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Efeitos da temperatura sobre o comportamento mecânico dos materiais -
PMT2200 – Ciência dos Materiais
Prof. Angelo Fernando Padilha Prof. Douglas Gouvêa Prof. Nicole R. Demarquette Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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Conteúdo ü ü
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Temperatura homóloga Visco-elasticidade Comportamento mecânico das famílias de polímeros Viscosidade Comportamento visco-elástico Efeito da temperatura sobre a deformação plástica em materiais cristalinos Fluência A taxa mínima de fluência Mecanismos de fluência Outros fenômenos que ocorrem a altas temperaturas Materiais para aplicação em temperaturas elevadas
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A temperatura homóloga Ø O calor, como uma forma de energia, afeta os diferentes materiais de formas diversas dependendo da energia de coesão do sólido. Fenômenos observados em certas faixas de temperatura para um material (como a fluência, por exemplo) também são observados em um segundo material similar, só que provavelmente em uma faixa de temperaturas diferentes. Ø Experimentalmente observa-se que as faixas de temperaturas em que os diferentes fenômenos ocorrem são fortemente correlacionadas nos diferentes materiais em uma escala adimensional na qual a temperatura (absoluta) de uso do material é dividida pela temperatura de fusão (Tc) do mesmo. À temperatura adimensional assim obtida dá-se o nome de temperatura homóloga:
Ø Exemplos:
τH = T/Tc
(temperaturas em K!)
T = 300K ⇒ τH = 0,6 para polímeros (Tc ~ 500K) e 0,16 para aços (Tc ~ 1800K)
ü Portanto a temperatura ambiente é uma temperatura relativamente elevada para a maioria dos polímeros, porém uma temperatura baixa para a maioria dos materiais inorgânicos
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Polímeros: transições térmicas Ø Polímeros podem se apresentar na forma totalmente amorfa (caso dos termorígidos e de alguns termoplásticos) ou parcialmente cristalina (termoplásticos semi-cristalinos) Ø Polímeros amorfos apresentam apenas uma temperatura de transição, a chamada temperatura de transição vítrea (Tg), já polímeros semi-cristalinos apresentam além desta, a temperatura de cristalização (Tc). Ø Os diferentes plásticos de engenharia podem ser esquematicamente classificados conforme o diagrama abaixo
Tuso
Semi-cristalinos
Amorfos
Líquido viscoso, processamento
Líquido Viscoso, processamento
Estado Ordenado, Volume livre aumenta, polímeros dúcteis
Estado Borrachoso, elastômeros
Tc Tg
Estado Ordenado, polímeros frágeis e rígidos
Estado Vítreo, Polímeros rígidos
Obs.: Não existem polímeros 100% cristalinos. Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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Comportamento mecânico dos polímeros A relação entre a temperatura de uso do polímero, Tg e Tc varia em função da classe de polímeros Termorígidos
Elastômeros
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Comportamento mecânico dos polímeros Continuação...
Termoplástico amorfo
Termoplástico semi-cristalino
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Viscosidade Ø 1687: Isaac Newton “Principia” § Fluidos newtonianos ∆x
τ=F/A γ = ∆x / h
área A V,F h
τ = η d γ / dt σ = tensão; γ = deformação; η: viscosidade
a tensão de cisalhamento é proporcional à taxa de deformação
Unidades da viscosidade no SI: [Pa.s] ou Poise [P] = 0,1 [Pa.s] Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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Viscosidades típicas [Pa.s] Ø Ø Ø Ø Ø Ø Ø Ø
Asfalto Polímero Fundido Melaço Mel líquido Glicerina Óleo Vegetal Água Ar
100.000 1.000 100 10 1 0,01 0,001 0,00001
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Visco-elasticidade Ø Fios de seda (observação experimental) Quando se aplica uma tensão observa-se uma deformação imediata (elástica) que prossegue com o tempo. Quando a força é removida há um encolhimento instantâneo (elástico), seguido de um encolhimento que prossegue com o tempo.
James Clerk Maxwell (1867) Encyclopedia Britanica: Teoria da visco-elasticidade
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Efeito da temperatura sobre o comportamento mecânico do poliestireno
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Módulo de rigidez do poliestireno em função da temperatura Comportamento elástico Comportamento visco-elástico Fluência Líquido viscoso
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Efeito da temperatura sobre a deformação plástica
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Ø Os mecanismos de deformação plástica (também) são fenômenos termicamente ativados, portanto o limite de escoamento cai com o aumento da temperatura (para a grande maioria dos materiais) Ø Isto faz com que a aplicação intencional dos conhecimentos de ciência dos materiais (ou seja a engenharia do material) seja essencial no projeto para aplicações em altas temperaturas → mecanismos de endurecimento (superligas à base de níquel), formação de compósitos (compósitos de matriz cerâmica), modificações na estrutura das cadeias poliméricas (black orlon) Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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O fenômeno e o ensaio de fluência Ø Materiais (metálicos, cerâmicos e poliméricos) expostos a altas temperaturas homólogas por tempos longos sofrem deformação plástica, mesmo quando submetidos a tensões inferiores ao limite de escoamento na mesma temperatura. Este fenômeno é denominado fluência ("creep") e tem grande importância em engenharia. Ø O ensaio de tração tem uma duração aproximada de 2 minutos a 2 horas. Nessa faixa de duração, a influência do tempo ou da velocidade de deformação é muito pequena. Ø O ensaio de fluência é isotérmico e realizado em dois modos: com tensão real ou carga (força) constantes. O ensaio tem duração típica na faixa de 2.000 a 10.000 horas. A deformação é determinada com grande precisão e a deformação total é freqüentemente inferior a 0,5%. Ø O ensaio de ruptura por fluência é realizado com cargas maiores, tem duração típica inferior a 1.000 horas. A deformação é usualmente determinada com menor precisão e a deformação total pode atingir valores da ordem de 50%. A principal informação obtida no ensaio de ruptura em fluência é o tempo de ruptura sob uma determinada tensão numa dada temperatura. Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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Relembrando: As curvas de fluência Ø As curvas de fluência (Deformação Versus tempo) em geral apresentam três estágios:
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Relembrando:As curvas de fluência Ø A tensão (ou carga) aplicada e a temperatura de ensaio têm grande influência na forma das curvas de fluência:
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A taxa de fluência Ø A taxa mínima de fluência ("creep rate") é o parâmetro mais importante para finalidade de projeto extraído dos ensaios de fluência, particularmente a velocidade de fluência no estágio estacionário ("steady-state creep rate") ou segundo estágio. Ø Dois valores de referência são muito importantes: a) a tensão necessária para produzir uma velocidade de fluência de 0,0001% por hora ou seja 1% de deformação em 10.000 horas (quase 14 meses) e b) a tensão necessária para produzir uma velocidade de fluência de 0,00001% por hora ou seja 1% em 100.000 horas (cerca de 11,5 anos). O primeiro valor é um parâmetro de projeto típico para turbinas de combustão interna (jato) e o segundo para turbinas a vapor.
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Os mecanismos de fluência em materiais inorgânicos
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Ø A deformação plástica durante o ensaio de fluência ou em serviço pode ocorrer por três mecanismos: movimentação de discordâncias, difusão e escorregamento de contornos de grãos. Ø O movimento das discordâncias é termicamente ativado e sua mobilidade aumenta com o aumento da temperatura. Novos sistemas de deslizamento tornam-se operativos e mecanismos alternativos de movimentação de discordâncias, tais como escalada ("climb") e escorregamento com desvio ("cross-slip"), são ativados quando materiais cristalinos são deformados em altas temperaturas. Ø O escorregamento de contornos de grão ocorre na parte final do ensaio e é o mecanismo dominante para temperaturas muito altas. Este mecanismo é fortemente relacionado com a fratura em fluência e será discutido posteriormente.
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Os mecanismos de fluência Ø A difusão, sob ação de tensão externa, também pode causar deformação plástica. A difusão tanto pode ocorrer através do volume (mecanismo de Nabarro-Herring) como ao longo dos contornos de grãos (mecanismo de Coble). Conforme esperado, as energias de ativação para difusão e para fluência apresentam excelente correlação.
a) Escalada ("climb) de discordância:
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Os mecanismos de fluência b)
Deformação difusão:
plástica
por
c)
Energias de ativação fluência e para difusão:
para
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A equação de Mukherjee-Bird-Dorn Ø A equação de Mukherjee-Bird-Dorn é uma tentativa de correlacionar a taxa mínima de fluência com os diferentes parâmetros físicos que caracterizam o processo.
AGbD b σ = kT d G p
ε&min
n
Onde: G = módulo de cisalhamento, b = módulo do vetor de Burgers, D = difusividade, k = constante de Boltzmann, d = tamanho de grão, σ = tensão aplicada, A, p e n são parâmetros
Lembrando:
Q D = D0 exp − D kT
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Os mapas de fluência (mapas de Weertman-Ashby) Ø O comportamento sob fluência de um determinado material pode ser concisamente representado em um gráfico envolvendo a temperatura homóloga na abcissa e a tensão normalizada (σ/G ou τ/G) na ordenada. Ø Nestes mapas, chamados mapas de Weertman-Ashby, costuma-se graficar também as linhas correspondentes às condições que resultam numa mesma taxa mínima de fluência. Ø O mecanismo de fluência predominante em uma dada temperatura pode ser identificado pelo parâmetro n da equação MBD, plotando-se num gráfico bi-log:
ε&min kT σ × DGb G Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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Mapas de Weertman-Ashby (Exemplo) Ø Mapas WA para o Níquel puro com dois tamanhos de grão diferentes (note as melhores propriedades do material com maior Tamanho de Grão)
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Fratura em fluência Ø Durante a deformação plástica de materiais policristalinos em temperaturas elevadas pode ocorrer o deslizamento de grãos, o qual é favorecido pelo aumento da temperatura e pela diminuição da velocidade de deformação. A contribuição deste mecanismo na deformação total é pequena (exceto em cerâmicas, onde é o mecanismo dominante), mas ele está freqüentemente associado com o início da fratura nos contornos de grãos.
a) Mecanismo de formação de trincas intergranulares por deslizamento de grãos (segundo H. C. Chang e N. J. Grant). b) Mapa de mecanismos de fratura (segundo M. F. Ashby).
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Trincas de fluência: a) do tipo w (wedge), em contornos de grão alinhados com a direção de máxima tensão de cisalhamento e b) do tipo r (round), em contornos normais à tensão de tração.(segundo G.Dieter).
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Outros fenômenos ("internos" e "externos") que ocorrem em altas temperaturas
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Ø Durante a exposição em altas temperaturas por tempos longos, o material sofre modificações internas e externas, que por sua vez, afetam a resistência à fluência. Os dois problemas "internos" principais são o engrossamento ou coalescimento da microestrutura (“Ostwald ripening”) e a precipitação de fases duras e frágeis conhecidas como fases intermetálicas. Os três problemas "externos" principais são: oxidação, carbonetação e corrosão a quente ("hot corrosion"). Ø Enquanto o engrossamento ou coalescimento da microestrura é praticamente inevitável, a precipitação de fases intermetálicas pode ser minimizada por um balanceamento adequado da composição da liga. Ø As principais fases intermetálicas indesejáveis nas superligas à base de níquel, cobalto ou ferro são: i) fases intermetálicas produto de coalescimento e transformação de γ' e γ'': η e δ, respectivamente; ii) fases intermetálicas produto de precipitação: σ, µ, χ , G e Laves. Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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Resistência à Oxidação Ø A resistência à oxidação dos aços inoxidáveis e superligas à base de níquel, cobalto ou ferro é obtida por meio da adição de cromo, que propicia a formação de um óxido à base de cromo aderente e protetor. O alumínio tem efeito similar ao do cromo e em algumas superligas o óxido formado é a alumina. Ø Os metais refratários apresentam resistência à oxidação muito pobre e alguns deles são susceptíveis à chamada "oxidação catastrófica", pois formam óxidos com ponto de fusão mais baixo que o respectivo metal.
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Resistência à Oxidação
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Resistência à oxidação e resistência à fluência para vários materiais metálicos
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Resistência à fluência em função da temperatura para vários materiais. 28 (Segundo A.Weronski e T. Hejwowski)
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Recobrimentos ("coatings") Ø A proteção contra ataques do meio, principalmente oxidação, só é alcançada em alguns casos com auxílio de recobrimentos. Os recobrimentos metálicos têm espessura de alguns µ m, enquanto os cerâmicos também funcionam como barreira térmica e têm cerca de 1 mm. Os principais recobrimentos metálicos utilizados para proteger as superligas são os aluminetos. Na proteção de metais refratários são utilizados predominantemente silicetos.
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Algumas Propriedades dos Principais Materiais Utilizados para Recobrimentos em comparação com os substratos (Ni, aço inoxidável austenítico AISI 316 e Mo). Densidade (g/cm3) 21,4
Coef. Dilat. Térm. (10 -6 K)
Pt
Ponto de Fusão (°C) 1770
NiAl
1640
5,90
CoAl
1640
6,04
NbAl 3
>1700
TaAl 3 NbSi 2
Material
8,8
Cond. Térm. (W/cm K) 0,71
Estrutura Cristalina CFC
14
-
Cúbica
-
-
Cúbica
4,60
8,3
-
Tetragonal
>1500
7,0
6,9
-
Tetragonal
2000
5,3
8,5
MoSi 2
1870
6,2
8,1
TaSi 2
2400
8,8
8,5
WSi 2
2150
9,3
8,5
0,31
Tetragonal
Al 2O3
2030
4,0
7,4
0,088
Hexagonal
Cr2O3
2430
3,6
8,1
0,088
Hexagonal
MgO
2800
5,2
14,2
-
Cúbica
ThO2
3220
9,7
9,9
0,050
Cúbica
Ni
1455
8,90
13,3
0,80
CFC
1400-1370
8,00
16,0
0,16
CFC
2625
10,22
4,9
1,42
CCC
AISI 316 Mo
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Hexagonal 0,31
Tetragonal Hexagonal
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Cerâmicas para aplicações em altas temperaturas
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ü Cerâmicas geralmente apresentam estruturas cristalinas complexas que reduzem a difusividade e a habilidade do material em sofrer deformação plástica. Desta forma, cerâmicas geralmente apresentam boas propriedades em solicitações de fluência ü Além disto, cerâmicas freqüentemente apresentam uma excelente resistência à oxidação e à corrosão a quente ü A limitação é a baixa tenacidade intrínseca do material, além da sua sensibilidade ao choque térmico ü Exemplo de material promissor para uso até 1900o C → MoSi2 ü Alternativa é o uso de cerâmicas como material de reforço em compósitos de matriz metálica (aumentando a resistência à fluência da matriz) ou de matriz cerâmica (aumentando a tenacidade da matriz) Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais Escola Politécnica - USP
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Exemplos de aplicação Ø O desenvolvimento das turbinas, especialmente daquelas utilizadas para propulsão a jato, ocasionou grande desenvolvimento nos materiais para altas temperaturas nos últimos 50 anos.
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