Preview only show first 10 pages with watermark. For full document please download

1.1 - A Terra é Magnética

Curso de Geomagnetismo

   EMBED


Share

Transcript

MÓDULO 1.1: A TERRA É MAGNÉTICA A descoberta de que a Terra possui um campo magnético próprio ocorreu em 1600 por um cientista chamado William Gilbert. Ele chegou a conclusão de que a Terra se comportava como um grande imã. O estudo do campo magnético da Terra (ou geomagnético) sempre foi de grande importância histórica, tanto para a orientação nas navegações quanto para um melhor conhecimento sobre o planeta Terra. Nos dias atuais há muita pesquisa sendo desenvolvida sobre geomagnetismo. Alguns tópicos ainda estão em plena discussão, como por exemplo, os processos que originam este campo magnético e as suas consequências para a Terra. Neste curso discutiremos desde os tópicos fundamentais até as questões mais complexas que atualmente estão sendo estudadas. Como o campo magnético é uma grandeza vetorial, com intensidade e direção, podemos medi-lo por seus componentes (Figura 1): norte (X), leste (Y), vertical (Z) e por seus ângulos de declinação magnética (D) e inclinação magnética (I). A componente horizontal do campo é representada por H e a intensidade total por F (ou por B). A componente horizontal (H) aponta para o norte magnético. A declinação magnética é o ângulo entre o norte magnético e o geográfico. A intensidade do campo magnético é medida em uma unidade chamada Tesla. O campo geomagnético é expresso em nano-tesla (nT) que é igual a 10-9 tesla. A intensidade do campo na superfície da Terra é da ordem de 70.000 nT próximo aos pólos e cerca da metade deste valor próximo ao equador (Figura 2). Mas há uma região da Terra onde o campo é mais fraco e essa área é chamada de Anomalia Magnética do Atlântico Sul (AMAS). Grande parte da AMAS está localizada no Brasil e será um tópico de importante discussão no decorrer deste curso. Figura 1: Componentes do campo geomagnético: “X” é a componente norte, “Y” é a componente leste e “Z” a vertical. O ângulo “D” é a declinação magnética: desvio da bússola em relação ao norte geográfico e a inclinação “I” é o ângulo entre a componente horizontal (“H”) e o campo total (“F”). AMAS Figura 2: Mapa do campo magnético em 2005 calculado por um modelo internacional de referência do campo geomagnético (IGRF). O campo magnético observado é resultado da contribuição de diferentes fontes: o campo do núcleo, o campo externo, campo induzido e o campo crustal. Os campos do núcleo, crustal e induzido serão abordados em detalhes no módulo 2, já o campo externo será descrito no módulo 3. Entretanto, para uma visão geral do campo geomagnético, explicamos as principais características em seguida. 1 Campo do núcleo (ou campo principal): o campo geomagnético gerado no núcleo possui uma geometria aproximadamente dipolar. Este campo corresponde a cerca de 90% do campo observado, por isso o campo do núcleo também é chamado de principal. Esse campo dipolar funciona como um “escudo protetor” para as partículas que vêm do Sol e de raios cósmicos que se propagam na direção do nosso planeta. O termo dipolar significa dois pólos, norte e sul, como por exemplo, em um imã. As LINHAS DE FORÇA DO CAMPO MAGNÉTICO em um imã saem do pólo norte para o pólo sul (Figura 3). consideram os pólos magnéticos de acordo com os pólos geográficos. Por isso, a configuração atual do campo magnético indica que o pólo sul magnético está próximo ao pólo sul geográfico e vice-versa (Figura 4). Essa associação não é permanente, já que devido às reversões do campo, os pólos invertem o sentido. Figura 4: Representação atual do campo dipolar da Terra, mostrando as linhas do campo magnético, os pólos magnéticos e geográficos. Figura 3. Linhas de força do campo magnético de um imã. Mas você imagina como é o interior da Terra? O interior da Terra possui quatro camadas principais: a crosta, o manto, o núcleo externo e o núcleo interno (Figura 5). Cada camada possui características específicas de composição, pressão e temperatura. As LINHAS DE FORÇA DO CAMPO MAGNÉTICO descrevem a estrutura do campo magnético. A agulha da bússola aponta ao longo de uma linha de campo. Quanto mais próximas as linhas de campo, maior será a intensidade do mesmo (como nos pólos magnéticos da Terra ou de um imã). Já as linhas de campo afastadas representam campos magnéticos mais fracos. Entretanto esta convenção do imã não é adotada pelos geofísicos no caso da Terra. Note que em nosso planeta atualmente as linhas de força saem do sul geográfico para o norte geográfico (Figura 4). Entretanto, os geofísicos Figura 5: Principais camadas da Terra: crosta, manto e núcleo (interno e externo). 2 A crosta possui espessuras diferentes nos continentes e nos oceanos: poucas dezenas de quilômetros nos continentes e menos do que dez quilômetros nos oceanos. Abaixo da crosta, existe o manto que atinge uma profundidade de aproximadamente 2891 quilômetros. O núcleo externo é a única camada liquida da Terra e atinge uma profundidade de 5150 quilômetros. Já o núcleo interno é sólido e se estende até 6371 km (raio da Terra). Mas como sabemos sobre a existência destas camadas e das divisões entre elas? Para responder esta pergunta consulte o: Campo Externo: é gerado pelo VENTO SOLAR ao atingir a magnetosfera terrestre, que é a região em volta da Terra onde o campo magnético está confinado. A parte da magnetosfera voltada para o Sol é comprimida pelo vento solar e atinge 10 Raios da Terra (Re=6371km). Já a parte oposta ao Sol, fica alongada e é chamada de cauda magnética, atingindo 60 Re (Figura 6). Outra região onde o campo externo é produzido é chamada de ionosfera e estende-se de 60 km até 1500 km. A ionosfera é dividida em camadas com espessuras e ionizações diferentes. SAIBA MAIS SOBRE SISMOLOGIA Entretanto, na realidade, não há um imã no núcleo terrestre. O que existe é fluido composto principalmente de ferro (Fe) e níquel (Ni) com uma alta CONDUTIVIDADE ELÉTRICA (σ = 5x105 S/m). Este fluido está em constante movimento na presença de um campo magnético pré-existente. Consequentemente, o fluido induz correntes elétricas que ampliam o campo magnético. A CONDUTIVIDADE ELÉTRICA mede a capacidade de um material conduzir uma corrente elétrica. É normalmente representado pela letra grega sigma (σ) e sua unidade é Siemens/metro (S/m). Metais, por exemplo, possuem uma alta condutividade elétrica e por isso são chamados de condutores. Alguns exemplos da condutividade elétrica de materiais encontram-se abaixo (para uma temperatura de 20ºC): Terra Magnetosfera Figura 6: Esquema mostrando o efeito do vento solar no campo magnético da Terra. A magnetosfera é a região de existência do campo geomagnético. O VENTO SOLAR é composto por partículas energizadas e ionizadas, basicamente elétrons e prótons que fluem do Sol para todas as direções. O vento solar é originado na camada mais externa do Sol, chamada corona. A sua velocidade é de aproximadamente 400 km/s, mas pode chegar até 800 km/s. Campo Crustal: é gerado pelas rochas magnéticas que existem na camada mais superficial da Terra. A primeira observação da existência do campo magnético da Terra ocorreu devido à propriedade de atração de uma rocha magnética, o imã natural. O campo magnético antigo é registrado por rochas, 3 que contém minerais magnéticos. Estes minerais funcionam como pequenos imãs e orientam-se de acordo com o campo magnético natural naquela época em que as rochas foram formadas. Este tipo de magnetização é chamada de permanente. Quando medimos o campo magnético em um determinado local, a influência de todas as fontes está contida no registro. A Figura 7 mostra a localização dessas diferentes fontes. Não há uma forma automática de se separar o campo do núcleo do campo externo no momento em que estamos fazendo medições. Isso é feito posteriormente usando métodos matemáticos. Figura 7: Esquema mostrando as diferentes fontes do campo magnético da Terra. As primeiras observações do campo geomagnético mostraram que o campo magnético da Terra não é estático, mas varia no tempo em uma ampla escala temporal: de milissegundos até milhões de anos. A Figura 8 mostra um registro da declinação magnética na China do ano de 720 até 1829. De modo geral, podemos dividir a variação temporal do campo geomagnético em duas faixas: as variações mais longas, de milhões de anos a dezenas de anos, são geradas pelo núcleo e as variações de mais curto período, como as tempestades magnéticas, são geradas pelo campo externo. Figura 8: Declinação magnética registrada na China. São as rochas magnéticas que registram as variações paleomagnéticas, na escala de milhões de anos. Um fato bem conhecido é que o campo magnético reverteu sua polaridade muitas vezes no tempo geológico. No presente, o dipolo magnético aponta do hemisfério sul para o hemisfério norte (veja Figura 4), mas no passado essa direção já foi invertida muitas vezes. Já as mudanças do campo magnético na escala de centenas de anos são chamadas de variação secular. Desde o início das observações contínuas do campo geomagnético, a cerca de 170 anos atrás, a intensidade do campo magnético global vem decaindo em uma taxa de 6% em 100 anos. Entretanto, o decréscimo da intensidade do campo não é igual em todas as regiões do globo; especialmente na região da AMAS esta diminuição está ocorrendo mais rapidamente. Outra característica interessante da variação secular é o deslocamento do campo para oeste. Assista o vídeo BfS.mov e note que a AMAS estava na África por volta de 1600 e se deslocou para a direção do Brasil, onde encontra-se atualmente. Existem outras variações temporais mais curtas devido à atividade solar, que vão de dezenas de anos até milissegundos. Por exemplo, há 4 variações no decorrer de 1 dia (chamada variação diurna). Quando a atividade solar não está muito ativa, o dia é chamado de “dia geomagneticamente calmo” ou Sq (do inglês: “Solar-quiet”). Já quando a atividade solar encontra-se muito ativa, ocorrem tempestades magnéticas, que duram horas. Durante tempestades magnéticas, podem ocorrer problemas em satélites, sistemas de navegação e rádio-comunicação. Estes distúrbios ocorrem mais frequentemente nas áreas onde a intensidade do campo é mais fraca (AMAS), ou seja, onde o “escudo protetor” da Terra (campo principal) é mais fraco. Todos estes tópicos serão abordados em detalhes nos próximos módulos do curso. R eferências Bibliográficas Merril, R. T.; McElhinny, M. W.; McFadden, P. L. (1996). The Magnetic Field of the EarthPaleomagnetism, the core, and the deep mantle. Academic Press. Olsen, N; Hulot , G.; Sabaka, T.J. (2010). Measuring the Earth’s Magnetic Field from Space: Concepts of Past, Present and Future Missions. Space Sci Rev. 155: 65–93, DOI 10.1007/s11214-010-9676-5. Pawar, S. D.; Murugavel, P.; Lal, D. M. (2009). Effect of relative humidity and sea level pressure on electrical conductivity of air over Indian Ocean. Journal of Geophysical Research 114: D02205. F ontes das F iguras Figura 1: Modificado do livro “The Magnetic Field of the Earth- Paleomagnetism, the core, and the deep mantle” Merril, R. T. et. al. (1996) Figura 3: Homepage da NASA sobre campos magnéticos “Magnetic Fields” http://helios.gsfc.nasa.gov/magfield.html Figura 4: Homepage da Agência Espacial Européia. Autor: Peter Reid (2003) http://sci.esa.int/sciencee/www/object/index.cfm?fobjectid=41209 Figura 5: Homepage sobre as camadas da Terra “Into the dephts of the Earth” http://sprg.ssl.berkeley.edu/~ateste/AlexandraTest e/Earth_layers.html Figura 6: Homepage da NASA http://sohowww.nascom.nasa.gov/gallery/images/ magfield.html Figura 7: Artigo científico N. Olsen · G. Hulot · T.J. Sabaka (2010). Figura 8: Homepage sobre paleomagnetismo Autora: Lisa Tauxe http://magician.ucsd.edu/essentials/WebBookch14 .html#WebBookse89.html Raymond Jeanloz (1990). The nature of the Earth´s core. Annu. Rev. Earth Planet. Sci., 18:357-86. Serway, Raymond A. (1998). Principles of Physics (2nd ed.). Fort Worth, Texas; London: Saunders College Pub. p. 602. 5