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Aula 23 - Uma Demonstração De Convergência

Curso de física matemática I ministrado pelo professor Jorge L. deLyra no segundo semestre do ano de 2010

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F´ısica Matem´atica I Jorge L. deLyra 26 de Abril de 2010 23: Uma Demonstra¸ c˜ ao de Convergˆ encia Na aula anterior expusemos uma forma geom´etrica de interpretar a convergˆencia de s´eries de Fourier no plano complexo. Introduzimos tamb´em o conceito de sequˆencia de Cauchy como teste de convergˆencia de s´eries. Al´em disso, apresentamos e discutimos uma certa classe de s´eries de Fourier, que inclui muitas que n˜ao s˜ ao absoluta nem uniformemente convergentes. Vamos agora utilizar aquele m´etodo geom´etrico, e tamb´em o conceito de sequˆencia de Cauchy, para demonstrar a convergˆencia desta classe de s´eries de Fourier. Como veremos, as s´eries desta classe tipicamente convergem em quase todo o intervalo de periodicidade, a menos de um n´ umero finito de pontos, nos quais pode haver divergˆencia para o infinito. Consideremos portanto, mais uma vez, as s´eries complexas com coeficientes reais, que foram discutidas na palestra anterior, S∞ = ∞ X ak eı kθ , k=0 onde θ = 2πx/L. Como antes, vamos assumir aqui que os coeficientes ak s˜ ao todos positivos e constituem uma sequˆencia monotonicamente decrescente que converge para zero, ou seja, que ak ≥ 0, ∀k; ak+1 ≤ ak , ∀k; lim ak = 0. k→∞ Vamos mostrar que este conjunto de hip´ oteses ´e suficiente para garantir a convergˆencia da s´erie em quase todos os pontos. Ao final da palestra discutiremos a extens˜ao deste resultado para v´arios outros casos relacionados com este de forma simples, mas para definir bem as id´eias, por ora vamos tratar apenas deste caso bem espec´ıfico. Na palestra anterior discutimos o comportamento desta s´erie no caso em que ak = 1 para todo k. Vamos agora verificar o que acontece, ou seja, o que muda na imagem do processo de soma que resultou daquela an´ alise, quando temos coeficientes ak 6= 1, por exemplo com a0 = 1, a1 < 1 e a2 < a1 , ou seja uma sequˆencia de valores que decresce monotonicamente para zero, de acordo com nossa hip´ otese. Desenhando os primeiros poucos termos da soma, temos o diagrama que segue, no qual vemos que os vetores tˆem neste caso as mesmas dire¸c˜oes de antes, mas m´ odulos menores, decrescendo a partir de a0 = 1. 1 Fig. 1: Uma cadeia de vetores com m´ odulos decrescentes espiralando para dentro de um c´ırculo, e a correspondente migra¸c˜ao mais lenta do centro instantˆaneo de rota¸c˜ao. Vemos que neste caso a cadeia de vetores tende a espiralar para dentro do c´ırculo. Por outro lado, o centro do c´ırculo n˜ao mais permanece fixo, e em vez disso migra para um novo centro a cada passo da cadeia. Temos portanto uma sequˆencia de tais “centros instantˆaneos de rota¸c˜ao”, C0 , C1 , C2 , C3 , . . ., que corresponde `as somas parciais da s´erie, S0 , S1 , S2 , S3 , . . .. Os mesmos argumentos aritm´eticos que usamos anteriormente nos d˜ao agora o centro Cn em termos de Sn , Sn = n X ak v k , k=0 Cn = Sn + v an v n , 1−v pois para chegar ao centro Cn partindo da soma parcial Sn , a opera¸c˜ao aritm´etica ´e dada por   1 Cn = Sn + ı h − an v n , 2 onde h e 1/2 s˜ ao os parˆ ametros correspondentes a an = 1, enquanto h an e an /2 s˜ ao os correspondentes parˆ ametros para o valor corrente do coeficiente, pois an 6= 1 no passo n ´ claro que o fator constante (ı h − 1/2) que nos leva da ponta do n-´esimo desta nova s´erie. E vetor ao n-´esimo centro depende apenas de θ, que ´e uma constante ao longo da sequˆencia, e o mesmo ´e verdade para o vetor v = exp(ı θ). N˜ ao ´e dif´ıcil deduzir diretamente da geometria que 1 1 1 v = − + ıh = − + ı . 1−v 2 2 2 tan(θ/2) Desta forma podemos escrever para C0 , por exemplo, v a0 v 0 1−v v = 1+ 1−v 1 , = 1−v C0 = S0 + 2 que naturalmente ´e o mesmo valor de antes. Por outro lado, temos para C1 v a1 v 1 1−v v a1 v 1 = S0 + a1 v 1 + 1 − v   v a1 v = 1+ 1+ 1−v a1 v = 1+ , 1−v C1 = S1 + que ´e agora diferente de C0 , pois a1 6= a0 = 1. Observe-se que a distˆ ancia de um elemento da sequˆencia at´e o centro correspondente, que ´e dada por |Cn − Sn |, ´e proporcional ao n´ umero positivo an , pois 1 |Cn − Sn | = ı h − |an ||v n | 2 p = an h2 + 1/4 an , = 4 sin2 (θ/2) e portanto vai a zero para an → 0, desde que θ n˜ao seja nulo ou um m´ ultiplo de 2π. Assim, os pontos da cadeia se aproximam deste centro m´ ovel, e se seguirmos o centro obteremos o ponto-limite da sequˆencia, o ponto para o qual a sequˆencia parece convergir. Podemos analisar o comportamento do centro m´ ovel como fun¸c˜ao de n representando a sequˆencia de centros atrav´es de uma cadeia de vetores, exatamente como fazemos com a cadeia que corresponde ` a s´erie original. Para fazer isto calcularemos uma sequˆencia de varia¸c˜oes ∆Cn da posi¸c˜ao do centro, come¸cando com o caso particular n = 0, que ´e at´ıpico, e para o qual adotamos ∆C0 = C0 . Depois deste temos ∆C1 = C1 − C0 , ∆C2 = C2 − C1 , ∆C3 = C3 − C2 , e assim por diante indefinidamente. No caso geral, para n > 0, obtemos ∆Cn = Cn − Cn−1 v v = Sn + an v n − Sn−1 − an−1 v n−1 1−v 1−v  v an v n − an−1 v n−1 = an v n + 1−v (an − an−1 )v n = . 1−v Posta esta sequˆencia de varia¸c˜oes, ´e claro que a cadeia correspondente nos d´a Cn de volta, ou seja, que temos Cn = n X ∆Ck = C0 + n X ∆Ck , k=1 k=0 onde podemos escrever ∆Cn para n > 0 de uma forma mais simples e interessante multiplicando toda esta equa¸c˜ao por (1 − v), o que resulta em 3 (1 − v)∆Cn = (an − an−1 )v n . Com isto, podemos mostrar que a s´erie cujas somas parciais s˜ ao dadas por (1 − v)Cn ´e de fato absolutamente convergente, bastando para isto que an → 0 quando n → ∞ e que an+1 ≥ an para todo n. Segue disto, naturalmente, que para v 6= 1 a s´erie C∞ tamb´em ´e uma s´erie absolutamente convergente. Para mostrar estes fatos, come¸camos escrevendo a s´erie para (1 − v)C∞ , (1 − v)C∞ = (1 − v) ∞ X ∆Ck k=0 = (1 − v)C0 + ∞ X (ak − ak−1 )v k . k=1 Tomando m´ odulos nesta express˜ao, e lembrando das desigualdades triangulares, obtemos |1 − v||C∞ | ≤ |1 − v||C0 | + ∞ X |ak − ak−1 ||v|k . k=1 Nesta express˜ao |v| = 1, pois v ´e um vetor de m´ odulo unit´ ario. Al´em disso, como temos que ak ≤ ak−1 para todo k, obtemos |1 − v||C∞ | ≤ |1 − v||C0 | + ∞ X (ak−1 − ak ). k=1 Observamos agora que quase todos os termos se cancelam aos pares na soma `a direita, restando apenas um a0 . Se considerarmos um argumento mais detalhado, em termos das somas parciais, nestas somas parciais sobra tamb´em um termo an `a direita, mas no limite n → ∞ temos que an → 0, como postulamos em nossas hip´ oteses. De uma forma ou de outra segue que temos |1 − v||C∞ | ≤ |1 − v||C0 | + a0 ⇒ a0 |C∞ | ≤ |C0 | + . |1 − v| O que isto quer dizer ´e que, desde que v 6= 1, o comprimento total da cadeia de centros ´e finito, e portanto que a s´erie de C∞ ´e absolutamente convergente. Vemos assim que o centro instantˆaneo de rota¸c˜ao tende a algum ponto a uma distˆ ancia finita do centro inicial. Como os elementos da sequˆencia original de somas parciais se aproximam deste centro m´ ovel, fica claro que a sequˆencia original converge, e portanto que a s´erie original converge. Entretanto, n˜ao precisamos depender apenas deste argumento, pois podemos tamb´em fazer a demonstra¸c˜ao formal e rigorosa de convergˆencia diretamente para a sequˆencia Sn , de forma muito simples, usando as estruturas aritm´eticas que apareceram ao longo deste argumento. De fato, poder´ıamos simplesmente invocar o crit´erio de convergˆencia de Dirichlet para demonstrar a convergˆencia da s´erie S∞ , entretanto esta discuss˜ ao geom´etrica ´e simples e instrutiva, de forma que vale a pena passar por ela. O crit´erio de Dirichlet estendido para o ˆambito complexo nos diz que, dada uma sequˆencia limitada cn de n´ umeros complexos, ou seja tal que os m´ odulos de todos os n´ umeros est˜ao abaixo de um limite m´ aximo finito, e uma outra sequˆencia bn de n´ umeros reais que tende monotonicamente para zero, ent˜ ao a s´erie formada pelo produto termo-a-termo das duas sequˆencias, 4 S∞ = ∞ X bn c n , n=0 converge. Uma demonstra¸c˜ao rigorosa de nosso resultado, que ´e equivalente a uma demonstra¸c˜ao do crit´erio de Dirichlet para o nosso caso espec´ıfico, pode ser encontrada no ep´ılogo matem´ atico desta palestra. Uma consequˆencia interessante do fato de que para v 6= 1 a s´erie C∞ ´e absoluta e portanto uniformemente convergente, ´e que o seu limite ´e necessariamente uma fun¸c˜ao cont´ınua. Isto ´e verdade porque h´a um teorema da an´ alise real que garante que uma s´erie de fun¸c˜oes cont´ınuas que converge uniformemente num intervalo real fechado sempre converge para uma fun¸c˜ao cont´ınua neste intervalo. Assim, a s´erie C∞ converge para uma fun¸c˜ao cont´ınua em qualquer intervalo fechado que n˜ao contenha o ponto v = 1. Como a s´erie S∞ tem o mesmo limite, ponto a ponto, que a s´erie C∞ , ela tamb´em converge para uma fun¸c˜ao que ´e cont´ınua em todos os pontos menos v = 1, apesar desta s´erie n˜ao ser, ela mesma, absolutamente convergente. Segue que o ponto v = 1, ou seja θ = 0, ´e o u ´nico ponto de descontinuidade da fun¸c˜ao representada por estas s´eries. ´ necess´ario agora descrever o que isto significa para as s´eries de senos e de cossenos. E Conforme nos aproximamos de θ = 0, que corresponde a x = 0, temos que v tende a 1 e portanto que o disco tende a ter um raio infinito. No caso θ = 0 n˜ao h´a convergˆencia da s´erie complexa, mas como neste caso a sequˆencia de somas parciais est´a sobre o eixo real, a sua parte imagin´aria ´e identicamente nula. Assim, apesar de que na s´erie de cossenos, que corresponde ` a parte real, aparece uma divergˆencia para o infinito neste ponto, na s´erie de senos ainda temos convergˆencia, pois trata-se de uma s´erie que ´e uma soma de termos nulos. Isto significa que a s´erie de senos converge em todo o intervalo de periodicidade, enquanto a s´erie de cossenos converge em todos os pontos menos em um deles, o ponto x = 0. Isto n˜ao quer dizer que a s´erie de senos converge uniformemente, pois apesar dela convergir para θ = 0, dependendo do comportamento dos coeficientes ela ainda pode convergir com extrema lentid˜ ao para θ pr´oximo do zero, mas n˜ao de fato nulo. Com efeito, podemos usar estas id´eias para ver geometricamente a origem da descontinuidade da fun¸c˜ao para a qual a s´erie converge, descontinuidade esta localizada no ponto θ = 0. Se tivermos θ pequeno mas positivo, ent˜ao o centro de rota¸c˜ao estar´a no semi-plano com parte imagin´aria positiva, e a sequˆencia de vetores se curvar´ a lentamente para cima, de tal forma a convergir para este ponto. Se, por outro lado, o valor de θ for pequeno e negativo, ent˜ao o centro estar´a no semi-plano oposto, e a sequˆencia de vetores se curvar´ a para baixo, de tal forma a convergir para ele. Vemos assim que h´a uma descontinuidade no ponto θ = 0, pois uma varia¸c˜ao infinitesimal de θ, que troque o seu sinal, far´a com que a s´erie pule de um valor estritamente positivo para um valor estritamente negativo, ou vice-versa. Observe-se que a aritm´etica complexa que foi usada aqui n˜ao serve s´ o para demonstrar a convergˆencia da s´erie, ela tamb´em serve como um algoritmo para uma soma eficiente da s´erie, o que vem a calhar pois s´eries desta classe podem convergir com extrema lentid˜ ao. Vamos lembrar que podemos escrever as somas parciais Sn da s´erie como (1 − v)Sn = a0 + n X (ak − ak−1 )v k − an v n+1 . k=1 No limite n → ∞ o u ´ltimo termo vai a zero, e podemos portanto escrever para a s´erie S∞ 5 (1 − v)S∞ = a0 + ∞ X (ak − ak−1 )v k . k=1 Observe-se que os termos da soma `a direita tˆem todos os coeficientes negativos, devido ao car´ater decrescente da sequˆencia de coeficientes. Ao contr´ario da s´erie original S∞ , a s´erie da direita na f´ormula acima ´e absolutamente convergente, como vimos durante o argumento da demonstra¸c˜ao de convergˆencia. Ela aparece tamb´em na f´ormula que determina o limite do centro instantˆaneo de rota¸c˜ao, C∞ , de forma que esta t´ecnica de soma est´a associada ` a id´eia de se seguir o cento instantˆaneo de rota¸c˜ao como uma forma de se chegar ao ponto de convergˆencia da s´erie. Assim, temos aqui uma forma eficiente de somar a s´erie, seguindo este algoritmo e somando, em vez da s´erie original, uma outra s´erie que converge muito melhor, com coeficientes dados por bk = ak − ak−1 , em termos dos quais podemos escrever que S∞ = ∞ a0 1 X bk v k , + 1−v 1−v k=1 o que vale para o caso v 6= 1. Recordemos agora que o limite do centro de rota¸c˜ao pode ser escrito como ∞ 1 X bk v k . C∞ = C0 + 1−v k=1 Como vimos, o valor de C0 , o centro inicial de rota¸c˜ao, no caso em que a0 = 1 ´e dado pela raz˜ao 1/(1 − v). Seguem sem muita dificuldade que o valor de C0 para um valor qualquer de a0 ´e dado por a0 /(1 − v). Portanto, as s´eries S∞ e C∞ s˜ ao de fato idˆenticas, e temos de fato que S∞ = C∞ . Isto demonstra mais uma vez o fato de que o limite da s´erie ´e de fato o limite do centro instantˆaneo de rota¸c˜ao. Voltando a escrever tudo em termos de θ, obtemos ∞ X a0 1 S∞ = bk eı kθ . + 1 − eı θ 1 − eı θ k=1 Para que possamos identificar as partes real e imagin´aria desta express˜ao para S∞ , as quais est˜ao associadas respectivamente ` as s´eries de Fourier de cossenos e de senos, ´e u ´til observar que temos 1 e−ı θ/2 ı e−ı θ/2 . = = 2 sin(θ/2) 1 − eı θ e−ı θ/2 − eı θ/2 Substituindo isto em nossa nova express˜ao para S∞ obtemos S∞ = = ∞ ı e−ı θ/2 X ı a0 e−ı θ/2 bk eı kθ + 2 sin(θ/2) 2 sin(θ/2) k=1 # " ∞ X ı a0 e−ı θ/2 + bk eı (kθ−θ/2) 2 sin(θ/2) k=1 = ı 2 sin(θ/2) ∞ X bk eı (kθ−θ/2) . k=0 6 onde, para escrever o resultado nesta u ´ltima forma, estamos adotando a defini¸c˜ao b0 = a0 para bk no caso k = 0. Lembrando que a s´erie dos cossenos ´e a parte real de S∞ , e a s´erie dos senos a parte imagin´aria, podemos agora ler as partes real e imagin´aria da f´ormula acima, S∞ = ∞ X ak cos(kθ) + ı ak sin(kθ) k=1 k=0 = ∞ X ∞ X ı bk [cos(kθ − θ/2) + ı sin(kθ − θ/2)] 2 sin(θ/2) k=0 ∞ = X 1 bk [− sin(kθ − θ/2) + ı cos(kθ − θ/2)] . 2 sin(θ/2) k=0 Escrevendo as partes real e imagin´aria separadamente obtemos ∞ X k=0 ∞ X ∞ ak cos(kθ) = X −1 bk sin(kθ − θ/2), 2 sin(θ/2) k=0 ak sin(kθ) = k=1 1 2 sin(θ/2) ∞ X bk cos(kθ − θ/2). k=0 Separando novamente o termo k = 0, podemos escrever isto como ∞ X k=0 ∞ X k=1 ∞ ak cos(kθ) = X a0 1 bk sin[(k − 1/2)θ], − 2 2 sin(θ/2) k=1 ∞ ak sin(kθ) = X 1 a0 cos(θ/2) bk cos[(k − 1/2)θ]. + 2 sin(θ/2) 2 sin(θ/2) k=1 Vemos que resulta uma troca de senos por cossenos e uma s´erie com um ´ındice semi-inteiro (k − 1/2) nos argumentos. Os termos iniciais da s´erie s˜ ao as coordenadas x e y do centro inicial de rota¸c˜ao, a saber a0 /2 e a0 h, o que evidencia mais uma ver o fato de que estamos seguindo o centro instantˆaneo de rota¸c˜ao. Para as s´eries S∞ cujos coeficientes ak satisfazem `as hip´ oteses que adotamos aqui, estas s´eries alternativas devem convergir significativamente mais r´apido para os mesmos limites. De fato, em quaisquer circunstˆ ancias nas quais for poss´ıvel mostrar que a s´erie ∞ X bk v k k=1 converge, independentemente de quais sejam as propriedades que se assuma sobre os correspondentes coeficientes ak , a s´erie S∞ tamb´em convergir´ a para v 6= 1, e ser´a dada pelas express˜oes que deduzimos acima. Isto constituiria, ´e claro, uma extens˜ao do teorema de convergˆencia que demonstramos aqui. O resultado que obtivemos aqui pode ser estendido facilmente para alguns outros casos relacionados com aquele que examinamos em detalhe acima. Por exemplo, a condi¸c˜ao de que os coeficientes an decres¸cam monotonicamente para zero n˜ao precisa ser aplicada a toda a sequˆencia de termos da s´erie, mas precisa valer apenas para a parte assint´otica. O que isto quer dizer ´e que, como um n´ umero finito de termos no in´ıcio da s´erie sempre tem uma soma finita, basta que exista um certo n0 acima do qual a sequˆencia de coeficientes 7 seja monotonicamente decrescente para zero. Al´em disso, ´e claro que podemos igualmente ter coeficientes an todos negativos, de tal forma que eles sejam monotonicamente crescentes para zero, uma vez que isto equivale a uma simples troca do sinal da s´erie como um todo. Outros casos particularmente interessantes que podem ser considerados s˜ ao aqueles nos quais temos que todos os coeficientes com k par s˜ ao nulos, restando apenas aqueles com k ´ımpar, ou exatamente o oposto disto. Desde que os coeficientes restantes satisfa¸cam ` a hip´ otese de limite monotˆonico para o zero, podemos reduzir o novo problema ao problema ´ mais f´acil explicar como anterior simplesmente reinterpretando os elementos envolvidos. E fazer isto no caso em que os coeficientes n˜ao-nulos s˜ ao aqueles para k par, ou seja k = 2j. Neste caso basta considerar o argumento da exponencial no vetor v, que ´e ı 2πkx/L = ı 2π2jx/L, e redefinir θ com um fator de 2, adotando para esta vari´avel o valor θ = 4πx/L. Desta forma, todo o argumento que foi utilizado antes ainda vale, e o resultado segue. O caso complementar, com k ´ımpar, pode ser tratado de forma an´ aloga. H´ a entretanto uma diferen¸ca importante entre estes novos casos e o que examinamos em detalhe aqui, pois antes havia um u ´nico valor de x no intervalo peri´odico que correspondia a θ = n 2π para algum inteiro n, a saber o valor x = 0. Em nosso novo esquema, h´a agora dois valores com esta propriedade, x = 0 e x = L/2. Assim, se a convergˆencia n˜ao for absoluta teremos agora dois pontos de divergˆencia da s´erie de cossenos no intervalo de periodicidade, que s˜ ao tamb´em pontos onde a s´erie de senos podem convergir com mais lentid˜ ao, e potencialmente correspondem a descontinuidades da fun¸c˜ao para a qual a s´erie converge. Um exemplo importante que se enquadra neste novo esquema ´e o da s´erie da onda quadrada, que como vimos tem dois pontos de descontinuidade, perto dos quais a convergˆencia ´e lenta. S´eries que alternem sinais, por exemplo como (−1)k , que sejam tais que os coeficientes positivos e negativos, separadamente, tendam monotonicamente para zero, podem ser separadas em duas s´eries, cada uma das quais pode ser tratada de acordo com o esquema mencionado acima. Como cada uma delas ser´a convergente, a soma das duas tamb´em ser´a convergente. Observe-se entretanto que neste caso estamos fazendo uma reorganiza¸c˜ao da s´erie, que corresponde a um tipo de mudan¸ca de ordem de soma. Assim, a menos que as s´eries resultantes convirjam absolutamente, em princ´ıpio n˜ao h´a garantia de que o resultado obtido n˜ao dependa da ordem de soma. O esquema mencionado acima pode ser estendido para s´eries que s´ o tenham um coeficiente n˜ao-nulo a cada p termos. Entretanto, no caso em que a convergˆencia n˜ao for absoluta, em geral isto implicar´a na existˆencia de p valores de x para os quais a s´erie de cossenos n˜ao ser´a convergente. Neste caso as s´eries de senos deste tipo convergem para fun¸c˜oes que tˆem p pontos de descontinuidade no intervalo de periodicidade. De forma mais geral, qualquer s´erie que possa ser separada em um n´ umero finito de sub-s´eries disjuntas, cada uma das quais tenha um passo uniforme ao longo do ´ındice k, e cada uma das quais tenha coeficientes que satisfazem ` as nossas hip´ oteses, ser´a necessariamente convergente, pois ser´a uma soma finita de certos n´ umeros, sendo cada um destes n´ umeros o limite de uma das sub-s´eries. De forma ainda mais geral, qualquer s´erie que possa ser escrita como uma combina¸c˜ao linear de um n´ umero finito de s´eries como as que discutimos aqui ser´a tamb´em convergente, apesar de que neste caso os coeficientes desta s´erie resultante n˜ao precisam satisfazer `as hip´ oteses que assumimos aqui. Cada uma destas extens˜oes da demonstra¸c˜ao de convergˆencia vem acompanhada, ´e claro, de uma correspondente f´ormula de soma da s´erie em termos de s´eries que s˜ ao absolutamente convergentes, e que representam formas eficientes de realizar a soma. 8 Ep´ılogo Matem´ atico: Demonstra¸ c˜ ao Rigorosa Nesta palestra apresentamos um argumento de car´ater geom´etrico para mostrar que a s´erie S∞ ´e convergente. Podemos formalizar esta id´eia observando que a sequˆencia de pontos determinada pelas somas parciais Sn no plano complexo ´e uma sequˆencia de Cauchy. Recordemos que uma sequˆencia de n´ umeros Sn , para n ∈ {0, 1, 2, 3, . . .} ´e de Cauchy se, dado um n´ umero real ǫ > 0, existe um inteiro nm (ǫ) tal que [n > nm (ǫ) e n′ > nm (ǫ)] ⇒ |Sn − Sn′ | < ǫ. Podemos fazer a demonstra¸c˜ao formal de convergˆencia para a sequˆencia Sn , de forma muito simples, usando as estruturas aritm´eticas que apareceram ao longo do argumento geom´etrico [1]. Basta escrever a soma parcial Sn em sua forma original, Sn = n X ak v k , k=0 multiplicar por (1 − v) e manipular os ´ındices das somas para obter (1 − v)Sn = (1 − v) n X ak v k k=0 = n X ak v k − n X k ak v − n X n+1 X ak−1 v k k=1 k=1 = a0 + ak v k+1 k=0 k=0 = a0 + n X (ak − ak−1 )v k − an v n+1 . k=1 Tomando m´ odulos de ambos os lados desta express˜ao obtemos, devido `as desigualdades triangulares, |1 − v||Sn | ≤ |a0 | + n X |ak − ak−1 | + |an |. k=1 Considerando agora que os coeficientes ak formam uma sequˆencia monotonicamente decrescente para zero, podemos escrever que n X (ak−1 − ak ) + an . |1 − v||Sn | ≤ a0 + k=1 Mais uma vez quase todos os elementos da soma se cancelam aos pares, restando apenas um a0 `a esquerda e um −an ` a direita, de forma que obtemos |1 − v||Sn | ≤ a0 + a0 − an + an = 2a0 . Segue que, desde que v 6= 1, podemos escrever uma majora¸c˜ao finita e independente de n para a soma parcial, |Sn | ≤ 2a0 = ρ0 , |1 − v| 9 que ´e independente de n e portanto vale para todo n. Vemos assim que a sequˆencia de somas parciais est´a toda contida dentro de um disco fechado de raio ρ0 centrado na origem, que ´e o ponto inicial da sequˆencia. N˜ ao ´e dif´ıcil repetir este argumento para uma soma parcial que parte da posi¸c˜ao de algum elemento intermedi´ ario m da sequˆencia, e vai at´e um elemento posterior, com n > m. Se n = m + 1, ent˜ao ´e claro que o m´ odulo da diferen¸ca das duas somas ´e simplesmente an = am+1 , pois trata-se da diferen¸ca de duas somas parciais consecutivas da s´erie. No caso geral trata-se da diferen¸ca de duas somas parciais quaisquer da s´erie, que denotaremos por Sm,n , Sm,n = Sn − Sm , e temos neste caso, repetindo as mesmas manipula¸c˜oes, Sm,n = n X ak v k ⇒ k=m+1 (1 − v)Sm,n = (1 − v) n X ak v k k=m+1 = n X n X ak v k − k=m+1 = am+1 v m+1 + = am+1 v m+1 + ak v k+1 k=m+1 n X k ak v − k=m+2 n X n X ak−1 v k − an v n+1 k=m+2 (ak − ak−1 )v k − an v n+1 . k=m+2 Tomando m´ odulos obtemos |1 − v||Sm,n | ≤ |am+1 | + n X |ak−1 − ak | + |an | k=m+2 = am+1 + am+1 − an + an = 2am+1 . Desta forma vemos que, desde que v 6= 1, todos os elementos da sequˆencia Sn com n > m est˜ao dentro de um disco fechado centrado em Sm , pois |Sm,n | ≤ 2am+1 , |1 − v| que ´e independente de n e portanto vale para todo n > m. Note-se que, como para n = m+1 a distˆ ancia entre as duas somas parciais ´e igual a am+1 , e como o m´ aximo valor de |1 − v| ´e 2, este resultado inclui o caso particular n = m + 1. Pode-se agora perceber como este fato estabelece a estrutura de uma sequˆencia de Cauchy para Sn , pois quaisquer dois elementos desta sequˆencia com n > m est˜ao dentro do disco, e portanto a uma distˆ ancia um do outro que ´e menor do que o diˆ ametro do disco, Dm = 4am+1 . |1 − v| S´o falta formalizar a demonstra¸c˜ao: seja dado ǫ > 0; considere os n´ umeros reais da forma 10 4am+1 , |1 − v| que s˜ ao todos finitos para v 6= 1. Como temos que am+1 → 0 quando m → ∞, e tamb´em que |1 − v| ´e algum n´ umero finito, segue que existe um valor de m tal que 4am+1 < ǫ. |1 − v| Tomemos este valor de m para o nosso crit´erio de sequˆencia de Cauchy. Como acabamos de verificar, para n, n′ > m temos que |Sn − Sn′ | ≤ 4am+1 < ǫ, |1 − v| ou seja, de fato existe um m tal que a sequˆencia Sn satisfaz ao crit´erio das sequˆencias de Cauchy. Como Sn ´e uma sequˆencia de Cauchy contida num disco fechado de raio ρ0 centrado na origem do plano complexo, segue que Sn converge para algum ponto dentro deste disco. Como consequˆencia disto a s´erie de Fourier que corresponde a esta sequˆencia de somas parciais Sn ´e convergente, o que conclui a demonstra¸c˜ao. Referˆ encias [1] Um “paper” contendo esta demonstra¸c˜ao pode ser obtido na rede, em Inglˆes, em formato PS ou PDF, no URL http://latt.if.usp.br/scientific-pages/otcoaccofs/ 11