sabe-se como obter as suas componentes no referencial S. Basta invocar a regra de transforma¸c˜ ao para vectores contravariantes [ver (10.21)] para escrever de imediato: Aµ = Lνµ A0ν . Para cada uma das componentes, A0 A1 A2 A3 = = = = γ(A00 + βA01 ) γ(βA00 + A01 ) A02 A03 . O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 339 Exemplo 10.2: Transforma¸ c˜ ao dos potenciais produzidos por uma carga pontual Consideremos uma carga pontual q em repouso na origem do sistema S0 que, como temos sempre considerado, se desloca relativamente a S com velocidade constante, v, segundo o eixo dos x. Sabemos quais s˜ao os potenciais escalar e vector no referencial S0 : V0 = q = c A00 4π²0 r0 A0 = 0 , onde r0 ´e o m´odulo do vector posicional tridimensional de um ponto no referencial S0 , isto ´e, a distˆancia do ponto `a origem O0 do referencial. No referencial S, a componente temporal do tetrapotencial ´e A0 = V γq = 0 4π²0 c r c ⇒ V = γq 4π²0 r0 e a primeira componente espacial (as outras duas s˜ao nulas) ´e A1 = γβq . 4π²0 c r0 A= γqv . 4π²0 c2 r0 Em nota¸c˜ao vectorial, As express˜oes de A0 e de A est˜ ao escritas em fun¸c˜ ao de r0 , coordenadas no sistema S0 . ´ mais conveniente escrever o potencial em S em fun¸c˜ E ao das coordenadas neste referencial. Assim, usando as transforma¸c˜oes de Lorentz (10.2) a (10.4), obt´em-se r0 = q q x02 + y 02 + z 02 = γ 2 (x − vt)2 + y 2 + z 2 . (10.56) Finalmente, os potenciais escalar e vector em S s˜ao: V = A = 1 1 q p p 2 2 2 4π²0 1 − v /c γ (x − vt)2 + y 2 + z 2 v c2 V. (10.57) (10.58) Esta ´e uma forma particular dos potenciais de Li´enard-Wiechert que ser˜ao estudados no Cap´ıtulo 11. 10.5 ´ O TENSOR DO CAMPO ELECTROMAGNETICO A partir das componentes de Aµ podem determinar-se os campos E e B utilizando B = ∇×A E = −∇V − (10.59) ∂A . ∂t (10.60) A componente x do campo de indu¸c˜ ao magn´etica ´e (recorde-se que ∂i = −∂ i , i = 1, 2, 3) Bx = ∂Az ∂Ay − = ∂2 A3 − ∂3 A2 = −∂ 2 A3 + ∂ 3 A2 . ∂y ∂z 340 • ´tico Campo electromagne Obtˆem-se express˜oes an´alogas para as outras componentes cartesianas de B : By = ∂ 1 A3 − ∂ 3 A1 Bz = ∂ 2 A1 − ∂ 1 A2 . Pode concluir-se que as componentes de B s˜ao componentes de um tensor de segunda ordem, o qual ´e obtido a partir de dois vectores contravariantes: ∂ µ e Aµ . Esse tensor contravariante de segunda ordem ´e definido atrav´es de F µν = ∂ µ Aν − ∂ ν Aµ , e chama-se tensor do campo electromagn´etico. A partir da express˜ao anterior, reconhece-se, de imediato, que ´e um tensor anti-sim´etrico: F µν = −F νµ . Esta propriedade permite reduzir o n´ umero de componentes independentes do tensor. Assim, das dezasseis componentes iniciais, quatro — as componentes diagonais — s˜ao nulas e dos restantes doze elementos s´o seis s˜ao independentes (os outros seis s˜ao sim´etricos destes). Acab´amos de ver que trˆes dos seis elementos independentes s˜ao as componentes do campo de indu¸c˜ao magn´etica: Bx = F 32 = −F 23 By = F 13 = −F 31 Bz = F 21 = −F 12 . Os restantes trˆes elementos de F µν est˜ao directamente relacionados com as componentes do campo el´ectrico. A Eq. (10.60) pode ser escrita, em termos das componentes de Aµ , na forma ∂A E = −∇ A0 − 0 . c ∂x As componentes cartesianas do campo el´ectrico vˆem dadas por: Ex c Ey c Ez c = −∂1 A0 − ∂0 A1 = ∂ 1 A0 − ∂ 0 A1 = F 10 = −F 01 = ∂ 2 A0 − ∂ 0 A2 = F 20 = −F 02 = ∂ 3 A0 − ∂ 0 A3 = F 30 = −F 03 . O tensor F µν ´e escrito na seguinte forma matricial (µ = 0, 1, 2, 3 ´e o ´ındice de linha e ν = 0, 1, 2, 3 ´e o ´ındice de coluna), que resume os resultados obtidos:     ( F µν ) =  0 −Ex /c −Ey /c −Ez /c Ex /c 0 −Bz By Ey /c Bz 0 −Bx Ez /c −By Bx 0    .  (10.61) As equa¸c˜oes de Maxwell podem ser escritas usando este tensor: as que relacionam os campos com as fontes, ou seja, as eqs. (9.1) e (9.4), s˜ao dadas por ∂µ F µν = µ0 j ν ; O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 341 as outras duas [eqs. (9.2) e (9.3)] est˜ao contidas na express˜ao: ∂λ F µν + ∂ν F λµ + ∂µ F νλ = 0 . O tensor antissim´etrico de segunda ordem covariante Fµν tem uma forma matricial difer´ obtido a partir da sua forma contravariante usando o tensor da m´etrica ente de (10.61). E Fµν = gαµ gβν F αβ , tendo-se     ( Fµν ) =  0 Ex /c Ey /c Ez /c −Ex /c 0 −Bz By −Ey /c Bz 0 −Bx −Ez /c −By Bx 0    .  (10.62) De (10.61) e de (10.62), efectuando os c´alculos, conclui-se que à F µν Fµν E2 = 2 B2 − 2 c ! , (10.63) que ´e, por natureza, um escalar de Lorentz e, portanto, independente do referencial. 10.6 ˜ DOS CAMPOS LEI DE TRANSFORMAC ¸ AO ´ ˜ MAGNETICA ´ ELECTRICO E DE INDUC ¸ AO A lei de transforma¸c˜ao dos campos E e B obt´em-se a partir da lei de transforma¸c˜ ao de F µν . O tensor do campo electromagn´etico transforma-se do mesmo modo que o produto (antissimetrizado) de dois tetravectores, aµ bν − aν bµ . A Eq. (10.18) diz-nos como se transforma cada um destes tetravectores. Assim, continuando a admitir que S0 se move com velocidade vˆi relativamente a S, tˆem-se as seguintes express˜oes para as transformadas das componentes do tensor do campo electromagn´etico: • Componente F 10 = Ex /c F 010 = ∂ 01 A00 − ∂ 00 A01 = γ(∂ 1 − β∂ 0 )γ(A0 − βA1 ) − γ(∂ 0 − β∂ 1 )γ(A1 − βA0 ) = γ 2 (1 − β 2 ) [∂ 1 A0 − ∂ 0 A1 ] = ∂ 1 A0 − ∂ 0 A1 = F 10 ; (10.64) • Componente F 20 = Ey /c F 020 = ∂ 02 A00 − ∂ 00 A02 = ∂ 2 γ(A0 − βA1 ) − γ(∂ 0 − β∂ 1 )A2 = γ(∂ 2 A0 − ∂ 0 A2 ) − γβ(∂ 2 A1 − ∂ 1 A2 ) = γ (F 20 − βF 21 ) ; (10.65) • Componente F 30 = Ez /c F 030 = ∂ 03 A00 − ∂ 00 A03 = γ (F 30 − βF 31 ) ; (10.66) 342 • ´tico Campo electromagne • Componente F 21 = Bz F 021 = = = = ∂ 02 A01 − ∂ 01 A02 ∂ 2 γ(A1 − βA0 ) − γ(∂ 1 − β∂ 0 )A2 γ(∂ 2 A1 − ∂ 1 A2 ) − γβ(∂ 2 A0 − ∂ 0 A2 ) γ (F 21 − βF 20 ) ; (10.67) • Componente F 13 = By F 013 = ∂ 01 A03 − ∂ 03 A01 = γ (∂ 1 − β∂ 0 ) A3 − γ∂ 3 (A1 − βA0 ) = γ(F 13 − βF 03 ) ; (10.68) • Componente F 32 = Bx F 032 = ∂ 03 A02 − ∂ 02 A03 = ∂ 3 A2 − ∂ 2 A3 = F 32 . (10.69) Tendo em conta os resultados (10.64) a (10.66) [ver tamb´em (10.61)] podemos escrever as express˜oes para as componentes cartesianas do campo el´ectrico no referencial S0 : Ex0 = Ex Ey0 = γ (Ey − v Bz ) Ez0 = γ (Ez + v By ) . (10.70) (10.71) (10.72) As componentes cartesianas do campo de indu¸c˜ ao magn´etica no referencial S0 s˜ao obtidas a partir de (10.67) a (10.69): Bx0 = Bx By0 Bz0 (10.73) v Ez = γ (By + 2 ) c vEy = γ (Bz − 2 ) . c (10.74) (10.75) A escolha de eixos em S e S0 e da velocidade de S0 relativamente a S permite escrever: (v × E )y (v × E )z (v × B )y (v × B )z = −vEz = vEy = −vBz = vBy , pelo que as express˜oes (10.70) a (10.75) passam a ser dadas por Ex0 = Ex Ey0 = γ (E + v × B )y Ez0 = γ (E + v × B )z Bx0 = Bx µ By0 = γ B− ¶ c2 y ¶ v×E B− . c2 z µ Bz0 = γ v×E O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 343 Fazendo uma decomposi¸c˜ao do tipo (10.9) para o campo el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica, E = Ek + E⊥ , B = Bk + B⊥ , conclui-se que as componentes de E e B paralelas a v s˜ao as mesmas em ambos os referenciais: Ek0 = Ek e Bk0 = Bk ; e que as perpendiculares satisfazem µ E⊥0 = γ (E + v × B )⊥ e 0 B⊥ =γ B− v×E c2 ¶ . ⊥ A partir das express˜oes (10.70) a (10.75) pode o leitor certificar-se, efectuando os c´alculos, que B 2 − E 2 /c2 = B 02 − E 02 /c2 , ou seja, trata-se de um invariante [cf. Eq. (10.63)]. Ainda a partir de (10.70) a (10.75) pode mostrar que E · B = E 0 · B 0 . Exemplo 10.3: Condensador plano visto de dois referenciais de in´ ercia Considere-se um condensador plano, formado por duas placas quadradas de lado a separadas por uma distˆancia d ¿ a e carregado com carga Q. No sistema S o condensador est´a em repouso (Figura 10.2). Neste referencial, os campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao magn´etica s˜ao σ ²0 B = 0. ˆ =− E = − k Q ˆ ˆ k = Ez k ²0 a2 (10.76) (10.77) Suponhamos que o condensador est´a a ser visto de um referencial S0 que se desloca relativamente a S com velocidade constante v = v ˆi. Quais s˜ao os campos el´ectrico e de indu¸c˜ ao 0 magn´etica observados a partir do referencial S ? S ' z' + Q Q + + + E + v S z a + + + + + z = 0 z = x x ' d Figura 10.2. Condensador plano carregado observado a partir do referencial S (no qual est´ a em repouso) e do referencial S0 . 344 • ´tico Campo electromagne De acordo com as transforma¸c˜oes dos campos (10.70) a (10.75), tem-se: Ex0 = Ex = 0 (10.78) Ey0 Ez0 Bx0 = γ (0 + 0) = 0 (10.79) = γ (Ez + 0) = γ Ez (10.80) = Bx = 0 (10.81) By0 Bz0 µ ¶ vEz Ez = γ 0+v 2 =γ 2 c c = γ (0 + 0) = 0 . (10.82) (10.83) No referencial S0 o campo el´ectrico ´e mais intenso e aparece tamb´em um campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Vejamos como interpretar fisicamente estes resultados. O campo E 0 pode ser atribu´ıdo a uma densidade de carga σ 0 tal que σ0 . |E 0 | = ²0 A densidade n˜ao ´e invariante, isto ´e, σ 0 6= σ. Mas a carga total, Q, ´e a mesma vista de S ou de S0 : Q = σ A = σ 0 A0 , p sendo A = a2 a ´area das placas em S e A0 = a2 1 − v 2 /c2 a ´area das placas em S0 , que ´e menor do que A devido `a contrac¸c˜ao de Lorentz.4 Pode, ent˜ ao, escrever-se σ0 = γ σ = γQ . a2 Usando o resultado (10.76), chega-se a E0 = γ E , que ´e o resultado expresso por (10.80). Vejamos agora qual a origem do campo de indu¸c˜ ao magn´etica. Na placa em z = 0 surge uma densidade superficial de corrente κ0(1) = −σ 0 v = − a2 Qv ˆi , 1 − v 2 /c2 p pois a placa move-se, em rela¸c˜ao a S0 , com velocidade −v = −v ˆi. Para a outra placa, cuja carga total ´e −Q, a densidade superficial de corrente ´e κ0(2) = −κ0(1) = a2 Qv ˆi . 1 − v 2 /c2 p O campo de indu¸c˜ao magn´etica produzido por uma placa com a densidade de corrente uniforme κ tem grandeza constante µ0 κ B= . 2 Como as correntes nas placas tˆem a direc¸c˜ ao do eixo x, o campo de indu¸c˜ ao magn´etica tem a direc¸c˜ao do eixo y. Para z > 0 e para z < −d o campo total ´e nulo, pois os campos 4 Um lado do quadrado est´ a na direc¸ca ˜o do movimento e s´ o esse lado sofre a contrac¸ca ˜o. O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 345 produzidos por cada uma das placas s˜ao iguais em m´odulo mas tˆem sentidos opostos. Para a regi˜ao entre as placas os campos refor¸cam-se, obtendo-se B 0 = −µ0 a2 Qv jˆ = µ0 ²0 γ Ez v jˆ , 1 − v 2 /c2 p onde se fez uso da express˜ao (10.76). Recordando que µ0 ²0 = 1/c2 , obt´em-se, finalmente, B0 = γ vEz ˆ j, c2 que ´e a equa¸c˜ao expressa por (10.82). 10.7 O TETRAVECTOR FORC ¸A Em Mecˆanica Cl´assica a for¸ca ´e um vector dado por F = ddtp , ou, em termos das componentes, dpi Fi = . (10.84) dt Um vector assim definido n˜ao pode ser a parte espacial de um tetravector, pois, embora dpi sejam as componentes espaciais de um tetravector, dt n˜ao ´e um invariante de Lorentz. O problema ´e semelhante ao que se encontrou na Sec¸c˜ ao 10.2 aquando da defini¸c˜ ao do tetramomento linear. O que se faz agora ´e algo semelhante, isto ´e, define-se o tetravector for¸ca a µ partir de dp e o invariante dado por (10.38): ds , onde ds ´ ds = c dt = c dt0 , γ ou seja, dpµ (10.85) ds j´a ´e um tetravector contravariante. Vejamos qual ´e a rela¸c˜ ao entre as componentes espaciais deste tetravector e as componentes da for¸ca tridimensional (10.84). As componentes espaciais de (10.85) s˜ao dpi γ dpi γ fi = = = Fi i = 1, 2, 3 , ds c dt c pelo que c Fi = fi . γ fµ = Quanto `a componente temporal do tetravector for¸ca, e uma vez que p0 = E/c [ver (10.42)], f0 = dp0 γ dE = 2 . ds c dt (10.86) Para calcular a derivada da energia em ordem ao tempo diferencia-se o quadrado da norma de pµ [ver (10.42)], que ´e um invariante de Lorentz, obtendo-se 1 E dE = p · dp , c2 pelo que dE p dp = c2 · . dt E dt 346 • ´tico Campo electromagne Recordando que [ver (10.42)] E = γ m c2 e p = γ m v , e de (10.84), conclui-se que dE =v·F , dt e ent˜ao (10.86) vem f0 = γ v·F . c2 A componente zero da tetrafor¸ca est´a, pois, relacionada com o trabalho realizado por unidade de tempo sobre a part´ıcula. A tetrafor¸ca, em termos das suas componentes temporal e espaciais pode, finalmente, ser escrita da seguinte forma: à F ·v µ f ≡ c2 p 1 − v 2 /c2 , c p F 1 − v 2 /c2 ! . Consideremos a for¸ca de Lorentz [ver Eq. (2.65)] que actua numa part´ıcula com carga el´ectrica q, velocidade v e sujeita aos campos E e B , no referencial S: F = q(E + v × B ). (10.87) Pode mostrar-se (o que se deixa como exerc´ıcio ao leitor) que o tetravector for¸ca de uma part´ıcula de massa m sujeita `a for¸ca (10.87) ´e dado por fµ = q pν F νµ . mc Se no referencial inercial S0 a velocidade da part´ıcula for u0 (e n˜ao zero como se tem vindo a considerar) e os campos forem E 0 e B 0 , a for¸ca de Lorentz ser´a dada por F 0 = q ( E 0 + u0 × B 0 ) . A partir das leis de transforma¸c˜ao das velocidades e dos campos que vimos anteriormente neste cap´ıtulo, podem obter-se as leis de transforma¸c˜ ao das componentes da for¸ca de Lorentz. Mas, em geral, as leis de transforma¸c˜ ao do vector tridimensional for¸ca (10.84) s˜ao obtidas a partir das leis de transforma¸c˜ao do tetravector contravariante f µ . O resultado exprime-se, sucintamente, na forma γ v (F⊥0 · u0⊥ ) /c2 + F⊥0 ³ ´ , F = Fk0 + γ 1 + cv2 u0k onde v ´e a velocidade de S0 em rela¸c˜ ao a S. 10.8 10.8.1 PROBLEMAS RESOLVIDOS Equa¸c˜ ao de onda e transforma¸c˜ ao de Galileu Quest˜ ao Mostrar que a transforma¸c˜ao de Galileu n˜ao deixa invariante a equa¸c˜ ao de onda. O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 347 Resposta A equa¸c˜ao de onda 1 ∂2φ ∂2φ ∂2φ ∂2φ − − 2 − 2 =0 c2 ∂t2 ∂x2 ∂y ∂z (10.88) ´e, como se sabe, invariante sob transforma¸c˜ oes de Lorentz, mas n˜ao o ´e relativamente a transforma¸c˜oes de Galileu. A transforma¸c˜ ao de Galileu para os referenciais inerciais da Figura 10.1 ´e dada por t0 = t (10.89) 0 = x − vt (10.90) y 0 = y (10.91) z 0 = z. (10.92) x Podemos agora obter as leis de transforma¸c˜ ao das derivadas. Para a derivada em ordem a t, ∂ ∂t0 ∂ ∂x0 ∂ ∂y 0 ∂ ∂z 0 ∂ = + + + . ∂t ∂t ∂t0 ∂t ∂x0 ∂t ∂y 0 ∂t ∂z 0 Efectuando as derivadas parciais no membro direito desta equa¸c˜ ao usando (10.89) a (10.92), obt´em-se ∂ ∂ ∂ = 0 −v 0 . (10.93) ∂t ∂t ∂x De modo an´alogo se obt´em ∂ ∂t0 ∂ ∂x0 ∂ ∂y 0 ∂ ∂z 0 ∂ ∂ = + + + = , 0 0 0 0 ∂x ∂x ∂t ∂x ∂x ∂x ∂y ∂x ∂z ∂x0 (10.94) ∂ ∂ ∂ ∂ = 0, = 0. ∂y ∂y ∂z ∂z (10.95) e A equa¸c˜ao de onda ´e uma equa¸c˜ ao diferencial de segunda ordem, pelo que ´e necess´ario encontrar as leis de transforma¸c˜ao para as derivadas de segunda ordem. As segundas derivadas em ordem a x, a y e a z s˜ao obtidas directamente de (10.94) e (10.95): ∂2 ∂2 ∂2 ∂2 ∂2 ∂2 = , = , = . ∂x2 ∂x02 ∂y 2 ∂y 02 ∂z 2 ∂z 02 (10.96) De (10.93) determina-se a segunda derivada em ordem a t: ∂2 = ∂t2 µ ∂ ∂ −v 0 0 ∂t ∂x ¶µ ∂ ∂ −v 0 0 ∂t ∂x ¶ = 2 ∂2 ∂2 2 ∂ + v − 2 v . ∂t02 ∂x02 ∂x0 ∂t0 (10.97) Finalmente, substituindo (10.96) e (10.97) em (10.88), a equa¸c˜ ao de onda transforma-se do seguinte modo: 1 ∂2φ ∂2φ ∂2φ ∂2φ − − 2 − 2 =0 → c2 ∂t2 ∂x2 ∂y ∂z → 1 ∂2φ ∂2φ ∂2φ ∂2φ v2 ∂ 2φ 2 v ∂2φ − − − + − = 0. c2 ∂t02 ∂x02 ∂y 02 ∂z 02 c2 ∂x02 c2 ∂x0 ∂t0 A equa¸c˜ao de onda n˜ao fica invariante sob transforma¸c˜ oes de Galileu devido `a presen¸ca dos dois u ´ltimos termos no membro esquerdo da u ´ltima equa¸c˜ ao. 348 • ´tico Campo electromagne 10.8.2 Transforma¸c˜ ao de fontes e de campos Quest˜ ao Um fio rectil´ıneo, de sec¸c˜ao A, est´atico no referencial de in´ercia S e paralelo ao eixo x, ´e percorrido por uma corrente, sendo uniforme a densidade de corrente, j = −j ˆi. A densidade de carga ´e nula. a) Determinar a densidade de carga e de corrente num referencial S0 que se move relativamente a S com velocidade v = v ˆi; b) A partir das densidades de carga e de corrente em S e S0 obter os campos el´ectrico e de indu¸c˜ao magn´etica num ponto exterior ao fio em ambos os referenciais; c) Verificar que os campos obtidos na al´ınea b) satisfazem a lei geral de transforma¸c˜ ao dos campos perante uma transforma¸c˜ ao de Lorentz. Resposta Considera-se que o eixo da distribui¸c˜ ao de corrente no referencial S coincide com o eixo x desse referencial (eixo x0 de S0 ). a) O tetravector corrente no referencial S ´e j µ ≡ (c ρ, j ) = (0, −j, 0, 0) . As componentes do tetravector j 0µ s˜ao obtidas de (10.33):      j 00 j 01 j 02 j 03       =   γ −βγ 0 0 −βγ γ 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1      0 −j 0 0       =   βγj −γj 0 0    ,  o que permite escrever j 0µ ≡ (c ρ0 , j 0 ) = (βγj, −γj, 0, 0) . No referencial S0 a densidade de carga ´e ρ0 = e a densidade de corrente βγj , c j 0 = −γ j ˆi0 . b) Em S, o campo el´ectrico ´e nulo: Ex = 0 , Ey = 0 , Ez = 0 . No referencial S0 existe uma carga por unidade de comprimento dada por λ0 = ρ0 A = βγjA . c O electromagnetismo e a teoria da relatividade • 349 Num ponto fora da distribui¸c˜ ao, o campo el´ectrico s´o depende da distˆancia ao eixo x0 , sendo dado por (2.17). Essa express˜ao permite escrever à E 0 = = 0 λ0 y0 ˆ0 ˆ0 + p z p p j k 2 π ²0 y 02 + z 02 y 02 + z 02 y 02 + z 02 ³ ´ βγjA 0 ˆ0 0 ˆ0 y j + z k . 2 π c ²0 (y 02 + z 02 ) ! As componentes do campo el´ectrico no referencial S0 s˜ao: Ex0 = 0 (10.98) Ey0 = βγjA y0 βγjA y = 02 02 2 2 π c ²0 y + z 2 π c ²0 y + z 2 Ez0 = βγjA z0 βγjA z = . 02 02 2 2 π c ²0 y + z 2 π c ²0 y + z 2 (10.99) (10.100) Quanto aos campos de indu¸c˜ ao magn´etica nos referenciais S e S0 , apenas diferem de um factor γ, pois as densidades de correntes s´o diferem deste mesmo factor. No referencial S, num ponto fora da distribui¸c˜ ao de corrente, o campo de indu¸c˜ ao magn´etica ´e dado por [ver Eq. (2.48) com i = jA] µ jA B = − p0 2 2 π y + z2 à z ˆ ˆ+p y −p 2 j k y + z2 y2 + z2 ! . Assim, Bx = 0 (10.101) By = µ0 j A z 2 2π y + z 2 (10.102) Bz = − µ0 j A y 2 2π y + z 2 (10.103) e as componentes do campo de indu¸c˜ ao magn´etica no referencial S0 s˜ao Bx0 = 0 By0 = z0 z γµ0 j A γµ0 j A = 02 02 2 2π y + z 2π y + z 2 Bz0 = − γµ0 j A y0 γµ0 j A y =− ; 2π y 02 + z 02 2π y 2 + z 2 c) A lei geral referida no enunciado ´e expressa pelas eqs. (10.70) a (10.75). As eqs. (10.70) e (10.73) verificam-se trivialmente, pois as componentes x dos campos s˜ao nulas nos dois referenciais. Com Ey = 0, a Eq. (10.71) ´e escrita do seguinte modo: Ey0 = −vγBz , equa¸c˜ao que ´e confirmada usando (10.99) e (10.103). A Eq. (10.72) vem Ez0 = vγBy , equa¸c˜ao que ´e confirmada usando (10.100) e (10.102). As eqs. (10.74) e (10.75) s˜ao igualmente verificadas pelas componentes dos campos magn´eticos em ambos os referenciais de in´ercia. CAP´ITULO 11 ˜ RADIAC ¸ AO Este cap´ıtulo ´e uma introdu¸c˜ ao `a teoria cl´assica da radia¸c˜ ao. Come¸camos por obter os chamados potenciais retardados como solu¸c˜ oes das equa¸c˜ oes para os potenciais escalar e vector. Estuda-se, a seguir, o dipolo el´ectrico oscilante, determinando os respectivos campos el´ectrico e magn´etico. Faz-se finalmente referˆencia `a radia¸c˜ ao do quadrupolo el´ectrico linear. Mas ainda antes de encontrar a solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao para o potencial escalar V que, na gauge de Lorentz, se escreve [ver (2.79)] 1 ∂2V ρ , − ∇2 V = 2 2 c ∂t ²0 (11.1) referir-nos-emos `a correspondente equa¸c˜ ao independente do tempo — a equa¸c˜ ao de Poisson. 11.1 ˜ DE POISSON (AINDA) A EQUAC ¸ AO No caso de uma distribui¸c˜ao est´atica de cargas, a solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao de Poisson ´e o potencial electrost´atico (2.12): 1 V (r ) = 4π²0 Z v ρ(r 0 ) dv . a (11.2) Relembra-se que a = r − r 0 e que a integra¸c˜ ao se efectua sobre as coordenadas r 0 da distribui¸c˜ao de cargas que ocupam o volume v. A express˜ao (11.2) foi introduzida de uma forma natural no Cap´ıtulo 2: ela cont´em a lei de Coulomb e o princ´ıpio de sobreposi¸c˜ ao. ´ importante demonstrar matematicamente que a fun¸c˜ E ao dada por (11.2) ´e, de facto, a solu¸c˜ ao da Eq. (11.1), a qual, no caso est´atico, se reduz `a equa¸c˜ ao de Poisson: −∇2 V = ρ . ²0 (11.3) 352 • ´tico Campo electromagne Fazendo uso de (11.2), o primeiro membro de (11.3) vem 1 −∇ V = − 4π²0 µ ¶ Z 0 2 v 1 a 2 ρ(r )∇ dv , (11.4) pois o operador ∇2 , que se refere `as coordenadas r , pode passar para dentro do integral, actuando apenas em 1/a. Observe-se novamente a Figura 2.2 e considerem-se as duas situa¸c˜ oes seguintes: na primeira, o ponto P est´a fora do volume onde existe a distribui¸c˜ ao das cargas; no segundo caso, P pertence a esse volume v. Analisa-se a seguir cada um destes casos. 11.1.1 Ponto fora da distribui¸c˜ ao volum´ etrica de carga Nesta situa¸c˜ao, o denominador de 1/a nunca se anula e esta fun¸c˜ ao nunca diverge. O laplaciano pode ser obtido a partir da divergˆencia do gradiente: µ ¶ 1 a 2 ∇ µ ¶ 1 a =∇·∇ . (11.5) Ora, em geral (n ´e um inteiro qualquer), ∇ µ ¶n 1 a =− n an+1 ∇a = − tendo-se utilizado ˆ= ∇a = a n an+1 ˆ =− a n an+2 a, (11.6) a . (11.7) a O resultado (2.28) ´e um caso particular de (11.6) com n = 1. Recorda-se tamb´em que ∇ · a = ∇ · r = 3. Retomando ent˜ao (11.5), e usando os resultados que acab´amos de referir, µ ¶ 2 ∇ 1 a µ = −∇ · a ¶ · µ 1 1 =− 3 ∇·a+a·∇ 3 a a a3 ¸ 3 3 = − 3 − 5a · a a a = 0, · A Eq. (11.4) reduz-se, pois, a se a 6= 0 . ¶¸ (11.8) ∇2 V = 0 , que ´e a equa¸c˜ao de Laplace. Este resultado ´e o esperado, pois a densidade de carga em P ´e nula. 11.1.2 Ponto no interior da distribui¸c˜ ao volum´ etrica de carga Nesta situa¸c˜ao conv´em considerar o volume v subdividido no volume v 0 , que n˜ao inclui o ponto P, e no volume v0 , que cont´em esse ponto. Os dois volumes s˜ao arbitr´arios, excepto no facto de v = v 0 + v0 . O integral em (11.4) pode ser decomposto na soma de dois integrais: um, sobre v 0 , que ´e nulo, pois, para todos os pontos de v 0 , a 6= 0 e o resultado (11.8) volta a aplicar-se; o outro, sobre v0 , vai ser calculado de seguida. A express˜ao (11.4) fica simplesmente 1 −∇ V = − 4π²0 µ ¶ Z 0 2 v0 2 ρ(r )∇ 1 a dv . ˜o Radiac ¸a • 353 O volume v0 pode ser t˜ao pequeno quanto se queira. Pode ser, por exemplo, uma esfera de raio a, considerando-se o limite a → 0. A este limite corresponde r 0 → r , pelo que a fun¸c˜ ao ρ passa para fora do integral: µ ¶ Z 1 1 ∇2 −∇2 V = − ρ(r ) dv . (11.9) 4π²0 a v0 Consideremos apenas o integral em (11.9): µ ¶ µ ¶ Z Z 1 1 ∇2 dv = ∇·∇ dv . a a v0 v0 O gradiente ´e calculado usando (11.6) e como, por outro lado, ∇ = −∇0 , tem-se, aplicando o teorema de Gauss, µ ¶ I Z Z a a 2 1 ∇ dv = ∇0 · 3 dv = · dS , 3 a a S0 a v0 v0 ˆ , pelo que dS = onde S0 ´e a superf´ıcie esf´erica que delimita v0 , cuja normal exterior ´e −a ˆ dS. Assim, o integral anterior ´e simplesmente igual a −4π: −a µ ¶ Z 2 1 dv = −4π , se a = 0 em v0 . (11.10) ∇ a v0 A Eq. (11.9) passa a ser escrita na forma ρ(r ) (11.11) ²0 e fica, assim, demonstrado que (11.2) ´e solu¸c˜ ao de (11.1) no caso est´atico. Ainda relativamente a ∇2 (1/a), atendendo aos resultados (11.8) e (11.10), pode concluir-se que µ ¶ µ ¶ 1 2 2 1 =∇ = − 4 π δ(r − r 0 ) , ∇ a |r − r 0 | onde se introduziu a fun¸c˜ao delta de Dirac no espa¸co tridimensional. De uma maneira geral, ∇2 V = − ( µ ¶ Z v f (r 0 ) ∇2 1 a dv = 0, −4π f (r ) , se a nunca se anula em v se a = 0 em v . (11.12) No caso do potencial vector, A, a respectiva equa¸c˜ ao na gauge de Lorentz ´e [ver (2.80)] 1 ∂2A (11.13) − ∇2 A = µ0 j . c2 ∂t2 Em regime estacion´ario, a derivada temporal nesta equa¸c˜ ao ´e nula e a sua solu¸c˜ ao ´e dada por (2.31): Z µ j (r 0 ) dv A(r ) = 0 . 4π v a Esta express˜ao, que no Cap´ıtulo 2 foi apresentada como consequˆencia da lei de Biot-Savart e do princ´ıpio de sobreposi¸c˜ao, pode ser obtida matematicamente como solu¸c˜ ao de (11.13) em regime estacion´ario, tal como se fez para o potencial escalar. 11.2 POTENCIAIS RETARDADOS Admita-se agora que a densidade de carga varia com o tempo, isto ´e, que ρ = ρ(r 0 , t), e considere-se outra vez a Figura 2.2. Se houver uma modifica¸c˜ ao da carga em P0 , cujo vector 0 posicional ´e r , no instante t, a correspondente modifica¸c˜ ao no potencial escalar V , em P, s´o pode ter lugar decorrido o intervalo de tempo1 a/c. Por outras palavras, a informa¸c˜ao n˜ao 1 Consideramos sempre o vazio, onde a velocidade de propaga¸ca ˜o da luz ´e c. 354 • ´tico Campo electromagne se propaga instantaneamente e o potencial em P no instante t depende da carga que existia em P0 no instante t − ac . Considere-se que a densidade de carga que se distribui num volume v varia com o tempo segundo ρ(r 0 , t) = ρ0 (r 0 ) ei ω t . (11.14) ´ natural admitir que o potencial em P seja dado por E Z 1 V (r , t) = 4π²0 v ρ0 (r 0 ) eiω(t− c ) dv . a a (11.15) Notemos o seguinte: • A express˜ao do potencial retardado (11.15) — cuja plausibilidade assenta afinal no princ´ıpio da causalidade — ´e uma generaliza¸c˜ ao de (11.2). • Pode considerar-se uma dependˆencia temporal para a densidade de carga diferente da oscila¸c˜ao harm´onica expressa por (11.14). Por´em, esta escolha n˜ao ´e restritiva, pois qualquer outra dependˆencia pode ser expressa como uma combina¸c˜ ao linear de dependˆencias harm´onicas com diferentes frequˆencias, tendo-se, ent˜ ao, uma s´erie ou um integral de Fourier. Resta demonstrar matematicamente que (11.15) ´e, na realidade, solu¸c˜ ao da Eq. (11.1). ´ conveniente reescrever a Eq. (11.15), de modo a introduzir a parte espacial do potencial E escalar que designamos por ϕ(r ). Assim, i ωt V (r , t) = e 1 4π²0 Z v ρ0 (r 0 ) e−i a ωa c dv = ei ωt ϕ(r ) . (11.16) O c´alculo da segunda derivada em ordem ao tempo que aparece em (11.1) ´e imediato: 1 ∂2V ω 2 iωt = − e ϕ(r ) = −k 2 V (r , t) , c2 ∂t2 c2 (11.17) tendo sido introduzido o n´ umero de onda k = ω/c [ver (9.36)]. Por outro lado, −∇2 V (r , t) = −ei ωt ∇2 ϕ(r ) . (11.18) No segundo membro, o operador laplaciano actua nas coordenadas r , pelo que, de (11.16), 1 ∇ ϕ(r ) = 4π²0 à Z 2 0 v 2 ρ0 (r ) ∇ e−i k a a ! dv . (11.19) Para calcular o laplaciano conv´em obter, em primeiro lugar, o gradiente da fun¸c˜ ao e depois tomar a divergˆencia desse resultado. Assim, à e−i k a ∇ a ! · µ ¶¸ −i k 1 = ∇a + ∇ a a e− i k a e, tomando a divergˆencia, à 2 ∇ e−i k a a ! · = µ ¶ µ ¶¸ −i k 2 1 1 ∇ a − i k ∇a · ∇ + ∇2 a a a · µ ¶¸ −ik 1 −i k ∇a + ∇ · ∇ a e− i k a . a a e−i k a (11.20) ˜o Radiac ¸a • 355 Esta express˜ao simplifica-se usando (11.6), (11.7), e 2 ∇ a = ∇ · (∇a) = ∇ · a a = ∇·a a µ ¶ +a·∇ 1 a 3 a·a 2 − 3 = . a a a = A Eq. (11.20) fica, ent˜ao, à 2 ∇ e−i k a a ! " = µ ¶ a 1 2 ˆ · 3 + ∇2 −i k 2 + i k a a a a # k2 a ˆ e−i k a − + ik 3 · a a a µ ¶ = −k 2 e−i k a 1 + e−i k a ∇2 a a . Substituindo em (11.19) e o resultado em (11.18), µ ¶ Z ei ω t 1 −∇ V (r , t) = k e ϕ(r ) − ρ0 (r 0 ) e−i k a ∇2 4 π ²0 a i ωt ρ ( r ) e 0 = k 2 V (r , t) + ²0 ρ( r , t) . = k 2 V (r , t) + ²0 2 2 iωt dv (11.21) Para se chegar a esta express˜ao utilizou-se (11.12) e ainda a express˜ao da densidade de carga (11.14). Finalmente, somando (11.21) e (11.17) membro a membro obt´em-se a Eq. (11.1). Fica assim demonstrado matematicamente, tal como pretend´ıamos, que o potencial retardado (11.15) ´e solu¸c˜ao da Eq. (11.1). Em geral, pode escrever-se o potencial escalar retardado na forma V (r , t) = 1 4π²0 Z v ρ[r 0 , t] dv , a (11.22) onde a nota¸c˜ao ρ[r 0 , t] significa que a fun¸c˜ ao ´e tomada no ponto r 0 mas no instante t − ac . Quanto ao potencial vector, a solu¸c˜ ao da Eq. (11.13) ´e an´aloga a (11.22) µ A(r , t) = 0 4π Z v j [r 0 , t] a dv , (11.23) que ´e o potencial vector retardado. Exemplo 11.1: Potenciais de Li´ enard-Wiechert As express˜oes dos potenciais retardados, embora formalmente simples, envolvem integrais nem sempre f´aceis de calcular. Mas no caso de uma carga pontual movendo-se com velocidade u, os integrais resolvem-se analiticamente e os potenciais resultantes designam-se por ´ essa a situa¸c˜ potenciais de Li´enard-Wiechert. E ao que vamos considerar neste exemplo. Considere-se ent˜ao uma carga pontual, q, que se desloca sobre a traject´oria2 representada na Figura 11.1. 2 N˜ ao importa considerar as for¸cas que actuam sobre a part´ıcula carregada, mas apenas que ela se desloca segundo uma certa traject´ oria. 356 • ´tico Campo electromagne D D * r '( t) a r '* = r '( t * ) P r O Figura 11.1. Traject´ oria da carga pontual. O ponto D indica a “posi¸ c˜ ao presente”, o ponto D∗ a “posi¸ c˜ ao retardada” e P ´ e o ponto onde se pretendem conhecer os potenciais. Um ponto da traject´oria descrita pela carga ´e dado pelo vector posicional r 0 relativamente a uma origem O3 . Para se conhecer o potencial num ponto P, cujo vector posicional ´e r relativamente `a mesma origem, num certo instante t, importa a posi¸c˜ ao da carga no “instante retardado”, t∗ . Nesse instante a carga ocupa a “posi¸c˜ ao retardada” D∗ , algures sobre a traject´oria, de tal modo que o tempo que a part´ıcula demora desde esse ponto at´e D — o ponto onde a part´ıcula est´a no instante t — ´e igual ao tempo que a luz demora de D∗ at´e P. O vector posicional do “ponto retardado”, r 0 (t∗ ) ´e designado por r∗0 e o instante retardado ´e, pois, |r − r∗0 | . t∗ = t − c A densidade de carga que interv´em na Eq. (11.22) exprime-se em termos da fun¸c˜ ao delta de Dirac, pois a carga ´e pontual: ρ[r 0 , t] = q δ(r 0 − r∗0 ) = q δ[r 0 − r 0 (t∗ )] · µ ¶¸ |r − r∗0 | = q δ r0 − r0 t − . c (11.24) Inserindo a densidade de carga (11.24) no potencial escalar retardado (11.22), este escrevese, explicitamente, na forma V (r , t) = q 4π²0 Z δ(r 0 − r∗0 ) dv . |r − r 0 | (11.25) Poder-se-ia pensar, `a primeira vista, que, devido `a fun¸c˜ ao delta de Dirac, o integral nesta express˜ao seria simplesmente 1/a, com a = |r − r∗0 |. Ora, tal n˜ao ´e correcto, pois em (11.25), o aveis sobre as quais se integra. Formalvector r∗0 n˜ao ´e constante, mas fun¸c˜ao das pr´oprias vari´ mente, uma adequada transforma¸c˜ao de coordenadas permite resolver o integral. Contudo, ´e mais interessante abordar o problema numa perspectiva “f´ısica”, o que envolve a considera¸c˜ ao de um modelo para a distribui¸c˜ao da carga. Considere-se, ent˜ao, que a carga q est´ a distribu´ıda uniformemente num cilindro de base A e altura h e que a traject´oria da “part´ıcula” ´e rectil´ınea, com velocidade u constante segundo uma direc¸c˜ao que passa pelo ponto P. A situa¸c˜ ao est´a representada na Figura 11.2. Designamos por r 0 um ponto gen´erico da traject´ oria da part´ıcula carregada e n˜ ao necessariamente o ponto onde ela est´ a. 3 ˜o Radiac ¸a A D * u a • 357 P h Figura 11.2. Distribui¸ c˜ ao de carga num cilindro de base A e altura h que se move com velocidade u. Com base neste modelo simples para a distribui¸c˜ ao de carga, mas que ret´em todos os aspectos f´ısicos que importa considerar, vamos calcular V (r , t) = 1 4π²0 Z ρ[r 0 , t] dv . |r − r 0 | (11.26) O integral pode ser substitu´ıdo por um somat´orio, V (r , t) = N 1 X ρi ∆vi , 4π²0 i=1 ai (11.27) onde ∆vi s˜ao elementos de volume (suficientemente pequenos), ρi = q/(A h) ´e a densidade de carga, constante, em cada elemento de volume, e, no denominador, ai ´e a distˆancia do ´ conveniente considerar, para elementos de volume, elemento de volume i ao ponto P. E cilindros com ´area de base A e altura w: ∆vi = Aω como se mostra na Figura 11.3. Quando se efectua o somat´orio em (11.27), h´a um aspecto crucial a ter em conta: tˆem de ser considerados instantes diferentes e n˜ao um s´o instante, como seria o caso se o cilindro estivesse parado. De facto, a informa¸c˜ao proveniente da distribui¸c˜ ao de carga que chega ao ponto P no mesmo instante t partiu em instantes diferentes das diferentes fatias do cilindro. Para i = 1, o instante a considerar ´e t∗1 = t − a1 /c, pois o elemento de carga est´a `a distˆancia a1 de P; para i = 2, o elemento de volume ∆v2 est´ a a uma distˆancia diferente a2 e o instante retardado ∗ ´e t2 = t − a2 /c, e assim sucessivamente. Na Figura 11.3 representa-se o volume cil´ındrico, de ´area de base A e altura d, que o cilindro de carga da Figura 11.2 “varre” no intervalo de tempo ∆t = t∗N − t∗1 . Indicam-se na mesma figura os N volumes elementares que devem ser considerados no somat´orio (11.27). Na Figura 11.4 pormenoriza-se a posi¸c˜ ao dos cilindros elementares. Na situa¸c˜ ao ai À h podem ser consideradas todas as distˆancias ai , no denominador de (11.27), iguais a a, que ´e a distˆancia, digamos, do ponto m´edio do cilindro de carga ao ponto P, quando este ocupa a posi¸c˜ao retardada m´edia. O potencial escalar (11.27) vem ent˜ ao V (r , t) = N q Nw 1 X ρAw = . 4π²0 i=1 a 4 π ²0 a h (11.28) Sublinha-se novamente que N w n˜ ao ´e a altura h do cilindro de carga, mas sim esta altura mais o deslocamento do cilindro no intervalo de tempo ∆t = t∗N − t∗1 , que ´e a diferen¸ca entre 358 • ´tico Campo electromagne w A P 1 2 3 i N d Figura 11.3. Volume cil´ındrico, seccionado em N cilindros elementares, ocupado pela carga durante o intervalo de tempo compreendido entre os instantes retardados t∗1 e t∗N . os instantes retardados relativos ao primeiro cilindro elementar e ao u ´ltimo cilindro elementar que entram no somat´orio da Eq. (11.28). Este intervalo de tempo ´e4 µ ∆t = t∗N − t∗1 aN = t− c ¶ µ a1 − t− c ¶ = a1 − aN d = , c c (11.29) onde d = N w ´e a distˆancia indicada na Figura 11.4: N w = d = u ∆t + h . (11.30) Eliminando ∆t de entre (11.29) e (11.30), encontra-se d Nw 1 = = . h h 1 − u/c (11.31) Substituindo em (11.28), obt´em-se V (r , t) = N 1 X ρAw q 1 = . 4π²0 i=1 a 4 π ²0 a 1 − u/c (11.32) Repare-se que este resultado ´e independente do modelo utilizado, ou seja, da geometria particular escolhida para a distribui¸c˜ ao da carga. Seria o mesmo se se considerasse outra qualquer distribui¸c˜ao de carga e, em particular, ´e v´alido para a carga pontual. Outro aspecto que importa sublinhar ´e a altera¸c˜ao pelo factor cinem´atico (11.31) do potencial criado pela part´ıcula em repouso que ´e simplesmente da forma 1/a. Se a traject´oria da part´ıcula for arbitr´aria e u a sua velocidade no instante retardado t∗ , a express˜ao anterior toma a forma V (r , t) = q 1 , 4 π ²0 a − a · u/c (11.33) pois s´o importa a componente da velocidade u na direc¸c˜ ao de a. O potencial vector obt´em-se de forma idˆentica ao escalar. A densidade de corrente a usar em (11.23) ´e j = ρ u, e o integral a resolver ´e igual ao que encontr´ amos para o potencial escalar. O potencial vector ´e q u A(r , t) = , (11.34) 4 π ²0 c2 a − a · u/c 4 Note-se que, agora, ´e crucial n˜ ao considerar todos os ai iguais! ˜o Radiac ¸a a 1 a 2 u a u D t • 359 P P 3 P h a N P d Figura 11.4. Esquema da posi¸ c˜ ao dos cilindros elementares quando se efectua o somat´ orio na Eq. (11.27). Os potenciais (11.33) e (11.34) s˜ao os potenciais de Li´enard-Wiechert. No caso em que a carga pontual se desloca segundo a direc¸c˜ ao x com velocidade v, ou seja, para u = v ˆi, reencontram-se as express˜oes (10.57) e (10.58) para os potenciais escalar e vector. A partir dos potenciais (11.33) e (11.34) podem determinar-se os campos el´ectricos e de indu¸c˜ao magn´etica produzidos por uma carga pontual em movimento. No Problema 11.5.1 obtˆem-se, noutra perspectiva, os potenciais de Li´enard-Wiechert. 11.3 ˜ DO DIPOLO ELECTRICO ´ RADIAC ¸ AO Consideremos um dipolo el´ectrico, de comprimento s, tal como se mostra na Figura 4.1, mas agora com as cargas Q e −Q vari´ aveis no tempo. Admitamos que essa dependˆencia ´e do tipo Q = Q0 ei ω t . (11.35) Recorde-se o que se disse na sec¸c˜ao anterior a prop´osito da dependˆencia oscilat´oria no tempo considerada para a densidade de carga em (11.14): tamb´em aqui n˜ao h´a qualquer restri¸c˜ ao ao considerar-se uma dependˆencia temporal desta forma, pois outra qualquer pode sempre ser reproduzida `a custa de uma sobreposi¸c˜ ao adequada de dependˆencias harm´onicas do tipo (11.35), com frequˆencias diferentes. O momento dipolar do dipolo ´e p = p0 ei ω t , (11.36) 360 • ´tico Campo electromagne onde p0 = Q0 s — ver (4.7) — com s o vector dirigido de −Q para Q. Nestas condi¸c˜ oes, o potencial em P (ver Figura 4.1) ´e dado por  1  Q0 e (t− V (r , t) = 4π²0 r− iω r− c ) Q0 e (t− − r+ iω r+ c )  , (11.37) que ´e a generaliza¸c˜ao de (4.1) quando h´a uma dependˆencia temporal nas cargas como a dada por (11.35). Em geral, a regi˜ao que importa considerar ´e tal que s ¿ r, pelo que se pode tomar o desenvolvimento (4.5), truncando-o no termo linear em s/r: µ 1 1 s ' 1∓ cos θ r± r 2r ¶ (11.38) . Usando (11.38) em (11.37) e recordando que ω/c = k, V (r , t) ' Q 0 ei ω t 4 π ²0 r ·µ ¶ 1+ µ ¶ ¸ s s cos θ e−i k r− − 1 − cos θ e−i k r+ . 2r 2r (11.39) De (11.38), e recordando que (1 ± x)−1 = 1 ∓ x + ..., obt´em-se µ r± ' r 1 ± s cos θ 2r ¶ , (11.40) pelo que, no quadro desta aproxima¸c˜ ao, as exponenciais em (11.39) vˆem e−ikr∓ ' e−ikr e±i sk 2 cos θ . (11.41) Substituindo em (11.39), desenvolvendo as exponenciais que dependem de s e retendo apenas at´e termos lineares nesta quantidade (o que pressup˜oe s ¿ 1/k), isto ´e, e±i sk 2 cos θ '1 ± i sk cos θ , 2 obt´em-se Q0 ei (ωt−kr) V (r , t) ' 4 π ²0 r ·µ s 1+ cos θ 2r ¶µ ¶ µ sk s 1 + i cos θ − 1 − cos θ 2 2r ¶µ sk 1 − i cos θ 2 ¶¸ , de onde resulta, em ordem s, µ ¶ Q0 ei (ωt−kr) s + i s k cos θ 4 π ²0 r r µ ¶ p0 k ei (ωt−kr) 1 + i cos θ , 4 π ²0 r kr V (r , t) ' = (11.42) tendo-se feito uso da igualdade p0 = Q0 s acima referida. Quando a frequˆencia ω → 0, tamb´em k → 0 e k1r + i ∼ k1r ; neste caso, recupera-se o resultado expresso por (4.8). Considerando a parte imagin´aria integralmente na exponencial, a Eq. (11.42) passa a ser escrita na forma5 p0 k V (r , t) = 4 π ²0 r µ 1 1+ (kr)2 ¶1/2 cos θ e i [ωt−kr+arctan(kr)] . ˜o Radiac ¸a • 361 z A s q r Figura 11.5. Potencial vector A criado por corrente que flui no fio condutor de comprimento s. Conclui-se daqui que a velocidade de fase j´a n˜ao ´e c, pois arctan(kr) n˜ao ´e constante. Os ao na chamada regi˜ ao da radia¸c˜ ao.6 Nesta pontos a distˆancias do dipolo tais que r À k1 est˜ regi˜ao, arctan(kr) ' π2 e a velocidade de fase ´e c. Analisemos de seguida o potencial vector A. A varia¸c˜ao das cargas no dipolo pode ser atribu´ıda a uma corrente que flui entre elas, isto ´e, ao longo de s que ´e, por exemplo, um fio condutor (Figura 11.5). Essa corrente ´e obtida derivando (11.35), isto ´e, dQ I= = i ω Q0 ei ωt = I0 ei ωt . (11.43) dt O vector A ´e dado por (2.33), embora agora o integral se reduza ao segmento de comprimento (pequeno) s. Assim7 r µ I e−i (t− c ) iµ ωp ˆ. A(r , t) = 0 0 s = 0 0 e−i (t− c ) k 4π r 4πr r (11.44) ˆ = cos θ e ˆ r − sin θ e ˆθ , Atendendo a que k A(r , t) = i µ0 ω p0 ei (ωt−kr) ˆ r − sin θ e ˆθ) , (cos θ e 4πr (11.45) que ´e o potencial vector associado ao dipolo el´ectrico oscilante. Note-se, finalmente, que, atendendo a (11.43) e `a defini¸c˜ ao p0 = Q0 s, se pode escrever o momento dipolar (11.36) na forma p = −i 5 I0 i ωt e s. ω (11.46) Vamos passar a usar o sinal “=” em vez do sinal “'”, embora se n˜ ao deva esquecer que as express˜ oes s˜ ao v´ alidas apenas para regi˜ oes afastadas do dipolo (s ¿ r). 6 A condi¸ca ˜o que define a regi˜ ao da radia¸ca ˜o pode tamb´em ser expressa por r À ¯ λ com ¯ λ = 1/k [ver (9.37)]. 7 O potencial dado pela Eq. (11.44) ´e finito. No caso do dipolo, p = limQ0 →∞ ,s→0 Q0 s ei ωt ´e finito e, por ˆ tamb´em ´e finito. isso, I s = i ω Q s = i ω p k 362 • ´tico Campo electromagne 11.3.1 Os campos el´ ectrico e magn´ etico O campo intensidade magn´etica H obt´em-se a partir do potencial vector (11.45). Considera-se o dipolo no vazio e, por isso, H = µ10 ∇ × A. Como o vector A ´e uma fun¸c˜ao ˆ r + Aθ (r, θ) e ˆ θ , ´e conveniente considerar a express˜ao do rotacional da forma A = Ar (r, θ) e em coordenadas esf´ericas. Assim, · H= ¸ 1 1 ∂(r Aθ ) ∂Ar ˆφ . ∇×A= − e µ0 µ0 r ∂r ∂θ Calculadas as derivadas das componentes do potencial vector A — que podem ser obtidas a partir da express˜ao (11.45) — obt´em-se µ H= ω p0 k i (ωt−kr) 1 e i −1 4πr kr ¶ ˆφ . sin θ e (11.47) Na regi˜ao da radia¸c˜ao (k r À 1) o campo intensidade magn´etica ´e simplesmente dado por H =− ω p0 k i (ωt−kr) ˆφ , e sin θ e 4πr (11.48) sendo de assinalar que a dependˆencia com a distˆancia ´e essencialmente da forma ∼ 1r . A express˜ao (11.48) mostra tamb´em que o campo magn´etico na regi˜ao da radia¸c˜ ao ´e transverso. Por outro lado, o regime estacion´ario corresponde ao limite ω → 0 (ou, o que ´e equivalente, 1 k → 0): nestas condi¸c˜oes, o termo i kr em (11.47) domina sobre 1 e a exponencial toma o valor 1, resultando para o campo magn´etico H= iω Q0 s sin θ ˆφ ; e 4 π r2 o campo de indu¸c˜ao magn´etica [recorda-se que I0 = iωQ0 — ver (11.43)] vem B= µ0 I0 s sin θ ˆφ , e 4 π r2 express˜ao que est´a de acordo com a lei de Biot-Savart. A − ∇V , considerando as O campo el´ectrico calcula-se a partir da express˜ao E = − ∂∂t express˜oes dos potenciais escalar (11.42) e vector (11.45). Vamos omitir os pormenores do c´alculo de E , apresentando apenas a express˜ao final e incluindo j´a a aproxima¸c˜ ao adicional expressa por kr À 1, v´alida para a zona da radia¸c˜ ao. Assim, nessa regi˜ao, o campo el´ectrico tamb´em ´e transverso, sendo dado por E=− k 2 p0 i (ωt−kr) ˆθ . e sin θ e 4π²0 r (11.49) Confrontando esta express˜ao com (11.48), conclui-se que os campos E e H s˜ao ortogonais entre si na zona da radia¸c˜ao e, al´em disso, s˜ao ambos perpendiculares a r , ou seja, s˜ao transversos. Para a raz˜ao E/H obt´em-se E 1 = = H c ²0 r µ0 = 377 Ω , ²0 que ´e a impedˆancia caracter´ıstica do v´acuo [cf. Eq. (9.63)] de que se falou no Cap´ıtulo 9 quando se estudaram os campos el´ectrico e magn´etico da onda plana polarizada linearmente. Os campos E e H da radia¸c˜ao dipolar tˆem pois, localmente, as caracter´ısticas dos campos de uma onda electromagn´etica plana. ˜o Radiac ¸a 11.3.2 • 363 Vector de Poynting O vector de Poynting, definido na Sec¸c˜ ao 9.4, depende do tempo. O seu valor m´edio no tempo ´e dado por (9.62) e, para a radia¸c˜ ao do dipolo na regi˜ao da radia¸c˜ ao, isto ´e, considerando os campos (11.48) e (11.49), obt´em-se < S >= c k 4 p20 sin2 θ ˆr . e 32 π 2 ²0 r2 (11.50) Esta dependˆencia em sin2 θ ´e caracter´ıstica da radia¸c˜ ao dipolar, tal como a dependˆencia em k 4 . A radia¸c˜ao de outros multipolos apresenta n˜ao s´o uma diferente dependˆencia angular como uma dependˆencia em k n , com n 6= 4 (por exemplo, para a radia¸c˜ ao quadrupolar, n = 6). Vejamos finalmente qual ´e o fluxo do vector de Poynting m´edio atrav´es de uma superf´ıcie esf´erica de raio r com centro no dipolo. Este fluxo ´e dado por (note-se que ent˜ ao dΣ = 2 ˆ r sin θ dθ dφ er ) I Σ c k 4 p20 dUD = < S > · dΣ = dt 32 π 2 ²0 Z 2π 0 dφ Z π 0 sin3 θ dθ = c k 4 p20 , 12 π ²0 que ´e a energia radiada pelo dipolo por unidade de tempo. 11.4 ˜ DO QUADRUPOLO ELECTRICO ´ RADIAC ¸ AO LINEAR z 2 s p r q q P r q p r + + 1 Figura 11.6. Esquema do quadrupolo el´ ectrico linear, formado por dois dipolos colocados nas extremidades de s e alinhados com este vector. O quadrupolo el´ectrico linear ´e o sistema representado na Figura 11.6, constitu´ıdo por dois dipolos, 1 e 2, de momentos dipolares p e −p separados por uma distˆancia, pequena, s (dimens˜ao da fonte emissora). Considera-se que os momentos dipolares dependem do tempo e que essa dependˆencia ´e da forma (11.36). Na regi˜ao da radia¸c˜ ao, kr À 1, os campos el´ectricos 364 • ´tico Campo electromagne produzidos por cada um dos dipolos s˜ao dados, de acordo com (11.49), por k 2 p0 i (ωt−kr+ ) ˆ θ+ e sin θ+ e 4π²0 r+ k 2 p0 i (ωt−kr− ) ˆ θ− . = − e sin θ− e 4π²0 r− E1 = (11.51) E2 (11.52) Em regi˜oes afastadas do sistema, ou seja, tais que r À s, pode considerar-se θ− ' θ+ ' θ , donde tamb´em resulta a igualdade dos versores nas express˜oes dos campos el´ectricos acima escritas. Nessas express˜oes, e no que diz respeito `as amplitudes dos campos, pode igualmente considerar-se r− ' r+ ' r. Nas exponenciais, todavia, esta aproxima¸c˜ ao j´a n˜ao pode ser feita, pois est˜ao em causa fases e, mesmo que r− e r+ tenham valores pr´oximos, podem ocorrer diferen¸cas de fase significativas. Deve, ent˜ ao, utilizar-se a aproxima¸c˜ ao (11.40), sendo − i kr± as exponenciais e em (11.51) e (11.52) dadas por (11.41). Fazendo estas substitui¸c˜oes em (11.51) e (11.52), podemos escrever o campo el´ectrico na regi˜ao da radia¸c˜ao na seguinte forma: E = E1 + E2 = − ³ sk k 2 p0 i (ωt−kr) e sin θ ei 2 4π²0 r cos θ − e−i sk 2 cos θ ´ ˆθ . e No caso do tamanho da fonte emissora, s, ser muito pequeno comparado com λ ¯ = 1/k, isto 8 ´e, se s ¿ ¯λ, a quantidade entre parˆentesis fica simplesmente i s k cos θ e o campo el´ectrico vem i p s k 3 i (ω t−k r) ˆθ . E=− 0 e sin θ cos θ e 4 π ²0 r Este ´e o campo caracter´ıstico da radia¸c˜ ao quadrupolar. Trata-se de um campo transverso e, tal como na radia¸c˜ao dipolar, o campo el´ectrico e o campo magn´etico tˆem um comportamento local de onda plana. Uma vez determinado o campo magn´etico, podia determinar-se o vector de Poynting, S , e o valor m´edio no tempo deste vector. Este vector m´edio, < S >, tem as ˆ r , dependˆencia em r−2 , tal como no caso dipolar — seguintes caracter´ısticas: direc¸c˜ao de e ver Eq. (11.50); varia com k 6 , e n˜ao com k 4 como no dipolo, e a distribui¸c˜ ao angular ´e da 2 forma sin 2θ, diferente da dipolar dada pela Eq. (11.50). 11.5 11.5.1 PROBLEMAS RESOLVIDOS Potenciais de Li´ enard-Wiechert Quest˜ ao Obter os potenciais de Li´enard-Wiechert usando um formalismo covariante. 8 Desenvolvem-se as exponenciais em s´erie, retendo apenas termos de primeira ordem. ˜o Radiac ¸a • 365 Resposta No Exemplo 11.1 obtiveram-se os potenciais de Li´enard-Wiechert efectuando explicitamente o integral nas express˜oes dos potenciais retardados (11.22) e (11.23). Ora, as express˜oes (11.33) e (11.34) podem tamb´em ser obtidas utilizando o formalismo da Teoria da Relatividade desenvolvido no Cap´ıtulo 10. Consideremos uma carga q no seu referencial pr´oprio. O tetrapotencial criado por esta carga num ponto P a uma distˆancia a0 da carga ´e (ver Sec¸c˜ ao 10.4) µ Aµ ≡ q 1 , 4 π ²0 c a0 ¶ . (11.53) O potencial vector ´e nulo neste referencial espec´ıfico — o referencial pr´oprio —, mas esta situa¸c˜ao n˜ao ´e geral. De facto, podemos exprimir Aµ numa forma covariante, v´alida em qualquer referencial de in´ercia, sendo (11.53) um caso particular dessa express˜ao geral. Para isso, introduzimos o tetravector do tipo luz aµ ≡ (a, a) (aµ aµ = 0) (11.54) que localiza o acontecimento “recep¸c˜ ao da radia¸c˜ ao” em P, (ct, r ), relativamente ao acontecimento “emiss˜ao da radia¸c˜ao” no ponto retardado D∗ , (ct∗ , r∗0 ) (a nota¸c˜ ao ´e a mesma da do Exemplo 11.1). Em particular, no referencial pr´oprio, este tetravector tem componentes aµ ≡ (a0 , a0 ) . (11.55) Designemos por uµ a tetravelocidade da carga no instante retardado t∗ . A tetravelocidade ´e o tetravector dado por9 ¶ µ uµ ≡ γ, γ u c . (11.56) No referencial pr´oprio, como u = , vem uµ ≡ (1, ) . (11.57) Com os vectores aµ e uµ pode construir-se o seguinte invariante (ou escalar) de Lorentz, s = aν uν (11.58) que tem, portanto, o mesmo valor em todos os referenciais de in´ercia. Este valor pode ser calculado no referencial pr´oprio, usando (11.55) e (11.57), obtendo-se aν uν = a0 . A partir deste resultado e ainda de (11.57), podemos reescrever a componente temporal de (11.53) na forma u0 q (11.59) A0 = 4 π ²0 c aν uν e o tetravector cuja componente temporal ´e (11.59) ´e, pois, Aµ = 9 uµ q . 4 π ²0 c aν uν (11.60) A tetravelocidade ´e, por defini¸ca ˜o uµ = pµ /(m c). A Eq. (11.56) resulta directamente de (10.40). Note-se µ que o tetravector u , ao contr´ ario do vector u, ´e adimensional. 366 • ´tico Campo electromagne Esta ´e uma express˜ao v´alida em todos os referenciais de in´ercia. Em particular, no referencial pr´oprio, (11.60) reduz-se a (11.53). Fazendo agora o c´alculo expl´ıcito do escalar (11.58) no denominador de (11.60), usando (11.54) e (11.56), µ aν u ν = γ a − e a Eq. (11.60) escreve-se Aµ = a·u ¶ c , q uµ . ˆ · u/c) 4π²0 c γa (1 − a A componente temporal deste tetravector [atender `a defini¸c˜ ao (11.56)] ´e o potencial escalar (11.33) dividido por c. A componente espacial ´e o potencial vector (11.34). 11.5.2 Antena de meia onda Quest˜ ao Considerar uma antena linear de comprimento 2` = λ2 (antena de meia onda), percorrida por uma corrente vari´avel (com uma dependˆencia oscilat´oria no tempo e no espa¸co) a qual ´e fornecida por uma fonte de alimenta¸c˜ ao ligada ao ponto m´edio da antena. Obter os campos E e B num ponto P (r, θ) com r À λ (zona da radia¸c˜ ao). Calcular tamb´em a potˆencia total radiada pela antena atrav´es de uma superf´ıcie esf´erica de raio r com centro no ponto m´edio da antena. Considerar que o comprimento da antena ´e pequeno comparado com r ( 2` ¿ r). Resposta Vamos considerar que a antena ´e percorrida por uma corrente I(r 0 , t) = I(r 0 ) ei ωt . Escolhendo o eixo z na direc¸c˜ao da antena (e com origem no seu ponto m´edio), a dependˆencia espacial ´e apenas na vari´avel z 0 , sendo da forma I(z 0 ) = I0 cos(kz 0 ) , (11.61) como se indica no enunciado. Atendendo `a rela¸c˜ ao entre o comprimento da antena e o comprimento de onda e ao facto de k = 2π/λ, o n´ umero de onda em (11.61) ´e k= π , 2` garantindo-se assim que a corrente ´e m´axima no centro e tem nodos nas extremidades da antena. A existˆencia de uma corrente ao longo de um segmento de comprimento dz 0 pode ser associada a um dipolo oscilante cujo momento dipolar [ver (11.46)] ´e dp(z 0 , t) = −i I(z 0 ) i ωt 0 e dz . ω (11.62) Assim, o campo el´ectrico criado pela antena no ponto P (ver Figura 11.7) ´e a sobreposi¸c˜ao de todos os campos elementares do tipo (11.49). A contribui¸c˜ ao para E do dipolo oscilante cujo momento dipolar ´e dado por (11.62) ´e escrita do seguinte modo: dE = i µ0 ω I(z 0 ) dz 0 ˆ θ0 sin θ0 ei (ωt−ka) e 4πa (11.63) ˜o Radiac ¸a z + l P ( r ,q ) a q ' e^ r r' q ' e^ 367 r e^ e^ • a q q o - l Figura 11.7. Esquema da antena. ˆ ee ˆ θ0 o versor perpendicular a e ˆa. sendo a = r − r 0 , r 0 = z 0 k Na aproxima¸c˜ao 2` ¿ r, que implica tamb´em |z 0 | ¿ r, a distˆancia a entre cada elemento da antena, dz 0 , e o ponto P pode ser escrita na forma a ' r − z 0 cos θ , (11.64) tendo-se considerado o desenvolvimento de a/r em s´erie de potˆencias de z 0 /r e desprezado termos de ordem igual ou superior a dois (Sec¸c˜ ao 4.2). Uma simplifica¸c˜ao adicional que pode ser feita consiste em desprezar as diferen¸cas entre ˆθ e e ˆ θ0 ), o que equivale a considerar que todos os campos elementares s˜ao θ e θ0 (ou entre e paralelos entre si. Note-se que, embora no denominador de (11.63) se possa tomar r em vez de a, j´a na exponencial se deve ter em conta o resultado (11.64). No quadro das aproxima¸c˜oes referidas, o campo el´ectrico ´e dado por i µ0 ω sin θ ei (ωt−kr) ˆθ E=e 4πr Z ` −` ei kz 0 cos θ I(z 0 ) dz 0 . (11.65) Inserindo (11.61) em (11.65), o integral nesta express˜ao, que designamos por J , ´e escrito na forma (faz-se a mudan¸ca de vari´avel u = kz 0 ) J = I0 Z ` −` e i kz 0 cos θ I0 cos(kz ) dz = k 0 Fazendo uso da rela¸c˜ao cos u = 0 Z π/2 −π/2 ei u cos θ cos u du . (11.66) ¢ 1 ¡ iu e + e−i u , 2 o integral (11.66) vem J Z π/2 h i = I0 2k = 2 I0 cos π2 cos θ 2 c I0 π = cos θ cos 2 2 k 1 − cos θ 2 ω sin θ −π/2 ¡ ei u(1+cos θ) + e−i u(1−cos θ) du ¢ µ ¶ , (11.67) 368 • ´tico Campo electromagne tendo-se utilizado a express˜ao do seno de uma soma. Substituindo o integral em (11.65) por este valor, ¡ ¢ µ0 c I0 cos π2 cos θ i (ωt−kr) ˆθ . e e E=i (11.68) 2πr sin θ O campo E ´e indeterminado para θ = 0 ou θ = π mas, recorrendo `a regra de l’Hˆopital, a indetermina¸c˜ao pode ser levantada e verifica-se que E → 0 quando θ toma algum daqueles valores. Quer isto dizer que a antena n˜ao radia ao longo do seu eixo. O campo de indu¸c˜ao magn´etica pode ser obtido a partir do campo el´ectrico, notando que B= 1 ˆr × E . e c (11.69) De facto, pode verificar-se, usando o resultado (11.48) para o campo magn´etico e (11.49) para o campo el´ectrico, a validade da express˜ao anterior. Tem-se, ent˜ ao, para o campo de indu¸c˜ ao magn´etica, ¡ ¢ µ0 I0 cos π2 cos θ i (ωt−kr) ˆφ . B=i e e (11.70) 2πr sin θ A potˆencia total radiada pela antena ´e Z P = Σ < S > · dΣ , (11.71) ˆr. sendo < S >= 12 Re(E × H ∗ ) [ver Eq. (9.62)] e dΣ = r2 sin θ dθ dφ e Usando as express˜oes (11.68) e (11.70), obt´em-se, para a potˆencia m´edia radiada, ¢ ¡ 1 µ0 c I02 cos2 π2 cos θ ˆr . < S >= e 2 4π 2 r2 sin2 θ (11.72) A distribui¸c˜ao angular da potˆencia radiada ´e independente de φ (a antena radia igualmente em todas as direc¸c˜oes do plano horizontal) e, embora dada por uma express˜ao diferente da da radia¸c˜ao dipolar — que ´e da forma ∼ sin2 θ [ver Eq. (11.50)] — apresenta um contorno que ´e qualitativamente semelhante, como mostra a Figura 11.8. Figura 11.8. Padr˜ ao da radia¸ c˜ ao dipolar (a cheio) e da antena de meia onda (a ponteado). Calculemos, finalmente, a potˆencia radiada atrav´es de uma superf´ıcie esf´erica de raio r centrada no ponto m´edio da antena. De (11.71) e (11.72), µ0 c I02 P = 8 π2 Z 2π 0 dφ ¡ ¢ Z π cos2 π2 cos θ 0 sin θ dθ . (11.73) ˜o Radiac ¸a • 369 Para resolver o integral em θ faz-se a mudan¸ca de vari´ avel x = π(1 − cos θ), obtendo-se J 0 = = ¡ ¢ Z π cos2 π2 cos θ 0 1 4 ·Z 2π 0 dθ = π 2 Z 2π 1 − cos x dx sin θ x(2π − x) 0 ¸ Z 2π 1 − cos x 1 − cos x dx + dx . x 2π − x 0 Ora, os dois integrais nesta express˜ao s˜ao iguais (basta fazer no segundo a mudan¸ca de vari´ avel y = 2π − x para confirmar que assim ´e), pelo que 1 J = 2 0 Z 2π 1 − cos x 0 x dx = 1, 2188 . (11.74) O integral anterior entra na defini¸c˜ ao de uma fun¸c˜ ao especial [denominada fun¸c˜ ao co-seno integral, Ci(x)] e o seu valor s´o pode ser obtido numericamente. Substituindo em (11.73) o integral em θ pelo valor (11.74), e tendo em conta que o integral sobre o ˆangulo azimutal contribui com o factor 2π, obt´em-se P = 1, 2188 µ0 c I02 . 4π 370 • ´tico Campo electromagne ˆ APENDICE A TEOREMAS DE GAUSS E DE STOKES A.1 TEOREMA DE GAUSS O teorema de Gauss, tamb´em chamado teorema de Ostrogradski ou, ainda, teorema da divergˆencia, permite relacionar o integral da divergˆencia de uma fun¸c˜ ao vectorial, E , sobre um volume, v, com o fluxo do vector que sai atrav´es da superf´ıcie fechada, S, que delimita esse volume (Figura A.1): Z I v ∇ · E dv = S E · dS . (A.1) As componentes de E devem ter derivadas cont´ınuas em todos os pontos. d S v S Figura A.1. Esquema para ilustrar o teorema de Gauss. 372 • ´tico Campo electromagne Considere-se o caso particular em que o campo vectorial E ´e da forma E (r ) = f (r ) c, onde f ´e uma fun¸c˜ao escalar e c um vector constante. Como ∇ · (f c) = c · ∇f , pois c ´e constante [ver (B.37)], a express˜ao (A.1) ´e escrita na forma Z c· ou I v ∇f dv = c · µZ c· S f dS ¶ I v ∇f dv − S f dS = 0. Para um vector c constante e arbitr´ario, a u ´ltima igualdade s´o se verifica se I Z v ∇f dv = f dS . S Considere-se agora que o campo vectorial ´e da forma E (r ) = c × F (r ) , onde F ´e uma fun¸c˜ao vectorial e c um vector constante. Como ∇ · (c × F ) = −c · ∇ × F [ver (B.43)], a express˜ao (A.1) toma a forma Z −c · v I ∇ × F dv = I S (c × F ) · dS = S I F × dS · c = c · S F × dS , tendo-se utilizado a permuta¸c˜ao c´ıclica dos vectores no produto misto. Como o vector constante c ´e qualquer, Z I ∇ × F dv = − F × dS . (A.2) v A.2 S TEOREMA DE STOKES Este teorema relaciona a circula¸c˜ao de um campo vectorial B ao longo de um percurso fechado C com o fluxo do rotacional do campo atrav´es de uma qualquer superf´ıcie S que se apoie no contorno C: Z I ∇ × B · dS = S C B · dl , (A.3) onde dl e dS s˜ao elementos de linha e de superf´ıcie orientados como mostra a Figura A.2 (regra do saca-rolhas). d l C S d S Figura A.2. Esquema para ilustrar o teorema de Stokes. Teoremas de Gauss e de Stokes • 373 Tal como na sec¸c˜ao anterior, podem encontrar-se formas alternativas ao teorema de Stokes. Considere-se B (r ) = f (r ) c, onde f ´e uma fun¸ca˜o escalar e c um vector constante. De (B.40) vem ∇ × (f c) = ∇f × c, pois c ´e constante e o primeiro membro de (A.3) toma a forma Z Z S ∇ × B · dS = Z S ∇f × c · dS = −c × Z S ∇f · dS = −c · S ∇f × dS e a express˜ao (A.3) escreve-se ent˜ ao · c· − ¸ I Z S ∇f × dS − f dl = 0 . C Esta express˜ao verifica-se, para um vector c constante e arbitr´ario, se Z S I dS × ∇f = C f dl . Seja agora B (r ) = c × F (r ), sendo c um vector constante e F (r ) uma fun¸c˜ ao vectorial. O primeiro membro de (A.3) pode ser escrito na seguinte forma: Z Z S ∇ × B · dS = Z S ∇ × (c × F ) · dS = S Z (dS × ∇) · (c × F ) = −c · e, portanto, (A.3) vem Z −c · I S (dS × ∇) × F = c · C F × dl . Finalmente, como c ´e qualquer, Z I S (dS × ∇) × F = C dl × F . S (dS × ∇) × F ˆ APENDICE B ´ CALCULO VECTORIAL B.1 SISTEMAS DE COORDENADAS Apresentamos nesta sec¸c˜ao os sistemas de coordenadas ortogonais: coordenadas cartesianas ou rectangulares, cil´ındricas e esf´ericas. Em coordenadas cartesianas, um ponto P ´e definido pela intersec¸c˜ ao de trˆes planos; a sua posi¸c˜ao relativamente `a origem de um referencial de eixos ortogonais entre si ´e especificada pelos valores das suas coordenadas cartesianas x, y, z. Os vectores unit´arios (ou versores) segundo as direc¸c˜ oes dos trˆes eixos ortogonais designamˆ ˆ ˆ se por i, j , k. Assim, um vector F ´e escrito na forma geral: ˆ, F = Fx (x, y, z) ˆi + Fy (x, y, z) jˆ + Fz (x, y, z) k (B.1) em que Fx , Fy , Fz s˜ao as componentes cartesianas do vector F . Em particular, o deslocamento elementar dr ´e dado por ˆ. dr = dx ˆi + dy jˆ + dz k (B.2) O volume elementar em coordenadas cartesianas ´e dv = dx dy dz . Em coordenadas cil´ındricas, um ponto P resulta da intersec¸c˜ ao de um cilindro e dois planos, um dos quais perpendicular ao eixo do cilindro e outro contendo este eixo. A sua posi¸c˜ ao ´e especificada pelas coordenadas r, φ, z; a rela¸c˜ ao entre estas coordenadas e as coordenadas cartesianas ´e (ver Figura B.1)    x = r cos φ     y = r sin φ z = z, (B.3) 376 • ´tico Campo electromagne ê z ê z f P ( r ,f ,z ) ê f r y r x Figura B.1. Defini¸ c˜ ao das coordenadas cil´ındricas. ou, de modo equivalente,  r = (x2 + y 2 )1/2     à !   y       φ = arctan (B.4) x z = z. Os vectores unit´arios ortogonais segundo a direc¸c˜ ao de varia¸c˜ ao das coordenadas r, φ e z ˆ ). De notar que a direc¸c˜ ˆr , e ˆφ , e ˆ z (ou k s˜ao e ao destes vectores varia de ponto para ponto (`a ˆ. ˆ z ), contrariamente ao que acontece com os vectores unit´arios ˆi, jˆ , k excep¸c˜ao de e f y ê r iî f ê jî r x ˆr e e ˆφ. Figura B.2. Versores ˆi e jˆ , e e ˆ relacionam-se com eˆr , e ˆφ, e ˆ z atrav´es de (ver Figura B.2) Os vectores unit´arios ˆi, jˆ , k ˆi = cos φ e ˆ r − sin φ e ˆφ (B.5) ´ lculo vectorial Ca • 377 ˆ r + cos φ e ˆφ jˆ = sin φ e (B.6) ˆ = e ˆz , k (B.7) ou, equivalentemente, ˆ r = cos φ ˆi + sin φ jˆ e ˆ φ = − sin φ ˆi + cos φ jˆ e ˆ. ˆz = k e A express˜ao geral de um vector F ´e dada, em coordenadas cil´ındricas, por ˆ r + Fφ (r, φ, z) e ˆ φ + Fz (r, φ, z) e ˆz . F = Fr (r, φ, z) e O vector deslocamento elementar em coordenadas cil´ındricas ´e1 ˆ r + rdφ e ˆ φ + dz e ˆz . dr = dr e O volume elementar em coordenadas cil´ındricas ´e dv = r dr dφ dz . z ê r r ê f ê P ( r ,q ,f ) q q f y x Figura B.3. Defini¸ c˜ ao das coordenadas esf´ ericas. Em coordenadas esf´ericas a posi¸c˜ ao de um ponto P ´e dada pelas coordenadas r, θ, φ, cuja rela¸c˜ao com as coordenadas cartesianas ´e (ver Figura B.3)  x = r sin θ cos φ       1 y = r sin θ sin φ (B.8) z = r cos θ , N˜ ao confundir a coordenada cil´ındrica, r, com o m´ odulo do vector posi¸ca ˜o, que tamb´em se designa por r. 378 • ´tico Campo electromagne ou seja,   r = (x2 + y 2 + z 2 )1/2    à !      θ = arcos z r   à !    y     φ = arctan x . (B.9) ´ lculo vectorial Ca • 379 Os vectores unit´arios ortogonais segundo as direc¸c˜ oes de varia¸c˜ ao das coordenadas s˜ao, ˆ ´e ˆ ˆ ˆ em coordenadas esf´ericas, er , eθ , eφ . A sua rela¸c˜ ao com os versores ˆi, jˆ , k ˆi = sin θ cos φ e ˆ r + cos θ cos φ e ˆ θ − sin φ e ˆφ ˆ r + cos θ sin φ e ˆ θ + cos φ e ˆφ jˆ = sin θ sin φ e ˆ ˆ r − sin θ e ˆθ , k = cos θ e (B.10) (B.11) (B.12) ou, equivalentemente, ˆ ˆ r = sin θ cos φ ˆi + sin θ sin φ jˆ + cos θ k e ˆ ˆ θ = cos θ cos φ ˆi + cos θ sin φ jˆ − sin θ k e ˆ φ = − sin φ ˆi + cos φ jˆ . e Um vector F escreve-se, em fun¸c˜ ao das suas componentes esf´ericas, na forma ˆ r + Fθ (r, θ, φ) e ˆ θ + Fφ (r, θ, φ) e ˆφ . F = Fr (r, θ, φ) e Em particular, o vector deslocamento dr ´e ˆ r + r dθ e ˆ r + r sin θ dφ e ˆφ dr = dr e e o elemento de volume em coordenadas esf´ericas escreve-se dv = r2 sin θ dr dθ dφ . B.2 B.2.1 OPERADORES DIFERENCIAIS Gradiente de fun¸c˜ oes escalares Consideremos, para ilustrar o significado deste operador diferencial, uma fun¸c˜ ao escalar U cujo valor depende do ponto considerado. Seja U (x, y, z) o valor desta fun¸c˜ ao (tamb´em chamada campo escalar) no ponto P. Noutro ponto pr´oximo, Q, a fun¸c˜ ao toma o valor U +dU , com dU dado por ∂U ∂U ∂U dU = dx + dy + dz. (B.13) ∂x ∂y ∂z Na express˜ao anterior, as derivadas s˜ao calculadas no ponto P e dx, dy, dz s˜ ao as componentes cartesianas do vector deslocamento dr [ver Eq. (B.2)]. Recordando a defini¸c˜ao de produto escalar de dois vectores, facilmente se conclui que a express˜ao (B.13) ´e o produto escalar do vector dr , dado por (B.2), pelo vector ∇U = ˆi ∂U ˆ ∂U ˆ ∂U , +j +k ∂x ∂y ∂z (B.14) ou seja, dU = ∇U · dr . (B.15) A Eq. (B.15) pode ser vista como a defini¸c˜ ao do gradiente de uma fun¸c˜ ao escalar U : este ´e o vector que, multiplicado escalarmente pelo deslocamento dr entre dois pontos P e Q, d´a a varia¸c˜ao da fun¸c˜ao U entre esses pontos. A Eq. (B.14) ´e a express˜ao do gradiente da fun¸c˜ ao U em coordenadas cartesianas. 380 • ´tico Campo electromagne Para real¸car o significado f´ısico do gradiente, consideremos uma superf´ıcie em que U ´e constante (U = U1 ). Um deslocamento infinitesimal dr1 sobre esta superf´ıcie n˜ao acarreta qualquer varia¸c˜ao na fun¸c˜ao U , pelo que se conclui de (B.15) que o vector ∇U ´e perpendicular `as superf´ıcies em que U se mant´em constante. Por outro lado, considerando agora deslocamentos de igual grandeza dr0 , mas em diversas direc¸c˜oes, a partir de um ponto P situado sobre a superf´ıcie atr´as referida, podemos escrever dU = |∇U | dr0 cos α , sendo α o ˆangulo entre a direc¸c˜ao do vector deslocamento e a direc¸c˜ ao da normal `a superf´ıcie (direc¸c˜ao de ∇U ). Da express˜ao anterior conclui-se que a varia¸c˜ ao de U ´e m´axima quando o deslocamento se faz na direc¸c˜ao normal `a superf´ıcie; o m´odulo do gradiente de U ´e exactamente igual `a m´axima taxa de varia¸c˜ao da fun¸c˜ao U com o deslocamento, ou, dito de outro modo, o vector gradiente de uma fun¸c˜ao escalar U tem a direc¸c˜ ao e o sentido em que a derivada direccional ´e m´axima e tem grandeza igual a esta. Devido `as simetrias dos sistemas f´ısicos, ´e, por vezes, mais simples utilizar os operadores diferenciais como o gradiente, ∇, noutras coordenadas para al´em das cartesianas. Para escrever o operador ∇ em coordenadas cil´ındricas, basta transformar as derivadas ˆ pelas suas na Eq. (B.14) em derivadas em ordem a r, φ, z e substituir os versores ˆi, jˆ , k express˜oes em fun¸c˜ao dos versores das coordenadas cil´ındricas [ver (B.5) a (B.7)]. A t´ıtulo de exemplo, veja-se que ∂ ∂x ∂ ∂r ∂ ∂φ ∂ ∂z + + ∂r ∂x ∂φ ∂x ∂z ∂x ∂ sin φ ∂ = cos φ − , ∂r r ∂φ = (B.16) onde se usou (B.3) e (B.4). Procedendo de modo an´alogo a (B.16) para as restantes derivadas, obt´em-se o gradiente de U expresso em coordenadas cil´ındricas: ˆr ∇U = e 1 ∂U ∂U ∂U ˆφ ˆz +e +e . ∂r r ∂φ ∂z Seguindo a mesma metodologia e fazendo agora uso das equa¸c˜ oes (B.8) e (B.9) e das rela¸c˜oes entre os versores (B.10)-(B.12), pode obter-se o gradiente de U em coordenadas esf´ericas: ˆr ∇U = e B.2.2 ∂U 1 ∂U 1 ∂U ˆθ ˆφ +e +e . ∂r r ∂θ r sin θ ∂φ Divergˆ encia de fun¸c˜ oes vectoriais Define-se a divergˆencia de uma fun¸c˜ ao vectorial num ponto P como a raz˜ao entre o fluxo que sai atrav´es de uma superf´ıcie fechada que limita o volume elementar ∆v contendo o ponto P, e o volume ∆v, no limite em que ∆v → 0: I ∇ · F = lim ∆v→0 S F · dS ∆v . (B.17) ´ lculo vectorial Ca • 381 z d S 1 d y d z d x y x Figura B.4. Paralelep´ıpedo de volume elementar. A express˜ao anterior ´e uma rela¸c˜ ao geral, independente do sistema de coordenadas que se utilize, podendo ser usada para exprimir a divergˆencia de F nas coordenadas mais adequadas a um dado problema. Para obter a express˜ao de ∇ · F em coordenadas cartesianas, calcula-se o fluxo de F que sai atrav´es da superf´ıcie fechada que limita o paralelep´ıpedo de volume dv = dx dy dz representado na Figura B.4: I Z S F · dS = Z F · dS1 + S1 Z F · dS2 + S2 Z F · dS3 + S3 Z F · dS4 + S4 Z F · dS5 + S5 F · dS6 S6 = −Fx (x) dydz + Fx (x + dx) dydz − Fy (y) dxdz + Fy (y + dy) dxdz −Fz (z) dxdy + Fz (z + dz) dxdy , (B.18) tendo-se usado, para escrever a segunda igualdade, a express˜ao (B.1) e tido em conta que as componentes cartesianas do vector F n˜ ao variam de ponto para ponto sobre uma dada face. Como os acr´escimos dx, dy, dz s˜ao pequenos pode escrever-se ∂Fx dx + ... ∂x e express˜oes an´alogas para as restantes componentes de F . Substituindo estes resultados em (B.18) obt´em-se µ ¶ I ∂Fx ∂Fy ∂Fz F · dS = + + dx dy dz . ∂x ∂y ∂z S Fx (x + dx) = Fx (x) + Retomando, finalmente, a defini¸c˜ ao (B.17), no limite em que ∆v → 0, obt´em-se ∇·F = ∂Fz ∂Fx ∂Fy + + . ∂x ∂y ∂z (B.19) Note-se que este resultado poderia tamb´em ser obtido a partir do produto escalar do operador vectorial nabla, ∇, cuja express˜ao em coordenadas cartesianas, ∇ = ˆi ∂ ∂ ˆ ∂ , + jˆ +k ∂x ∂y ∂z (B.20) 382 • ´tico Campo electromagne decorre de (B.14), pelo vector F dado por (B.1). A divergˆencia de um vector em coordenadas cil´ındricas e em coordenadas esf´ericas pode ser obtida a partir da defini¸c˜ao (B.17), considerando-se o volume elementar ∆v e a superf´ıcie que o envolve expressos em termos destas coordenadas, ou, em alternativa, procedendo-se como em B.2.1 e partindo-se, neste caso, da express˜ao (B.19). Seguindo um ou outro destes procedimentos, obt´em-se ∇·F = 1 ∂ 1 ∂Fφ ∂Fz (rFr ) + + r ∂r r ∂φ ∂z em coordenadas cil´ındricas e ∇·F = 1 ∂ ³ 2 ´ 1 ∂ 1 ∂Fφ r Fr + (sin θ Fθ ) + 2 r ∂r r sin θ ∂θ r sin θ ∂φ em coordenadas esf´ericas. B.2.3 Rotacional de fun¸c˜ oes vectoriais O operador diferencial rotacional actua num vector, F , e transforma-o noutro vector, ∇ × F . Consideremos um ponto P do espa¸co no centro da superf´ıcie elementar ∆S, `a qual ˆ ∆S. A componente de ∇ × F na direc¸c˜ ˆ ´e corresponde o elemento orientado de ´area n ao n dada, no ponto P, por I ˆ = lim (∇ × F ) · n C F · dl , (B.21) ∆S em que o integral se estende `a curva fechada C que limita a superf´ıcie ∆S, perpendicular a ˆ. n Vamos usar a express˜ao anterior para exemplificar a obten¸c˜ ao das componentes do rotacional; por uma quest˜ao de simplicidade, usaremos, como anteriormente, coordenadas cartesianas. ∆S→0 z z+ d z z d S d l4 d l1 d l3 y d l2 y + d y y Figura B.5. Superf´ıcie elementar no plano yz. Consideremos a Figura B.5. A superf´ıcie dS = dydz situada no plano yz ´e adequada para obter ∇ × F · ˆi = (∇ × F )x . O integral ao longo do contorno fechado C (de lados dy e dz) ´ lculo vectorial Ca • 383 ´e escrito do seguinte modo: Z I C F · dl = Z C1 F · dl1 + Z C2 F · dl2 + Z C3 F · dl3 + F · dl4 C4 = −Fz (y) dz + Fy (z) dy + Fz (y + dy) dz − Fy (z + dz) dy ∂Fz ∂Fy = −Fz (y) dz + Fy (z) dy + Fz (y) dz + dydz − Fy (z) dy − dzdy ∂y ∂z ∂Fz ∂Fy = dydz − dzdy , (B.22) ∂y ∂z em que se usaram desenvolvimentos em s´erie do tipo Fz (y + dy) = Fz (y) + ∂Fz dy + ... , ∂y tomando apenas termos at´e primeira ordem. Substituindo o resultado (B.22) em (B.21) e tomando o limite quando ∆S → 0, obt´em-se (∇ × F )x = ∂Fz ∂Fy − . ∂y ∂z (B.23) As restantes componentes cartesianas s˜ao obtidas de modo an´alogo, sendo o rotacional de F dado por µ ∇×F = ¶ ∂Fy ˆ ∂Fz − i+ ∂y ∂z µ ∂Fx ∂Fz − ∂z ∂x ¶ jˆ + µ ¶ ∂Fx ˆ ∂Fy − k. ∂x ∂y (B.24) As express˜oes do rotacional de um vector, em coordenadas cil´ındricas e em coordenadas esf´ericas, s˜ao, respectivamente, · ∇×F = e ¸ · ∇×F = ¸ · · ¸ ∂Fφ 1 ∂Fz ∂Fz ∂Fr ∂Fr 1 ∂ ˆr + ˆφ + ˆz − − (rFφ ) − e e e r ∂φ ∂z ∂z ∂r r ∂r ∂φ ¸ · ¸ ∂ ∂Fθ 1 ∂Fr ∂ 1 1 ˆr + ˆθ (sin θ Fφ ) − − (rFφ ) e e r sin θ ∂θ ∂φ r sin θ ∂φ ∂r · ¸ 1 ∂ ∂Fr ˆφ , + (rFθ ) − e r ∂r ∂θ as quais se obtˆem usando a metodologia preconizada na sec¸c˜ ao anterior. B.2.4 O operador laplaciano O operador laplaciano ´e o operador escalar ∇2 = ∇ · ∇. Usando a express˜ao (B.20) do operador ∇ em coordenadas cartesianas, obt´em-se, de forma imediata, o laplaciano da fun¸c˜ao escalar U ∇2 U = ∂2 U ∂2 U ∂2 U + + , ∂x2 ∂y 2 ∂z 2 que ´e igualmente uma fun¸c˜ao escalar. O laplaciano de uma fun¸c˜ao vectorial F ´e um vector de componentes ∇2 Fx , ∇2 Fy , ∇2 Fz , cada uma das quais se obt´em usando a express˜ao anterior. Tem-se, por exemplo, ∇2 Fx = ∂ 2 Fx ∂ 2 Fx ∂ 2 Fx + + , ∂x2 ∂y 2 ∂z 2 (B.25) 384 • ´tico Campo electromagne e o mesmo para as restantes componentes cartesianas de F . A express˜ao do laplaciano de uma fun¸c˜ ao escalar ´e dada em coordenadas cil´ındricas por µ 1∂ ∂U ∇ U= r r ∂r ∂r ¶ 2 + 1 ∂2 U ∂2 U + , r2 ∂φ2 ∂z 2 e, em coordenadas esf´ericas, por µ ∇2 U = ∂U 1 ∂ r2 2 r ∂r ∂r ¶ µ + 1 ∂ ∂U sin θ 2 r sin θ ∂θ ∂θ ¶ + 1 ∂2 U . r2 sin2 θ ∂φ2 A express˜ao (B.25) aplica-se apenas `as componentes cartesianas de um vector, pelo que, para obter o laplaciano de um vector expresso em outras coordenadas (cil´ındricas, esf´ericas) deve usar-se a rela¸c˜ao (B.41). B.3 ´ ´ IDENTIDADES UTEIS DO CALCULO VECTORIAL Indicam-se a seguir algumas express˜oes u ´teis do c´alculo vectorial, muitas delas referenciadas ao longo do livro. (B.26) ∇r = rˆ µ ¶ 1 r ∇ =− rˆ r2 ∇·r =3 µ ¶ ∇· r r = (B.27) (B.28) 2 r ∇×r =0 (B.29) (B.30) µ ¶ ∇× r r =0 (B.31) ∂ ∂f ∂A (f A) = A+f ∂s ∂s ∂s (B.32) ∂ ∂A ∂B (A · B ) = ·B+A· ∂s ∂s ∂s (B.33) ∂ ∂A ∂B (A × B ) = ×B+A× ∂s ∂s ∂s (B.34) ∇ × ∇f = 0 (B.35) ∇·∇×A=0 (B.36) ´ lculo vectorial Ca • 385 ∇ · (f A) = ∇f · A + f ∇ · A (B.37) ∇(f g) = f ∇g + g ∇f (B.38) µ ¶ ∇ 1 f =− 1 ∇f f2 (B.39) ∇ × (f A) = ∇f × A + f (∇ × A) (B.40) ∇ × (∇ × A) = ∇(∇ · A) − ∇2 A (B.41) ∇(A · B ) = (B · ∇)A + (A · ∇)B + B × (∇ × A) + A × (∇ × B ) (B.42) ∇ · (A × B ) = B · (∇ × A) − A · (∇ × B ) (B.43) ∇ × (A × B ) = (B · ∇)A − (A · ∇)B + (∇ · B )A − (∇ · A)B (B.44) A · (B × C ) = B · (C × A) = C · (A × B ) (B.45) A × (B × C ) = B (A · C ) − C (A · B ) (B.46) (A × B ) · (C × D ) = (A · C )(B · D ) − (A · D )(B · C ) (B.47) Em (B.42) e (B.44), e considerando coordenadas cartesianas, µ ¶ µ ∂Ax ∂Ax ∂Ax ˆ ∂A ∂A ∂A + By + Bz i + Bx y + By y + Bz y ∂x ∂y ∂z ∂x ∂y ∂z µ ¶ ∂Az ∂Az ∂Az ˆ + Bx + By + Bz k. ∂x ∂y ∂z (B · ∇)A = Bx ¶ jˆ (B.48) BIBLIOGRAFIA 1. Ashcroft, N. W. e Mermin, N. D., Solid State Physics, HRW International Editions, Hong Kong, 1988. 2. Barger, V. D. e Olsson, M. G., Classical Electricity and Magnetism (2a ed.), Allyn and Bacon, Boston, 1987. 3. Cook, D. M., The Theory of the Electromagnetic Field, Prentice-Hall, Englewood Cliffs, 1975. ´ 4. Durand, E., Electrostatique (Tom. I, II e III), Masson, Paris, 1964. 5. Durney, C. H. e Johnson, C. C., Introduction to Modern Electromagnetics, McGrawHill, Nova Iorque, 1969. 6. Eyges, L., Classical Electromagnetic Field, Addison-Wesley, Reading, Mass., 1972. 7. Feynman, R. P., Leighton, R. B. e Sands, M., The Feynman Lectures on Physics (Vol. II), Addison-Wesley, Reading, Mass., 1977. 8. French, A. P., Special Relativity, Chapman & Hall, Londres, 1968. 9. Griffiths, D. J., Introduction to Electrodynamics, Prentice Hall, Englewood Cliffs, 1981. 10. Hauser, W., Introduction to the Principles of Electromagnetism, Addison-Wesley, Reading, Mass., 1971. 11. Jackson, J. 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CONSTANTES F´ISICAS, GRANDEZAS E UNIDADES SI Constantes f´ısicas Constante carga elementar (do prot˜ao) constante de Avogadro constante de Boltzmann constante de estrutura fina constante de Planck constante de Stefan-Boltzmann constante (molar) dos gases ideais massa do electr˜ao massa do prot˜ao magnet˜ao de Bohr magnet˜ao nuclear permeabilidade do vazio permitividade do vazio raio de Bohr velocidade da luz (no vazio) volume molar do g´as ideal (PTN) S´ımbolo e NA k α = e2 /(2²0 hc) h σ R me mp µB µN µ0 ²0 a0 c v0 Valor em unidades SI 1,602 177 33×10−19 C 6,022 136 7×1023 mol−1 1,380 658×10−23 J K−1 1/137,036 6,626 075 5×10−34 J s 5,670 5×10−8 W m−2 K−4 8,314 510 J mol−1 K−1 9,109 389 7×10−31 kg 1,672 623 1×10−27 kg 9,274 015 4×10−24 J T−1 5,050 786 6×10−27 J T−1 4 π ×10−7 H m−1 8,854 187×10−12 F m−1 5,291 772 49×10−11 m 2,997 924 58×108 m s−1 2,241 4×10−2 m3 mol−1 390 • ´tico Campo electromagne Grandezas de electricidade e magnetismo e unidades SI Grandeza Unidade SI corrente el´ectrica carga el´ectrica densidade volum´etrica de carga densidade superficial de carga densidade linear de carga campo el´ectrico potencial, for¸ca electromotriz deslocamento el´ectrico capacidade el´ectrica permitividade permitividade relativa susceptibilidade el´ectrica polariza¸c˜ao momento de dipolo el´ectrico densidade volum´etrica de corrente densidade superficial de corrente resistˆencia condutˆancia (inverso da resistˆencia) resistividade condutividade factor de qualidade impedˆancia potˆencia campo de indu¸c˜ao magn´etica fluxo magn´etico campo magn´etico n´ umero de espiras indutˆancia (pr´opria ou m´ utua) permeabilidade permeabilidade relativa susceptibilidade magn´etica magnetiza¸c˜ao momento magn´etico vector de Poynting ampere (A) coulomb (C) coulomb por metro c´ ubico (C/m3 ) coulomb por metro quadrado (C/m2 ) coulomb por metro (C/m) volt por metro (V/m) volt (V) coulomb por metro quadrado (C/m2 ) farad (F) farad por metro (F/m) (adimensional) (adimensional) coulomb por metro quadrado (C/m2 ) coulomb metro (C m) ampere por metro quadrado (A/m2 ) ampere por metro (A/m) ohm (Ω) siemens (S) ohm metro (Ω m) siemens por metro (S/m) (adimensional) ohm (Ω) watt (W) tesla (T) weber (Wb) ampere por metro (A/m) (adimensional) henry (H) henry por metro (H/m) (adimensional) (adimensional) ampere por metro (A/m) ampere metro quadrado (A m2 ) watt por metro quadrado (W/m2 ) TABELA DE S´IMBOLOS a A A B c C d D e E E Ei f fµ F F µν g h H i, I j k k k ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... M´odulo da acelera¸c˜ ao ´ Area Potencial vector Campo de indu¸c˜ ao magn´etica Velocidade da luz no vazio Capacidade de um condensador Comprimento Deslocamento el´ectrico Carga elementar (do prot˜ao) Campo el´ectrico Energia For¸ca electromotriz induzida Frequˆencia Tetrafor¸ca For¸ca Tensor do campo electromagn´etico M´odulo da acelera¸c˜ ao da gravidade Altura Campo magn´etico Intensidade de corrente Densidade de corrente Constante de Boltzmann Vector de onda Constante el´astica 392 • ´tico Campo electromagne L, ` L L m m M M Mij N N n n n NA P P P p p pµ q, Q Q q∗ Qij r R R R s S S t T T T T u u U v v V W Z ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... Comprimento Momento angular Indutˆancia Massa Momento dipolar magn´etico Magnetiza¸c˜ ao Momento de uma for¸ca Indutˆancia m´ utua N´ umero de part´ıculas N´ umero de espiras num solen´oide N´ umero de part´ıculas por unidade de volume N´ umero de espiras por unidade de comprimento ´Indice de refrac¸c˜ ao Constante de Avogadro Press˜ao Potˆencia Polariza¸c˜ao Momento dipolar el´ectrico Momento linear Tetramomento linear Carga el´ectrica Factor de qualidade Carga magn´etica Momento quadrupolar el´ectrico Vector posicional Coeficiente de reflex˜ao Raio Resistˆencia el´ectrica Distˆancia entre cargas num dipolo Superf´ıcie Vector de Poynting Tempo Coeficiente de transmiss˜ao Temperatura termodinˆamica Energia cin´etica Per´ıodo Densidade de energia Velocidade Energia Velocidade Volume Potencial escalar, diferen¸ca de potencial Trabalho Impedˆancia Tabela de s´ımbolos α δ ² ²0 ²r φ κ λ λ µ µ0 µr ω ρ ρ∗ Σ σ σ σ∗ χe χm ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... ...... • 393 Polarizabilidade Profundidade da pele Permitividade absoluta Permitividade do vazio Permitividade relativa Fluxo Densidade superficial de corrente Densidade linear de carga Comprimento de onda Permeabilidade magn´etica Permeabilidade magn´etica do vazio Permeabilidade relativa Velocidade angular Densidade vol´ umica de carga el´ectrica Densidade vol´ umica de carga magn´etica Superf´ıcie Condutividade Densidade superficial de carga el´ectrica Densidade superficial de carga magn´etica Susceptibilidade el´ectrica Susceptibilidade magn´etica Sobre a nota¸c˜ ao ˆ (ou e ˆ z ). • Coordenadas cartesianas: x, y, z; versores ˆi, jˆ e k ˆ ). ˆr, e ˆφ e e ˆ z (ou k • Coordenadas cil´ındricas: r, φ, z; versores e ˆ r (ou r ˆ ), e ˆθ e e ˆ φ ; ˆangulo s´olido Ω. • Coordenadas esf´ericas: r, θ, φ; versores e • Linha (sobre a qual se integra) C; superf´ıcie S, Σ; volume v. • O vector a ´e o vector posicional do ponto P, onde se pretende conhecer o potencial ou o campo, relativamente a ponto P0 onde se localiza uma fonte (carga ou corrente). • O vector r ´e o vector posicional do ponto P relativamente `a origem. • O vector r 0 ´e o vector posicional do ponto P0 onde se localiza uma fonte (carga ou corrente) em rela¸c˜ao `a origem. • Operadores diferenciais: ∇ (gradiente); ∇· (divergˆencia); ∇× (rotacional). divS (divergˆencia superficial); rotS (rotacional superficial). • Tetravector contravariante, aµ com µ = 0, 1, 2, 3; tetravector covariante, aµ . ¡ ¢ Componentes do tetravector xµ ≡ x0 = ct, x1 = x, x2 = y, x3 = z . ∂ ∂xµ . g µν = gµν Tetragradiente, ∂µ = Tensor da m´etrica (g 00 = 1, g ij = −δij , g 0i = 0 com i, j = 1, 2, 3).