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6. ESTABILIDADE AVARIADA
Neste capítulo apresentar-se-á os efeitos de avarias na estabilidade
e flutuabilidade de embarcações, bem como os procedimentos de cálculo
pertinentes. Mais uma vez, a exposição do tema em pauta se fará com enfoque
dirigido aos navios convencionais, já que envolvem as maiores dificuldades.
Sempre que necessário, tópicos especialmente dirigidos às plataformas
flutuantes serão abordados.
6.1 INTRODUÇÃO
Todos os barcos e navios estão sujeitos ao risco de inundação ou
emborcamento, seja por conseqüência de um abalroamento, uma falha
estrutural ou uma má distribuição da carga a bordo.
As primeiras proteções do casco contra acidentes, com a construção de
anteparas estanques, são datadas do final do século XIII, e só recentemente
as sociedades classificadoras passaram a impor regras que balizem a
definição destas anteparas no projeto.
Acidentes são comuns o suficiente para que sejam previstos em etapas
de projeto e evitados da maneira mais conveniente, na medida do possível.
Para isso definem-se, com exatidão, planos e procedimentos de carga e
descarga; plano de manutenção de tanques de fluídos, evitando-se superfície
livre demasiada grande; coeficientes de segurança nos escantilhões
estruturais; anteparas transversais estanques, que garantam confinamento da
região de alagamento.
Este capítulo refere-se ao estudo do efeito da inundação no navio e
da definição das anteparas estanques necessárias para garantir algum índice
de segurança, cujo valor deve variar de acordo com a conveniência de uma
embarcação à outra. Não discute, no entanto, valores para os índices,
apresentando apenas de maneira geral quais os aspectos que devem ser
considerados na sua determinação.
A inundação do casco de um navio tem dois efeitos indesejáveis. O
primeiro associado a perda de flutuabilidade e trim excessivo, e o segundo
associado a perda de estabilidade transversal e conseqüente emborcamento.
Poder-se-ia postular, com alguma pertinência real, que quanto maior o
número de subdivisões estanques de uma determinada embarcação maior será
sua segurança. No entanto os navios prestam-se a uma atividade econômica, e
aspectos econômicos devem ser ponderados. Uma embarcação com um número
muito elevado de anteparas estanques, naturalmente, custaria muito caro
(construtiva e operacionalmente) e, inevitavelmente, levaria menos carga.
Em se tratando de embarcações militares, onde o aspecto custo assume sempre
importância secundária, uma embarcação com muitas anteparas estanques não
seria capaz de atender ao perfil da grande maioria das missões.
Assim, inevitavelmente, a subdivisão de um navio envolve um
compromisso entre segurança e custo (direto e indireto).
Para navios de carga essa questão pode ser resolvida cientificamente
com relativa facilidade. O procedimento padrão é a minimização do custo
esperado, que é a soma do custo extra advindo da subdivisão (custo de
projeto e construção e custo resultante de limitações da capacidade de
carga) e do custo de falha (que pode ser obtido pelo produto do custo da
embarcação pela probabilidade de falha durante sua vida operacional). A
probabilidade de falha leva em conta fatores tais como: rota e estação do
ano; tipo de carga transportada; condição de estabilidade em cada trecho da
viagem; número de tripulantes; etc.
Para navios de passageiros, no entanto, o problema se complica. A
questão é que é difícil computar o custo de uma vida humana. Entretanto,
esforços tem sido despendidos para computar os riscos associados a cada
meio de transporte, de maneira a se estabelecer um nível diferente de
comparação, com base num índice de risco "aceitável". Os valores dos
prêmios dos seguros de vida fornecem também uma parâmetro de comparação que
não pode ser desprezado.
6.2 HISTÓRICO
No final do século XIX as sociedades classificadoras
estabeleceram algumas regras empíricas para determinação do número de
anteparas transversais estanques em navios mercantes. Inicialmente, as
anteparas de vante e de ré, e posteriormente, anteparas que separassem o
compartimento de máquinas.
No começo do século XX essas determinações começaram a se tornar mais
embasadas na efetiva capacidade de um determinado navio resistir a um
alagamento. Esse interesse estava sendo motivado por alguns desastres
sérios que vinham acontecendo, culminando com o naufrágio do Titanic em
1912, onde 1430 pessoas pereceram. Em 1913 foi organizada a Conferência
Internacional de Segurança da Vida no Mar (SOLAS), que reuniu estudos de
organizações inglesas, francesas e germânicas. No entanto, a I Guerra
Mundial tornou o cenário confuso e suas determinações nunca foram postas em
prática. Em 1929 foi organizada uma nova Conferência na qual, finalmente,
se concordou num sistema de subdivisão baseado na utilização do então
definido critério de subdivisão.
O critério de subdivisão é um fator que pondera a importância da
carga e a quantidade de passageiros a bordo e estabelece um parâmetro para
definição do número de anteparas estanques para cada navio. É dado como um
número que determina quantos compartimentos contíguos podem ser inundados
sem haver perda do navio.
Em 1936 foi organizada uma comissão para estudar as regras oriundas
dos Estados Unidos, que até então adotava suas próprias regras. Essa
comissão estabeleceu que as embarcações deveriam conseguir flutuar com
estabilidade sob alagamento de qualquer compartimento, o que equivale a
possuírem um fator de subdivisão igual a 1.
Posteriormente a International Conferences of Life at Sea (SOLAS),
reunida em 1948 e 1960, propôs pequenas alterações como a adoção do fator
de subdivisão 2 para navios de passageiros.
Na Conferência da SOLAS em 1960 um novo conceito foi introduzido,
qual seja o de que a segurança de um navio pode ser mensurada pela extensão
da avaria a que este é capaz de resistir. O novo conceito substituía a
análise determinística da resistência do navio a uma inundação também
determinística, pelo conceito de extensão vezes probabilidade de ocorrência
da avaria.
O acidente ocorrido com o Adrea Doria após uma colisão na entrada do
porto de Nova Yorque, o qual havia sido construído com base nas regras de
1948, mostrou a inadequabilidade do critério até então utilizado para
aplicações práticas, levando às alterações de 1960.
Os anos 60 foram então marcados pela sistematização de estudos
continuados sobre a questão, principalmente desenvolvidos nas reuniões
regulares de um comitê técnico da IMCO - Inter Governmental Maritime
Consultative - e ainda pela difusão da utilização de computadores no
cálculo do comprimento alagável das embarcações. Cálculos que antes
demoravam semanas e até meses poderiam então ser efetuados em questão de
minutos, o que permitiu uma maior precisão e confiabilidade de seus
resultados.
A partir de então, os critérios de subdivisão começaram a derivar
tornando-se particulares a cada tipo de navio, caracterizado pela carga que
carrega, notando-se hoje em dia uma forte influência das determinações da
MARPOL - Conference on Marine Pollution.
É notável o poder atual das determinações impostas pelas sociedades
internacionais, quando comparado com seu poder poucos anos atrás. A
consciência de que a preservação da vida humana e da vida do planeta Terra
é aspecto fundamental em qualquer atividade de engenharia e é uma coisa
recente e de um poder muito grande. Atualmente navios com mais de 12
passageiros são considerados navios de passageiros e portanto devem atender
a regulamentação específica e muito rigorosa. Petroleiros devem possuir
duplo casco de maneira a evitar catástrofes semelhantes aquela ocorrida com
o acidente do Valdez, no Alasca. Navios de produtos químicos tem
regulamentação particular que garantem alto índice de proteção ambiental.
Ainda, recentemente, essas imposições começam a aparecer na própria maneira
de projetar e construir navios, buscando-se maneiras de se causar menor
impacto ambiental considerando-se, em etapa de projeto, o procedimento de
descarte ao final da vida útil, e o custo associado.
É muito importante nos dias atuais que o engenheiro projetista esteja
em contato com as novas restrições que vão surgindo a cada dia, de maneira
que seu produto possa ser aceito na comunidade econômica e válido por um
maior período de tempo.
6.3. EFEITOS FUNDAMENTAIS DAS AVARIAS
O estudo de estabilidade avariada é bastante complexo pois envolve
muitas variáveis. A separação dos efeitos das avarias permite um estudo
mais claro e, portanto, uma melhor compreensão.
6.3.1 Extensão da Avaria
Refere-se agora, de maneira geral, à avaria como a abertura de um
buraco no casco, que permite a inundação dos compartimentos atingidos
completamente ou até que uma nova posição de equilíbrio seja encontrada.
O comprimento e profundidade da avaria e sua posição relativa às
anteparas estanques têm grande influência sobre seus efeitos. Em termos
gerais, pode-se considerar que quanto maior o número de compartimentos
estanques mais seguro será o navio, no entanto isso nem sempre é verdade.
Por exemplo seja a ocorrência de uma avaria de comprimento de 23 metros.
Figura 6.1 - Compartimentos avariados por uma abertura no casco de mesmo
comprimento, em embarcações de diferentes distâncias entre anteparas
transversais estanques.
Considere, num primeiro caso, uma embarcação que possui anteparas
estanques separadas por uma distância de 12 metros. Essa avaria pode
atingir dois ou três compartimentos contíguos, causando a inundação de
respectivamente 24 ou 36 metros do comprimento da embarcação. Seja agora um
segundo caso de anteparas mais próximas com, digamos 11 metros. A avaria
poderá inundar um comprimento de 33 metros, no mínimo, e 44 metros no
máximo.
Percebe-se que, relativa a essa avaria, pode ser mais interessante a
primeira opção de anteparas estanques com distância maior, diferentemente
do que foi dado como regra geral.
Naturalmente que o estudo para determinação dos comprimentos dos
compartimentos deve levar em conta a probabilidade de ocorrência de cada
tamanho e posição da avaria.
A prática tem demonstrado que as avarias quando muito extensas não
são profundas e vice-versa, o que permite que uma subdivisão conduzida com
critério reduza fortemente o risco de perda da embarcação.
A internacional SOLAS efetuou uma análise estatística dos dados
disponíveis de colisões e avarias em linhas gerais concluiu o seguinte:
Avarias existem na mais ampla gama de variações. Seus comprimentos vão
desde 1 metro até 30 metros. Grande parte das colisões de baixa energia não
chegam a afetar o casco abaixo da linha d'água. As colisões mais profundas
são resultado de colisões a 90 graus e tem extensão entre 6 e 15 metros.
Em função do estudo das avarias já ocorridas, as sociedades
classificadoras estabelecem avarias padrão para as quais um determinado
tipo de navio deve resistir. Essas avarias padrão determinam o tamanho e a
profundidade da avaria.
Avarias padrão, logicamente, são avarias hipotéticas que tem
utilidade nas etapas de projeto.
Essa nota não tem como objetivo a apresentação extensiva das normas
existentes, de cada um dos órgãos competentes. A título de exemplo é
apresentada a seguir a extensão da avaria para estruturas semi-
submersíveis, segundo a MODU CODE, 1980 ABS:
"Área "Extensão "
"Periférica "Colunas e suas porções expostas "
"Colunas (vertical) "Abertura de 3m ocorrendo em "
" "qualquer região entre 5m acima e "
" "3m abaixo dos calados principais "
"Colunas (horizontal) "1/8 do perímetro "
"Penetração (coluna e pontoon) "1,5m "
"Pontoon (vertical) "Da quilha ao teto "
"Pontoon (horizontal) "3m "
6.3.2 Efeitos da Inundação
Os efeitos de uma avaria são a seguir reunidos, fornecendo uma
diretriz da maneira a se atacar o problema.
a) Mudança do calado como resultado da perda de flutuabilidade. O
novo equilíbrio será encontrado quando o deslocamento da parte intacta for
igual ao deslocamento anterior a avaria menos o peso de algum líquido ou
carga que eventualmente tenha vazado.
b) Mudança do trim, até que o novo centro de carena se encontre no
mesmo plano transversal-vertical que passe pelo centro de gravidade da
embarcação.
c) Ocorrência de banda. O navio tomará uma banda no caso da avaria
causar alagamento desigual bordo a bordo, de tal maneira que seu novo
centro de carena se encontre no mesmo plano vertical longitudinal do centro
de gravidade. (A banda pode ainda ser causada por GM inicial menor que
zero.)
d) Mudança na estabilidade. A inundação causa mudança da posição
vertical do centro de flutuação bem como no momento de inércia da área de
flutuação, mudando dessa maneira respectivamente KB e BM. Normalmente KB
aumenta dado o aumento do calado, no entanto BM diminui de maneira em geral
preponderante. Para navios com pequena relação B/H o aumento de KB pode
preponderar a diminuição de BM, ou ainda o BM pode aumentar como resultado
do alagamento se a embarcação possui linhas que se alargam acima da
superfície livre causando, dessa maneira, um aumento do momento de inércia
do plano de flutuação.
São casos isolados aqueles nos quais a avaria se dá numa região
interior dos conveses e não existe alagamento na região do plano de
flutuação. Nesses casos o GM, naturalmente, sempre aumenta.
e) Mudança da Borda Livre. Uma avaria sempre é acompanhada de uma
redução da borda livre da embarcação. Dessa maneira fica reduzida a região
de braços de endireitamento positivos, pois com uma banda menor a imersão
de um dos bordos, o que reduz drasticamente o momento de inércia da
superfície de linha d'água, além de causar inundação das aberturas dos
conveses superiores. Quanto maior a borda livre antes da avaria menos
drástica será a sua diminuição com a avaria.
A figura a seguir mostra a variação dos braços de endireitamento para
diferentes valores de borda livre residual.
Figura 6.2 - Variação dos braços de endireitamento com a borda livre medida
a meio navio.
Atualmente as sociedades classificadoras impõe um valor mínimo de 3
polegadas para borda livre, e de 2 polegadas para o valor mínimo de GM
residual. As restrições parecem muito suaves, no entanto, em pequenos
calados, navios que possuem GM suficiente para assegurar um valor de GM
residual maior que as 2 polegadas têm uma borda livre residual elevada. Por
outro lado, em grandes calados, quando a borda livre residual é pequena o
GM residual é elevado, impedindo assim grandes inclinações.
f) Perda do Navio. Quando as mudanças do calado do trim e da banda
necessárias para o restabelecimento da condição de equilíbrio são tais que
provocam a inundação das partes não estanques do casco, passa a existir um
alagamento progressivo que termina por afundar o navio.
6.3.3 Efeitos de Flutuabilidade Intacta.
Denomina-se flutuabilidade intacta aquele volume que, dentro de um
compartimento alagado, permanece estanque à inundação. Seu efeito é em
geral de diminuir a inundação, o trim e a banda resultantes, aumentando
dessa maneira o comprimento do navio que pode ser inundado. O efeito da
flutuabilidade intacta sobre a estabilidade residual (valor de GM após a
avaria) depende de sua posição com relação a superfície do plano de
flutuação. Muitas vezes pode se tornar crucial o alagamento dessa avaria, e
é por isso que se deve ter em mente o que segue
Nas duas considerações a seguir a filosofia utilizada é aquela
baseada no método da perda de flutuabilidade, o que não leva a variações da
posição do centro de gravidade!
Se essa flutuabilidade intacta se estende acima do plano de
flutuação, seu efeito sobre a estabilidade tende a ser benéfico já que
aumenta a área estanque da linha d'água, garantindo uma diminuição mais
suave de seu momento de inércia. Por outro lado, a inundação desse
compartimento causa um aumento do valor de KB, que pode ou não compensar a
perda de área de linha d'água e, portanto, há que se analisar cada caso.
Se a flutuabilidade intacta não se estende acima da linha d'água e o
navio alagado estiver no limite de estabilidade deve-se inundar esse
compartimento, garantindo dessa maneira um aumento do KB residual e
portanto um aumento da altura metacêntrica. Se, por outro lado, o problema
é de borda livre mínima a inundação do tanque intacto só pode ser maléfica
já que causa um aumento do afundamento.
Via de regra, uma flutuabilidade intacta abaixo da linha d'água é
alagada se encontra-se a meio navio, o que causa aumento do GM residual e
melhora a estabilidade, e não é alagada se encontra-se em posições extremas
ao longo do comprimento pois pode aumentar o trim e diminuir sobremaneira a
borda livre na proa ou na popa.
6.4. SUBDIVISÃO ESTANQUE E ESTABILIDADE NA CONDIÇÃO AVARIADA
A Linha Marginal de um navio é uma linha hipotética, traçada em ambos
os bordos, posicionada 3 polegadas abaixo do convés das aberturas ao lado.
É utilizada pelos critérios de estabilidade e para traçado da Curva de
Comprimento Alagável.
O comprimento alagável de um navio, em qualquer ponto ao longo de seu
comprimento, é definido como a máxima extensão longitudinal do navio, com
centro no referido ponto, que pode ser alagada de bordo a bordo,
simetricamente e com a determinada permeabilidade, sem causar imersão da
linha marginal e sem conduzir a valores de GM menores que zero.
A determinação do comprimento alagável requer uma análise de
afundamento, trim e banda. No entanto, os métodos tradicionais determinam o
comprimento alagável considerando-se apenas os efeitos combinados de
afundamento e trim. O estudo da estabilidade na condição avariada engloba a
necessidade de verificação da banda eventualmente adquirida pela
embarcação, o que é causado por alguma assimetria do alagamento (ou
assimetria de permeabilidade).
A determinação do comprimento alagável ao longo do navio é objetivo
principal da análise da flutuabilidade avariada. Para tanto é necessário
anteriormente o desenvolvimento dos métodos de cálculo que permitam a
determinação da condição de flutuabilidade e estabilidade após uma avaria
de tamanho e posição previamente estabelecida.
6.4.1 Método da Adição de Peso e Método da Perda de Flutuabilidade
Quando o casco está parcialmente avariado na região correspondente a
um espaço vazio, a diferença de pressão causa um escoamento do fluído para
dentro do casco.
Existem dois métodos de cálculo para se determinar as novas
propriedades hidrostáticas dos navios que, após um alagamento continuam com
flutuabilidade: o método da adição de peso e o método da perda de
flutuabilidade.
No método da adição de peso, a água embarcada pela avaria é
considerada como um peso adicionado ao deslocamento do navio, e o estudo é
feito pelos métodos do capítulo 5. A dificuldade desse método reside no
fato de não se conhecer a priori a quantidade de água embarcada em virtude
da avaria, visto que não se conhece a linha d'água final.
No método da perda de flutuabilidade, o volume de flutuabilidade
perdido e igual ao volume de água deslocada pelo compartimento alagado,
antes da avaria, menos a reserva de flutuabilidade eventualmente existente
neste compartimento (abaixo da linha d'água inicial).
No método da adição de pesos, todas as características hidrostáticas
do navio variam. Isto incluí o deslocamento e a localização do centro de
gravidade. No método da perda de flutuabilidade não se considera variação
de carga a bordo ficando, portanto, o deslocamento e a posição do centro de
gravidade do navio inalterados. Neste caso, parte do casco, inicialmente
acima da linha d'água, afunda de maneira a compensar a flutuabilidade que
foi perdida. Então o centro de carena varia, bem como os metacêntros
longitudinais e transversais e todas as propriedades hidrostáticas.
Os dois métodos são igualmente válidos, e quando conduzidos com
cuidado, naturalmente, levam aos mesmos resultados.
A escolha do método a ser utilizado repousa fundamentalmente na
conveniência do cálculo. Em geral, os estudantes que enfrentam pela
primeira vez o problema preferem o método da adição de peso, por ser mais
intuitivo e utilizar conceitos já apreendidos. Com o passar do tempo a
escolha acaba derivando para o método da perda de flutuabilidade, que exige
menor quantidade de cálculos.
.
A vantagem do método da perda de flutuabilidade fica clara com o
seguinte exemplo:
Imagine-se um navio que sofreu uma avaria, em um compartimento que se
estende do duplo fundo ao convés principal. A água será forçada para dentro
até que as pressões internas e externas se igualem. O nível da água no
tanque avariado deverá ser então igual ao nível da água do mar.
Figura 6.3 - Alagamento de um compartimento
Com a adição do peso o deslocamento se alterou e, portanto, alterou-
se o calado. O novo calado depende da quantidade de água embarcada que, por
sua vez, depende da posição da nova linha d'água. Um procedimento iterativo
deve ser utilizado, como por exemplo:
a) Adiciona-se ao deslocamento do navio, inicialmente, a massa
de água que completa o tanque até o nível do calado inicial.
b) Com o peso embarcado determina-se a nova condição de
equilíbrio, isto é, os calados a vante e a ré e a banda tomada.
c) Em seguida, reitera-se o processo com a adição do volume
extra de água que preenche o tanque alagado até o novo calado
naquela região, definido pela segunda etapa.
d) Continua-se o processo até que o novo cálculo do volume de
água embarcada seja da ordem de 2% do volume total de água
embarcada.
O processo converge em 3 ou 4 ciclos.
O mesmo problema pode ser resolvido pelo método da perda de
flutuabilidade:
A perda de flutuação é igual ao volume do compartimento abaixo de WL
(Cuidado! O volume de flutuabilidade perdida não se estende acima da linha
d'água inicial, mesmo que a água alí penetre, pois esse volume não
pertencia ao volume de flutuabilidade inicial). O navio deve, portanto,
ganhar esse volume pela imersão das extremidades, o que deve corresponder
aos volumes WW1fe mais LL1gh. Em primeira aproximação, esse volume pode ser
considerado como a área do plano de flutuação original menos a área do
compartimento alagado, multiplicada pela variação de calado.
Dessa maneira o novo calado é obtido imediatamente. Posteriormente se
determina o eventual trim ou a banda, com os métodos semelhantes aos já
descritos no capítulo 4. Naturalmente, o cálculo do novo calado pode ser
refinado utilizando-se para tanto das curvas de Bonjean.
Vê-se, pois, que o método da perda de flutuabilidade é mais direto, e
menos suscetível a erros.
Em seguida apresenta-se o segundo método em maiores detalhes.
6.4.2 Aplicação do Método da Perda de Flutuabilidade
Pelo que foi descrito, vê-se que o procedimento para cálculo através
do método da perda de flutuabilidade divide-se em três etapas: a)
determinação do calado final; b) determinação do trim; c) determinação da
banda. A seguir desenvolve-se em detalhes cada uma das etapas.
Os sub-índices utilizados seguem a regra usual. Parâmetros sem sub-
índice referem-se a posição inicial antes da avaria. Sub-índice 1 refere-se
a posição avariada onde a embarcação sofreu apenas afundamento paralelo e
assim por diante para cada posição intermediária assumida no transcorrer
dos cálculos.
a) Determinação do calado médio final:
Seja:
V1= Volume total dentro dos limites alagados, limitado
superiormente pela linha d'água WL.
= Permeabilidade média de v1, incluindo qualquer
flutuabilidade intacta.
O volume de flutuação ganha pode ser expresso como:
, onde
H1= Calado depois da avaria, considerando-se afundamento paralelo
(W1L1).
H= Calado antes da avaria (WL).
A= Área média entre as linhas d'água WL e W1L1.
a= Área média do compartimento avariado entre WL e W1L1.
s= Permeabilidade da superfície média de a.
Como a flutuabilidade perdida deve ser igual a flutuabilidade ganha,
deve-se ter:
(6.1)
b) Determinação da nova altura metacêntrica transversal:
Como no método da perda de flutuabilidade não se considera que houve
embarque de carga e sim perda de volume de flutuação o centro de gravidade
permanece fixo. O que acontece é uma alteração da forma do volume de
flutuação, com a perda de uma parcela e ganho de outra. Seja então:
GM1=GM+MM1 (6.2)
MM1=KM1-KM
KM1= KB+BB1+B1M1
KM= KB+BM
MM1=(KB+BB1+B1M1)-(KB+BM)
e portanto,
MM1=BB1+B1M1-BM
(6.3)
Figura 6.4 – Esquema das Posição Sucessivas de B e M
De maneira a se determinar a posição vertical do novo centro de
carena B1 toma-se momentos estáticos de volume. O volume da flutuabilidade
do tanque alagado até WL é transferido verticalmente de uma distância d,
que pode ser expressa como:
Então:
(6.4)
Figura 6.4 - Esquema de compartimento avariado
O termo c1h representa a distância vertical do centro de gravidade da
flutuabilidade perdida até WL, com c1 sendo um coeficiente menor do que 1 e
h a altura do tanque até WL. O termo c2(h1-h) representa a distância do
centro de gravidade da flutuabilidade ganha até WL, com c2 sendo um
coeficiente também menor do que 1. Para navios em forma de caixa, com
subdivisões verticais ter-se-á c1=c2=0,5.
O segundo termo da (6.3) pode ser dado por:
onde:
momento de inércia transversal da área de linha d'água avariada
(parte intacta), em relação a um eixo que passa pelo seu centro de
gravidade.
seja:
I1 = momento de inércia transversal da área de linha d'água total
W1L1, em relação a sua interceção com o plano de centro do navio (XX).
= momento de inércia transversal da área de linha d'água W1L1,
em relação ao eixo que passa pelo centro de gravidade da área remanescente
depois da avaria.
em que:
A1= área de linha d'água total W1L1.
q= distância transversal da linha de centro original ao centro de
gravidade da parte intacta do plano de flutuação W1L1. A área intacta da
linha d'água avariada pode ser expressa como: A1-sa1.
Se r é a distância transversal do centro de gravidade da área sa1 à
linha de centro, vale a igualdade:
(6.6)
e finalmente a mudança do momento transversal de área pode ser calculada
por:
onde = momento transversal de inércia de , em relação a um eixo
que passa através do seu centro de gravidade.
Tem-se então:
(6.7)
Substituindo os resultados obtidos na (6.3) ter-se-á a altura
metacêntrica transversal depois da avaria:
Substituindo a expressão encontrada por q nos quarto e sexto termos
do lado direito, sua soma fica:
e, portanto,
(6.8)
Deve ser salientado que com a avaria de linha d'água, a mesma pode
deixar de apresentar simetria. Isso significa que os eixos principais de
inércia deixarão de ser respectivamente paralelos a direção proa-popa e
transversal. No entanto, em se tratando de corpos afilados como navios,
essa rotação dos eixos principais é usualmente desprezada, o que se mostra
consistente. Dessa maneira, o valor de GM pode ser determinado como acima,
sem a necessidade de se tomar momentos principais de inércia.
c) Altura metacêntrica longitudinal depois da avaria:
A altura metacêntrica longitudinal é determinada da mesma maneira que
a transversal, chegando-se a:
ou
(6.9)
d)Determinação da inclinação transversal e do calado nos bordos:
Tendo em vista a consideração feita no parágrafo anterior, com o
alagamento assimétrico o navio se inclina em relação a um eixo paralelo a
XX. Se a inclinação é pequena, esta se dá sobre o eixo X1X1, que contém o
centro da área intacta. Se a inclinação é grande ela se dá sobre outro eixo
desconhecido a priori. Na falta de informações mais precisas considera-se a
inclinação pelo eixo X1X1.
Essa inclinação se dá como resultado da variação da posição
longitudinal e transversal do centro de carena que, portanto, deixa de
estar na mesma vertical do centro de gravidade.
O deslocamento transversal de B, ilustrado a seguir, pode ser
calculado por:
onde,
rg= distância transversal do centro de gravidade de V1 ao plano de linha de
centro.
qg = distância transversal do centro da flutuabilidade ganha até a linha de
centro.
É importante notar que o metacêntro sofre uma variação de posição
transversal semelhantemente a B1. Dessa maneira podemos falar num momento
gerado pela flutuabilidade perdida, que é equivalente ao deslocamento vezes
a distância transversal de B1 a G.
Note que a distância transversal de B1 a G varia com o ângulo de
banda, já que a distância transversal é sempre paralela a linha d'água.
Neste caso o momento de inclinação MH será dado por:
Se o ângulo não excede cerca de 8, o conjugado de endireitamento MR
pode ser escrito como:
e o ângulo aproximado de inclinação é obtido igualando-se os momentos
restaurador e de emborcamento, o que resulta em:
(6.10)
Se, no entanto, a inclinação é grande o método gráfico semelhante ao
descrito no capítulo 4 deve ser utilizado.
O calado final, devido à banda, no bordo avariado é dado por:
e o calado no outro bordo, naturalmente, fica dado por:
e pode-se então efetuar o estudo de borda livre.
Toda a análise feita foi baseada em considerações estáticas. Quando
um rombo grande é aberto no casco, a velocidade de entrada da água é muito
grande, de modo que uma análise baseada em considerações estáticas não é de
todo válida. Devido a energia cinética de roll absorvida pelo navio durante
sua inclinação em busca da nova posição de equilíbrio, o ângulo máximo
atingido deve ser maior do que aquele que a análise estática determina, e
nesse caso, a sua reserva de estabilidade dinâmica será decisiva.
e) Efeito do alagamento na Curva de Estabilidade Estática
Com a perda de flutuabilidade, a posição do centro de carena do
navio, sob cada ângulo de banda, se altera. Portanto alteram-se também as
Curvas Cruzadas de Estabilidade. Novas curvas deveriam então ser plotadas.
No entanto, um processo simplificado pode ser adotado, considerando-
se o volume de flutuabilidade perdido como fornecendo uma parcela do braço
de endireitamento de sinal negativo, já que deixou de existir, e a parcela
de flutuabilidade ganha como fornecendo uma parcela aditiva do braço de
endireitamento. Então:
Figura 6.5 - Seção transversal com compartimento avariado
Como os volumes de flutuabilidades ganha e perdida são constantes e
tem centros de carena também constantes, as correções nas Curvas Cruzadas
seriam fixas e valeriam para toda a faixa de ângulos.
No entanto, o erro nesse processo advém do fato de ter existido
alteração da forma da superfície livre e assim da trajetória do centro de
carena. As Curvas Cruzadas foram construídas para uma dada trajetória do
centro de carena, para um deslocamento fixo, em função do ângulo de banda.
Assim, se por alguma razão for possível adotar que não ouve variação
da forma dessa trajetória, mas sim apenas da posição inicial do centro de
carena, o procedimento sugerido será verdadeiro e conduzirá a resultados
reais.
O processo seguido é em todo semelhante a deduzir-se do braço de
endireitamento original a parcela:
.
Se essa hipótese não é plausível, novas Curvas Cruzadas de
Estabilidade devem ser construídas para o casco avariado. O processo de
construção é o mesmo já visto, mas o novo casco deve ser considerado sem o
volume total do compartimento avariado, como se o navio fosse descontínuo.
f) Cálculo dos Calados a Vante e a Ré
Analogamente ao que foi apresentado com relação a banda, o centro de
carena se movimenta longitudinalmente em virtude da variação da forma do
deslocamento. Passa então a existir um momento de trim dado por:
onde = distância longitudinal do centro de gravidade de V1 ao centro
de gravidade da área da linha d'água W1L1. O conjugado de endireitamento
inicial é .GM1L.sen, válido enquanto a proa ou a popa não emergem. Portanto
o ângulo de trim estático pode ser obtido de:
Se houve afundamento do convés na proa ou na popa esta equação
fornece apenas um solução aproximada. O cálculo do ângulo estático neste
caso deveria ser feito com o auxílio das Curvas de Bonjean. No entanto,
neste caso, passaria a haver alagamento progressivo, o que levaria a perda
do navio.
6.5.3 - Discussão de Resultados e Exemplos de Aplicação
O efeito desvantajoso de um alagamento assimétrico pode ser
evidenciado pela discussão do problema a seguir.
Considere um navio em forma de caixa de 150 pés de comprimento, 50
pés de boca e 15 pés de pontal, calando 10 pés ao longo de todo seu
comprimento. O navio flutua em água salgada e tem centro de gravidade no
plano de simetria situado numa altura de 12,5 pés em relação ao plano de
base.
Serão consideradas duas divisões de anteparas. Num primeiro caso, a
subdivisão é definida por uma antepara longitudinal ao longo da linha de
centro, e anteparas transversais separadas de 50 pés.
No segundo caso a subdivisão é definida apenas por cinco anteparas
transversais, distanciadas de 25 pés, sem anteparas longitudinais.
Nos dois casos a inundação de um compartimento leva a uma perda igual
de flutuabilidade, que é de: 50.26.5.10 = 12.500 ft3, mas no primeiro
arranjo o alagamento é assimétrico.
Em ambos os casos, ter-se-á:
o novo calado é determinado de tal modo que não haja alteração do volume de
deslocamento.
onde foram tomados igual a unidade.
Como os costados são verticais os momentos de inércia I1 e I, como
definidos, são idênticos.
Para o primeiro arranjo:
Procurando agora o ângulo de banda, escreve-se o momento de
emborcamento na condição avariada sem banda:
Para o segundo arranjo:
Procurando agora o ângulo de banda, escreve-se o momento de emborcamento na
condição avariada sem banda:
6.6 Comprimento Alagável
O comprimento alagável de um ponto ao longo do comprimento do navio é
a máxima extensão longitudinal do navio, com centro no referido ponto, que
pode ser alagada de bordo a bordo, simetricamente e com a determinada
permeabilidade, sem causar imersão da linha marginal e sem reduzir o valor
de GM residual à valores menores ou iguais a zero.
Assim, se um determinado navio possui anteparas transversais que
distam entre si de valor igual ou menor ao do comprimento alagável do ponto
médio entre as duas anteparas então, uma avaria entre essas anteparas não
levará a perda do navio nem por efeitos de alagamento e trim, nem por falta
de estabilidade estática.
No entanto, um navio que tenha disposição de anteparas tal que para
nenhum ponto médio a distância entre as anteparas adjacentes seja maior que
o comprimento alagável ainda assim não é completamente seguro, visto que um
abalroamento pode produzir um buraco que atinja dois compartimentos
contíguos. O fator de subdivisão, quando maior que 1, leva em conta esse
efeito.
O comprimento alagável é assim simplesmente uma medida da habilidade
do navio para resistir a uma avaria abaixo da linha d'água.
A determinação desse comprimento para um determinado ponto do
comprimento do navio, pode ser efetuado racionalmente da seguinte maneira:
a) Para o ponto ao longo do comprimento do navio considerado
escolhe-se um comprimento de compartimento.
b) Considera-se a avaria desse compartimento, e determina-se o
afundamento paralelo e o trim resultante (podendo ser utilizado
o método da adição de pesos ou da perda de flutuabilidade).
c) A comparação entre a linha d'água final obtida e a linha
marginal permite concluir se o comprimento de compartimento
determinado deve ser aumentado ou diminuído para a próxima
iteração ( o objetivo é achar o comprimento de compartimento
que, uma vez avariado, leve a linha d'água de equilíbrio
tangente a linha marginal).
d) Quando a linha d'água final for tangente à linha marginal,
deve-se ter, para aquele ponto ao longo do comprimento do navio,
determinado o comprimento alagável.
e) O procedimento é repetido para alguns pontos (digamos 10) ao
longo do comprimento do navio. Se plotarmos os valores de
comprimento de compartimento obtido num eixo vertical, contra a
posição longitudinal do centro desse compartimento num eixo
horizontal, deve-se obter a curva de comprimento alagável do
navio.
Como se vê, o procedimento é extremamente trabalhoso, e nem sempre
fornece valores precisos do comprimento alagável, pois é bastante difícil a
determinação exata do peso adicionado bem como a posição de seu centro de
gravidade, haja vista que o compartimento inundado é um espaço interno
ocupado por equipamentos e material de bordo.
Tendo isso em vista, alguns procedimentos aproximados podem ser
utilizados, sem que, no entanto, grandes diferenças com o método racional
sejam encontradas.
Existem vários procedimentos aproximados para o cálculo do comprimento
alagável. Esses procedimentos não determinam o comprimento alagável para um
ponto pré determinado do comprimento do navio, determinando sim alguns
valores de comprimento alagável para pontos distribuídos ao longo do navio,
mas cuja posição só é conhecida ao término dos cálculos. Um método bastante
utilizado é chamado de Shirokauer. Esse método faz uso, como todos os
métodos aproximados, das Curvas de Bonjean e das Curvas Hidrostáticas do
navio. Para que se determine a permeabilidade a ser aplicada num
determinado compartimento são necessários também os planos de arranjo de
equipamentos. Algumas tabelas empíricas fornecem coeficientes de
permeabilidade em função da posição ao longo do compartimento, para navios
convencionais.
A base teórica para o uso do método de Shirokawer é apresentada a
seguir.
6.7 Determinação de um Ponto da Curva de Comprimento Alagável
O procedimento a seguir baseia-se em considerações do método da
adição de peso.
Considere um determinado navio do qual se conhecem os planos, as
Curvas Hidrostáticas e as Curvas de Bonjean e que flutuava na linha d'água
WL. Escolhendo uma nova linha d'água de equilíbrio avariado qualquer W1L1,
respeitando apenas que essa seja tangente a Linha Marginal, queremos
determinar qual o compartimento que uma vez avariado cause flutuação com
essa linha d'água. O volume deslocado inicialmente vale ( e na nova
condição vale (1.
Figura 6.6 – Linha d'água de Equilíbrio tangente à Linha Marginal
Sejam Vw e Xw respectivamente o volume de água que deve ser embarcado
e a posição longitudinal de seu centro de massa, medido em relação ao
centro de carena de WL (B). Então as seguintes relações são válidas:
Se for previamente assumido um valor de permeabilidade para o volume
alagado e esse valor for considerado constante ao longo do espaço, o volume
do compartimento fica determinado por V1/(, e são portanto conhecidos seu
volume e a posição de seu centro de massa.
A determinação de sua posição nas formas do casco pode ser determinada
iterativamente com o auxílio da Curva de Áreas Seccionais para aquela linha
d'água. Vale lembrar que a CAS, para uma determinada linha d'água, pode ser
obtida através das Curvas de Bonjean para aquela linha d'água.
Na cota XW lê-se uma estimativa do valor da área de seção média do
compartimento. O comprimento alagável é então estimado por
lalagável=VC/Amédia. Dessa primeira estimativa determina-se a posição de
duas anteparas fictícias, a –l/2 e l/2 da cota de XW , que delimitam VC.
Figura 6.7 – Curva de Áreas Seccionais
O compartimento assim obtido não deve ter nem volume igual a VC nem
comprimento igual a lalagável. As correções são efetuadas integrando-se
sobre a Curva de Áreas Seccionais, onde pode-se utilizar o método de
Simpson com 5 ordenadas. O primeiro ajuste se faz corrigindo o volume,
movendo-se a segunda antepara de y.
A partir daí passo a mover as duas anteparas de tal forma que o
produto das distâncias movidas pela área seccional de cada uma seja
constante até que o compartimento tenha centro em XW.
Isso finalizou a determinação do tamanho e da posição do compartimento
que, quando alagado, leva o navio a flutuar numa linha d'água como aquela
arbitrada inicialmente. O comprimento alagável de um ponto foi determinado.
Note que esse ponto ficou determinado somente após todos os cálculos.
6.8 Construção da Curva de Comprimento Alagável
A Curva de Comprimento Alagável (CCA) pode ser obtida repetindo-se o
processo do item anterior para várias linhas d'água diferentes, todas elas
tangentes à Linha Marginal. O arbítrio dessas linhas d'água pode ser
orientado pelo método de Shirokawer, que é descrito a seguir.
A primeira etapa consiste em se traçar, no plano de perfil, sete
linhas d'água específicas que devem ser tangentes a linha marginal (a linha
marginal é traçada a uma distância de 3 polegadas abaixo da linha de
interseção do convés de anteparas e o costado). Estas linhas, portanto,
definem as condições limite de flutuabilidadede e trim do navio.
Para cada uma dessas sete linhas d'água, determina-se o comprimento e
a posição do compartimento que deve ser alagado, como descrito, fornecendo
como linha d'água final aquela em questão. Isso fornece sete pontos da
curva de comprimento alagável.
A determinação das sete linhas d'água dá-se como segue:
Uma paralela a linha de carga, tangente a linha marginal é traçada
graficamente sobre o plano de perfil. Geralmente o ponto de tangência está
na seção mestra do navio. As outras seis linhas restantes são traçadas com
trim de popa (3 linhas) e trim de proa (3 linhas), determinadas da seguinte
maneira: Nas perpendiculares AV e AR, a partir dos dois pontos de
interceção destas com a linha d'água tangente à marginal, já determinada,
marcam-se distâncias 1/3 T, 2/3 T e T a partir da linha de base, sendo T
dado pela relação: T=1,6H1 -1,5H onde:
H= Calado na linha d'água de projeto
H1= Calado na primeira tangente definida
Figura 6.8 - Tangentes à Linha Marginal
Fixadas as linhas d'água avariadas, o procedimento descrito no item
anterior determina sete pontos da Curva de Comprimento alagável. Alguns
detalhes devem ser comentados com relação às extremidades dessa curva.
Como o navio é limitado longitudinalmente e a definição de
comprimento alagável para um ponto refere-se a um compartimento centrado
nesse ponto, convenciona-se que os comprimentos alagáveis à proa e à popa
são dados pelo dobro da distância do ponto em questão à extremidade
correspondente do navio ( ou à perpendicular de colisão). Assim a CCA é
delimitada por duas retas oblíquas que formam um ângulo dado por arctag(2)
com as horizontais.
Até agora, então, tem-se determinados sete pontos da CCA, e as retas
extremas, que devem se estender até um determinado ponto do comprimento, a
partir do qual o compartimento fictício extremo não mais se estende até a
extremidade do navio. A determinação desse chamado ponto extremo é feita
como segue.
Do esboço da parte central da CCA com os sete pontos determinados
encontra-se uma estimativa do comprimento do compartimento extremo a partir
da intercessão desse esboço com a reta extrema. Na Curva de Áreas
Seccionais correspondente a linha d'água 3A (ou 3F) marca-se esse
comprimento estimado e arbitra-se dois outros comprimentos, lA e lB, um
maior e outro menor que aquele estimado.
Figura 6.9 – Compartimentos Extremos na CAS
Para esses dois compartimentos a utilização do método de Simpson com
5 ordenadas fornece XWA , VCA, XWB e VCB de onde obtêm-se VwA e VwB. Esses
valores, com a ajuda das chamadas Curvas de Interpolação, permitirão
determinar os comprimentos dos compartimento extremos.
As Curvas de Interpolação são construídas plotando-se os valores de
XW e VW obtidos para cada ponto da CCA sob o mesmo eixo de abcissas, em
espaçamentos arbitrários mas iguais. Elas tem utilidade na determinação do
comprimento de compartimentos extremos, na verificação de eventuais erros
do processo de cálculo e auxiliam na determinação de pontos adicionais à
CCA, quando os sete obtidos por Shirokawer não se mostram suficientes.
Figura 6.10 – Curvas de Interpolação
Entrando-se agora com os valores de VwA e VwB (retas pontilhadas)
determinam-se os pontos em abcissas nos quais compartimentos terão esses
volumes. Traçando-se duas perpendiculares por esses pontos (retas cheias)
marcam-se sobre elas as ordenadas dos pontos XWA e XWB . Unindo-se esses
pontos por uma reta (negrito), determina-se o valor de XWextremo onde essa
reta cruza a curva XW. A vertical define VCextremo.
A partir daí, assumindo-se que nessa região o volume do compartimento
alagável seja uma função linear do comprimento alagável, uma interpolação
fornece o valor do comprimento do compartimento extremo:
Os valores de comprimentos de compartimentos extremos assim obtidos
permitem completar o traçado da CCA, onde se considerou apenas efeitos de
afundamento e trim. A consideração dos efeitos de variação do valor de
altura metacêntrica quando compartimentos fictícios com comprimentos dados
pela curva até agora obtida são alagados.
Nesse caso é interessante o uso do método da perda de flutuabilidade.
O procedimento usual é, através do arbítrio de comprimentos de
compartimentos, determinar-se o GMtransversal residual. O comprimento
desses compartimentos vai sendo diminuído até que a condição de GM maior
que zero seja encontrada. A repetição do processo para compartimentos
distribuídos ao longo do comprimento da embarcação fornece a CCA
considerando-se o efeito de estabilidade transversal.
Figura 6.11 – Curvas de Comprimento Alagável
De posse da CCA para um determinado casco e do fator de subdivisão
relativo àquela classe o projetista pode então definir a posição
longitudinal das anteparas transversais.
6.9 Exercícios
Apresenta-se a seguir, como exercício, a determinação do efeito de um
alagamento em um determinado compartimento de uma semi-submersível,
que foi feito pela equipe de lastro da plataforma X. O método
utilizado é o da adição de peso, e pode-se perceber que não é o mais
adequado tendo em vista o grande número de iterações necessárias.
Simulação do efeito de um alagamento da sala de bombas de bombordo da
Petrobrás X. Verificação dos efeitos na Estabilidade - Equipe de Lastro
da Petrobrás X
Calculou-se inicialmente apenas o alagamento da sala de bombas; a
partir daí foram sendo considerados, em função da linha d'água de
equilíbrio, novos alagamentos resultantes e o processo é iterativo.
Concluiu-se que o alagamento da referida sala de bombas leva ao alagamento
do poço do elevador e conseqüente perda da estrutura.
"Calado inicial da unidade: H "20 m "
"KG médio: KGmed "17.86 m "
"Correção devido ao efeito de superfície livre: CSL"0.48 "
"Densidade da água do mar : ( "1.025 t/m3 "
"Permeabilidade do compartimento alagado: ( "0.852 "
"Volume do compartimento alagado: V "1420.0 m3 "
"KG arbitrado: KGarb "15m "
É desprezado o efeito de trim pois o compartimento alagado encontra-
se praticamente na seção mestra.
Considerando o alagamento total da sala de bombas que tem altura de
7m:
Padic=
Padic=
Cálculo da altura do centro de gravidade corrigido: KGcorr após o
alagamento:
"H "( "KG "MV "
"20.0 "21693.7 "17.86 "392217.7 "
"Padic "1240.1 "3.50 "4340.4 "
"22.64 "23203.8 "17.09 "396612.1 "
Onde o KG para o calado de 20m foi lido nas curvas hidrostáticas.
KGcorr= KG + CSL
Kgcorr=17,09 + 0,48 = 17,57 m
Cálculo do braço de emborcamento (Gzemb), sabendo que a sala está a d
= 27,5m a BB do plano de centro.
Gzemb=
Gzemb=
Cálculo do braço restaurador: GZrest
GZrest= GZo - ( KGcorr - KGarb ) sen (()
GZrest= GZo - ( 17.57 - 15.00 ) sen (()
GZrest= GZo - 2.57 sen (()
O valor do braço de restauração inicial, GZ0, vem das Curvas Cruzadas
de Estabilidade, a partir do deslocamento de 23000t, já que o valor
23203,8t não consta alí. A conseqüência de tal aproximação será a leitura
de braços maiores e portanto ângulos de banda menores do que os reais, em
detrimento da segurança
Com esses valores entra-se nas curvas de estabilidade estática e
obtêm-se a tabela que segue:
" "0( "2.5( "5.0( "10( "15( "20( "
"GZ0 " -- "0.275 "0.554 "1.132 "1.167 "2.492 "
"GZrest "0.0 "0.163 "0.33 "0.686 "1.102 "1.613 "
"GZemb "1.470 "1.469 "1.464 "1.448 "1.420 "1.381 "
"Gzrest- "-1.470 "-1.306 "-1.134 "-0.762 "-0.318 "0.232 "
"GZemb " " " " " " "
(l
Note que os braços de restauração e emborcamento se igualam entre 15(
e 20(. Então interpola-se:
(l= 17.89(
Cálculo do calado nas marcas:
variação do calado nas marcas
Tg (1 = ————————————————
cota transversal da sala de bombas
Tg (1 =
X= 8,88m
calado em proa BB: 22,64 + 8,88 = 31,52m
calado em popa BB: 22,64 + 8,88 = 31,52m
calado em proa BE: 22,64 - 8,88 = 13,76m
calado em popa BE: 22,64 - 8,88 = 13,76m
Considerando o alagamento do poço do elevador e do compartimento PC2-
BS1 até a altura de 31.52, que é a cota da linha d'água naquela região:
Segunda iteração:
Cálculo do peso adicionado:
Volume alagado: VPC2 =210,9m3
Permeabilidade do PC2-BS1: (PC2 = 0,850
Peso adicionado no PC2-BS1: PadiPC2= 210,9 0,85 1,025
PadiPC2= 183,7t
Peso adicionado no poço do elevador: PadiELV = 17,61 3,14
1,025 0,95 = 13,40t
Cálculo do novo KGcorr :
"H "( "KG "MV "
"22.64 "23203.8 "17.09 "396612.1 "
"PadiELV "13.4 "15.80 "212.7 "
"PadiPC2 "183.7 "28.07 "5156.5 "
"23.08 "23400.9 "17.18 "401981.3 "
KGcorr= 17,18 + 0,48 = 17,66m
Cálculo do GZemb :
GZemb =
GZemb =
GZemb= 0,23cos (()
Cálculo de GZres :
GZres= GZ0 -(KGcorr - KGarb)sen (()
GZres= GZ0 - (17.66 - 15.00) sen(()
GZres= GZ0 - 2,66sen (()
Cálculo do ângulo (2, incremento ao ângulo de equilíbrio (1.
" "0( "2.5( "5.0( "
"GZ0 "-- "0.275 "0.554 "
"GZres "0.0 "0.159 "0.332 "
"GZbem "0.230 "0.230 "0.229 "
"GZres - GZemb "-0.230 "-0.071 "0.093 "
(2
Interpolando-se encontra-se: (2 = 3,58(
Ângulo de equilíbrio (3:
(3 = (1 + (2
(3 = 21,47(
Cálculo do calado nas marcas:
Tg (3=
X = 10,82m
Calado em proa BB: 23,08 + 10,82 = 33,90m
Calado em popa BB: 23,08 + 10,82 = 33,90m
Calado em proa BE: 23,08 - 10,82 = 12,26m
Calado em popa BE: 23,08 - 10,82 = 12,26m
Considerando o alagamento até a altura de 33.9m no compartimento PC2-
BS1.
Peso adicionado:
Padi = (33,9 - 31,52) 3,14 3,522 1,025 0,85
Padi = 79,7 t
Cálculo do novo KGcorr:
"H "( "KG "MV "
"23.08 "23480.9 "17.18 "401981.3 "
"PadiPC2 "79.7 "32.7 "2606.2 "
"23.25 "23480.6 "17.23 "404587.5 "
KGcorr = 17,23 + 0,48 = 17,71m
Cálculo do GZemb:
GZemb =
GZemb = 0,093cos(()
Cálculo do GZres:
GZres= GZ0 - (17,71 - 15,00) sen (()
GZres = GZ0 - 2,71sen(()
Cálculo do ângulo (4, incremento ao ângulo (3.
" "0( "2.5( "
"GZ0 "—— "0.275 "
"GZres "0.0 "0.157 "
"GZbem "0.093 "0.093 "
"GZres - GZbem "-0.093 "0.064 "
(4
Interpolando-se encontra-se: (4 = 1,48(
Ângulo de equilíbrio (5:
(5 = (3 + (4
(5= 22,95(
Cálculo do calado nas marcas:
Tg(5=
X = 11,64m
Calado em proa BB: 23,25 + 11,64 = 34,89m
Calado em popa BB: 23,25 + 11,64 = 34,89m
Calado em proa BE: 23,25 - 11,64 = 11,61m
Calado em popa BE: 23,25 - 11,64 = 11,61m
Conclusões:
Continuando-se com os cálculos chegar-se-ia a um ângulo de equilíbrio
final que acarretaria uma linha d'água final muito próxima das aberturas de
alagamento progressivo dos paióis de amarra das colunas. A distância das
aberturas dos paióis até a quilha é de 35.3m.
Como foi explicado esse é um cálculo otimista, ou seja, na realidade
o ângulo de equilíbrio final é um pouco maior que o aqui calculado. Além
disso há o balanço comum da unidade que contribui ainda mais para diminuir
e ou zerar a pequena folga vertical que houvesse.
Assim, na realidade, ao final deste alagamento as aberturas de
alagamento progressivo estariam submersas acarretando conseqüências
desastrosas para a estabilidade desta unidade.
* * *