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A Terceira Margem Do Rio - Primeiras Estórias

Análise Semântica do conto "A terceira margem do rio", de Guimarães Rosa

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1 INTRODUÇÃO Este trabalho tem por objetivo fazer uma breve análise semântica do conto "A terceira margem do rio", do aclamado escritor mineiro João Guimarães Rosa (1908-1967), presente em seu livro Primeiras estórias (1962). Trata-se de um texto que permite várias interpretações e análises, motiva diversas discussões e reflexões, além de ser fonte para intertextualidades em outras linguagens artísticas: em 1991 Caetano Veloso e Milton Nascimento lançaram um poema-canção de mesmo título, presente no CD Circuladô. Já no cinema, o cineasta Nélson Pereira dos Santos dirigiu o longa A Terceira margem do rio (1994), onde seis contos transformam-se numa só estória, com predominância do conto A menina de lá (pouco é retratado o conto homônimo que dá título ao filme). A primeira seção desta obra apresenta na íntegra o conto "A terceira margem do Rio". Logo após, enfocamos a vida e a obra de Guimarães Rosa. Os dois capítulos seguintes falam da linguagem originalíssima desenvolvida pelo autor, e como ele está inserido no contexto da prosa pós-moderna (ou 3ª geração modernista). Em seguida é definido o conceito de conto. O capítulo seguinte trata dos elementos narrativos que compõem "A terceira margem do rio": narrador, personagens, espaço e tempo. A próxima seção analisa os aspectos marcantes e oferece possíveis interpretações do enredo, em todos os seus quinze parágrafos. O último capítulo faz um paralelo entre as ideias do psicanalista Jacques Lacan e esta obra-prima de Guimarães Rosa. 2 A TERCEIRA MARGEM DO RIO Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho e menino, pelo que testemunharam as diversas sensatas pessoas, quando indaguei a informação. Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ralhava no diário com a gente — minha irmã, meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, nosso pai mandou fazer para si uma canoa. Era a sério. Encomendou a canoa especial, de pau de vinhático, pequena, mal com a tabuinha da popa, como para caber justo o remador. Mas teve de ser toda fabricada, escolhida forte e arqueada em rijo, própria para dever durar na água por uns vinte ou trinta anos. Nossa mãe jurou muito contra a idéia. Seria que ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora para pescaria e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa casa, no tempo, ainda era mais próxima do rio, obra de nem quarto de légua: o rio por aí se estendendo grande, fundo, calado que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira. E esquecer não posso, do dia em que a canoa ficou pronta. Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez alguma recomendação. Nossa mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço e bramou: — "Cê vai, ocê fique, você nunca volte!" Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: — "Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?" Ele só retornou o olhar em mim, e me botou a benção, com gesto me mandando para trás. Fiz que vim, mas ainda virei, na grota do mato, para saber. Nosso pai entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo a sombra dela por igual, feito um jacaré, comprida longa. Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais. A estranheza dessa verdade deu para estarrecer de todo a gente. Aquilo que não havia, acontecia. Os parentes, vizinhos e conhecidos nossos, se reuniram, tomaram juntamente conselho. Nossa mãe, vergonhosa, se portou com muita cordura; por isso, todos pensaram de nosso pai a razão em que não queriam falar: doideira. Só uns achavam o entanto de poder também ser pagamento de promessa; ou que, nosso pai, quem sabe, por escrúpulo de estar com alguma feia doença, que seja a lepra, se desertava para outra sina de existir, perto e longe de sua família dele. As vozes das notícias se dando pelas certas pessoas — passadores, moradores das beiras, até do afastado da outra banda — descrevendo que nosso pai nunca se surgia a tomar terra, em ponto nem canto, de dia nem de noite, da forma como cursava no rio, solto solitariamente. Então, pois, nossa mãe e os aparentados nossos, assentaram: que o mantimento que tivesse, ocultado na canoa, se gastava; e, ele, ou desembarcava e viajava s'embora, para jamais, o que ao menos se condizia mais correto, ou se arrependia, por uma vez, para casa. No que num engano. Eu mesmo cumpria de trazer para ele, cada dia, um tanto de comida furtada: a idéia que senti, logo na primeira noite, quando o pessoal nosso experimentou de acender fogueiras em beirada do rio, enquanto que, no alumiado delas, se rezava e se chamava. Depois, no seguinte, apareci, com rapadura, broa de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso pai no enfim de uma hora, tão custosa para sobrevir: só assim, ele no ao longe, sentado no fundo da canoa, suspendida no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o de comer, depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva e orvalho. Isso, que fiz, e refiz, sempre, tempos a fora. Surpresa que mais tarde tive: que nossa mãe sabia desse meu encargo, só se encobrindo de não saber; ela mesma deixava, facilitado, sobra de coisas, para o meu conseguir. Nossa mãe muito não se demonstrava. Mandou vir o tio nosso, irmão dela, para auxiliar na fazenda e nos negócios. Mandou vir o mestre, para nós, os meninos. Incumbiu ao padre que um dia se revestisse, em praia de margem, para esconjurar e clamar a nosso pai o dever de desistir da tristonha teima. De outra, por arranjo dela, para medo, vieram os dois soldados. Tudo o que não valeu de nada. Nosso pai passava ao largo, avistado ou diluso, cruzando na canoa, sem deixar ninguém se chegar à pega ou à fala. Mesmo quando foi, não faz muito, dos homens do jornal, que trouxeram a lancha e tencionavam tirar retrato dele, não venceram: nosso pai se desaparecia para a outra banda, aproava a canoa no brejão, de léguas, que há, por entre juncos e mato, e só ele conhecesse, a palmos, a escuridão daquele. A gente teve de se acostumar com aquilo. Às penas, que, com aquilo, a gente mesmo nunca se acostumou, em si, na verdade. Tiro por mim, que, no que queria, e no que não queria, só com nosso pai me achava: assunto que jogava para trás meus pensamentos. O severo que era, de não se entender, de maneira nenhuma, como ele aguentava. De dia e de noite, com sol ou aguaceiros, calor, sereno, e nas friagens terríveis de meio-do-ano, sem arrumo, só com o chapéu velho na cabeça, por todas as semanas, e meses, e os anos — sem fazer conta do se-ir do viver. Não pojava em nenhuma das duas beiras, nem nas ilhas e croas do rio, não pisou mais em chão nem capim. Por certo, ao menos, que, para dormir seu tanto, ele fizesse amarração da canoa, em alguma ponta-de-ilha, no esconso. Mas não armava um foguinho em praia, nem dispunha de sua luz feita, nunca mais riscou um fósforo. O que consumia de comer, era só um quase; mesmo do que a gente depositava, no entre as raízes da gameleira, ou na lapinha de pedra do barranco, ele recolhia pouco, nem o bastável. Não adoecia? E a constante força dos braços, para ter tento na canoa, resistido, mesmo na demasia das enchentes, no subimento, aí quando no lanço da correnteza enorme do rio tudo rola o perigoso, aqueles corpos de bichos mortos e paus-de-árvore descendo — de espanto do esbarro. E nunca falou mais palavras, com pessoa alguma. Nós, também, não falávamos mais nele. Só se pensava. Não, de nosso pai não se podia ter esquecimento; e, se, por um pouco, a gente fazia que esquecia, era só para se despertar de novo, de repente, com a memória, no passo de outros sobressaltos. Minha irmã se casou; nossa mãe não quis festa. A gente imaginava nele, quando se comia uma contida mais gostosa; assim como, no gasalhado da noite, no desamparo dessas noites de muita chuva, fria, forte, nosso pai só com a mão e uma cabaça pra ir esvaziando a canoa da água do temporal. Às vezes, algum conhecido nosso achava que eu ia ficando mais parecido com nosso pai. Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pêlos, com o aspecto de bicho, conforme quase nu, mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia. Nem queria saber de nós; não tinha afeto? Mas, por afeto mesmo, de respeito, sempre que às vezes me louvavam, por causa de algum meu bom procedimento, eu falava: — "Foi pai que um dia me ensinou a fazer assim...", o que não era o certo, exato, mas, que era mentira por verdade. Sendo que, se ele não se lembrava mais, nem queria saber da gente, por que, então, não subia ou descia o rio, para outras paragens, longe, no não- encontrável? Só ele soubesse. Mas minha irmã teve menino, ela mesma entestou que queria mostrar para ele o neto. Viemos, todos, no barranco, foi num dia bonito, minha irmã de vestido branco, que tinha sido o do casamento, ela erguia nos braços a criancinha, o marido dela segurou, para defender os dois, o guarda-sol. A gente chamou, esperou. Nosso pai não apareceu. Minha irmã chorou, nós todos aí choramos, abraçados. Minha irmã se mudou, com o marido, para longe daqui. Meu irmão resolveu e se foi, para uma cidade. Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. Nossa mãe terminou indo também, de uma vez, residir com minha irmã, ela estava envelhecida. Eu fiquei aqui, de resto. Eu nunca podia querer me casar. Eu permaneci, com as bagagens da vida. Nosso pai carecia de mim, eu sei — na vagação, no rio no ermo — sem dar razão do seu feito. Seja que, quando eu quis mesmo saber, e firme indaguei, me diz-quedisseram: que constava que nosso pai, alguma vez, tivesse revelado a explicação, ao homem que para ele aprontara a canoa. Mas, agora, esse homem já tinha morrido ninguém soubesse, fizesse recordação, de nada, mais. Só as falsas conversas, sem senso, como por ocasião, no começo, na vinda das primeiras cheias do rio, com chuvas que não estiavam, todos temeram o fim-do-mundo, diziam: que nosso pai fosse o avisado que nem Noé, que, por tanto, a canoa ele tinha antecipado; pois agora me entrelembro. Meu pai, eu não podia malsinar. E apontavam já em mim uns primeiros cabelos brancos. Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo. Eu sofria já o começo de velhice — esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, não ia, mais dia menos dia, fraquejar do vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo em tororoma e no tombo da cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha tranquilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse — se as coisas fossem outras. E fui tomando ideia. Sem fazer véspera. Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido não se falava, nunca mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido. Ninguém é doido. Ou, então, todos. Só fiz, que fui lá. Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e declarado tive que reforçar a voz: — "Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto... Agora, o senhor, vem, não carece mais... O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor na canoa!..." E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo. Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n'água, proava para cá, concordado. E eu tremi, profundo, de repente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de gesto o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos! E eu não podia... Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão. Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água, que não para, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio. ROSA, João Guimarães. "A terceira margem do rio". In: Primeiras estórias. 15 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p.79-85. 3 A VIDA E A OBRA DE GUIMARÃES ROSA João Guimarães Rosa nasceu a 27 de junho de 1908, em Cordisburg – MG (que significa cidade do coração). Era o filho mais velho do casal Floduardo Pinto Rosa e Francisca Guimarães Rosa. Iniciou seus estudos na pequena cidade natal, onde seu pai era pequeno comerciante. "Cresceu ouvindo vaqueiros que passavam pelo armazém do pai contarem "causos". Aos dez anos, mudou-se para Belo Horizonte, onde faria seus estudos." (Abaurre; Pontara, 2005, p. 616). Mostra-se um aluno aplicado, principalmente em História Natural e Línguas. Gostava de colecionar insetos e fazer expedições nas matas de Cordisburgo durante as férias. Era míope, introvertido e calado, mas observador atento. Em 1925, matriculou-se na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais (atualmente Faculdade de Medicina da UFMG), com apenas 16 anos. Em 27 de junho de 1930, ao completar 22 anos, casou-se com Lygia Cabral Penna, com quem mais tarde teve duas filhas: Vilma (1931) e Agnes (1934). No mesmo ano formou-se em medicina. Iniciou o exercício da profissão em Itaguara (pequena cidade que pertencia ao município de Itaúna) onde permaneceu cerca de dois anos. Cobrava suas consultas pela distância que tinha de percorrer a cavalo. Quando os pacientes não tinham dinheiro, os pagamentos "[...] muitas vezes eram sob a forma de aves e ovos, doces, bolos e frutas." (Rosa, 2009, p.313). Tornou-se um médico respeitadíssimo naquela região. A convivência com sertanejos mais tarde iria inspirar suas obras. Durante a Revolução Constitucionalista de 1932 trabalha como médico voluntário. Entra posteriormente para a Força Pública, chegando a ser oficial médico do 9º Batalhão de Infantaria em 1933, no município de Barbacena. "A angústia provocada pela sua extrema sensibilidade no convívio com a doença e a morte, que algumas vezes, apesar de seus desesperados esforços, não conseguia impedir, levou-o a abandonar a medicina." (Rosa, 2009, p.313). Em 1934 ingressa na carreira diplomática, favorecido pelo seu conhecimento de idiomas, que começa a aprender aos sete anos de idade. "Falava alemão, francês, inglês, espanhol, italiano e um pouco de russo; além dessas línguas, lia também sueco, holandês, latim e grego." (Abaurre; Pontara, 2005, p. 616). Como se não bastasse, dominava o esperanto e conhecia as gramáticas húngara, árabe, sânscrita, lituânica, polonesa, tupi, hebraica, japonesa, tcheca, finlandesa e dinamarquesa. "Nessa época ele conseguiu inúmeros prêmios literários, competindo em concursos de contos. Iniciava uma espécie de pré-literatura." (Rosa, 2009, p.314). Em 1938 é nomeado Cônsul Adjunto em Hamburgo, e segue para a Europa. Lá fica conhecendo Aracy Moebius de Carvalho (Ara), que viria a ser sua segunda mulher. Com a ajuda da esposa, protegeu e facilitou a fuga de judeus perseguidos pelo Nazismo. Em reconhecimento a essa atitude, em abril de 1985 o nome do casal foi dado a um bosque que fica ao longo das encostas que dão acesso a Jerusalém, Israel. Em 1942, ocasião em que o Brasil declara guerra à Alemanha, volta para o país natal, em rápida passagem. O escritor segue para Bogotá, como Secretário da Embaixada, lá permanecendo até 1944. Em dezembro de 1945 o escritor retorna ao Brasil depois de longa ausência. Em 1946, após quase dez anos de preparativos, publica Sagarana, livro de contos (nove ao total) com grande variedade de enredos. Foi seu livro de estreia, que "[...] causou surpresa pela linguagem, que recriava o português como língua literária e dava uma dimensão nova ao regionalismo, vertente tão explorada na literatura brasileira." (Abaurre; Pontara, 2005, p. 623). De grande sucesso, o título do livro "[...] passou a ser nome de escolas, de ruas, de revistas, de projetos artísticos e mesmo de uma cachaça." (Galvão, 2009, p.20). Ainda em 1946 é nomeado chefe de gabinete do amigo e ministro João Neves da Fontoura, e vai a Paris como membro da delegação à Conferência de Paz. Em 1948 o escritor está novamente em Bogotá como Secretário-Geral da delegação brasileira à IX Conferência Interamericana. De 1948 a 1950 encontra-se novamente em Paris, respectivamente como 1º Secretário e Conselheiro da Embaixada. Em 1951 retorna ao Brasil e é outra vez nomeado Chefe de Gabinete de João Neves da Fontoura. No ano seguinte faz uma excursão ao Mato Grosso que durou dez dias. Em 1953 torna-se Chefe da Divisão de Orçamento. Em 1956 lança Corpo de baile, livro de novelas originalmente composto de dois volumes com sete novelas. A partir de 1964 passou a ser publicado em três volumes: Manuelzão e Miguilim, No Urubuquaquá, no Pinhém e Noites do sertão. No mesmo ano publica Grande sertão: veredas, sua obra-prima e único romance. "Todo convencionalismo característico da prosa cai por terra. Guimarães Rosa ousa escrever um romance de mais de 500 páginas sem dividi- lo em capítulos, num imenso monólogo." (Abaurre; Pontara, 2005, p. 624). O livro é traduzido para diversas línguas, tornando-se sucesso editorial. Crítica e leitores dividem-se entre louvores apaixonados e ataques ferozes. O nome de Guimarães é projetado mundo afora, sendo considerado um dos dez maiores escritores de todos os tempos. Em 1958 é promovido a Ministro de Primeira Classe (cargo correspondente a Embaixador). Nessa época começa a apresentar problemas de saúde, decorrentes da vida sedentária e do tabagismo (tinha hipertensão e excesso de peso). Em 1961 recebe o Prêmio Machado de Assis, concedido pela Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da obra. Em janeiro de 1962 assume a chefia do Serviço de Demarcação de Fronteiras. Nessa função trabalhou com afinco, ganhando destaque na resolução de casos como os do Pico da Neblina (1965) e das Sete Quedas (1966). Em 1969, em homenagem ao seu desempenho como diplomata, seu nome é dado ao pico culminante (2.150 m) da Cordilheira Curupira, situado na fronteira Brasil/Venezuela. Em 1962 lança Primeiras estórias, livro de reúne 21 contos (entre eles a obra-prima "A terceira margem do rio", sexto conto do livro). As narrativas, conforme Abaurre e Pontara (2005, p.623), abordam o confronto entre sanidade e loucura, a infância, o amor, a violência e o misticismo. Em relação às suas obras anteriores, percebemos algumas mudanças: "Além de uma diminuição considerável do número de páginas para cada narrativa, de uma renúncia a longas passagens descritivas e enredos paralelos, ocorre também uma sensível redução do colorido regional." (Bolle apud Gomes, 2009, p.3). O critico literário Alfredo Bosi percebe um aspecto muito relevante em vários contos da obra: a "passagem" de um estado de "necessidade" para o "reino da liberdade": Muitas personagens das Primeiras estórias acham-se privadas de saúde, de recursos materiais, de posição social e até mesmo do pleno uso da razão. Pelos esquemas de uma lógica social moderna, estritamente capitalista, só lhes resta esperar a miséria, a abjeção, o abandono, a morte. O narrador, cujo olho perspicaz nada perde, não poupa detalhes sobre o seu estado de carência extrema. Apesar disso, os contos não correm sobre os trilhos de uma história de necessidades, mas relatam como, através de processos de suplência afetiva e simbólica, essas mesmas criaturas conhecerão a passagem para o reino da liberdade. (Bosi, 1988). "A loucura enche os vazios da vida, solta fogos de artifício, escancara os horizontes." (Rónai, 2001, p.22). Aqui cabe uma explicação para o título da obra: "Estória" é um neologismo que refere-se ao relato de acontecimentos fictícios, diferentemente de história, que registra os acontecimentos reais da vida de povos e países. E "primeiras" por ter sido a primeira vez que o autor praticou o gênero do conto curto. Em maio de 1963 candidata-se pela segunda vez à Academia Brasileira de Letras (a primeira fora em 1957, quando obtivera apenas 10 votos), na vaga deixada por João Neves da Fontoura. Desta vez é eleito por unanimidade. Em janeiro de 1965, participa do Congresso de Escritores Latino-Americanos, em Gênova (como resultado do congresso formou-se a Primeira Sociedade de Escritores Latino-Americanos). Em abril de 1967 vai ao México na qualidade de representante do Brasil no I Congresso Latino-Americano de Escritores, no qual atua como vice-presidente. Também em 1967, no meio do ano, publica Tutaméia ou terceiras estórias, coletânea de 40 estórias e 4 prefácios. "'Por que não houve Segundas estórias?', quis eu saber [...]. Papai fez uma de suas costumeiras expressões de mistério e explicou: 'É pra provocar a curiosidade do leitor.'" (Rosa, 2009, p.320). Assim como muitas de suas personagens, Guimarães Rosa era profundamente supersticioso. Por mais de quatro anos, adiou a posse na Academia Brasileira de Letras, porque tinha certeza de que, quando assumisse sua cadeira, algo de ruim lhe aconteceria. Cedendo aos apelos dos outros imortais, marcou sua posse para o dia 16 de novembro de 1967. No discurso emocionado que fez, Rosa explicou: "a gente morre é para provar que viveu. [...] As pessoas não morrem, ficam encantadas". Três dias mais tarde, um infarto calava a voz do mais inspirado contador de histórias da literatura brasileira. (Abaurre; Pontara, 2005, p. 625) Naquele ano Guimarães Rosa seria indicado para o Prêmio Nobel de Literatura, porém sua morte barrou a escolha. Desde então foram publicadas três obras póstumas do escritor: Estas estórias (1969), de contos, Ave, palavra (1970), diversos, e Magma (1997), único livro de poesias e vencedor do prêmio da Academia Brasileira de Letras de 1936. 4 A LINGUAGEM Guimarães Rosa praticamente recria a linguagem literária própria, reinventa a palavra. Baseia-se na musicalidade da fala sertaneja, de jagunços e vaqueiros do interior de Minas. Seu regionalismo é universal, pois os grandes dramas humanos (morte, ódio, amor, medo) dizem respeito a qualquer ser humano, independentemente de época, lugar, renda, grau de instrução ou nacionalidade. Em suas obras a palavra assume um feite de significações, não só no plano semântico (do significado), mas também no fonético (sons). Os gêneros épico e lírico podem ser observados ao mesmo tempo; opera a fusão entre poesia e prosa, formando o prosopoema. Guimarães Rosa lança mão de vários recursos. Entre eles estão os neologismos, isto é, palavras novas criadas pelo autor. Em "A terceira margem do rio", podemos verificar a ocorrência de cinco: "diluso", "encontrável", "demoramento", "perrenguice" e "fervimento". Outro recuso bastante utilizado são as figuras de linguagem: metáforas, eufemismos, antíteses, gradações, hipérboles, metonímias, aliterações, anáforas, pleonasmos, símiles, elipses, e litotes. Registra-se ainda o emprego de diminutivos (foguinho, canoinha), arcaísmos (cordura, falimento, pojava), regionalismos (alembro; estúrdio; ralhava; era a sério; encalcar; de vez de jeito; fiz que vim; chegar à pega ou à fala; severo que era; foi pai; cá de baixo; só fiz, que fui lá; aí e lá;) e brasileirismos (matula, bubuiasse, tororoma). O próprio Guimarães Rosa, em carta a Harriet de Onis, esclarece que a inacessibilidade que reveste seus textos é uma proposta intencional: Não procuro uma linguagem transparente. Ao contrário, o leitor tem de ser chocado, despertado de sua inércia mental, da preguiça e dos hábitos. Tem de tomar consciência viva do escrito, a todo momento. Tem quase que aprender novas maneiras de sentir e de pensar. Não o disciplinado – mas a força elementar, selvagem. Não a clareza – mas a poesia, a obscuridade do mistério, que é o mundo. E é nos detalhes, aparentemente sem importância, que estes efeitos se obtêm. (Gomes, 2009, p.10). 5 A PROSA PÓS-MODERNA OU 3ª GERAÇÃO MODERNISTA Guimarães Rosa e Clarice Lispector são os dois principais representantes da prosa de ficção Pós-Moderna. "Para eles, a questão central não era mais definir nossa identidade, nossos símbolos ou denunciar o subdesenvolvimento do país. Suas obras falam de aspectos da vida brasileira, mas abordam questões universais." (Abaurre; Pontara, 2005, p.619). Esses escritores buscam novas linguagens, rompendo com a estrutura tradicional da narrativa. Ao mesmo tempo, fazem um mergulho na mais funda intimidade do ser humano. O Pós-Modernismo surge com o fim da segunda guerra mundial (1945), ganha fôlego nos anos 1950 e se afirma na década de 1960. Nesse período é criada a ONU e inicia-se um conflito de ideologias: a Guerra Fria; EUA (capitalista) e URSS (socialista) disputam áreas de influência no mundo. "O Pós-Modernismo nasce da ruptura com algumas certezas e definições que sustentavam conceitos do campo social, político, econômico, estético, etc." (Abaurre; Pontara, 2005, p.595). 6 O CONCEITO DE CONTO "Às vezes acredito que eu mesmo, João, seja um conto contado por mim!" (Rosa apud Costa; Vitor, 2011, p.326). Luiza e Bernadete Abaurre assim definem o gênero narrativo conto: O conto é uma narrativa curta que apresenta os mesmos elementos do romance: narrador, personagens, enredo, espaço e tempo. Diferencia-se do romance pela sua concisão, linearidade e unidade: o conto deve construir uma história focada em um conflito básico e apresentar o desenvolvimento e a resolução desse conflito. (Abaurre; Abaurre, 2007, p.114). Em "A terceira margem do rio", essa brevidade do conto pode ser observada especialmente no primeiro parágrafo: a primeira metade da vida de "nosso pai" é resumida em apenas seis linhas. Os demais integrantes da família são apresentados muito sucintamente, sem pormenores. Essas narrativas curtas admitem uma grande diversidade temática. Há contos fantásticos, policiais (ou de suspense), eróticos, românticos, autobiográficos, de ficção científica, entre outros. Orione classifica "A terceira margem do rio" como alegoria: "a narrativa não se pauta pelo registro realista, mas pela alegoria (mostra-se "A" para sugerir "B", numa direção que vai do concreto ao abstrato)." (2008, p.71). 7 ELEMENTOS NARRATIVOS 7.1 Narrador O foco narrativo, isto é, "[...] a perspectiva a partir da qual a história será contada" (Abaurre; Abaurre, 2007, p. 116), está em 1ª pessoa. Além disso, o narrador testemunha os fatos e participa deles. Portanto, trata-se de um narrador-personagem. O filho-narrador é quem reconstitui a trama, rememora, organiza o relato a partir de experiências subjetivas. Como todas as informações do conto são dadas por ele, só é possível ao leitor conhecer os fatos a partir do ponto de vista desse narrador. Conforme lembra Iolanda, "O silêncio do Pai silenciaria a narrativa, não fosse a voz do Filho que narra o já vivido. Da experiência do Pai ele nada pode falar, pois ela não lhe foi transmitida. O Pai não volta para contar. [...]" (s/d, p.8). Apesar de fazer parte da história, esse narrador não é o protagonista, sendo classificado como narrador homodiegético. 7.2 Personagens Protagonistas: pai-narrado Secundários: filho-narrador, mãe, irmã, marido da irmã, filho da irmã, irmão, tio, vizinhos e conhecidos, mestre, padre, soldados, homens do jornal. O filho pode ser considerado uma personagem esférica (ou redonda), pois apresenta "[...] psicologia complexa, suscetível a variações, mudanças, reviravoltas [...]. Já o pai pode ser visto como um personagem esférico simbólico." (Ponchirolli, 2006, p.8). O uso do pronome possessivo na primeira pessoa do plural ("nosso pai", "nossa mãe") indica os fortes laços existentes entre o filho-narrador e sua família. Também percebe-se a ausência de nomes próprios das personagens. 7.3 Espaço Não há referências geográficas e espaciais precisas. Os cinco integrantes da família vivem em uma fazenda, cuja casa fica nas proximidades de um rio de grande porte (também não nomeado). Este rio é caracterizado como "grande, fundo, calado que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira." (Rosa, 2001, p.80). Essas três dimensões (comprimento, profundidade e largura) são retomadas no decorrer do conto, através da repetição da palavra rio três vezes: "e o rio-rio-rio, o rio – pondo perpétuo." (Rosa, 2001, p.84); "[...] rio abaixo, rio a fora, rio a dentro – o rio." (Rosa, 2001, p.85). Daniele dos Santos Rosa comenta o caráter coletivo do conto: a intenção do autor, ao não dar indicações de local, nomes ou datas, seria em "[...] tratar de algo maior, mais completo, que pode ser a realidade nacional e também a realidade brasileira dentro da totalidade mundial." (2008, p.3). Nota-se, portanto, o caráter universal presente nas obras de Guimarães Rosa; "fala-se do Brasil sem especificá-lo." (Rosa, 2008, p.3). 7.4 Tempo O tempo é psicológico, pois "[...] a rememoração do passado desencadeia a narrativa." (Abaurre; Abaurre, 2007, p. 134). Lenine Ribas Maia comenta: "[...] esses anos transcorridos evidenciam o arrastar de um tempo interior, no qual as horas são muito maiores e carregam o peso de uma vida inteira." (s/d, p.6). 8 O ENREDO: ANÁLISE E INTERPRETAÇÕES Logo de início, o título do conto chama a atenção do leitor: no mundo da lógica e da razão, qualquer rio tem uma margem direita e outra esquerda, a do lado de lá e a do lado de cá; não há primeira, nem segunda, muito menos terceira margem. Essa terceira margem abstrata, mencionada somente no título, "[...] é formada pelo próprio pai e por sua canoa situada paralelamente às margens, sempre a subir e a descer – nunca a fazer rotas perpendiculares." (Maia, s/d, p.4). No poema-canção de Caetano Veloso e Milton Nascimento, "risca-terceira" refere-se a essa metáfora. A água do rio pode ser interpretada como a própria vida, com "aspecto sacrorreligioso" (Papette, 2009, p.329). É um rio-texto, ou texto-rio. O primeiro parágrafo resume em poucas linhas a primeira metade da vida de "nosso pai", além de apresentar os demais integrantes da família do filho-narrador. Desde criança, o pai é descrito como "homem cumpridor, ordeiro e positivo" (Rosa, 2001, p.79). A imagem de homem aparentemente equilibrado e afeito às rotinas diárias é confirmada por "sensatas pessoas". No entanto, "[...] exercendo o papel social que lhe cabia, ele não se afirmou enquanto ser humano, não pôs em prática, sua busca pessoal." (Ponchirolli, 2006, p.38). A mãe era quem administrava o lar, "regia e ralhava". A expressão "nosso pai" faz uma alusão imediata ao "Pai Nosso" das orações. "Ecos religiosos emergem também da presença de elementos e imagens, formando tríades: rio/pai/filho, divino/humano/natural, corpo/mente/espírito, terra/céu/água." (Papette, 2009, p.328). A última frase do primeiro parágrafo anuncia uma decisão importante de "nosso pai": encomendar uma canoa. Se repararmos que a canoa é um objeto de madeira (horizontal e oco), feito sob medida para nele caber uma única pessoa, e no qual ela vai entrar para dele não mais sair, torna-se nítida a proximidade simbólica da canoa com um caixão. Porém, paradoxalmente, temos aqui um caixão que não é enterrado, e que fica boiando indefinidamente nas águas do rio. (Orione, 2008, p.70). "Nossa mãe" se posicionou enfaticamente contra o "projeto" do marido. Ela formula uma hipótese para o verdadeiro objetivo do homem, como se pode perceber através de um discurso indireto livre: "Seria que, ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora para pescarias e caçadas?" (Rosa, 2001, p.79). Assim como o fundo do rio, é um mistério o que se passa na mente humana. "Nosso pai" não explica suas motivações ou propósitos, nada responde. Aliás, o silêncio do pai é uma característica marcante da personagem. Sua comunicação com os demais que o rodeiam é feita através de gestos e olhares. Brandão chama de "discurso do silêncio" (2006, p.395). Em seguida o filho-narrador faz algumas descrições do rio, possibilitando que o leitor forme uma imagem visual. Certamente os adjetivos conferem personalidade, sentimento humano ao curso d'água, que não é inanimado. O narrador também se envolve com a grandiosidade do rio, tanto física como espiritualmente. Em entrevista a Günter Lorenz, Guimarães Rosa põe em evidência a sua metáfora do rio enquanto espelho da alma humana e enquanto representação da eternidade, o que automaticamente nos remete ao caráter alegórico, metafísico e transcendente do conto. Entrar no rio é transportar-se a uma outra dimensão: [...] amo os grandes rios, pois são profundos como a alma do homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranquilos e escuros como os sofrimentos dos homens. Amo ainda mais uma coisa de nossos grandes rios: sua eternidade. Sim, rio é uma palavra mágica para conjugar eternidade. (Lorenz apud Gomes, 2009, p.5). No terceiro parágrafo podemos perceber a decisão firme e desapaixonada do pai. Provavelmente é uma referência à expressão que parece ter inspirado Guimarães Rosa: NEC SPE NEC METU, ou "nem com esperança nem por medo" (sem alegria nem cuidado). "Nosso pai" não leva comida nem roupa, nem faz nenhuma recomendação. "Nossa mãe", quando exclama "Cê vai, ocê fique, você nunca volte!" (Rosa, 2001, p.80), usa de três formas o pronome pessoal de tratamento "você", em uma espécie de gradação que vai do menos formal ao mais formal (a frase expressa ordem, imposição e distanciamento). O filho-narrador deseja ir junto com o pai, porém o patriarca rejeita a companhia. O quarto parágrafo do conto, o mais curto, revela o estranho comportamento do pai, mantendo-se afastado das duas margens, a esmo, sem concluir viajem e jamais pisar em terra: "Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais." (Rosa, 2001, p.80). Desaparece das vistas da família, conhecidos, e também do próprio leitor. [...] a atitude do pai marca a coexistência de estados aparentemente excludentes: simultaneamente ausente e presente. O personagem se posiciona entre o dentro e o fora, e se mantém em uma espécie de entrelugar, à margem, em uma margem, na terceira margem. [...] Assim, embora o personagem pareça ter adotado o isolamento, o desligamento absoluto não acontece, pois ele permanece à margem. A partida definitiva do personagem não ocorre, ele não prescinde de continuar existindo. (Brandão, 2006, p.395- 396). Os moradores da comunidade rural, habitantes da beira da razão, logo pensam sobre os motivos de o pai ter partido, conforme se lê no quinto parágrafo: "pagamento de promessa", "alguma feia doença", e até mesmo "doidera". [...] antes de o pai ser "louco", com atitudes alógicas, ele é muito mais o filósofo, o visionário, que ruma à exterioridade daquela caverna: a caverna que era sua casa, sua vizinhança [referindo-se ao Mito da Caverna de Platão]. Como aponta Platão: Um homem desses se desliga dos interesses humanos e dirige seu espírito para os objetivos divinos; a multidão o considera louco, sem perceber que nele habita a divindade. (Platão apud Maia, s/d, p.4). "Nossa mãe e os aparentados nossos" acreditavam que o pai-narrado voltaria para casa assim que os mantimentos acabassem. Entretanto, conforme o filho-narrador explica no sexto parágrafo, ele mesmo se encarregava de trazer "comida furtada", protegida em pedras ocas contra a ação de animais e chuva. Tempos depois o narrador-personagem descobriu que sua ação era facilitada pela mãe. No sétimo parágrafo a mãe solicita que seu irmão ajude nos trabalhos na fazenda. São apresentadas outras personagens, homens instituição, que mais fortemente representam uma sociedade: "a escola (mestre), a igreja (padre), a força policial ("os dois soldados") e a imprensa (homens do jornal)." (Ponchirolli, 2006, p.67). No entanto, o pai evita aproximação e abordagem, e a atitude da mãe de convocar padre, soldados e jornalistas para trazer o marido de volta se mostra sem sucesso. O impasse é insolúvel. A palavra "lancha" sugere uma imagem visual de modernidade. Especialmente, se lembrarmos a descrição da "canoa especial" de "nosso pai", a lancha é uma imagem bastante oposta. [...] Dessa forma, os dois Brasis podem ser vistos nesse conto, se fizermos uma leitura alegorizante: um Brasil, caracterizado pelo desenvolvimento, pela rápida mudança, em choque com um Brasil ainda arcaico, ligado às profundezas dos caminhos que somente uma cultura mítica ou popular pode entender e decodificar. (Ponchirolli, 2006, p.69) No oitavo parágrafo, o mais longo do conto, nota-se a perplexidade do filho-narrador frente à vida que o pai levava, despojada e precária. O filho admira, sente orgulho do pai. Imagina as dificuldades que o barqueiro passava, exposto às intempéries da natureza. "O severo que era, de não se entender, de maneira nenhuma, como ele aguentava." (Rosa, 2001, p.82). Comia muito pouco dos alimentos colocados em raízes e barrancos. "Não adoecia?" (Rosa, 2001, p.82), pergunta o narrador ao leitor. "Nosso pai" viaja sem destino, não desembarca em alguma margem. "A corrente do rio leva essa personagem-chave a navegar numa dimensão desconhecida e distante, mas é um afastamento longínquo, que não é mensurável em termos físicos." (Papette, 2009, p.334). Ele faz uma busca pelo verdadeiro eu, mergulha no inconsciente, procura uma verdade superior, se integra ao Cosmos e às forças naturais. Desprende-se da civilização material das margens para contemplar a natureza em absoluto silêncio, nessa busca pela plenitude. O nono parágrafo mostra que a família tenta levar uma vida normal com o passar do tempo: a irmã se casa, mas a mãe recusa-se em organizar uma festa. A família sofre com a expectativa de retorno do pai (sempre possível, ainda que incerto), já que ele está desaparecido, não morto (apesar de essa ser uma questão passível de interpretações variadas). Orione (2008) fala em "luto interminável", "angústia interminável de espera", diferentemente da morte, que "[...] tira do convívio familiar de uma vez por todas (a morte é a certeza de que nunca mais a pessoa será vista)." (Orione, 2008, p.70-71). O filho-narrador imagina os desdobramentos da passagem dos anos na aparência do pai, e supõe adquirir características animalescas, homem- bicho: "Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pêlos, com o aspecto de bicho [...]." (Rosa, 2001, p.83). No décimo parágrafo o filho-narrador questiona se o pai perdeu o afeto pela família. Decepciona-se pela falta de satisfação e preocupação recíproca. Nem mesmo a aparição do neto (a irmã teve um filho) foi capaz de sensibilizar o barqueiro. Orione vê nessa cena comovente a representação de um enterro: "todos os familiares juntos, abraçados entre si e chorando por alguém da família que não voltará mais. Não por acaso, a partir daí cada um deles resolve seguir a sua própria vida e esquecer o pai, que deu sinais de nunca mais retornar." (Orione, 2008, p.70). O décimo primeiro parágrafo narra a dissolução do grupo familiar: "Minha irmã", juntamente com o marido, resolve se mudar "para longe daqui" (agora ela pertencia a duas famílias). "Meu irmão" adota conduta semelhante, e tenta a vida na cidade. "Nossa mãe" foi a última a abandonar o posto: envelhecida (uma metáfora para o cansaço físico e psicológico na espera eterna pelo marido) ela vai viver com a filha. Na tentativa de superar o trauma, tomam caminhos diferentes na vida. Já o filho-narrador é o único a permanecer. Ele não se liberta do pai, não constitui família, não conduz a vida de forma independente e autônoma. Falha no desenvolvimento da personalidade e do ego. O filho-narrador demonstra melancolia e emoção: "Eu fiquei aqui, de resto. [...] Eu permaneci, com as bagagens da vida." (Rosa, 2001, p.83-84). É feita uma intertextualidade com a história bíblica de Noé. O filho- narrador, cético e racional, refuta essa ideia do pai ter sido o escolhido para o salvamento e recomeço do mundo. A hipótese de que o pai tenha recebido uma forma de anunciação do iminente dilúvio universal e de que teriam sido mensagens divinas a induzi-lo a tal viagem para o não lugar é insustentável. Não é pensável que ele tenha agido num sentido tão egoístico – isolar-se para se salvar sozinho não pode ter sido o papel escolhido: este tem que trazer a salvação para os outros ou então tem de os levar até ela. (Papette, 2009, p.329). No final do parágrafo o filho-narrador utiliza, pela primeira vez, o pronome possessivo no singular: "Meu pai, eu não podia malsinar." (Rosa, 2001, p.84). De fato, todos os integrantes da família se foram, o abandonou. O aparecimento dos primeiros cabelos brancos no filho, sinal da velhice, encerra esse parágrafo. A melancolia e angústia do filho-narrador é reinterada no décimo segundo parágrafo: "Sou homem de tristes palavras." (Rosa, 2001, p.84). (Nota-se o uso do verbo no presente, recurso utilizado algumas vezes nos parágrafos restantes). Julga a si mesmo, fala em culpa, sentimento que o leitor só compreenderá no penúltimo parágrafo do conto (o filho não conseguiu substituir o pai na canoa); lembre-se que o narrador-personagem rememora, já vivenciou o fato. Os efeitos da velhice se intensificam no filho: "Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo." (Rosa, 2001, p.84). Ele também teme pela sobrevivência do pai, já com idade avançada. O décimo terceiro parágrafo marca o clímax, o ponto alto do conto. A ideia de substituir, ocupar o lugar do pai ganha força, até que chega o momento de fazer a troca. O filho tenta estabelecer comunicação com o barqueiro, chama repetidas vezes, e declara: "Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto... Agora, o senhor vem, não carece mais... O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa!..." (Rosa, 2001, p.85). O décimo quarto parágrafo narra a reação nos dois personagens. O pai parece ter escutado, levanta-se e aproxima-se com a canoa. O filho vacila: "E eu tremi [...], arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado." (Rosa, 2001, p.85). Esse trecho sugere uma aparência fantasmagórica do pai, de "monstro horripilante, assustador, recoberto de uma magia incognoscível [...]; provoca, então, medo irrefreável no filho, que, num rompante desesperado, foge instintivamente." (Cavalcanti, 2006, p.116). Ponchirolli classifica o filho-narrador como "homem de dois mundos", pois assume uma posição ambígua em relação ao pai: "[...] quer lançar-se para fora da sociedade convencional e racional, [...] mostra-se bastante próximo à experiência do pai, [...] mas, ao mesmo tempo, não tem a coragem de empreender sua busca." (Ponchirolli, 2006, p.48,91). "A coragem aparece como um dos atributos mais valiosos dos seres humanos, devendo o medo, a insegurança e a dúvida serem superados. O maior contraste entre pai e filho no conto é a ousadia de um e o medo do outro." (Costa; Vitor, 2011, p.336). Na frase final, a palavra pedindo é repetida três vezes: "E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão." (Rosa, 2001, p.85). "A repetição do termo "pedindo" e a aliteração lembram o discurso religioso ritualístico, como a reza." (Ponchirolli, 2006, p.106). O décimo quinto parágrafo marca o término do conto. O solitário narrador adoece, parece mergulhar em depressão. Questiona sua própria masculinidade: não teve a coragem que a sociedade exige dos homens, nem seguiu o caminho do pai. "As perguntas do narrador angustiado dirigem-se ao receptor e a si mesmo, como a sinalizar um julgamento em que o narrador é réu e juiz. Seu veredicto, culpado." (Ponchirolli, 2006, p.114). Também teme pela hipótese de suicídio, expressa na metáfora "abreviar com a vida". Esperando pela hora da sua morte, ele deseja ser posto "numa canoinha de nada" e ser levado ao sabor do fluxo do rio, "nessa água que não para". Assim interpreta Teresinha Zimbrão da Silva: [...] não tendo alcançado os objetivos da primeira metade da vida, ele [o filho] não estava preparado para dar início ao programa da segunda. [...] ao contrário do pai, sujeito ativo do próprio destino que, por sua vontade, foi ao encontro da morte, o filho terá um comportamento passivo. Não tendo se preparado para morrer, já que nem mesmo chegara a viver, ele é que será encontrado pela morte: pego de surpresa, só depois de morto será colocado na canoa dentro do rio. (Silva, s/d, p.6). 9 RELAÇÕES ENTRE FREUD, LACAN E A TERCEIRA MARGEM Ao criar a Psicanálise, Sigmund Freud (1856-1939) buscava um método de investigação que consiste essencialmente em evidenciar o significado do inconsciente das palavras, das ações, das produções imaginárias (sonhos, fantasias, delírios) de um sujeito. A aceitação de processos psíquicos inconscientes, o reconhecimento da doutrina da resistência e do recalcamento e a consideração da sexualidade e o do complexo de Édipo são os conteúdos principais da psicanálise e os fundamentos da teoria de Freud. Entre suas diversas análises do comportamento do sujeito perante a sociedade e situações conflitantes onde a loucura e os delírios eram pontos chaves, o Caso Schreber abordado por Freud faz uma analogia ao conto "A terceira margem do rio". O Caso Schreber (1911-1913) relata a história de Daniel Paul Schreber, que após perder a irmã Anna, o pai aos 19 anos e o irmão aos 35, entra em uma fase de conflitos. Schreber se casa aos 36 anos e com 42 tem sua primeira crise psíquica,e a segunda com 52 onde fora internado por mais seis meses. Schreber afirmava que suas crises eram fruto do cargo excessivo de trabalho, que vinha da grande responsabilidade de Presidente da Divisão da Corte de Apelação, e nada haveria com delírios e a paranoia. Durante seu tratamento manifestações delirantes não-sistematizadas e duas tentativas de suicídio foram registradas. Na abordagem de Freud o delírio teve como motor a ambição, do paciente, de ser o Redentor da humanidade, e que o meio, para isso, era a sua emasculação. Mas o estudo das memórias aponta a hipótese diversa, segundo a qual a fantasia de se transformar em mulher sempre seria delírio essencial (sonho em que Schreber tinha frequentemente), e o papel de redentor ficaria em plano secundário. Freud concluiu que o delírio de se haver transformado em mulher nada mais era do que a realização do sonho que teve antes de mudar-se para Dresden, não obstante ter lutado contra tal ideia no início. Assim como no conto "A terceira margem do rio", quando o narrador-personagem demonstra seu desejo de substituir o pai na canoa, e ao mesmo tempo se diz preocupado em recuperá-lo a vida de antes, a família. Como se a atitude que o pai teve ao subir em uma canoa e deixar tudo para trás, despertasse a admiração obscurecia do filho a tal ato. O mesmo desejo fluente más não imposto que Schreber tinha a se transformar em mulher e não admitia. Jaques Lacan foi o seguidor de Freud que mais contribui e deu continuidade à sua obra. Para Lacan a psicanálise não é uma ciência, uma visão de mundo ou uma filosofia que pretende dar a chave do universo. A psicanálise é uma prática de caráter subversivo, onde através do método da livre associação chegaremos ao seu núcleo. Com uma transmissão mais objetiva possível, Lacan mostrou que o inconsciente se estrutura como linguagem. A verdade sempre teve a mesma estrutura de uma ficção, em que aquilo que aparece sob forma de sonho ou devaneio é, por vezes, a verdade oculta sobre cuja repressão está a realidade social. Uma das teorias criadas por Lacan em alusão ao conto "A terceira margem do rio", de Guimarães Rosa, é O Estádio do Espelho. Lacan iniciou este conceito a partir das experiências de Henry Walon. Tal conceito tem como função observar e caracterizar a diferenciação que a criança faz do próprio eu. É definitivamente no Estádio do espelho, segundo Lacan onde o sujeito afinal se constitui, e que portanto uma nova dimensão, a dimensão "daquilo que sou" se difere da dimensão "daquilo que dizem que sou". Pode-se então considerar a importância, por exemplo, do período de amamentação. O encontro da mãe com a criança num insight de extremo significado em que se completa a beleza da afetividade, o bebê põe-se diante de um novo espelho, agora ao olhar da mãe. Nesse instante Lacan destaca que ao perceber sua imagem diante da imagem de outra no espelho a criança ilustra um aspecto conflituoso da relação dual. A construção do eu de Lacan é vista no conto A terceira Margem do Rio, onde a criação "daquilo que sou" do narrador personagem, se constrói sobre a imagem do pai ausente, e antes presente, que de certa forma colocou um fardo sobre a vida do filho, mesmo não sendo sua intenção. Como exemplo vemos no trecho do narrador-personagem: "Eu fiquei aqui, de resto. Eu nunca podia querer me casar. Eu permaneci, com as bagagens da vida." (Rosa, 2001, p.83-84). 10 CONSIDERAÇÕES FINAIS Primeiras estórias é recomendado para aqueles que estão se iniciando na leitura de Guimarães Rosa. Porém, o leitor ainda encontra algumas dificuldades no entendimento, seja pela linguagem original desenvolvida pelo escritor, seja pelo enredo da narrativa. Esse é o caso da obra-prima "A terceira margem do rio": ela exige paciência do receptor, que deve fazer várias leituras para descobrir as palavras de significado desconhecido e desvendar os meandros da estória. Guimarães Rosa não escreve nenhuma palavra por acaso. Paulo Rónai, no prefácio de Primeiras estórias, afirma que "todos os rios do mundo de Rosa tem três margens." (2001, p.27). De fato, budistas e hinduístas, duas importantes fontes de Guimarães Rosa, cultivam a ideia de travessia, a passagem de uma margem a outra da existência. Para o leitor, a conduta adotada pelo pai em "A terceira margem do rio" é no mínimo absurda: abandonar a família para permanecer no rio sem destino, indo e vindo, não corresponde ao nosso mundo racional. Nesse sentido "A terceira margem do rio" é um conto extremamente enigmático. O que de fato aconteceu com o pai? O barqueiro era "doido"? Ou seria todo o conto uma esquizofrenia do filho? Não sabemos. Trata-se de um conto inconclusivo, insolúvel. Entretanto, a atitude do pai nos lembra da necessidade de fugirmos do caos das cidades e da civilização material para fazermos um encontro com o espírito, consigo mesmo. A morte do narrador corresponde, coincidentemente, ao fim do conto, permitindo que o filho se despeça do leitor, na esperança de que este tenha tomado consciência do caminho a seguir, e que possa continuar sozinho na sua busca. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABAURRE, Maria Bernadete Marques; ABAURRE, Maria Luiza Marques. Produção de texto: interlocução e gêneros. São Paulo: Moderna, 2007. _________, Maria Luiza Marques; PONTARA, Marcela N. Literatura brasileira: tempos, leitores e leituras. São Paulo: Moderna, 2005. Biografia João Guimarães Rosa, s/d. Disponível em: Acesso em: 27 fev. 2012. BOSI, Alfredo. "Céu, Inferno". In: Céu, Inferno. 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Dissertação (Mestrado em Letras) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. Disponível em: Acesso em: 25 fev. 2012. RÓNAI, Paulo. "Os vastos espaços". In: ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. 15 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p. 14-48. ROSA, Daniele dos Santos. "O problema da literatura brasileira no conto 'A terceira margem do rio', de Guimarães Rosa'". XI Congresso Internacional da ABRALIC: Tessituras, Interações, Convergências, São Paulo. 13 a 17 jul. 2008. Disponível em: Acesso em: 27 fev. 2012. _____, João Guimarães. "A terceira margem do rio". In: Primeiras estórias. 15 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p.79-85. _____, Vilma Guimarães. "João Guimarães Rosa, meu pai". In: CHIAPPINI, Ligia; VEJMELKA, Marcel (orgs.). Espaços e caminhos de João Guimarães Rosa: dimensões regionais e universalidade. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p.309-323. SANTOS, Iolanda Cristina dos. "Memória e contemplação em 'A terceira margem do rio'". 2º Encontro de Ciência da Literatura da Faculdade de Letras da UFRJ, Rio de Janeiro. 21 a 23 out. Disponível em: Acesso em: 27 fev. 2012. SILVA, Teresinha V. Zimbrão da. "A terceira margem". Juiz de fora, s/d. Disponível em: Acesso em: 27 fev. 2012. VIEIRA, Alessandro Daros. "Der narrenkahn ou a canoa dos loucos: uma análise literária do conto 'A terceira margem do rio' de João Guimarães Rosa". REEL – Revista Eletrônica de Estudos Literários, Vitória. n.1, 2005. Disponível em: Acesso em: 27 fev. 2012. ANEXO ----------------------- Figura 1. Na primeira edição de Primeiras estórias (1962), Guimarães Rosa concebeu e rascunhou os desenhos presentes na epígrafe do livro. Eles foram finalizados por Luís Jardim. Cada conto possui seus desenhos próprios. Em "A terceira margem do rio", notamos uma flecha, relacionada com o signo de sagitário; dois símbolos de libra; uma canoa com o remador; e o oito deitado, símbolo do infinito. Machado assim interpreta as figuras: "Podemos pensar nas figuras de libra, que se repetem, como duas margens que separam dois mundos: o mundo concreto e finito da flecha e o mundo das ideias, do infinito. Entre esses dois mundos, a álgebra mágica surge como processo de travessia do 'homem humano'." (Machado, 2008, p.90). Observe que o barqueiro se dirige do mundo concreto, da civilização material, para o mundo das ideias, transcendente, metafísico. Figura 2. Capa da primeira edição de Primeiras estórias (1962). Figura 3. João Guimarães Rosa, acompanhando a boiada (maio de 1952). No alto da figura pode-se ler: no fim da jornada de 40 léguas a cavalo, Guimarães Rosa tem uma barba de três dias, está vermelhão de sol e queimado de poeira das trilhas sertanejas. Olha para trás, como que a verificar a grande distância percorrida.