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A PROVA NO PROCESSO DO TRABALHO
O Processo do Trabalho, enquanto ciência, possui princípios e regras
próprias, às vezes bastante distintos daqueles encontrados no Processo
Civil e Penal. Da mesma forma, a prática trabalhista difere sobremaneira
daquela existente nos demais foros.
Isso porque, no processo trabalhista, na grande maioria das
vezes se confrontam duas partes, sendo uma delas detentora de capital e
recursos suficientes para suportar verdadeiras batalhas judiciais, enquanto
outra é hipossuficiente, buscando na Justiça Obreira a satisfação de
direitos básicos necessários à sua própria sobrevivência. Dessa situação
decorre a diferença real entre as partes, de certa forma compensada pela
proteção dada ao trabalhador pelo direito material. Evidente que esse
equilíbrio gerado pela lei nem sempre é suficiente, sendo que na prática o
empregado normalmente se vê, mesmo perante o juiz, em posição desvantajosa
em relação ao seu antigo empregador.
Essa desvantagem é notada principalmente no campo das provas,
onde a empresa, além de ter grande parte delas em seu poder antes do
processo (controles de jornada, recibos de pagamento, atestados médicos,
etc.), tem uma maior facilidade na produção de outras provas na instrução
processual, como acontece com as testemunhas, perícia técnica, etc.
Destaca-se ainda que algumas das provas utilizadas no processo
são produzidas numa fase pré-processual, quando o direito do empregado
começa a ser lesado. Explicamos. É com o contrato de trabalho que surgem os
direitos do empregado, e é no seu decorrer que eventual lesão ocorre. Como
a prova visa demonstrar a existência de um fato, normalmente ela nasce no
mesmo momento daquele (testemunha que vê um acontecimento, pagamento que é
efetuado, etc.), especialmente as provas documentais. Assim, além de ter em
mãos tais documentos antes da própria propositura da ação, a empresa pode,
utilizando de seu poder de comando sobre o empregado, produzir a prova da
maneira que melhor lhe convir. Isso acontece especialmente com os controles
de jornada e registros de vendas/comissões, quando o empregado é compelido
à anotar, não necessariamente a realidade, mas sim aquilo que lhe é
determinado por seu empregador.
Essa prova, apesar de não ser absoluta (trata-se de presunção
juris tantum) tem plena validade, se não produzida prova em contrário no
processo. Sucede que essa contraprova, além da dificuldade em sua produção,
muitas vezes não possui a "clareza" esperada pelo juiz. Isso porque,
enquanto o documento apresenta dias e horários precisos ou valores
expressos, a prova do empregado muitas vezes é falha, imprecisa e até mesmo
confusa, justamente porque ele tem de utilizar meios inadequados para
provar (ou melhor, desmentir a prova da empresa) fatos e situações
discutidas no processo.
É sabido que a maior prova de que dispõe o empregado é a
testemunhal. Embora seja um tipo de prova arriscada – afinal de contas o
ser humano normalmente inclui a sua própria visão dos fatos ao relatar um
acontecimento – muitas vezes é a única disponível. Também é sabido que a
testemunha nem sempre age como um anjo da guarda, acompanhando o obreiro
durante toda sua jornada de trabalho, ou mesmo estando atento a cada
detalhe, por mais insignificante que possa lhe parecer.
O que muitas vezes acontece é a exigência de que a testemunha
diga aquilo que o julgador quer ouvir ou que esclareça os fatos segundo a
ótica da justiça, e não dela própria. Tal comportamento é inaceitável.
Primeiro, porque dispõe o juiz dos meios necessários para evitar as
testemunhas "preparadas", bem como para coibir aquelas que vão à juízo para
faltar com a verdade. As demais devem ser ouvidas de maneira a extrair-se a
verdade dos fatos, lembrando que, como o próprio CPC estabelece em seu
artigo 415, a testemunha deve prestar o compromisso de dizer a verdade
"daquilo que souber", não sendo exigível, obviamente, que a testemunha
saiba de toda a verdade, ou que conheça todos os fatos que envolvem a lide.
Em segundo lugar, deve-se ter em mente que a testemunha
normalmente relata os fatos da forma por ela percebida. Embora nem sempre
possa precisar exatamente se a tese do empregado ou da empresa é a correta,
as informações por ela prestadas servem como base para que o juiz possa
estabelecer um raciocínio lógico e com isso alcançar a verdade. Se a prova
testemunhal dá indícios de que os documentos juntados pela empresa não
refletem a verdade, mesmo que não indique precisamente os fatos ocorridos,
certamente restará comprovado que a prova trazida pela empresa,
especialmente aquela criada antes do processo, não merece fé.
Ao lado da prova testemunhal existe a confissão da empresa, que
pode ser expontânea (quando a própria empresa reconhece como verdadeira a
tese do empregado) ou provocada (através do desconhecimento de certos fatos
pertinentes ou mesmo da incongruência das afirmações prestadas). Muitas
vezes a confissão é a única prova de que dispõe o empregado, pois os
documentos ficam em poder da empresa, e as testemunhas ou têm receio de
depor (por continuarem laborando no mesmo local) ou sequer existem, como é
o caso dos trabalhadores que trabalham sozinhos, como motoristas, vigias,
etc. Deve assim o depoimento pessoal do representante da empresa ser
sabiamente explorado, tanto pelo juiz quanto pelo patrono do empregado,
pois muitas ações são julgadas com base na confissão extraída da parte. Da
mesma forma, o depoimento pessoal do empregado nunca deve ser dispensado,
pois com ele também é possível desmascarar pretensões infundadas e
descabidas.
Contudo a prática de perguntas capciosas deve não só ser
evitada, mas abolida dos corredores judiciários. O simples questionamento
sobre as anotações dos cartões ponto, por exemplo, pode levar o empregado a
dar uma resposta insuficiente, utilizando-se o juiz para ter como
confessado por ele que todas as informações ali constantes são verdadeiras
(mesmo que conste afirmação contrária na peça inicial). O mesmo ocorre com
a empresa que, quando seu preposto desconhece o horário de repouso e
alimentação do ex-funcionário, é tido como certa a mera alegação de que ele
não possuía intervalo algum.
Esse quadro desastroso da análise e produção da prova no
processo do trabalho certamente precisa ser combatido, seja pela utilização
de meios mais eficientes de controle dos documentos produzidos por parte da
empresa, seja pelo procedimento ético por parte dos advogados (tanto na
defesa do empregado quanto da empresa), e também pela conscientização do
juiz em não se ater apenas às formalidades da lei, mas buscar efetivamente
a verdade real. A efetivação da justiça depende da correta noção dos fatos
que envolvem a lide, e se a prova existente no processo não for devidamente
analisada, aquele objetivo não será alcançado.
BIBLIOGRAFIA:
PEREIRA, Luiz Fernando. A análise da prova no processo do trabalho.
Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 79, 20 set. 2003.