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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS – CCB
DEPARTAMENTO DE BIOQUÍMICA
BIOMEDICINA
Alessandra Maria Monteiro e Silva; Bernardo José de Araujo Jatobá; James
Chagas Almeida; Luiz Nascimento de Araújo Neto; Maria Isabela de Andrade
Pereira; Wanessa Silva dos Santos.
BIOQUÍMICA DO EXERCÍCIO FÍSICO
RECIFE, 2010.2
1. INTRODUÇÃO
O exercício muscular é uma atividade mecânica decorrente da contração
simultânea de vários músculos integrantes de uma ou mais regiões corporais.
Em todas as espécies, ele é a atividade fisiológica mais integrada que
existe. Além do suporte estrutural específico, sua base de operação é a
capacidade de produzir muito ATP e gasta-lo bem.
Vários outros tecidos estão envolvidos na oferta das condições que a
musculatura necessita para entrar em atividade. Entre eles podemos citar,
primordialmente, o nervoso, pois seus comandos conscientes ou inconscientes
materializam a vontade de trabalhar. O cérebro, por sua vez, exerce seu
próprio trabalho, que não é mecânico, mediante o consumo quase que
exclusivo de glicose. E a glicose, em certos momentos, vem em grau
preponderante do fígado, que também não executa atividade mecânica típica.
Aliás, o envolvimento dos hepatócitos na operação do trabalho do músculo é
feita por hormônios que poderão vir da hipófise, do pâncreas, das supra-
renais etc.
Estes hormônios, entre outras, têm a função de buscar combustíveis
para o músculo queimar: um pouco de glicogênio e muita gordura. E a gordura
está no tecido adiposo, à duradoura fonte de energia para o músculo que
trabalha.
Além disso, os nutrientes para as fibras musculares que estão ativas
vêm do sangue e quem movimenta o sangue é o coração. Na cadeia metabólica
produtora de ATP, tão importante quanto estes combustíveis é o oxigênio e
este chega pelo pulmão. Porém, a chegada de ambos ao local que está se
exercitando depende dos eritrócitos e de um sistema capilar dilatado, pelo
que a densidade capilar aumentada é uma das mais claras seqüelas do
treinamento. Durante as transformações químicas que acompanham a atividade
física, muitos cátions de hidrogênio (H+) são produzidos. A despeito de sua
produção ser originalmente benéfica – porque ajuda a estimular os controles
que aumentam as freqüências cardíaca e respiratória -, a concentração
sanguínea destes cátions (pH) precisa ser mantida dentro de limites que não
sejam exagerados. Nesta função, além dos pulmões, o rim tem papel muito
importante.
Por outro lado, dentro da fibra que trabalha, todos os conjuntos
enzimáticos estão orientados para queimar nutrientes, deixando os processos
de síntese reduzidos ao mínimo. Estes conjuntos de enzimas constituem as
chamadas vias ou rotas metabólicas, tais como a glicólise, ß-oxidação etc.
No momento do exercício, aqueles oxidativos somam-se no emergente objetivo
de fazer o músculo ter em quantidades suficientes a única fonte energética
direta que ele usa para funcionar: ATP. Efetores que a célula vai
oportunamente produzindo, ao mesmo tempo em que estimulam estes caminhos,
inibem os outros que conduzem os nutrientes até a construção de algum bloco
molecular, como proteína, por exemplo.
Finalmente, a integração se dá pela existência ou não de determinadas
enzimas, num ou noutro tecido participante do processo contrátil. Assim,
uma enzima que participe bem da fixação intracelular de glicose, por
exemplo, deverá estar no músculo, e uma que a capte mal, no fígado, porque
o primeiro é queimador de glicose e outro fornecedor dela para o plasma.
Também não pode acontecer, mantendo o exemplo, que a glicose bem absorvida
pela musculatura seja transformada em lipídeos: a fibra não tem enzimas
lipogênicas, mas o hepatócito sim.
Por tudo isso o exercício físico, decorrente de práticas desportivas
ou de atividades cotidianas de cada pessoa, só alcança bons resultados em
condições de perfeita saúde. Por outro lado, uma condição de perfeita saúde
só é alcançada quando há um mínimo de exercício físico, porque ainda
continua valendo aquele dogma da fisiologia: "a função faz o órgão"
(Riegel, 2006).
Nesse contexto o referente trabalho busca demonstrar á bioquímica do
exercício físico, bem como as principais rotas metabólicas, patologias e
suplementação por creatina, no qual é muito discutida na atualidade e a
contração muscular a nível molecular.
2. A CONTRAÇÃO MUSCULAR E SEUS ASPECTOS MOLECULARES
Os seres vivos ao longo do tempo desenvolveram tecidos especializados
para a produção de movimento. Nestes tecidos, um grande número de células
coopera entre si, para realizar um encurtamento reversível em um processo
conhecido como contração muscular, onde ocorre a conversão da energia
potencial de ligações químicas, contidas nas moléculas de ATP, em trabalho
mecânico. O termo contração muscular parece diretamente associado à
interação de grandes músculos e ossos, que irão controlar o movimento de
membros e a locomoção.
Para melhor entender o processo de contração muscular é fundamental o
conhecimento sobre a organização estrutural do tecido muscular (Junqueira e
Carneiro, 2005).
2.1. Estrutura do Músculo Estriado Esquelético
O músculo esquelético é formado por um número variável de células: as
fibras musculares. Cada fibra apresenta um formato cilíndrico, e é uma
célula grande multinucleada, formada pela fusão de células precursoras
chamadas mioblastos, que conservam seus núcleos. É envolvida por uma
membrana contínua (sarcolema), e é eletricamente separada das outras
fibras. A membrana plasmática contém canais de sódio, potássio e cálcio.
Estes canais são responsáveis pela manutenção do potencial eletroquímico
entre o meio intra e extracelular. Nesta membrana ocorre invaginações para
o interior da célula, dando origem aos túbulos transversais (túbulos T),
que é uma rede de túbulos que passa por entre as miofibrilas. Os túbulos T
estão em contato com um sistema de cisternas que envolvem longitudinalmente
as miofibrilas, chamado de retículo sarcoplasmático. Ele é um sistema de
túbulos e sacos longitudinais, que envolve cada e todas as miofibrilas,
como um revestimento. No local por onde passam os túbulos T, o retículo
sarcoplasmático forma estruturas volumosas, saculares, chamadas de
cisternas terminais, uma de cada lado dos túbulos T. Esse conjunto é
chamado de tríade: duas cisternas terminais com um túbulo T entre elas, com
suas membranas justapostas como pode ser observado na figura 01.
O retículo sarcoplasmático tem a capacidade de acumular cálcio dentro
de suas cisternas, por meio de uma proteína que é uma ATPase Ca2+ - Mg2+
dependente, que existe na membrana.Com isso, o retículo sarcoplasmático é
capaz de regular a contração na célula muscular, por controlar os níveis de
cálcio na célula. Esse controle é realizado através do arranjo estrutural
dos túbulos T, e é coordenado por impulsos nervosos. Todas essas estruturas
são envolvidas e banhadas pelo sarcoplasma, o líquido intracelular da fibra
muscular.
Uma das características marcantes em uma fibra muscular é a presença
de estriações transversais, claras e escuras, alternadas, que ocorrem
perpendicularmente ao longo do eixo da fibra. As bandas escuras são
nomeadas como Bandas A e as bandas claras como Bandas I. O centro de cada
Banda A é ocupada por uma região mais clara, conhecida como Zona H, a qual
é cortada por uma fina linha M. Cada Banda I é cortada por uma linha escura
chamada de Linha Z. A região da miofibrila entre duas linhas Z sucessivas,
conhecida como sarcômero, é considerada a unidade contrátil das fibras
musculares esqueléticas. Não pode esquecer que existe um alinhamento
transversal perfeito entre as linhas Z sucessivas das miofibrilas no
interior da fibra, e, portanto entre os sarcômeros. Esse alinhamento é
indispensável para que se tenha, na fibra como um todo, o padrão de bandas
claras e escuras característicos dos músculos estriados.
Ao nível de microscopia eletrônica, observa-se que os túbulos T
atravessam transversalmente a fibra, e localizam-se, especialmente entre as
Bandas A e I. Cada sarcômero possui dois conjuntos de túbulos T. O retículo
sarcoplasmático que está em contato com os túbulos T também está em contato
com as Bandas A e I. A organização da fibra muscular esquelética mostra
filamentos contráteis nomeados miofilamentos, que são de dois tipos
distintos: filamentos grossos e finos. As miofibrilas são formadas por
estes miofilamentos e constituem a unidade motora que é o sarcômero (Figura
02) (Junqueira e Carneiro, 2005).
2.1.1. Estrutura do filamento grosso
O filamento grosso é formado basicamente pela reunião de moléculas de
miosina. As moléculas de miosina estão unidas pelas caudas, posicionando-se
em direções opostas a partir de um núcleo central, que corresponde à "zona
careca". No sarcômero, as "zonas carecas" estão localizadas na altura da
zona H. Os filamentos apresentam as projeções típicas, que constituem as
cabeças das miosinas, espaçadas regularmente em toda a sua extensão, exceto
na parte central, chamada "zona careca", em que não se observam projeções.
O filamento grosso é constituído por cerca de 300 moléculas de miosina.
A miosina é uma molécula assimétrica, constituída de duas cabeças
globulares ligadas a uma longa cauda, sendo composta de seis cadeias
polipeptídicas; duas cadeias pesadas, e dois pares de cadeias leves (LC),
não-idênticas. A seqüência N-terminal forma a região da cabeça, onde cada
uma é composta de aproximadamente 850 resíduos de aminoácidos, na qual
estão localizados os sítios de ligação de actina e nucleotídeo. A porção C-
terminal das duas cadeias pesadas se associa para formar a cauda, que tem
uma estrutura altamente alongada, formado por um enovelado de α-hélices, e
é composta de aproximadamente 1.100 resíduos de aminoácidos. Entre a região
mais globular da cabeça e a prolongação da cauda estão os sítios de ligação
das duas cadeias leves. No músculo esquelético, as cadeias leves são
divididas em três classes: cadeia leve alcalina 1 (LC1, 25 kDa), cadeia
leve 2 (LC2, 20kDa) e cadeia leve alcalina 2 (LC3, 16 kDa). Cada cabeça de
miosina está associada com um tipo de cadeia leve, uma essencial (LC1 ou
LC3) e uma regulatória (LC2).
A miosina pode ser facilmente clivada em fragmentos funcionais
separados, por proteólises controladas, utilizando-se, por exemplo,
quimotripsina ou papaína. Um sítio de clivagem típico ocorre por volta de
130 kDa no N-terminal, e produz dois fragmentos, meromiosina pesada (HMM) e
a meromiosina leve (LMM), que podem ser separadas por diálise, em condições
de baixa força iônica(Junqueira e Carneiro, 2005).
2.1.2. Estrutura do filamento fino
O principal componente do filamento é a actina. Pode existir na forma
monomérica (G-actina) e na forma filamentosa (F-actina), dependendo da
força iônica do meio. A G-actina consiste de uma cadeia polipeptídica com
375 aminoácidos, cuja seqüência de aminoácidos e propriedades bioquímicas
foi altamente conservada durante a evolução. A F-actina além de formar o
filamento fino, é de fundamental importância para acelerar a atividade
Mg2+ATPásica da miosina, favorecendo a liberação dos produtos da hidrólise
de ATP(Junqueira e Carneiro, 2005).
2.1.3. Filamentos deslizantes
Pela teoria, a contração do músculo é devido à formação de pontes
entre a actina e a miosina, sendo que esta última funciona como uma
dobradiça, e faz com que o filamento fino deslize sobre o filamento grosso.
É o mecanismo pelo qual a miosina e actomiosina hidrolisam ATP. A
miosina é uma enzima que catalisa a hidrólise de MgATP, gerando a força
necessária para o trabalho mecânico da contração muscular. Na ausência de
actina, a ligação de ATP à miosina ocorre rapidamente. Os produtos da
hidrólise de ATP (ADP e Pi) são liberados seqüencialmente, ocorrendo
primeiro a saída do Pi, e subseqüentemente a de ADP(Junqueira e Carneiro,
2005; Cameron, 2004).
2. Complexo troponina-tropomiosina
O filamento fino além da actina é constituído também pela tropomiosina
e pelo complexo troponina, formando uma série de unidades regulatórias
repetidas; cada unidade regulatória contém sete monômeros de actina, uma
tropomiosina e um complexo troponina.
2.2.1. Tropomiosina
A tropomiosina é uma longa cadeia polipeptídica enrolada sob a forma
de dupla hélice, que se polimeriza formando longos filamentos. Essa
estrutura é estabilizada primariamente por interações hidrofóbicas e
secundariamente por interações eletrostáticas. Os filamentos de
tropomiosina se localizam nos sulcos da dupla hélice de actina e cada
intervalo de sete monômeros de actina, na forma filamentosa. Direciona-se
ao centro da fenda muscular durante a ativação do músculo
É postulado que no músculo em repouso a tropomiosina ocupa o sítio de
actina necessário para a ligação da cabeça da miosina. O movimento da
tropomiosina, no início da contração, libera o sítio de ligação da miosina,
então o complexo actomiosina pode ser formado e o músculo pode contrair.
2.2.2. Complexo troponina
É um complexo protéico globular composto por três subunidades:
troponina T (TnT), troponina I (TnI) e troponina C (TnC). A TnT une cada
complexo troponina a um sítio específico na molécula de tropomiosina; a TnI
inibe a interação entre filamentos finos e grossos; e a TnC se liga a íons
cálcio, sendo a principal responsável pelo disparo da contração muscular. O
complexo troponina, em conjunto com a tropomiosina, regula através da
ligação ao Ca2+, a interação contrátil entre a miosina e actina.
Durante a contração muscular a TnC forma complexos específicos com a
TnI e a TnT. Vários estudos vêm mostrando que a ligação da TnC à TnI é mais
forte na presença de Ca2+ do que na ausência. Acredita-se que a ligação de
Ca2+, nos sítios de baixa afinidade da TnC, modifica a interação desta com
a TnI, reduzindo a ação do peptídeo inibitório, pois induz a uma mudança
conformacional na TnC, expondo mais regiões hidrofóbicas desta. Esta
mudança na conformação da TnC aumenta a sua ligação com a TnI e,
consequentemente, diminui a interação da TnI com a actina. Desta forma, a
actina fica livre para se ligar à miosina, ocorrendo a contração muscular
(Junqueira e Carneiro, 2005; Cameron, 2004).
3. Mecanismo de regulação da contração
O mecanismo de contração, de acordo coma hipótese dos filamentos
deslizantes, é iniciado quando o impulso nervoso é arrastado ao longo do
axônio do neurônio motor. Com a chegada do impulso nervoso, há a
conseqüente despolarização da membrana pré-sináptica, e exocitose da
acetilcolina na fenda sináptica. A acetilcolina se liga aos seus receptores
na membrana pós-sináptica, provocando a despolarização do sarcolema, dos
túbulos T e do retículo sarcoplasmático. Esses eventos provocam a liberação
de Ca2+ do retículo sarcoplasmático para o sarcoplasma em torno das
miofibrilas; o aumento de Ca2+ no interior das fibras é em torno de 100
vezes. O Ca2+ liberado ocupa os sítios de baixa afinidade da TnC, levando a
uma mudança conformacional no domínio N-terminal, o que irá aumentar a
ligação entre a TnC e TnI, e diminuir a afinidade da TnI pela actina. O
ancoramento da tropomiosina na actina fica enfraquecido; a tropomiosina
então gira deixando de bloquear o sítio de ligação da miosina na actina,
permitindo que a cabeça da miosina se ligue a actina. O ATP presente na
cabeça da miosina é hidrolizado em ADP e Pi. O Pi é liberado, resultando
não somente no aumento da força de ligação entre actina e miosina. O ADP é
também liberado quando a cabeça se dobra sobre o braço, e arrasta o
filamento de actina preso em direção ao centro do sarcômero (força de
contração). Uma nova molécula de ATP se liga à cabeça de miosina, levando a
uma liberação da ponte entre actina e miosina. Havendo actina ativa, esta
miosina se liga a outra molécula de actina, e o processo se repete enquanto
houver a presença de ATP e Ca2+( Junqueira e Carneiro, 2005; Cameron,
2004).
O relaxamento ocorre quando o processo é revertido: cessado o
estímulo, o nível de Ca2+ citosólico é diminuído, devido à sua captação
pelo retículo sarcoplasmático, e o Ca2+ se dissocia da TnC, revertendo o
complexo troponina-tropomiosina à conformação original. Este é o modelo do
impedimento estérico para a regulação da contração muscular, no qual a
presença física do conjunto troponina-tropomiosina é o que bloqueia a
ligação da miosina à actina, na ausência de Ca2+.
Em um animal vivo, nunca ocorre à contração ou relaxamento total dos
músculos. Uma parte dos músculos esqueléticos está parcialmente contraída,
para manter o tônus muscular normal. A contração de um músculo leva ao
relaxamento do músculo que controla o movimento oposto(Junqueira e
Carneiro, 2005; Cameron, 2004).
3. GLICONEOGÊNESE HEPÁTICA EM ESFORÇO DE LONGA DURAÇÃO
A capacidade orgânica de estocar energia na forma de carboidrato é
limitada, o que constitui uma barreira á continuidade do esforço
prolongado. Isto porque os esgotamentos desses estoques ameaçam o adequado
suprimento de glicose para o sistema nervoso central, podendo gerar um
quadro de fadiga central por hipoglicemia. A formação de novo de glicose, a
partir de precursores não oriundos diretamente da ingestão, pela via porta
hepática, possibilita a reciclagem de matéria apta a atender parcialmente
essas demandas metabólicas. A associação da gliconeogênese com a de
fornecimento de glicose para outros tecidos é conferida aos rins e ao
fígado, pela presença da enzima glicose 6 fosfatase. Esta enzima catalisa a
formação de glicose a partir de glicose 6 fosfato, retirando este
grupamento, e aumentando a pressão osmótica da glicose, possibilitando sua
saída da célula. Acredita-se que a gliconeogênese renal se torne importante
na situação de jejum prolongado, mas ao contrário do fígado, o rim não é
capaz de estocar glicogênio em quantidades significativas. Entretanto,
pouco se sabe sobre a participação dos rins durante o esforço, sendo que a
maior parte da literatura se restringe à função hepática. Em repouso,
durante o período pós-prandial, estima-se que 25% da produção hepática de
glicose seja oriunda da gliconeogênese. Deste percentual, 16% derivam do
lactato, 6%de aminoácidos (preponderantemente a alanina) e 2% do glicerol.
Embora essa contribuição durante o esforço possa parecer limitada, já que
contribui com cerca de 15% da produção de glicose no fígado, aos 30min. de
esforço sua fundamental importância é de atender o sistema nervoso central
e retardar a fadiga hipoglicêmica. Esse quadro, obviamente, se torna mais
importante em situações de grande depleção de glicogênio hepático, como em
esforços mais prolongados, esforços realizados em jejum etc. O entendimento
dessa via é extremamente importante, quando se pensa em otimizar as
estratégias nutricionais que visam a reposição de glicogênio. Não obstante,
a complexidade dos estudos que inferem a gliconeogênese em humanos alimenta
muitas controvérsias sobre o papel desta via, durante o esforço (Cameron,
2004).
3.1. Gliconeogênese
3.1.1. Substrato
Os principais precursores da gliconeogênese hepática são o lactato,
alanina e o glicerol, respectivamente, embora muitos outros aminoácidos
possam desempenhar este papel. No que tange ao esforço de longa duração,
todos esses precursores encontram-se disponíveis, uma vez que o glicerol é
oriundo da lipólise, o lactato da glicogenólise muscular e a alanina da
proteólise, que atinge principalmente tecidos gástricos e músculos menos
ativos no esforço. Ressalta-se que a quantidade de alanina liberada pelo
músculo esquelético é muito maior que aquela constitutiva do mesmo, na
maior parte das situações, o lactato constitui o principal precursor
gliconeogênico, a alanina aumenta sua contribuição em situações de esforço,
e o glicerol em situações onde haja grande mobilização de lipídeos. Tanto o
lactato quanto a alanina, no fígado, são convertidos primeiro a piruvato. A
formação de piruvato a partir de lactato ocorre pela ação da lactato
desidrogenase. Esta enzima ocorre em isoformas com afinidade diferenciada
para a conversão de piruvato em lactato, ou lactato em piruvato, cuja
expressão é diferenciada nos diversos tecidos. A alanina é formada no
músculo, por transaminação, sendo o grupo amino (NH2) fornecido
principalmente pelos aminoácidos de cadeia ramificada e o esqueleto
carbônico, por piruvato. Este pode ser originário de outros aminoácidos ou
da glicólise. O glicerol é convertido pela glicerol cinase em glicerol 3
fosfato e este pela desidrogenase em diidroxiacetona fosfato, que é um
intermediário da via gliconeogênica(Cameron, 2004).
3.1.2. Transporte
O transporte do glicerol para o fígado ocorre por difusão, enquanto o
transporte de lactato e alanina é principalmente mediado por
transportadores protéicos denominados transportadores monocarboxilados
(MCT).
A função dos MCT no transporte de lactato vem sendo investigada,
devido à hipótese de que o lactato produzido durante o esforço (no músculo)
possa ser captado pelo próprio músculo, com células glicolíticas produzindo-
o e células oxidativas captando-o e oxidando-o. Esse fenômeno tem sido
denominado de "lançadeiras de lactato", onde esse lactato desempenharia um
papel central na distribuição do potencial energético dos carboidratos.
Sabe-se hoje que varias isoformas desses transportadores ocorrem de
maneira isolada ou combinada, e que esta configuração está associada às
peculiaridades metabólicas dos diversos tecidos(Cameron, 2004).
3.1.3. Regulação
A gliconeogênese é um processo endergônio que requer 6 moléculas de
ATP ( na verdade, duas são de GTP) para cada molécula de glicose formada.
Como cada molécula de glicose, ao ser degradada na glicólise, produz apenas
4 moléculas de ATP, a gliconeogênese deve estar acoplada a processos
exergônicos que "paguem" este déficit energético, como a beta oxidação. De
fato, a via de produção de energia mais ativa do fígado é a oxidação de
gorduras. A síntese de glicogênio representa uma reserva de estoques
energéticos para ser usada por outros tecidos.
A regulação da gliconeogênese ocorre pela ação de vários hormônios,
na disponibilização de substratos e em etapas enzimáticas específicas. Há
três passos metabólicos chaves na regulação da via, que são os que
"contornam" reações energeticamente desfavoráveis (irreversíveis) da
glicólise. Nessas etapas, a conversão de substrato em produto ocorre
simultaneamente com o processo inverso, constituindo o que se chama de
ciclos fúteis. Quando há predominância de um sentido sobre o outro, há
maior fluxo de matéria em favor de uma das vias, sendo a taxa de ciclagem
proporcional ao fluxo de matéria no sentido predominante. Na
gliconeogênese, essas etapas de regulação compreendem o ciclo glicose –
glicose 6 fosfato – glicose; o ciclo frutose 6 fosfato – frutose 1,6
bifosfato – frutose 6 fosfato e o ciclo piruvato – fosfoenol piruvato –
piruvato (Cameron, 2004; LEHNINGER2006).
4. ASPECTOS NUTRICIONAIS
De todos os suplementos nutricionais disponíveis no mercado, talvez os
líquidos com carboidratos sejam os mais efetivos e os mais amplamente
usados. Qualquer atleta de longa distância sabe que levar a termo um treino
longo é algo muito mais fácil quando usando adequadamente esse tipo de
suplemento.
De forma geral, vários carboidratos podem possibilitar o retardo da
fadiga por hipoglicemia. Essa vantagem aparente, por outro lado, pode
atenuar a gliconeogênese hepática. Bebidas carboidratadas com lactato,
disponíveis no mercado, sustentam sua eficiência pelo fato de aumentar a
disponibilidade deste precursor gliconeogênico. A idéia é que, nos pós-
esforço, uma fração significativa da síntese de glicogênio ocorreria pela
chamada via alternativa.
Um outro ponto, este conceitual, é que se, por um lado, as bebidas
carboidratadas permitem o prolongamento do esforço, é possível que retardem
as adaptações próprias do metabolismo energético, particularmente da
gliconeogênese hepática. Isto porque tendem a abrandar as respostas agudas
de alguns hormônios que modulam a glicemia (glucagon, catecolaminas,
cortisol), que como visto, respondem pela expressão de algumas enzimas da
via (Cameron, 2004; LEHNINGER2006).
5. METABOLISMO, TRANSPORTE E ARMAZENAMENTO DE CREATINA – EFEITOS DA
SUPLEMENTAÇÃO E EXERCÍCIO
No fim da década de 1980, estudos chamou a atenção para indivíduos que
utilizavam suplementação de creatina, o que levou a um incremento do
consumo desse composto por praticantes de diversas modalidades esportivas.
No entanto a suplementação oral de creatina já era estudada desde a década
1920, onde estudos mostram um aumento da massa corporal total e de massa
magra, o que levou esses esportistas a adotarem o uso como meio de obtenção
de hipertrofia muscular.
A creatina é um composto nitrogenado, sintetizado a partir dos
aminoácidos arginina, glicina e metionina, onde a arginina e glicina formam
guanidinoacetato devido a atividade da enzima arginina:glicina
amidinotrasferase (AGAT), que ocorre principalmente nos rins. O
guanidinoacetato é exportado para o fígado e pâncreas, onde o grupo metil
da S-adenosilmetionina é transferido para ele formando creatina, esta
reação é catalisada pela N-guanidinoacetato metiltrasferase (GAMT).
Concentrações plasmáticas elevadas de creatina, como as obtidas por
suplementação oral, inibem a expressão do gene responsável pela síntese de
AGAT, diminuindo a síntese endógena de creatina por um processo de
"feedback" negativo.
A creatina, em sua forma fosforilada, atua como "tampão" temporário de
energia para ressíntese de ATP, em processos de aumento repentino do gasto
energético. Este sistema funciona de forma eficiente, que não permite um
decréscimo importante na concentração de ATP, em um tempo curto, mas
suficiente para que o metabolismo glicolítico o substitua na sua
ressíntese.
No músculo humano, a concentração média de creatina foi estimada em120
mmol.Kg-1 de massa seca, que representa 95 a 98% do total de creatina
corporal. Sendo que, da creatina total do músculo, aproximadamente 60% sob
a forma fosforilada. Entretanto pesquisas mostraram que a concentração de
creatina varia em diferentes grupos de músculo em humanos.
O aumento na ingestão de creatina acarreta um aumento na concentração
intramuscular de creatina total para 149-152 mmol.Kg-1 de massa seca,
elevando a osmolaridade e, posteriormente, a quantidade total de líquido
intramuscular, sugerindo que o aumento da massa magra possa ter uma
importante contribuição, devido ao acúmulo hídrico.
A creatina é captada pela célula muscular por um transportador sódio e
cloro de alta afinidade dependente, da família dos transportadores de
dopamina, serotonina, noroepinefrina, glicina e taurina. O transportador de
creatina usa a energia do gradiente de Na+K+-ATPase, com estequiometria de
2 NA+ para cada molécula de creatina.
O produto final do metabolismo de creatina é a creatinina, no qual é
formada numa reação espontânea (não enzimática), irreversível em mamíferos,
a partir da ciclização e perda do fosfato da creatina fosfato. A taxa de
degradação de creatina em creatinina é de aproximadamente 1,7%.dia-1, do
total de creatina, e está relacionada com a quantidade de massa muscular
apresentada pelo indivíduo.
Em função de seu caráter não-iônico, a creatinina se difunde
constantemente para o meio extracelular e para a corrente sanguínea, até
ser excretada pelo rim (Cameron, 2004).
5.1. Suplementação de creatina
Estudos anteriores demonstraram o aumento das concentrações
musculares de creatina livre e creatina fosfato durante o período de
suplementação oral.
Quase 100% da creatina suplementada é absorvida no intestino, com
aumento da excreção de cratinina. A continuidade na suplementação em altas
doses (10-20g.d-1) faz com que, entre cinco e sete dias aproximadamente,
90% da creatina seja excretada, mostrando uma baixa captação pelos tecidos.
Duas estratégias de suplementação têm sido predominantemente usadas:
a) uso constante (2-5 g.dias-1) de creatina, que levaria aproximadamente 28
dias para atingir a saturação das células; b) um período inicial (ou único)
de 3 a 7 dias, onde há uma carga maior de creatina (20-30g.dia-1);
A captação de creatina in vivo é estimulada por insulina. Esses
achados levaram ao uso de suplementação de carboidratos associada à
creatina. Estudos mostram haver uma menor excreção de creatina quando
ocorre essa associação.
Utilizando Espectroscopia de Ressonância Magnética, mediram aumentos
significativos na concentração total de creatina no encéfalo de
humanos(Tabela 01), submetidos à suplementação oral de creatina.
" "Valor basal (mmol/l) "Pós-suplementação (mmol/l) "
"Matéria "6,4 +/- 0.3 "6,7 +/- 0.4* "
"Cinza " " "
"Matéria "4,8 +/- 0.6 "5,3 +/- 0.6* "
"Branca " " "
"Cerebelo "8,3 +/- 1,2 "8,7 +/- 0.8* "
TABELA 01. Total de creatina em diferentes porções do encéfalo. Medidas
feitas antes e após 4 semanas de suplementação oral de creatina (20g.dia-1
em doses de 5g) por MRS* diferença em relação ao valor basal (p<0,05).
Existe algumas duvidas no que diz respeito a melhora da performance
em exercício de alta intensidade dos atletas suplementados devido pesquisas
realizadas, no qual mostram resultados diferentes, isso deve-se ao fato da
metodologia utilizada ser diferente por diversos pesquisadores (Cameron,
2004).
5.1.1. Índices Metabólicos de Fadiga
Alterações metabólicas que levam a fadiga também foram área de
interesse dos estudos sobre suplementação de creatina. Alguns índices
correlacionados com a fadiga são concentração de lactato intramuscular e
sérico, pH, concentração de amônia( intra e extracelular) e glicogênio
muscular.
A maior parte dos estudos não demonstrou alterações significativas
nestes índices propostos, onde foi verificada uma redução na concentração
plasmática de amônia, após a atividade de intensidade moderada. Os autores
justificam tal evento como sendo causado por uma redução no catabolismo de
AMP, fato que contribuiria para retardo no aparecimento de fadiga.
Outro fator que requer maiores estudos é a utilização da
suplementação de creatina como contribuinte na diminuição da
gliconeogênese.
Doenças renais e hepáticas durante o uso prolongado do suplemento não
foram relatadas. E o uso da creatina tem sido empregado no tratamento de
doenças neuro-degenerativas, onde neurônios submetidos a condições
semelhantes a de diversas doenças do gênero, tem mostrado maior condições
de manutenção das funções e da sobrevivência, quando as concentrações de
creatina são aumentadas(Cameron, 2004).
6. MUDANÇAS NA EXPRESSÃO GÊNICA, DOENÇAS CRÔNICAS E ADAPTAÇÕES DO CORPO
HUMANO RELACIONADAS AO EXERCÍCIO FÍSICO.
Doenças crônicas,não-transmissíveis, são caracterizadas por
progredirem vagarosamente e terem grande duração. Essas doenças são
relacionadas com a sociedade moderna. Muitas, irreversíveis, causam lesões,
grande sofrimento e grande custo com médicos e medicamentos ao paciente e
podem o levar ao óbito.
Uma hipótese diz que o genoma humano é programado evolutivamente para
a atividade física, diz também que a gênese das disfunções metabólicas tem
associação com a inatividade física. Colocando o exercício físico como
nível primário de atenção à saúde, o conhecimento das bases moleculares,
celulares e genéticas de doenças causadas por essa inatividade será objeto
de estudo daqui por diante.
Um fator ambiental, como o sedentarismo, pode alterar uma população
de genes, que resultaria num fenótipo apropriado para evidenciar o
aparecimento de sintomas clínicos. Contrariamente, exercícios físicos
controlados trariam um distanciamento deste quadro e uma aproximação de uma
boa saúde para o paciente (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.1. O surgimento da programação da atividade física no genoma humano
O homem, no final da Era Paleolítica (50.000 – 100.000 a.C.), a
sobrevivência do homem dependia das suas necessidades e atividades básicas,
como água, comida, abrigo e fabricação de armas. Para a obtenção destas
necessidades, eram necessários mais de 30 minutos diários de atividade
física moderada.
Organismos fisicamente resistentes, que permitem um aumento na
capacidade de produção de ATP, deveriam ter mais chances de sobreviver e
transferir os genes para a geração futura. Tiramos daí que, provavelmente,
as características das vias metabólicas do homem moderno são adaptadas por
um estilo de vida ativo, feito por dietas ricas em proteínas e pobres em
gorduras.
Neel (1962), a partir dos ciclos de fome-alimentação, propôs a
hipótese do "gene econômico", onde indivíduos portadores das adaptações
vindas deste gene converteriam mais calorias em tecido adiposo durante os
períodos de alimentação. Uma ingestão calórica menor que os níveis de
requerimento resulta em uma série de respostas fisiológicas, bioquímicas e
comportamentais. Exemplos destas são a diminuição da atividade física
espontânea e a atrofia do músculo esquelético pela degradação de proteínas
musculares. Resumindo, a inatividade física produz atrofia muscular e
degradação de proteínas responsáveis pelo fornecimento de energia através
da gliconeogênese.
Durante uma inatividade física, o músculo esquelético não requer
muita glicose no sangue, desenvolvendo uma resistência à insulina como
efeito de moderar a hipoglicemia. Na necessidade de trabalho, como obtenção
de alimentos e caça, a resistência à insulina é superada e a glicose é
aumentada no músculo envolvido na contração por uma série de cadeias. Isto
comprova que as características das vias metabólicas foram programadas no
genoma humano desde a Era Paleolítica.
O homem moderno é ainda, geneticamente, adaptado ao estilo de vida da
sociedade pré-agricultora. Contudo, está constantemente exposto ao
sedentarismo e/ou dietas pobres em fibras e ricas em gorduras, deixando o
fenótipo "econômico" desvantajoso. Com aumento da conversão de caloria em
tecido adiposo antecipadamente a períodos de fome que não ocorrerão, a
conservação do "gene econômico" desenvolvera obesidade e disfunções
metabólicas como forma de resistência à insulina (Cameron, 2002; Riegel,
2006).
6.2. Mudanças no corpo humano induzidas por exercícios físicos
6.2.1. Tamanho do músculo
A quantidade de massa muscular no homem vem diminuindo desde o surgimento
do Homo erectus. Recursos hoje utilizados em indivíduos sedentários,
provavelmente se assemelham aos meios de manutenção da massa magra, aos
quais o homem da Era Paleolítica se submetia. São observadas, mediante a
diminuição da massa muscular secundária relacionada à fragilidade física,
desnutrição ou a estados patológicos.
O gene da α–actina esquelética é bem aceito e serve como modelo para a
compreensão dos mecanismos moleculares de como um aumento na carga sobre os
músculos pode estimular seu crescimento. Aumentos na quantidade e na
potencialidade do estado pós-translacional do SRF (Fator de Resposta
Sérica) foram notados em músculos com hipertrofia. O aumento da atividade
transcricional de SRF pode estimular a transcrição do RNAm para α -actina.
As mudanças adaptativas no músculo esquelético são atribuídas aos aumentos
translacionais de RNAm existentes, que se tornam suficientes para estimular
a produção de proteínas. O tipo de estímulo dado pelo exercício aponta qual
via de sinalização será ativada ou inibida, promovendo, assim, a regulação
fenotípica (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.3. Capacidade oxidativa do músculo esquelético
A duração da atividade contrátil está diretamente associada à densidade
mitocondrial do músculo em contração. O citocromo c é um marcador da
densidade mitocondrial e da capacidade oxidativa do músculo, estando a
concentração de RNAmcitocromo c aumentada ou diminuída por exercícios e
inatividade física, respectivamente.
A importância de uma grande quantidade de mitocôndrias é a redução de
rompimentos homeostáticos nos músculos em contração. Músculos treinados
oxidam mais os ácidos graxos e poupam os estoques de glicogênio, garantindo
proteção contra a hipoglicemia e fadiga.
O endotélio vascular é importante modulador do tônus e da função
vasomotora, por sintetizar e liberar o ácido nítrico (NO) para dilatação
fluxo-dependente das artérias condutoras, durante os períodos de incremento
do trabalho cardíaco. Lipemia pós-prandial, hiperglicemia, estresse e
inatividade física diminuem os níveis de expressão de ácido nítrico nas
paredes dos vasos e, consequentemente, os incrementos de fluxo através dos
vasos sanguíneos coronarianos.
Em logo prazo, exercícios conduzem ao aumento do diâmetro dos vasos
sanguíneos coronarianos. Além da vasodilatação, outras ações anti-
aterogênicas, como a inibição da agregação plaquetária, a proliferação
celular e a adesão leucocitária às células endoteliais são atribuídas ao
NO.
A estimulação da pelo exercício, para o aumento do aporte de glicose no
músculo esquelético, mostra mecanismos moleculares distintos da via de
sinalização da insulina. Por exemplo,
atividades contráteis não estimulam a auto-fosforilação dos receptores de
insulina e fosforilação da IRS-I, ou a atividade do PI3-kinase.
O fator mais limitante da regulação do suprimento de glicose para o
músculo esquelético via insulina ou mediada por exercícios é a translocação
do GLUT4 para a membrana celular. Num intervalo de cinco a dez dias após
redução do nível de atividade física, com o aumento da concentração
plasmática de glicose e insulina em humanos saudáveis, podem ser observados
efeitos como a diminuição da tolerância oral à glicose. Esses dados sugerem
um rápido desenvolvimento de resistência à insulina no músculo esquelético,
concordando com a base evolucionária para promoção do diabetes tipo II
(Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.4. Adaptações respiratórias
As respostas que os pulmões conferem para absorver oxigênio do ar
atmosférico e expulsar mais gás carbônico do corpo parecem ser
influenciadas pelo treinamento. As estruturas contráteis pulmonares
hipertrofiam.
Os músculos estriados que integram o ato respiratório são os que mais
aumentam de volume, e isto pode ser observado pela dimensão do tórax
daqueles que praticam exercício físico. Os músculos intercostais e o
diafragma são os mais exigidos, daí hipertrofiarem mais.
A adaptação respiratória consiste em aumentar a transferência de
oxigênio ao músculo em trabalho. Além da elevação do teor de hemoglobina, a
alteração do metabolismo eritrocitário tem efeitos positivos. Nestas
células cresce a concentração de 2,3-difosfoglicerato, que facilita a
liberação de O pela HbO .
Observando o papel fundamental do oxigênio na sustentação do esforço
de duração média ou longa, as adaptações respiratórias foram feitas para
serem alcanças com certa facilidade. Portanto, aceita-se que o sistema
respiratório não seja fator limitante para o consumo máximo de oxigênio
(Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.5. Adaptações cardiovasculares
Um músculo exigido cronicamente para o trabalho precisa aumentar seu
índice de perfusão. Quem se vincula primeiramente a este objetivo é o
coração que aumenta sua massa e seu volume sistólico. A elevação do débito
cardíaco em uma pessoa treinada é devida à cardiomegalia e não ao aumento
da frequência. Esta é estável para cada grupo etário e declina a partir dos
trinta anos de idade.
Um outro fator ligado à perfusão é a diferença arteriovenosa de
consumo de oxigênio, que é uma modificação importante, já que quanto maior
ela for melhor será o aproveitamento do oxigênio sanguíneo que aporta à
fibra.
Nos primeiros dois a três meses de treinamento, o VO max aumenta,
mantendo uma boa relação de crescimento com o débito cardíaco e a diferença
arteriovenosa. Exercícios mais prolongados incrementam o VO max várias
vezes, o mesmo acontecendo com o volume sistólico. Isto quer dizer que a
capacidade de uso do oxigênio cedo atinge uma intensidade máxima.
Os tipos de alteração ocorridos em nível cardiovascular mostram que o
aumento de consumo de O está mais limitado à sua oferta ao músculo do que
seu uso pelo tecido (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.6. Adaptações musculares
O condicionamento físico traz conseqüências importantes como os
aumentos da densidade capilar e do fluxo sanguíneo locais.
A densidade capilar é o número de capilares por milímetro quadrado.
Este é um dos quocientes mais aumentados pela atividade física. Seu
incremento acompanha aproximadamente o VO max e o débito cardíaco. É
importante salientar que a densidade capilar é aumentada à custa do
crescimento de novos capilares, além da hipertrofia dos preexistentes. Uma
pessoa bem treinada chega a ter esta densidade 60% maior do que outra
sedentária.
A hipertrofia muscular é, macroscopicamente, um dos mais claros
sinais do treinamento. Ela é provavelmente decorrente da formação de novas
fibras, bem como o aumento de tamanho das já existentes. A mioglobina é uma
das proteínas que sobem de concentração, havendo um elevado depósito local
de oxigênio.
De acordo com o que encontramos localmente na musculatura em
treinamento, observamos que o fluxo sanguíneo, a densidade capilar e o
volume da massa contrátil estão associados na melhoria da condição física.
O aumento do fluxo representa mais velocidade de circulação nos vasos
maiores aferentes e eferentes ao músculo: as trocas sangue-tecido ficam
favorecidas pelo maior volume sanguíneo e pelo maior tempo disponível para
estas trocas (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.7. Adaptações energéticas
6.7.1. Glicogênio
O processo contrátil é sustentado pelo glicogênio muscular, pela
gliconeogênese, pelo glicogênio hepático, pelo triacilgliceróis do tecido
adiposo e pelo triacilglicerol intramuscular.
O volume de glicogênio depositado tem estreita ligação com a capacidade
de executar o esforço máximo, como, por exemplo, competir em bicicleta.
Isto explica o fato de que a exaustão geralmente coincide com grave
esvaziamento dos depósitos musculares deste polissacarídeo.
Com o ritmo da maratona, grave depleção do glicogênio ocorre aos 30km,
aproximadamente. A partir daí, a intensidade da corrida diminui, pois os
ácidos graxos do organismo sustentam com grande preponderância a atividade
física e, para produzir a mesma quantia de ATP, necessitam de mais O .
Podemos então concluir que o glicogênio funciona como um plus energético de
grande significação (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.7.2. Glicose
Durante o esforço, as fibras dependem da captação de glicose
circulante. Por exemplo, ao longo de um trabalho aeróbico moderado de 40
minutos, o consumo de glicose sanguínea pode contribuir com até 30% do ATP
que a fibra consome. Esta glicose vem da gliconeogênese ou do glicogênio
hepático. Vale lembrar que a gliconeogênese renal só tem valor fisiológico
em situação de jejum muito prolongado (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
6.8. Efeitos endócrinos
Sabemos que durante o exercício físico a liberação de insulina
diminui, principalmente porque fica inibida pelas catecolaminas.
Acredita-se numa ampla adaptação endócrina durante o treinamento. Uma
delas, muito bem comprovada, é o aumento do número de receptores para a
insulina na fibra treinada. Com isto, ela é capaz de captar glicose e a
gastar em insulinemias mais baixas. Este fato é a razão do clássico
conselho que os diabéticos recebem de abandonar o sedentarismo a qualquer
preço.
A programação genômica humana, a partir de um estilo de vida ativo
como o do homem paleolítico, permitiu o desenvolvimento de alelos para
vantagem seletiva e sobrevivência, em um contexto em que a atividade física
era um aspecto obrigatório e integral.
A conservação destes genes para o homem moderno o tornou mais
vulnerável a desordens fisiológicas, visto que o predominante sedentarismo
é um dos fatores ambientais de maior relevância para a regulação da
expressão gênica, contribuindo significativamente para a manifestação de
estados patológicos.
Os avanços das novas tecnologias vindas da genômica e proteômica
poderão contribuir para os mecanismos bioquímicos, celulares e moleculares
destas interações, promovendo assim fundamentos científicos para
prescrições apropriadas dos exercícios físicos, e aumentando sua eficiência
como medida preventiva das doenças crônicas (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
7. ENVELHECIMENTO E LONGEVIDADE
O Envelhecimento é um processo fisiológico presente nos seres vivos
que consiste na perda progressiva das funções celulares, diminuindo as
chances de sobrevivência e aumentando a probabilidade de morte. Para a
sociedade humana, a longevidade coloca-se como uma obsessão.
A progressiva eficiência de todos os órgãos e tecidos (em diferentes
graus) leva a perda das funções intelectuais e motoras do indivíduo, o que
o torna dependente de seus semelhantes. Essa regressão das atividades
locomotoras deve-se principalmente à Sarcopenia e à Osteoporose, que são um
conjunto de alterações morfofuncionais dos músculos e ossos,
respectivamente.
Com os avanços do conhecimento científico e tecnológico, da medicina e
do incremento da agricultura, houve um aumento não só da população humana,
como um maior número de indivíduos atingindo a chamada terceira idade com
melhor qualidade de vida (ou seja, um aumento médio na expectativa de vida
da população). Paralelamente, tem-se a expectativa máxima de vida, a
Longevidade, que não aumentado.
Deste modo, é crucial o entendimento acerca dos diversos mecanismos
envolvidos no Envelhecimento, visando obter uma melhor qualidade de vida
para os idosos e revelar os segredos da Longevidade, a chave para se viver
eternamente jovem (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
7.1. Características do Envelhecimento
O Envelhecimento ocorre com um desequilíbrio entre o número de células
que degeneram e morrem e as que vão substituí-las ou na capacidade delas
repararem seus componentes. A velocidade deste desequilíbrio está
diretamente ligada à qualidade do Envelhecimento.
A composição corporal vai mudando gradualmente com o envelhecimento,
apresentando um declínio da massa magra (músculos esqueléticos) e aumento
da massa gorda (tecido adiposo).
Em culturas de células de idosos, foi observado: diminuição da
proliferação celular, da produção de enzimas e proteínas, aumento das
aberrações cromossomais, diminuição da parte terminal dos cromossomos, que
é conhecida como telômero (que funciona como relógio da multiplicação
celular) e uma maior sensibilidade a radicais livres. As enzimas que se
destacam pela fabricação reduzida são: a telomerase, que é responsável pela
restauração dos telômeros, e as que têm função de reparar outros segmentos
de DNA, quando esses são agredidos pelos radicais livres (gerando uma maior
incidência de câncer).
Outro fenômeno que ocorre na terceira idade e que acentua o
envelhecimento é o declínio da fabricação hormonal, especialmente o
hormônio de crescimento GH, os femininos (estrógeno), o DHEA
(Dehidroepiandrosterona), cujos níveis na corrente sangüínea servem como um
indicador do estágio de envelhecimento. Também exercem influência, o
hormônio tireoideano e o masculino (testosterona).
É importante saber que o declínio hormonal se dá não apenas pelo
envelhecimento da própria glândula, mas pela capacidade de resposta do
tecido-alvo.
Em relação ao envelhecimento cerebral há dois fenômenos que se
associam: perda das células nervosas e redução do número das conexões entre
uma célula e outra (dendritos), o que dificulta a transmissão nervosa
(Cameron, 2002; Riegel, 2006).
7.2. Fatores que influenciam o Envelhecimento
Dentre os fatores que influenciam no envelhecimento, há: os genéticos
e os que se desenvolvem durante a vida (os que podem ser revertidos ou
minimizados), que estão diretamente ligadas a intensidade e rapidez do
mesmo.
Alimentação, controle de doenças (como obesidade, diabetes e hipertensão
arterial), uso restrito de bebida alcoólica, são positivos para garantir
uma boa qualidade de vida e longevidade.
Pode-se considerar que existem duas hipóteses teóricas para explicar
tal processo: que o envelhecimento seja programado geneticamente, como a
embriogênese e a puberdade; outra que propõe um acúmulo de erros no nosso
organismo, principalmente devido à ação de agentes ambientais como os
radicais livres, radiações, alimentação inadequada, sedentarismo e poluição
industrial (Cameron, 2002; Riegel, 2006).
7.3. ATIVIDADE FÍSICA NA TERCEIRA IDADE
Ao falar na evolução do homem, sabe-se que sua estrutura foi se
alterando e adaptando à necessidade de movimentação para sobrevivência,
pois o homem dependia da caça. Muito depois, vieram as atividades de
pastoreio e agricultura, que também envolviam movimentação. Com o advento
da industrialização, houve uma grande mudança no estilo de vida dos
indivíduos, e com a vida moderna, o sedentarismo.
Com pesquisas comprovando sobre os fatores que influenciam o
aparecimento e desenvolvimento de certas doenças, a medicina começou a
apoiar a atividade física, como sendo um meio para manter a saúde, a auto-
estima, melhorar o estado psicológico e físico.
Uma das condutas preventivas mais indicadas para a manutenção da qualidade
de vida e para diminuir a mortalidade precoce, é uma restrição calórica,
mas que não leve à deficiência orgânica.
Com o ritmo da vida moderna, nem sempre é possível comer
adequadamente, é diferencial a prática de atividade física, a qual ajudará
manter e melhorar as condições de vida.
Entre os 40 e 50 anos de vida, surge os primeiros sinais de
envelhecimento: cansaço físico, que pode ser confundido com preguiça, uma
certa redução da memória e da força de trabalho, uma tendência de engordar
(aumentando cerca de 3kg a cada década) e uma lenta e progressiva perda de
massa muscular.
Com o envelhecimento, o organismo como um todo vai se tornando mais
debilitado. As células vão diminuindo sua capacidade de multiplicação, a
produção de enzimas anti-radicais livres fica menor, o material genético
contido nas células fica mais sensível ao ataque dos radicais livre, e as
glândulas vão deixando, gradativamente, de produzir hormônios (Riegel,
2006).
7.3.1. Importância da atividade física para os idosos
Sabe-se da dificuldade de modificar hábitos, programas da dieta e de
exercício físico de pessoas acima de 65 anos. Além disso, há condições
secundárias, como estados depressivos, hipertensão arterial, artritismo,
insuficiência coronariana, que impedem que estes indivíduos possam
modificar sua maneira de viver.
É comprovado que a atividade física e a restrição alimentar podem
interferir na produção hormonal. Portanto, se houver uma orientação em
relação à sua condição física, acompanhamento por profissionais
especializados, tanto no exercício quanto no controle alimentar, esses
serão benéficos para o indivíduo, pois trará sensações de que o organismo
entrou em um processo de recuperação. No entanto, é aconselhável que o
aumento da atividade física seja gradual e utilize suplementos
farmacêuticos de vitaminas, minerais e antioxidantes.
A atividade física bem orientada tornou-se uma indicação importante
como prevenção e para ajudar a melhorar a vida de diabéticos, hipertensos,
cardiopatas, portadores de osteoporose (ajuda a aumentar a densidade
óssea), e até mesmo daqueles que sofreram acidente vascular cerebral.
Seria conveniente, antes de iniciar uma atividade física constante,
avaliar as condições orgânicas em geral, a performance cardiorrespiratória,
os sistemas osteoarticular e muscular.
Tem-se conquistado do exercício:
Benefícios imediatos
Melhoramento dos níveis de glicose sangüínea, assim como a qualidade e
quantidade de sono, redução do grau de estresse, melhora no relaxamento
físico e no convívio social.
Benefícios em longo prazo
Melhoramento da resistência muscular, flexibilidade, coordenação motora,
velocidade dos movimentos, dos perfis aeróbicos e cardiovasculares.
Restauração da auto-estima, melhora da saúde mental, o que contribui para
tratamento da depressão e da ansiedade. Contribuindo assim para a
longevidade (Riegel, 2006).
8. BIOQUÍMICA DO MÚSCULO
8.1. Músculo em repouso
No músculo em repouso, a concentração de ATP dentro da fibra é alta e
de ADP é baixa; o ritmo oxidativo celular é lento. Em jejum de algumas
horas, o combustível usado preferencialmente são os ácidos graxos; os
hormônios atuantes são principalmente glucagônio, um pouco de
glicocorticóide e GH. Quando o repouso for numa situação de excesso
alimentar, a modulação endócrina é insulínica e o combustível é
preferencialmente a glicose (Riegel, 2006).
8.2. Músculo pré-absortivo
A razão ATP/ADP comanda o repouso pré-absortivo. Como este quociente é
alto, a reação da creatinafosfotransferase tende para a formação de
fosfocreatina e ADP.
A quantidade de fosfocreatina fornece ATP para, no máximo, perto de
100 contrações; a de ATP livre suporta uma atividade velocista por volta de
2 segundos. Costuma não passar de 5g, o que dá para umas dez contrações.
Quando o ATP está alto a cadeia respiratória fica lenta e tem baixo
gasto de oxigênio. As concentrações de NADH e FADH2 estão,
conseqüentemente, elevadas. Como o ciclo de Krebs e a β-oxidação necessitam
de NAD+ e FAD, seu ritmo também diminui.
A glicólise é dependente de ADP e NAD+. Seu ritmo declina e o pouco
de piruvato que se forma passa a lactato.
Para produzir um mol de acetil-CoA, tanto glicose como ácidos graxos
geram, como equivalentes reduzidos, um mol de NADH e FADH2. A densidade
eletrônica "produz" igualmente a glicólise a β-oxidação, porém a no repouso
com jejum o músculo gasta mais ácido graxo do que glicose, pois o
glucagônio atuando (junto com outros hormônios) eleva enormemente a taxa de
ácidos graxos circulantes e, conseqüentemente, o seu ingresso e uso pelas
fibras ficam facilitados. Além disso, na hipoinsulinemia as enzimas
glicolíticas insulina/dependentes estão com baixa atividade fazendo com que
a glicose penetre mal nas fibras.
A relação ATP/ADP no músculo relaxado pode ser de 10/1 a 20/1. Isto
favorece o gasto de FADH2 pela cadeia respiratória, quando o ATP precisa
ser reposto. O motivo é que FADH2 necessita de dois ADPs enquanto NADH
necessita de três, fazendo com que FADH2 oxide melhor. Nessa situação o
ácido graxo é melhor consumido do que o piruvato dentro da mitôndria porque
o primeiro gera FADH2 e o segundo não.
No repouso, a atividade de GLUT4 fica diminuída, pois ela é insulina
dependente. A captação de glicose é também desestimulada por esse motivo.
Durante o repouso os músculos podem obter o pouco de ATP que
necessitam em até 80% dos ácidos graxos. Os outros 20 vêm dos cetônicos,
glicose e aminoácidos (Riegel, 2006).
8.3. Repouso no estado absortivo
Os princípios estequiométricos antes discutidos também são válidos
quando os músculos repousam em situação absortiva. Os endócrinos, todavia,
não, porque está elevada a concentração circulante de insulina. Ela vai
aumentando aos poucos e inibindo a ação dos hormônios contra-reguladores,
principalmente o glucagônio. A ação plena da insulina demanda
aproximadamente duas horas.
Este modulador estimula a captação dos aminoácidos e da glicose
sangüíneos pelas fibras e ainda aumente a atividade das enzimas
glicolíticas, glicogênicas e da síntese protéicas. A massa muscular se
fortalece, porque são ressintetizadas cadeias que não puderam sê-lo no
estado de jejum, quando muitos aminoácidos estavam sendo usados para
sustentar a neoglicogênese ou oxidados. A falta de maiores tavas de
adrenalina deixa reduzida a AMPc e garante a preservação do glicogênio
existente nos momentos pré-absortivos. A ação fosfodiesterásica da insulina
fica responsável, de qualquer modo, pela manutenção da concentração de AMPc
em níveis sempre baixos.
A glicólise pode competir com a β-oxidação, na fibra, para o
fornecimento de acetil-CoA no ciclo de Krebs, pois para ambas existem
enzimas disponíveis. As fontes alimentadoras do ciclo de Krebs e da cadeia
respiratória, para repor o pouco ATP que sempre é gasto, dependerão da
concentração relativa da glicose e de ácidos graxos livres no sangue.
Os tecidos adiposo e hepático entram em grande atividade. O fígado
torna-se mais eficiente em repor seu glicogênio do que fazer glicólise,
devido ao baixo teor de frutose-2,6-bifosfato. Com o passar do tempo,
porém, estes dois tecidos consomem preferencialmente carboidratos para
produzir acetil-CoA e dela ATP. Esta produção, no entanto, ultrapassa a
capacidade oxidativa da mitocôndria e a acetil-CoA é endereçada a síntese
de ácidos graxos. A β-oxidação cai de ritmo, porque a carnitina-acil-
transferase está inibida pela malonilCoA. O sistema triglicerídeo-sintase,
estimulado pela insulina, encaminha para a síntese de triglicerídeos os
ácidos graxos que entram na célula, tanto quanto os biossintetizados.
Visto como um todo, o organismo está repondo suas reservas
energéticas e estruturais enquanto, afastadas as influências adrenérgicas,
o Sistema Gastrointestinal adquire o máximo de eficiência no processamento
alimentar.
Quando a situação absortiva é acompanhada de stress, a predominância
de catecolaminas mascara os efeitos dos demais hormônios. Então, embora
exista excesso alimentar, o organismo está submetido a fortes ações
catabólicas. E o resultado é todo o desconforto experimentado por quem não
busca o descanso mental e físico após as refeições principais(Riegel,
2006).
8.4. Músculo em trabalho
Numa condição pós-absortiva, a primeira fonte de ATP solicitada pela
célula muscular é a fosfocreatina, e as fibras primeiramente são as do tipo
IIb.
A creatina-quinase está sujeita a modulação apenas estequiométrica,
sua resposta está estimada em milésimos de segundo. Nestes primeiros
instantes, a glicólise é menos acelerada e não deixa, ainda, o ATP diminuir
muito.
Os efeitos seguintes são preponderantemente estequiométricos pela
falta de tempo para outro tipo de ajuste, especialmente hormonal. A
concentração alta de ADP parece ser o orientador central dos processos
bioquímicos que devem acontecer. A PKF-1 chega a aumentar sua atividade em
mil vezes, o que determina uma alta lactatemia, pois os caminhos aeróbicos
estão praticamente fechados. A elevação do quociente respiratório ou da
tava de trocas respiratórias no começo do trabalho físico denota maior
consumo de carboidratos em relação a lipídios. O NADH é preferencialmente
usado em relação ao FADH2 e as oxidações NAD+dependentes tornam-se
prioritárias. Conseqüentemente, dentro da mitocôndria, o piruvato será mais
bem aproveitado do que o ácido graxo, pois a piruvato desidrogenase usa
apenas NAD+ e a β-oxidação, além dele, FAD.
Nas fases iniciais do trabalho o piruvato sarcoplasmático é drenado
liberando os demais intermediários da glicólise em direção ao próprio
piruvato. A reobtenção do NAD+ citosólico pode ser feita, porque a
lançadeira do glicerol-fostato tem NAD na mitocôndria e pode entregar-lhe
seus elétrons, à diferença do que acontecia no repouso. Deste modo a fibra
gasta mais glicose do que ácidos graxos, porque a limitação de FAD atinge
igualmente a β-oxidação e a lançadeira mencionada. O impulso
estequiométrico dado pela melhor utilização do piruvato além da estimulação
estequiométrica independente que a alta [ADP] exerce sobre a via
glicolítica, fazem a diferença que prioriza a glicólise. Como o oxigênio
rapidamente se exaure, ficam deprimidos os processos oxigênios-dependentes,
tornando a glicólise anaeróbica a via de salvação. A glicólise aumenta, o
mesmo acontecendo com a produção de lactato. Se não vier mais oxigênio de
fora o esforço terá que terminar aí (Riegel, 2006).
8.5. O esforço adrenérgico
A liberação de adrenalina é um efeito prematuro na integração
fisiológica ao exercício. Seu efeito é extremamente rápido, mas, mesmo
assim, demanda certo lapso de tempo, durante o qual o músculo é sustentado
por adaptações puramente estequiométricas. Na medida em que as
catecolaminas aparecem, a glicogenólise despeja glicose no fígado para o e
do músculo para ele mesmo. A glicemia e a lactatemia sobem. A insulinemia
baixa, o que diminui o uso da glicose pelo tecido adiposo e esplâncnico.
Aparece o hormônio do crescimento e as somatomedinas, dele proveniente,
incrementam a captação da glicose e a glicólise musculares. Como a
contração de ADP continua elevada, as fibrilas contráteis prosseguem
gastando mais glicose do que ácido graxo. O consumo da glicose costuma ser
tão destacado que se torna alta a captação muscular da glicose sangüínea,
mostrando quando é útil, também para o músculo trabalhando, aquele
glicogênio que o fígado armazena.
Enquanto isso acontece, as catecolaminas estão provocando lipólise,
vasodilatação periférica, acompanhada de dilatação brônquica, constrição
esplâncnica, taquicardia e taquipnéia. Estabelecida esta adaptação
adrenérgica – que envolve o organismo inteiro – o músculo tem tudo o que
necessita: muito O2, glicose, ácidos graxos e uma boa perfusão sangüínea.
Ao passar o tempo, o glicogênio, tanto do músculo quanto do fígado,
fica reduzido e a concentração sarcoplasmática da glicose vai diminuindo.
Apesar, então, de favorecida a glicólise pela estequiometria do par
ADP/ATP, a fibra inicia a consumir cada vez mais ácido graxo e o quociente
respiratório começa a diminuir (Riegel, 2006).
8.6. A manutenção da glicemia
O aumento do gasto de glicose e a falta de ingestão conduzem os
sistemas corporais em trabalho a lutar contra uma ameaça muito próxima: a
hipoglicemia. Os combustíveis, neste caso, são o glicogênio e o
triacilglicerol. As catecolaminas mobilizam ambos e logo são auxiliadas por
outros hormônios do stress que são os glicocorticóides. A eles se
incorporam o glucagônio e o hormônio do crescimento. Com isto, ficam
favorecidas a glicogenólise, a glicólise, a lipólise e desfavorecida a
ressíntese protéica, porque os aminoácidos são desviados para a
neoglicogênese ou oxidação. Esta última peculiaridade é antagonizada pelas
somatomedinas (Riegel, 2006).
8.7. Recuperando do esforço
O acerto das novas condições, logo depois que termina o esforço, é
preponderantemente estequiométrico, considerando o rápido desaparecimento
dos sinais fisiológicos agudos que acompanham a suspensão do trabalho. No
entanto, a diminuição da [H+] e de adrenalina são bastante óbvias, pois
estes são os dois fatores principais pela desaceleração cardíaca e
respiratória. A produção de CO2 declina enquanto o indivíduo se recupera do
esforço. A ainda alta [ADP] estimula a cadeia respiratória que, por sua
vez, conserva com certa intensidade o ciclo de Krebs, a β-oxidação, a
glicólise e a cetólise. Com isso, a [ATP] e o NADH vão aumentando e a [ADP]
e o NAD+ diminuindo. O ritmo da lançadeira glicerol-fosfato aumenta e cai a
produção de lactato e os reservatórios de glicogênio vão sendo
restabelecidos.
O tecido adiposo vai sensivelmente decrescendo sensivelmente sua
lipólise e o fígado sua neoglicogênese e cetogênese, enquanto o músculo
desloca o equilíbrio-dinâmico das proteínas no sentido anabólico.
O resultado final de tudo isto é o retorno às condições de repouso
(Riegel, 2006).
8.8. A Exaustão
Se o peso do esforço se torna supramáximo, ou de duração
exageradamente longa, em algum momento o ritmo de produção de ATP não
acompanhará aquele de seu gasto. Não tendo de onde tirar energia na
intensidade solicitada pelos comandos nervosos, o músculo entra em
exaustão.
Quando o trabalho não for tipicamente anaeróbico, a exaustão espalha
processos oxidativos celulares onde quando a fibra em trabalho não pode
mais usar oxigênio do que já está usando. Apesar disso, a célula funciona,
de certo modo, como se estivesse em hipóxia.
Durante a exaustão manifesta, a [ATP] não costuma baixar mais do que
40%. A contração voluntária dos músculos trabalhando com "déficit" de ATP é
possível por algum tempo, mas determina um desgaste físico muito grande
(Riegel, 2006).
9. REFERÊNCIAS
1. CAMERON, L. C.; MACHADO, Marcos. Tópicos avançados em bioquímica do
exercício. Rio de Janeiro: Shape, 2004. 212 p.
2. JUNQUEIRA, Luiz Carlos Uchoa; CARNEIRO, José. Biologia celular e
molecular. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. 332 p.
3. LEHNINGER, Albert L.; NELSON, David L.; COX, Michael M.; SIMÕES,
Arnaldo Antônio; LODI, Wilson Roberto Navega. Princípios de
bioquímica. 4. ed. São Paulo: Sarvier, 2006. xxviii, 1202 p.
4. RIEGEL, Romeo Ernesto. Bioquímica do músculo e do exercício físico.
3.ed. São Leopoldo, RS: Ed. UNISINOS, 2006. 130 p.
5. http://www.ufmt.br/bionet/conteudos/15.10.04/contracao.htm.Disponivel
em 16/11/2010.
6.
http://www.territorioscuola.com/software/index_pt.php?title=Sarc%C3%B4me
ro. Disponível em 16/11/2010.
-----------------------
Relatório apresentado a disciplina de Bioquímica 1, do curso de Biomedicina
da Universidade Federal de Pernambuco como um dos requisitos a obtenção
parcial da nota do Segundo Exercício Escolar.
SUMÁRIO
1.
INTRODUÇÃO..................................................................
........................................................................03
2. A CONTRAÇÃO MUSCULAR E SEUS ASPECTOS
MOLECULARES.................................................................
....................05
3. GLICONEOGÊNESE HEPÁTICA EM ESFORÇO DE LONGA
DURAÇÃO...................................................................10
4. ASPECTOS
NUTRICIONAIS................................................................
............................................................................
..13
5. METABOLISMO, TRANSPORTE E ARMAZENAMENTO DE CREATINA – EFEITOS DA
SUPLEMENTAÇÃO
EXERCÍCIO...................................................................
............................................................................
................................13
6. MUDANÇAS NA EXPRESSÃO GÊNICA, DOENÇAS CRÔNICAS E ADAPTAÇÕES DO CORPO
HUMANO RELACIONADAS AO EXERCÍCIO
FÍSICO......................................................................
...................................................16
7. ENVELHECIMENTO E
LONGEVIDADE.................................................................
........................................................22
8. BIOQUÍMICA DO
MÚSCULO.....................................................................
......................................................................25
9.
REFERÊNCIAS.................................................................
................................................................31
Figura 01. Modelo de uma fibra muscular composta por miofibrilas. Fonte:
www.ufmt.br
Figura 02. Desenho esquemático da distribuição dos filamentos finos e
grossos no sarcômero. Fonte: www.territorioscuola.com