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ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
INFLUENCIANDO A MORAL
Daniela Carol Moniwa Reis
SÃO PAULO
2006
INFLUENCIANDO A MORAL
O que é moral? Segundo Vásquez, em A Essência da Moral, moral é um
conjunto de normas, aceitas livre e conscientemente, que regulam o
comportamento individual e social dos homens. As idéias morais e o modelo
de comportamento moral chegam ao indivíduo por meio de seus pais, seus
professores, pela convivência com seus colegas, etc., e também por seu
contato com os costumes e hábitos da sociedade em que vive. O costume
representa o usual, o comum, o que deve ser. O indivíduo passa a agir
conforme as normas e costumes aceitas por um grupo social ou por toda a
comunidade, fazendo, então, parte dela. Daí vem o caráter social da moral;
além de sujeitar todos os indivíduos a esses valores pré-estabelecidos pela
sociedade, ainda procurar regular o comportamento do indivíduo, uma vez que
as conseqüências de seu comportamento podem afetar outros.
Devemos perceber ainda que costumes aceitos a 10 anos atrás, não o são
hoje. Um aumento do grau de consciência, de liberdade e de responsabilidade
pessoal no comportamento moral faz com que alguns costumes percam a
importância e caiam no "desuso", o que acaba por criar uma abertura na
sociedade, e uma mudança em um costume, que pode ser, gradativamente,
substituído por outro.
Dito isso, partirmos para a análise da campanha publicitária
"Respeitar as diferenças é tão importante quanto usar camisinha" do
Ministério da Saúde, veiculada durante 15 dias, em junho de 2002, dirigida
para o público homossexual, cuja veiculação foi vetada pelo Conselho
Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (Conar), após a reclamação de
dois consumidores. Pedro Kassab, relator do processo no conselho do Conar,
alegou que o anúncio chocava o núcleo familiar, composto por crianças,
jovens, adultos e idosos que poderiam sentir-se constrangidos pela mensagem
passada pelo anúncio (conforme anexo I).
Um estudo realizado pelo programa de Doutorado em Ciências Sociais da
Universidade de Campinas sobre as tendências do comportamento social dos
brasileiros com base em posicionamentos sobre temas como o homossexualismo,
o aborto, o papel da mulher e a hierarquia social e suas relações com
variáveis demográficas, socioeconômicas e de comportamento político mostrou
que a maioria da sociedade ainda apresenta uma visão um tanto conservadora
em relação a esses temas, principalmente no que diz respeito ao
homossexualismo. Para a maioria dos entrevistados, o homossexualismo deve
ser aceito por representar um problema ou mesmo uma doença. Além disso,
54,9% dos consultados concordam totalmente com a proibição de um programa
de televisão que defendesse a união entre homossexuais (conforme anexo II).
Candidatos às próximas eleições vêm se posicionando abertamente contra
o homossexualismo no programa eleitoral gratuito da televisão. O candidato
a deputado estadual e pastor Edilson da Cunha Sena (PSDB) estampa em
material de campanha que lutou contra a instituição do Dia do Orgulho Gay
em Cuiabá. Da mesma forma, o pastor Sérgio Aguiar (PSDB), que disputa uma
vaga à Câmara Federal, afirma ser contrário aos projetos de lei que
tramitam no Congresso Nacional estabelecendo a união civil entre
homossexuais, bem como a adoção de crianças por casais gays e defende que
"a vida só pode ser gerada por um homem e uma mulher. Isso é um princípio
que não tem como mudar" (conforme anexo 3). Há um costume, um hábito e até
uma certa lógica por trás dessas idéias. Muitas delas chegaram a nós por
meio de nossos pais, avós e tios e as aceitamos como certas, "livre e
conscientemente".
Muitos ainda baseiam-se na Bíblia para ir contra o homossexualismo,
tratando essas relações como abomináveis e frutos do pecado. São Paulo, em
sua primeira carta aos coríntios diz claramente: "Acaso não sabeis que os
iníquos não hão de possuir o Reino de Deus? Não vos enganeis, nem os
crapulosos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os
sodomitas... hão de possuir o reino de Deus. "(I Coríntios, IV, 9-10).
Devemos observar, no entanto, que a campanha de prevenção teve por
objetivo estimular o uso freqüente da camisinha nas relações sexuais entre
homens e reduzir o preconceito da sociedade em relação às diferenças
sexuais. Além disso, grupos de homossexuais que trabalham em parceria com o
Ministério da Saúde e pesquisadores nacionais e internacionais concordam em
dizer que a discriminação e o preconceito levam o homossexual,
principalmente os mais jovens, a se distanciar das fontes de informação.
Isso dificulta a adoção de uma postura mais pró-ativa na prevenção,
colocando-os, dessa forma, em risco de infecção pelo HIV. Estudos ainda
afirmam que homens que fazem sexo com homens têm 11 vezes mais chances de
contrair o vírus da AIDS.
Desde 1996, quase a metade (49%) dos casos de infecção pela via sexual em
homens com mais de 13 anos foi observada no grupo de homo/bissexuais
masculinos.
Estudos apontam que o balanço de uma década do programa de combate à
AIDS no Brasil é amplamente positivo. Graças a ele, nunca se verificou a
projeção alarmista do Banco Mundial, feita em 1992, de que no ano 2000
haveria 1,2 milhão de HIV-positivos no país. São 600 mil, atualmente. No
entanto, o salto do preço da drogas forçou o governo a aumentar em 72% o
gasto com esse tipo de medicamento (vide anexo 4). Nesse ritmo, em 2008 o
país despenderia R$ 1,25 bilhão ao ano para medicar 215 mil HIV-positivos.
O gasto hoje é de R$ 945 milhões, 82% dos quais com a importação de nove
drogas (outras oito são fabricadas no Brasil). Esses gastos certamente
poderiam ser menores, ou inexistentes, se campanhas como a vetada pelo
CONAR ainda estivessem em circulação.
Há leis que protegem as pessoas de discriminação de raça, credo, cor e
preferência sexual. Em nosso país, foi criado ainda O Brasil Sem Homofobia,
um programa de Combate à Violência e à Discriminação contra GLTB e de
Promoção da Cidadania Homossexual, resultado de uma parceria entre o
Governo e sociedade civil organizada pela Secretaria Especial de Direitos
Humanos e prevê uma série de ações nas áreas da saúde, segurança pública,
trabalho, educação e cidadania.
A cada ano há um aumento significativo no número de associações pró-
homossexuais e sua fica evidente sua força tanto econômica quanto cultural.
As Paradas Gays mobilizam milhares de pessoas, movimentam a cadeia
turística das cidades que as recebem e empregam outros milhares. O filme
Brokeback Montain, aclamada produção norte americana, traz como trama
central o amor existente entre dois caubóis e sua "impotência diante de
convenções sociais" (conforme anexo 5) que parecem ter o propósito
específico de suprimir as escolhas individuais e encher suas consciências
de um sentimento de culpa e de transgressão social. Ennis, um dos rapazes,
sofre por amar Jack e não poder ficar com ele, mas sofre principalmente,
por medo de ser descoberto e ser punido pela sociedade. Ennis carregava o
grande peso da moral, suas normas e regras no formato das palavras de seu
pai, que lhe diziam que o homossexualismo era errado e que,
invariavelmente, deveria acabar em morte. Esse modelo de comportamento
moral separou duas pessoas que se amavam e que por essa separação tiveram
vidas incompletas e descontinuadas.Das cautelosas setenta salas em que
começou a ser distribuído em seu país de origem, o filme conquistou mais de
dois mil cinemas e contou com abaixo-assinados pedindo sua exibição.
ANEXOS
Anexo 1 : Notícia do jornal O Globo, de 28 de julho de 2006 retirada do
site:http://clipping.planejamento.gov.br/Noticias.asp?NOTCod=287651
"CONAR VETOU PROPAGANDA COM GAYS "
"Entidades da sociedade civil que atuam em defesa dos direitos dos"
"portadores do vírus da Aids estão indignadas com uma decisão do "
"Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (Conar), "
"que vetou a veiculação na TV de uma propaganda do Ministério da "
"Saúde direcionada aos homossexuais. Apesar da proibição ser de "
"agosto de 2002, as ongs só tomaram conhecimento da proibição "
"agora, quando o grupo Pela Vidda, de São Paulo, que está "
"organizando uma mostra itinerante de filmes sobre Aids, pediu ao "
"governo federal uma cópia do anúncio. O Ministério da Saúde "
"informou que não poderia ceder a peça publicitária por causa do "
"veto do Conar. "
"O filme foi veiculado em 2002, durante 15 dias, e custou R$ 3 "
"milhões. Na propaganda, um pai atende à porta e dispensa um "
"rapaz, dizendo que o filho não quer mais vê-lo. De volta à sala, "
"diante do filho desconsolado, o pai avisa que o rapaz já foi "
"embora e diz: "Você encontrará outro, não fique triste". A mãe, "
"ao lado, complementa: "Outro que use camisinha". No final, "
"aparece a mensagem de que "respeitar as diferenças é tão "
"importante quanto usar camisinha". "
"O Conar recorreu a argumentos morais para recomendar a suspensão "
"da propaganda. O relator do processo no conselho, Pedro Kassab, "
"afirmou no seu parecer que o anúncio "choca o núcleo familiar", é"
"constrangedor e tem impacto negativo indiscutível: "Esse impacto "
"carrega consigo inegáveis efeitos negativos, contraproducentes e "
"fortemente chocantes. No ambiente familial, de que fazem parte "
"crianças, jovens, adultos e idosos, às vezes com visitantes, "
"colaboradores domiciliares e outros, em diversos graus de "
"intimidade ou de formalismo, o anúncio é causador de "
"constrangimento, o que se agrava se houver alguém presente que "
"seja portador da diferença, assumida ou oculta, ou pessoa de sua "
"família. A força do impacto negativo é indiscutível", afirmou o "
"relator. "
"Mário Scheffer, do Pela Vidda, disse que, se tivesse tomado "
"conhecimento à época da proibição, teria organizado uma "
"mobilização contra a decisão do Conar. "
"— É lamentável que o governo tenha gasto tanto dinheiro num filme"
"que não pode ser exibido justamente para quem deveria ser o "
"público-alvo, que são os homossexuais. É uma censura absurda e "
"vamos tentar derrubá-la — disse Scheffer. "
"O anúncio foi a única propaganda de TV feita pelo governo "
"destinada aos homossexuais. Scheffer disse que o Pela Vidda pediu"
"ao Conar a revisão da decisão. O Conar informou que o veto à "
"propaganda dizia respeito apenas à exibição como peça "
"publicitária. "
Anexo 2: tabelas sobre o estudo de Katia Mika Nishimura para o Programa de
Doutorado em Ciências Sociais da Universidade de Campinas
Anexo 3: Notícia do jornal O Diário De Cuiabá, de 2 de agosto de 2006
retirada do site: www.diariodecuiba.com.br/detalhe.php?cod=263842
CANDIDATOS CONTRA O HOMOSSEXUALISMO
Candidatos a cargos proporcionais ligados ao segmento evangélico estão
abertamente se posicionando contra o homossexualismo nos programas
eleitorais gratuito da televisão. A atitude, apesar de ser considerada
corajosa por parte de integrantes de movimentos que defendem os direitos da
classe, promete gerar polêmica no debate político.
O candidato a deputado estadual e pastor Edilson da Cunha Sena (PSDB)
estampa em material de campanha que lutou contra a instituição do Dia do
Orgulho Gay em Cuiabá. Da mesma forma, o pastor Sérgio Aguiar (PSDB), que
disputa uma vaga à Câmara Federal, afirma no programa eleitoral ser
contrário aos projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional
estabelecendo a união civil entre homossexuais, bem como a adoção de
crianças por casais homossexuais. Esta é a primeira vez que candidatos vão
à televisão expor abertamente questões até então tratadas com certo
melindre.
Para o representante da Organização Não Governamental Livremente em
Mato Grosso, Clóvis Arantes, a atitude dos candidatos é preconceituosa e
oportunista. "Eles não fazem uma discussão com os movimentos, então eles
não estão fazendo uma defesa do que conhecem", opinou Arantes.
A falta de discussão, na avaliação de Arantes, faz com que o discurso
seja apresentado de forma individual e com um cunho moralista "muito
grande", que não contribui em nada para a democracia. "Um deputado desses
não vai trabalhar nunca pela inclusão, então eles não contribuem em nada
para a democracia, porque democracia é inclusão", ressaltou.
No entanto, Clóvis Arantes reconhece que os candidatos que se
manifestam contrários ao homossexualismo são corajosos, uma vez que os que
concordam e aceitam o segmento não tem coragem de falar abertamente. "Eles
têm medo de perder votos ou de ser taxados como sendo do movimento",
avaliou Clóvis.
Questionado sobre a bandeira contra o homossexualismo, o pastor Sena
argumentou que não tem nenhum preconceito contra os homossexuais, mas sim
contra a prática do homossexualismo. "A pessoa pode se recuperar, a prática
não", explicou. Segundo Sena, ele foi contrário à instituição do dia 17 de
junho como dia do orgulho gay porque considera que o projeto de lei
incentiva à prática do homossexualismo. "A prática é contra a Bíblia.
Quando você tem leis que incentivam a prática, você acaba tirando a
possibilidade das pessoas se recuperem", disse. Citou ainda que a sua
igreja não tem preconceito contra as pessoas.
"Prova disso é que na minha igreja tem uma pastora que nós recuperamos
há 12 anos", contou. "Mas eu realmente sou a favor dos valores morais e da
família, mas sem nenhum preconceito", finalizou.
Já o pastor Sérgio argumentou que é justamente porque o Brasil é um
país democrata que ele tem o direito de defender a sua opinião. "A
democracia é isso, cada um tem o direito de defender suas idéias. Eu
defendo isso e eles defendem a posição deles", disse.
Para o candidato, que também diz não perseguir os homossexuais,
mas sim à prática, o homossexualismo é uma tentativa de interferir no poder
de Deus. "A vida só pode ser gerada por um homem e uma mulher. Isso é um
princípio que não tem como mudar", ressaltou.
Anexo 4: Notícia do jornal Folha de S.Paulo, de 28 de agosto de 2006
CUSTO DA DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE DROGAS CONTRA HIV SOBE, PONDO EM
XEQUE A SUSTENTABILIDADE DO PROGRAMA DE COMBATE
A ACLAMADA política brasileira de combate à Aids, baseada na prevenção
e no acesso universal dos doentes a medicamentos, pode se aproximar da
exaustão. Faltaria uma atitude decidida do governo federal na área sensível
da propriedade intelectual, alertam especialistas e militantes do setor.
Sem ela, o custo de distribuir gratuitamente os anti-retrovirais pode
tornar-se proibitivo e insustentável.
O alerta já circula há algum tempo entre ativistas. Chegou ao periódico
científico americano "Science". Antes da 16ª Conferência Internacional
sobre Aids, encerrada dia 18, a revista publicou um dossiê de 24 páginas
sobre o panorama mundial da síndrome, três delas sobre o Brasil, em tom de
preocupação.
O balanço de uma década do programa é amplamente positivo. Graças a
ele, nunca se verificou a projeção alarmista do Banco Mundial, feita em
1992, de que no ano 2000 haveria 1,2 milhão de HIV-positivos no país. São
600 mil, atualmente. Segundo a "Science", citando dados do Ministério da
Saúde, a mortalidade por Aids caiu 50% de 1996 a 2002. Noventa mil mortes
foram evitadas; ao mesmo tempo, houve economia de US$ 1,2 bilhão com gastos
hospitalares. Hoje, 172 mil pacientes recebem os anti-retrovirais.
O cerne da preocupação se encontra no custo por paciente da
distribuição. Ele partiu de US$ 6.240 anuais, em 1997, e caiu até US$
1.336, em 2004. No ano passado, saltou para US$ 2.500.
Por trás da queda vertiginosa esteve uma bem-sucedida política de
fabricação e importação, mas também uma tensa negociação com a indústria.
Não faltaram ameaças de licenciamento compulsório. Trata-se de medida
justificável, prevista -em caso de emergência de saúde pública- nas regras
da Organização Mundial do Comércio sobre propriedade intelectual.
Já a disparada do custo em 2005 se explica pelo preço crescente das
novas gerações de medicamentos. Drogas como efavirenz, lopinavir/ritonavir,
tenofovir e T-20 são mais eficientes, mas importadas a peso de ouro. Isso
forçou o governo a aumentar em 72% o desembolso, nos últimos quatro anos.
Nesse ritmo, em 2008 o país despenderia R$ 1,25 bilhão ao ano para medicar
215 mil HIV-positivos. O gasto hoje é de R$ 945 milhões, 82% dos quais com
a importação de nove drogas (outras oito são fabricadas no Brasil).Em junho
passado, o governo ameaçou quebrar a patente de três medicamentos. Voltou
atrás e à mesa de negociações, que consumiram meses. Terminou por obter
reduções de até 50%.
Na Conferência Internacional, a diretora do Programa Nacional de
DST/Aids, Mariângela Simão, reafirmou o acesso universal como eixo da
política brasileira. Alertou, ainda, para as dificuldades erguidas por
regulamentos internacionais. Há razões para crer que logo o governo terá de
endurecer novamente a negociação, recorrendo ao instrumento de pressão da
quebra de patentes -além da política de ampliar a gama e a quantidade de
anti-retrovirais feitos no país.
Anexo 5: Notícia da Revista Veja de 1º de fevereiro de 2006