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Departamento de Construção Civil e Urbana
Universidade de São Paulo
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Sugestões e participação de empresas " "
Diretrizes para a gestão da qualidade do processo de projeto na construção
de edifícios em regime contratual de empreitada
Resumo
A complexidade tecnológica e gerencial advinda da intensificação das
exigências dos clientes tem impulsionado as empresas do setor, em
diferentes países, a desenvolver inovações na forma de organizar os
empreendimentos. Os sistemas não-tradicionais buscam minimizar as
deficiências dos modelos tradicionais de contratação, tais como a falta de
integração entre o projeto e a construção e divergência entre os objetivos
dos agentes envolvidos.
A falta de integração acarreta disputas e conflitos entre projetistas e
construtores, principalmente em torno de aspectos ligados à
construtibilidade. A divergência de objetivos, por sua vez, compromete o
atendimento das necessidades do cliente. A associação entre a falta de
integração e a divergência de objetivos repercutem no desempenho do
empreendimento e na obtenção do nível de qualidade exigido pelo cliente em
termos de produtos e serviços.
Este trabalho propõe diretrizes para a gestão da qualidade no processo de
projeto, no âmbito da construção por empreitada, que contemplam: a captação
das necessidades explícitas e implícitas do cliente; a identificação das
prioridades do empreendimento, sobre as quais o projeto deve ser pautado; a
organização de arranjos funcionais favoráveis ao estabelecimento da
integração entre os agentes e da convergência em torno de objetivos comuns;
e a incorporação dos aspectos construtivos no projeto.
O trabalho discute, paralelamente, os modelos de contratação aplicados no
país, a integração entre os sistemas da qualidade dos agentes e os fatores
indutores do sucesso do empreendimento, com o intuito de orientar as ações
de clientes, projetistas e construtores com relação à qualidade no processo
de projeto. A seleção dos métodos de pesquisa contempla os objetivos
delineados, consistindo em revisões bibliográficas, estudos exploratórios,
pesquisas de campo e estudos de caso.
Palavras-chave: projetos, construção de edifícios, qualidade, integração,
sistema contratual e desempenho do empreendimento.
Abstract
The technological and managerial complexity of building construction
processes due to client requirements intensification has stimulated the
development of innovative approaches to project organization around the
world. Non-traditional contractual systems aims to minimize current
problems related to conventional methods, such as the lack of integration
between design and construction and team members objectives divergence.
Lack of integration usually leads to claims and conflicts between designers
and contractors, mainly due to constructibility issues. Objective
divergence, in the other hand, raises difficulties to client requirements
meeting. Lack of integration and objective divergence influence project
performance and the achievement of quality level required by the client, in
terms of products and services.
This research aims to purpose guidelines to design process quality
management and involves procedures to: identify client implicit and
explicit needs in the briefing phase; analyze project priorities, including
schedule, cost and quality, in order to support the decision making
process; selection of functional arrangements which provide integration and
objective convergence; constructive issues incorporation in the design
process.
The discussion about contractual systems advantages and disadvantages,
project team quality systems integration and project success inductive
factors aims to guide owners, designers and contractors practices related
to design process quality. Research methods involves international
literature review, exploratory case studies, surveys and descriptive case
studies.
Keywords: design, building construction, quality, integration, contractual
system and project performance.
1. Revisão bibliográfica
1.1. Contextualização da pesquisa na EPUSP e a experiência do autor na área
de pesquisa
O trabalho se insere no contexto de pesquisa do GEPE-TGP – Grupo de Ensino,
Pesquisa e Extensão em Tecnologia e Gestão da Produção na Construção Civil,
do Departamento de Engenharia de Construção Civil e Urbana, da Escola
Politécnica de São Paulo, especificamente na linha de Qualidade do Projeto
na Construção de Edifícios (coordenada pelo Professor Doutor Silvio
Burrattino Melhado), onde algumas teses e dissertações estão sendo
produzidas sobre o assunto.
No âmbito do GEPE-TGP, um grupo de pesquisadores elaborou metodologias para
a gestão e garantia da qualidade no projeto de edifícios (MELHADO, 1994;
NOVAES, 1996), a implantação de tecnologia construtiva racionalizada na
produção de edifícios (BARROS, 1996) e sistemas da qualidade em empresas
construtoras (SOUZA, 1998), a aplicação de sistemas da qualidade em
empresas de arquitetura (BAÍA, 1998) e a análise do impacto da implantação
de sistemas de gestão da qualidade em empresas construtoras (REIS, 1998).
Atualmente, as pesquisas se direcionam para a avaliação dos impactos da
revisão da série de normas ISO 9000 nas empresas do setor, a integração
entre os sistemas da qualidade e a aplicação dos princípios da Engenharia
Simultânea no projeto de edifícios.
Fora do contexto da USP, o trabalho de Iniciação Científica do autor
(GRILO, 1999), sob a orientação do Professor Doutor João Luiz Calmon
Nogueira da Gama, na Universidade Federal do Espírito Santo, proporcionou
uma excelente oportunidade para a avaliação da influência do processo de
projeto na qualidade do processo construtivo e no desempenho do
empreendimento, assim como a motivação acadêmica necessária para a
realização do mestrado. A pesquisa envolveu as seguintes atividades:
avaliação do grau de satisfação de 322 usuários com os vícios da qualidade
em 100 edifícios habitacionais;
avaliação qualitativa do impacto dos problemas com origem nos projetos na
execução de duas obras;
diagnóstico das manifestações patológicas do Centro de Ciências Exatas da
UFES;
entrevistas com 16 profissionais da área sobre a importância da qualidade
no processo de projeto.
Dentre as atividades conduzidas, o diagnóstico realizado no Centro de
Ciências Exatas da UFES se destaca, devido à elevada incidência de
manifestações patológicas em idades prematuras (GRILO & CALMON, 2000a).
Após levantamentos e análises documentais concluiu-se que uma parcela
considerável dos problemas pode ser atribuída à baixa qualidade dos
projetos e a uma gestão de interfaces precária entre projetistas e
construtores.
Entre junho de 1999 e março de 2000, este pesquisador atuou como consultor
do "Programa de gestão da qualidade no desenvolvimento de projetos", sob
coordenação do Núcleo de Gestão e Inovação (NGI), contribuindo para a
implantação dos princípios da gestão da qualidade em mais de 40 empresas.
Durante este período, pode diagnosticar, junto com as empresas
participantes, as principais deficiências do setor de projetos,
especialmente na relação cliente-fornecedor, tanto em obras públicas quanto
no setor privado.
A partir dos avanços promovidos por pesquisas anteriores quanto à gestão da
qualidade no processo de projeto, o estudo proposto representa um
aprofundamento das questões levantadas durante a Iniciação Científica e o
exercício profissional do pesquisador, possibilitando um passo adiante na
linha de pesquisa à qual pertence, na medida em que analisa o processo de
projeto no segmento de construção de edifícios públicos e para terceiros,
temática pouco explorada nas teses e dissertações precedentes.
1.2. O processo de projeto na construção de edifícios por empreitada
MELHADO (1994) relaciona a qualidade do projeto com o atendimento das
necessidades dos clientes, usuário e construtor, conciliando os interesses
e eliminando os conflitos. O autor sugere que o projeto seja visto como uma
atividade estratégica do processo de construção, devendo considerar: a sua
relação com o empreendimento, com o usuário e a construtora; a execução da
obra, conforme a tecnologia construtiva adotada do construtor; e a formação
de uma equipe multidisciplinar coordenada de forma iterativa.
No entanto, um conjunto de condicionantes extrínsecos e intrínsecos ao
processo de projeto impede a consecução das diretrizes propostas,
prejudicando excessivamente o atendimento das necessidades do
empreendimento em termos de prazo, custo e qualidade (GRILO & CALMON,
2000), assim como o desempenho dos ambientes construídos (GRILO & CALMON,
2000a). Neste item, apresentaremos alguns fatores indutores do baixo
desempenho dos projetos, inerentes ou alheios ao processo de
desenvolvimento dos mesmos.
Autores apontam que a divergência de objetivos pode ocasionar falta de
cooperação e relações conflituosas entre o projetista e o construtor,
aspecto intimamente ligado com a metodologia de seleção dos profissionais e
o arranjo funcional do empreendimento, uma vez que o arquiteto focaliza a
qualidade do produto e o construtor, selecionado por competição de custo, a
qualidade do processo e a redução de custos (BOBROFF, 1990; NAM & TATUM,
1992, BARLOW et. al., 1997).
Embora não desponte como um problema comportamental, a subordinação do
construtor no arranjo funcional e a sua superioridade percebida quanto à
consecução do empreendimento ocasionam conflitos inevitáveis com o
arquiteto, devido a aspectos ligados à construtibilidade, ao menos no
sistema tradicional (BOWEN et al., 2000). De acordo com POCOCK et al.
(1996), a maioria dos arquitetos e engenheiros poderia ser beneficiada com
a contribuição do construtor. No entanto, o construtor não é envolvido
antes do momento da contratação, que no caso de empreendimentos públicos
envolve processos de licitação, cada proponente elaborando sua proposta
sobre projetos detalhados e especificações sem ter tido qualquer
participação na definição do seu conteúdo.
Os principais desafios para a implementação da garantia da qualidade em
sistemas tradicionais referem-se à gestão das interfaces entre os agentes,
em função de (GRIFFITH, 1990):
uma interpretação errônea do programa de necessidades e da qualidade
requerida pelo cliente;
a impossibilidade de obter o nível de qualidade requerido pelo cliente,
devido à falta de construtibilidade do projeto e incompatibilidade com os
sistemas construtivos do construtor;
equívocos na ponderação entre custo e qualidade no "briefing", com redução
da qualidade na construção;
insuficiência de prazo para construção segundo o nível de qualidade
desejado pelo cliente;
falhas na interpretação dos padrões de qualidade exigidos pelo construtor,
devido à contratação com projetos ainda incompletos;
falta de eficiência na comunicação dos requisitos de projeto para o
canteiro;
discrepâncias entre os custos de operação e manutenção com as previsões do
"briefing".
A ineficácia da gestão de interfaces entre clientes, projetistas e
construtores constitui uma fronteira para a evolução organizacional na
construção de edifícios. A obtenção da qualidade exige coerência e
continuidade, perdidas com freqüência como resultado de deficiências nas
interfaces entre os agentes. A implementação de sistemas da qualidade pode
ser considerada uma contribuição significativa, que deve evoluir para
sistemas integrados para a gestão dos empreendimentos, enfocando a gestão
das relações temporárias entre os principais agentes, reduzindo a dispersão
e as barreiras para decisões conjuntas (MELHADO, 2000).
Muitas empresas não atentam para a importância estratégica do projeto na
obtenção de um maior nível de competitividade, argumentando que não
participam de sua elaboração, principalmente em obras para terceiros
(BARROS, 1999). Segundo a autora, uma das empresas consultadas verifica as
interferências no projeto, levanta o potencial de racionalização e negocia
a efetivação das alterações com o cliente. Apesar da possibilidade de
racionalização construtiva, a mudança no arranjo funcional do
empreendimento permitiria uma intervenção pró-ativa do construtor nas fases
iniciais, minimizando possíveis conflitos com os demais agentes.
CALMON & BRASILIANO (2000) identificaram deficiências no processo de
projeto na Secretaria Municipal de Obras (SEMOB) da cidade de Vitória - ES,
tais como a contratação direta do arquiteto, responsável pela contratação
da equipe de projetos, restringindo a interação com o órgão solicitante; a
elevada incidência de interferências entre as disciplinas e a
incompatibilidade entre o projeto e a planilha orçamentária; a falta de
acompanhamento técnico durante a execução da obra; e a ausência de captação
dos anseios dos usuários durante a elaboração do programa de contratação,
originando modificações posteriores em virtude das alterações das
expectativas do cliente e do longo tempo até o início da obra.
Um estudo realizado em dez países ocidentais (Suécia, Finlândia, Dinamarca,
Reino Unido, Países Baixos, Bélgica, França, Itália, EUA e Canadá) apontou
um conjunto de tendências para a organização da produção na Construção
Civil na primeira década do século 21 (BORDEAU, 1994). As tendências
delineadas indicaram uma busca de padrões elevados de qualidade e
flexibilidade no setor da construção em países em desenvolvimento. Algumas
das tendências vão ao encontro dos aspectos abordados anteriormente, tais
como:
demanda por serviços globais de produção e conseqüente redução da
fragmentação do trabalho;
customização dos projetos para atender às necessidades específicas dos
clientes;
transição do "conflito de interesses" para uma cooperação durável entre os
agentes;
modificações nos papéis dos atores:
clientes e usuários: necessidade de mecanismos para "ouvir o cliente"; uma
participação mais intensa do cliente no processo;
arquitetos: passagem para um papel de coordenador do
projeto/empreendimento; a especialização segundo as tendências da
tecnologia de produção;
os empreendimentos: a redução do número de subcontratados; a evolução do
papel do contratado principal para a coordenação de todas as atividades de
produção;
a convivência de diversos contratos segundo as necessidades específicas de
cada empreendimento e suas partes;
a intensificação da exigência da certificação de sistemas de gestão e
garantia da qualidade, aspecto de diferenciação das empresas no mercado;
a integração entre todos os sistemas da qualidade, podendo existir um
sistema único para todo o processo.
Embora orientadas para a realidade sócio-econômica de países desenvolvidos,
as tendências apresentadas constituem um referencial de desenvolvimento
para a construção brasileira. A confirmação das mesmas repercutiria nas
atribuições e no relacionamento entre os agentes da cadeia produtiva,
pressupondo o estabelecimento de abordagens favoráveis à integração e
colaboração em torno de objetivos comuns; a formulação de estratégias
empresariais voltadas para a satisfação dos clientes; a adoção de novas
posturas profissionais e a introdução de competências inovadoras,
especialmente para arquitetos e engenheiros.
Este item descreveu a importância estratégica do projeto para a
competitividade da indústria, os fatores condicionantes da qualidade do
projeto, as deficiências na gestão de interfaces, as desvantagens do
sistema tradicional de contratação e as distorções na construção de
edificações públicas. Na seqüência, discutem-se as diferenças entre
incorporação e promoção e empreitada, os sistemas contratuais, a
integração, o relacionamento entre os agentes, o desempenho do
empreendimento e a gestão da qualidade do processo de projeto.
1.2.1. Diferenças entre incorporação/promoção e empreitada
O contrato de empreitada é aquele em que "o construtor-empreiteiro faz uma
obra certa, sem subordinação ou dependência, para o proprietário,
pessoalmente ou por terceiro, dando mão-de-obra ou somente mão-de-obra, por
preço determinado ou proporcional ao trabalho" (MILHOMENS & ALVES, 1996).
Os contratos de empreitada podem ser classificados, quanto ao objeto, em
empreitada global ou de mão-de-obra. Com relação à fixação dos preços,
podem ser divididos em empreitada de preço global, preços unitários e preço
de custo. As formas particulares de contratação influenciam de forma
distinta os riscos para o cliente e o construtor, a comparação das
propostas comerciais, as exigências quanto ao detalhamento do projeto, o
momento de contratação do construtor e o relacionamento entre as partes
(GONZÁLEZ, 1998; LIMMER, 1997).
A idéia principal da incorporação é a promoção do empreendimento, unindo os
esforços dos interessados, tais como proprietários de terrenos,
construtores e adquirentes, os quais, isoladamente, não atingiriam os
objetivos, por falta de recursos ou de prática no meio. As partes
contratantes são os incorporadores e os adquirentes. O objeto da
incorporação imobiliária é a venda de unidade autônoma de edifício a
construir, ou em construção, pelo regime de condomínio especial, efetuada
pela pessoa habilitada a promover a construção e a transferir o domínio da
unidade, mediante o pagamento, efetuado pelo adquirente, do preço ajustado
(GONZÁLEZ, 1998).
Os sistemas contratuais podem ainda ser classificados segundo os arranjos
funcionais, como mostrado no item 1.4. Nos contratos de empreitada pelo
sistema tradicional, modalidade plenamente difundida no país,
principalmente no setor público, a elaboração dos projetos antecede a
contratação do construtor, restringindo a racionalização construtiva ou
mesmo inviabilizando a execução da obra.
1.2.2. Sistemas contratuais
A complexidade tecnológica e gerencial dos empreendimentos tem aumentado,
colocando em relevo a inadequação do sistema de contratação tradicional. As
exigências referentes a prazos de produção, normas de qualidade e
desempenho têm se intensificado, proporcionando uma ênfase crescente no
desenvolvimento de novas formas de contratação e organização do
empreendimento (GRIFFITH, 1990; CHAN & CHAN, 2000).
CHAN & CHAN (2000) ressaltam a importância da seleção da organização mais
apropriada para o projeto e a construção do empreendimento, tendo em vista
a dependência entre o êxito na consecução do empreendimento e a capacidade
das equipes encarregadas desenharem os processos executivos, considerando a
organização efêmera das equipes e o caráter quase único do produto.
Sistemas contratuais inadequados podem conduzir a acréscimos nos custos e
atrasos, reivindicações e disputas em empreendimentos. A obtenção de
resultados ótimos em termos de prazos, custos e qualidade demanda a seleção
de sistemas contratuais compatíveis com as características técnicas do
empreendimento segundo as necessidades do cliente e do construtor (ALHAZMI
& MCCAFFER, 2000). Os arranjos possíveis nos diversos sistemas contratuais
pressupõem diferentes formas de relacionamento entre os participantes do
empreendimento (KUMARASWAMY & DISSANAYAKA, 1998).
Os sistemas contratuais podem ser classificados conforme o arranjo
funcional em (KUMARASWAMY & DISSANAYAKA, 1998; CHAN & CHAN, 2000): sistemas
separados (seqüencial tradicional e acelerado tradicional ou "fast-track"),
sistemas integrados ("design and build", novação, "turn-key"); e sistemas
gerenciados ("management contracting", "construction management").
Os sistemas de contratação não-tradicionais visam reduzir os problemas
advindos da contratação convencional, promovendo uma forma de organização
na qual a garantia da qualidade assume importância e a qualidade do
empreendimento pode ser maximizada. O "design and build" visa integrar as
etapas de projeto e produção, enquanto o "management contracting" e o
"project management" promovem o gerenciamento do empreendimento como uma
atividade distinta do projeto e da construção. Estes sistemas encerram um
potencial considerável de melhoria da qualidade no processo construtivo,
uma vez que permitem (GRIFFITH, 1990):
maior integração entre projeto, incluindo consultores, e o processo
construtivo;
melhoria da comunicação entre os agentes envolvidos no empreendimento;
coordenação mais adequada dos diversos profissionais da construção;
responsabilidade única ao invés da responsabilidade desintegrada entre os
diversos agentes;
envolvimento do construtor na etapa de projeto;
foco, por parte dos agentes do empreendimento, no atendimento das
necessidades reais dos clientes.
Ressalta-se a inexistência de uma única forma de organizar e gerenciar os
empreendimentos. Os modelos contratuais se adaptam a situações
particulares, dependendo das variáveis internas e externas inter-
relacionadas. Foram descritos, em linhas gerais, sistemas tradicionais e
não-tradicionais, e analisadas algumas características, como a influência
na integração entre o projeto e o processo construtivo, detalhada no item
1.5.
1.2.3. Integração entre projeto e produção
Em 1964, Sir Harold Banwell foi encarregado de um relatório governamental
sobre a forma de contratação dos empreendimentos na indústria da Construção
Civil britânica (1964). Dentro do escopo do trabalho, o pesquisador
investigou os procedimentos relativos à indústria da construção, com
relação ao projeto e à construção:
'Aqueles que continuam a considerar o projeto e a construção como campos de
atuação isolados cometem um erro, e não está fora de contexto parafrasear
Sir Harold Emmerson no parágrafo 27 da Pesquisa sobre os Problemas na
Indústria da Construção: "em nenhuma outra indústria importante a
responsabilidade pelo projeto afasta-se tanto da responsabilidade pela
construção"' (Banwell Report, 1964).
O PSQ (2000) aponta que a falta de integração entre o projeto e o processo
de produção na cadeia produtiva da Construção Civil, aliada à ausência de
metodologias para a gestão da qualidade no processo de desenvolvimento do
projeto, pode ser considerada o ponto de origem de uma parcela considerável
dos problemas com relação à qualidade existentes no setor de projetos
brasileiro.
A divergência de objetivos pode conduzir à falta de cooperação ou a uma
relação conflituosa entre o projetista e construtor. De uma forma geral, a
seleção do projetista se deve à reputação profissional. A contratação do
construtor, por sua vez, baseia-se na competição de preço. O construtor
possui incentivos para a redução dos custos através da adoção de métodos
inovadores, porém poucos estímulos para o aumento da qualidade. O
projetista se preocupa com a reputação e a qualidade do produto e o
construtor com a qualidade do processo, a competição de preços e a redução
de custos (BOBROFF, 1990; NAM & TATUM, 1992).
NAM & TATUM (1992) empregam o termo "integração" como "integração entre o
projeto e a construção". Segundo os autores, algumas abordagens para a
integração foram propostas e extensivamente empregadas, como o
gerenciamento da construção, o método de contratação negociado, o "Design
and Build" e programas de melhoria da construtibilidade, enfocando a
cooperação entre o projetista e o construtor. Algumas formas de integração
empregadas na Grã-Bretanha implicam em (NAM & TATUM, 1992):
integração organizacional das funções de projeto e produção em uma
estrutura organizacional sob liderança comum, por exemplo, integração
vertical;
integração contratual entre diferentes organizações por um período curto;
integração das informações em uma organização ou no empreendimento,
aumentando a coordenação;
integração por mecanismos não-contratuais, tais como envolvimento e
liderança do cliente, estabelecimento de relações duradouras entre as
organizações, emprego de profissionais responsáveis pela integração, etc.
O desenvolvimento seqüencial e fragmentado do processo tradicional de
projeto restringe a colaboração entre os agentes, visto que suas
contribuições ocorrem de forma isolada e independente. Algumas abordagens
estimulam a cooperação no processo tradicional, tais como a coordenação de
projeto e a formação de equipes multidisciplinares (MELHADO, 1994); o
estabelecimento de parcerias (BARLOW et. al, 1997); o envolvimento total
das equipes multidisciplinares (DJIFAROVA-VASSILEVA, 1997). Uma solução
alternativa consiste na aplicação dos princípios de "Construção Simultânea"
(JAAFARI, 1997) ou do "Projeto Simultâneo" (FABRÍCIO et al., 1998),
fundamentados na integração entre etapas, equipes e informações, no fomento
de sistemas de comunicações inter e intradisciplinares em tempo real e na
orientação para a satisfação dos clientes.
As parcerias, que designam um "conjunto de práticas destinadas à promoção
de uma maior cooperação entre os agentes envolvidos no empreendimento"
(BARLOW et al., 1997), podem implementar a cooperação no empreendimento,
proporcionando aumento da produtividade, redução das disputas e a
introdução de inovações tecnológicas. As modalidades de parceria podem
enfatizar a criação de sinergia entre os participantes, o processo de
gerenciamento, a formação de equipes com objetivos comuns e a influência no
contrato.
BARLOW et. al (1997) enumeram alguns elementos necessários ao sucesso de
uma parceria, tais como necessidade de confiança, personalidades adequadas,
eficiência na comunicação, cultura organizacional, aprendizagem
organizacional, formação de equipes multidisciplinares e a atuação da
gerência.
POCOCK et al. (1996) identificaram uma intensa relação entre o nível de
interação e o sucesso do empreendimento. Na amostra estudada, as parcerias
resultaram em atrasos no cronograma, modificações contratuais e custos
médios significativamente inferiores ao modelo tradicional. Os autores
propuseram o uso do termo "interação", que descreve a integração entre
projetistas, construtores e demais profissionais no decorrer do
empreendimento. O "nível de interação" considera os seguintes parâmetros:
fases de interação, número de intervenientes, função dos intervenientes,
carga horária mensal, duração e tipo de interação.
A integração constitui uma das premissas para o desempenho do projeto e do
sucesso do empreendimento. Entretanto, pressupõe o estabelecimento de
ambientes favoráveis à cooperação e eliminação dos conflitos entre o
cliente, o projetista e o construtor, assim como à convergência de
objetivos entre os mesmos.
1.2.4. Relacionamento entre cliente, arquiteto e construtor
O relacionamento entre os integrantes da equipe constitui um importante
componente de avaliação do desempenho do empreendimento pelas partes
envolvidas (NAOUM & LANGFORD, 1991). A seleção profissional apropriada pode
proporcionar ambientes isentos de relações competitivas destrutivas e
posturas reativas no que se refere às áreas de responsabilidade de cada um
(BARLOW et al., 1997). As disputas entre arquitetos e engenheiros podem ser
causadas ainda pela falta de construtibilidade dos projetos (GRILO &
CALMON, 2000).
A natureza temporária do empreendimento indica que os participantes podem
despender um tempo considerável para se ajustar às práticas de trabalho dos
demais participantes (LUCK, 1996), sugerindo que a otimização das
personalidades e habilidades para acomodar diferentes estilos de trabalho
representa um aspecto importante para o sucesso do empreendimento.
As alterações no escopo do trabalho, as revisões contratuais e as
reivindicações são apontadas como as maiores causas de atrasos e aumentos
dos custos das construções, sendo empregadas como indicadores do sucesso do
empreendimento (DODD & MCDERMOTT, 1991; SANVIDO et al. 1992; POCOCK et al.,
1996). O método de solução dos conflitos deve ser considerada nos contratos
(ASCE, 1990; PUDDICOMBE, 1997) ou na seleção do sistema contratual
(KUMARASHAMY & DISSANAYAKA, 1998). A equipe de projeto e o cliente são as
maiores fontes de alterações nas construções (AKINSOLA et al., 1994; CALMON
& BRASILIANO, 2000).
Nos itens anteriores foram discutidos fatores influentes na qualidade dos
projetos alheios à forma como os mesmos são desenvolvidos. O método de
solução de conflitos, a escolha do sistema contratual e a seleção de
profissionais aptos para atuar de forma cooperativa, renunciando a
interesses individuais em defesa de objetivos comuns revela que a gestão da
qualidade no projeto depende do envolvimento de todos os intervenientes.
1.2.5. Gestão da qualidade no processo de projeto
A etapa de projeto possui uma elevada capacidade de influenciar os custos,
prazos e a qualidade do empreendimento. Autores europeus indicam o projeto
como o maior responsável pelos custos da qualidade (HAMMARLUND & JOSEPHSON,
1991; CNUDDE, 1991; CALAVERA RUIZ; 1993; ABRANTES, 1995). Na França, o
projeto aparece como a maior interface da cadeia produtiva (BOBROFF, 1991).
Ao analisar a bibliografia sobre o desenvolvimento e aplicação de sistemas
de gestão da qualidade em empresas de projetos, constata-se a existência de
estudos sobre o assunto em diversos países, tais como Inglaterra, Holanda,
Noruega, Finlândia, Suécia e França (WESTGAARD, 1994; SPEKKINK, 1994; AQC,
1996).
CORNICK (1991) propôs um modelo de sistema de gestão da qualidade para
empresas de projeto britânicas, baseado em seis fases do desenvolvimento de
um empreendimento. Segundo o autor, o sistema da qualidade deve identificar
e sistematizar as diferentes atividades de cada uma das fases, conforme
ilustrado na figura 1.
ASCE (1990) apresenta recomendações para clientes, construtores e
projetistas sobre a obtenção da qualidade no empreendimento, discutindo
aspectos como definição de responsabilidades; a compreensão dos requisitos
e expectativas do cliente; a importância dos contratos; a eficácia na
comunicação; a seleção profissional; procedimentos para o projeto e a
construção; práticas organizacionais, gerenciais e administrativas;
participação do projetista durante a construção e a entrega; eliminação de
conflitos; gerenciamento do risco; e outros. O manual salienta que a
probabilidade de obtenção da qualidade aumenta com a comunicação aberta
entre os participantes, da seleção de profissionais qualificados e a rápida
solução de conflitos e desentendimentos.
Segundo o NGI (1998), os elementos de uma metodologia de gestão da
qualidade do projeto devem promover a integração entre os diversos
participantes, além de modificar o modelo tradicional de desenvolvimento do
projeto, reduzindo o número de etapas, aumentando a flexibilidade do
processo e garantindo transparência em todas as etapas. A figura 2 resume o
modelo proposto, em que cada um dos componentes deve ser detalhado para
gerar mecanismos que assegurem a qualidade por parte de todos os
envolvidos.
A capacidade de influência dos projetos no desempenho do empreendimento
coloca em relevo sua importância estratégica para o aumento da
competitividade das empresas do setor, reforçando a necessidade de
introdução de procedimentos que assegurem a qualidade por parte de todos os
agentes envolvidos.
1.2.6. Desempenho do empreendimento
A ponderação entre os objetivos de custo, prazo e qualidade tem sido uma
das preocupações centrais do gerenciamento do empreendimento. PUDDICOMBE
(1998) propôs variáveis operacionais que incorporam critérios específicos
de sucesso para o cliente, os projetistas e o construtor, tais como:
cumprimento do cronograma, respeito da margem de lucro do construtor,
respeito da margem de lucro dos subempreiteiros, redução de custo para o
cliente, cumprimento das especificações de qualidade, ausência de
reivindicações do construtor, ausência de reivindicações do cliente,
segurança e imprevistos mínimos.
BARROS NETO (1999) adapta os critérios competitivos clássicos para a
realidade da pequena empresa construtora, em virtude da sua função
produção, porte e das características do setor. A tabela 1 incorpora ainda
os desejos do cliente, utilizando o conceito de campo de competição,
atributo que interessa ao comprador, apresentando fatores genéricos
reconhecidos e valorizados pelos clientes (CONTADOR, 1995).
TABELA 1. Exposição dos Campos de Competição e os Reflexos na Função
Produção das Empresas de Construção de Edifícios (BARROS NETO, 1999).
CAMPOS (desejos dos clientes)
REFLEXOS NA PRODUÇÃO (critérios competitivos da produção)
PREÇO
Menor preço
Condições de pagamento
CUSTO
Menor custo (aumento da produtividade)
Adequação do fluxo de caixa
PRAZO
Prazo de entrega
Garantia de entrega do produto
DESEMPENHO NA ENTREGA
Velocidade na produção
Confiabilidade na entrega
PRODUTO
Desempenho do produto
Possibilidade de alterações
Introdução de novos produtos
QUALIDADE
Conformação com os contratos
Conformação com os projetos
Qualidade do processo
FLEXIBILIDADE
Flexibilidade do produto
INOVAÇÃO
SERVIÇOS ASSOCIADOS
Durante a construção
Após a construção
SERVIÇOS
Atendimento
Assistência técnica
O desempenho do empreendimento pode ser medido em função do aumento do
custo, do prazo de construção e do número de modificações. Alguns autores
consideram diretamente indicadores mensuráveis, tais como o número de
modificações no projeto, custo das disputas, economias com engenharia de
valor e número de acidentes com afastamento. No entanto, o acréscimo no
custo, o atraso no cronograma e as modificações contratuais apresentam
maior consistência (POCOCK et al,1996).
A gestão da qualidade no processo de projeto deve prever, na programação
das necessidades, a captação das necessidades do cliente e a subseqüente
tradução em prioridades do empreendimento. As prioridades permitem a
identificação dos critérios competitivos do construtor, que correspondem
aos objetivos a serem atingidos pela função produção para a satisfação das
necessidades do cliente. Os critérios competitivos subsidiam o
desenvolvimento e o detalhamento do projeto, que passa a focalizar o
atendimento das necessidades do cliente e do construtor em termos de
produtos e processos.
1.2.6. Considerações finais sobre o projeto na construção por empreitada
Os itens anteriores parecem reforçar a correlação entre a gestão do
processo de projeto e o desempenho do empreendimento. Paralelamente, o
nível de interação entre o projeto e a produção, o relacionamento entre os
agentes envolvidos, a convergência de objetivos e o sistema contratual
parecem repercutir na qualidade dos projetos. Por outro lado, na construção
de edifícios por empreitada, os aspectos discutidos sugerem:
o afastamento entre o projeto e o processo construtivo;
divergência de objetivos e presença de relações competitivas entre os
participantes;
pouca atenção dispensada à estratégia de seleção do sistema contratual;
carência de mecanismos para "ouvir a voz do cliente";
a falta de incorporação de aspectos de construtibilidade na etapa de
projeto;
pouca importância atribuída aos aspectos comportamentais dos agentes do
empreendimento.
Desta forma, a proposição de diretrizes para a gestão da qualidade no
processo de projeto, no âmbito da construção de edifícios por empreitada,
surge como uma resposta às deficiências supracitadas.
2. Justificativa
O estudo proposto incorpora elementos de análise incomuns aos trabalhos
precedentes, tais como a influência das características do cliente, do
relacionamento entre os agentes envolvidos e do sistema contratual adotado,
na qualidade do projeto e no desempenho do empreendimento, em termos de
prazos, custos e qualidade. Desta forma, pode trazer contribuições
importantes para a gestão do processo de projeto na construção de edifícios
públicos e para terceiros, uma vez que:
analisa o processo de projeto no contexto do empreendimento por uma
abordagem intra-organizacional e inter-organizacional e da caracterização
dos principais agentes envolvidos;
incorpora o cliente no escopo da análise, tendo em vista a sua capacidade
de influenciar o desempenho do empreendimento e seu papel estratégico na
retroalimentação dos processos;
focaliza o segmento de edifícios públicos e para terceiros, cujo arranjo
tradicional limita a integração entre os intervenientes, provocando
conflitos e decréscimo da qualidade;
avalia a percepção do cliente, do projetista e do construtor quanto ao
sistema contratual adotado e ao desempenho do empreendimento, sob a ótica
da gestão da qualidade e da integração;
possibilita avaliar a natureza da relação entre os sistemas da qualidade
dos agentes envolvidos e a necessidade de integração em um sistema único,
em benefício do cliente;
emprega múltiplas fontes de evidência, através de diferentes instrumentos
de pesquisa, de modo a implementar a consistência dos resultados obtidos.
Como visto anteriormente, as contribuições do estudo do processo de projeto
no contexto do empreendimento, segundo os aspectos relacionados, vão ao
encontro de tendências futuras para a indústria da construção de edifícios,
tais como a flexibilização de projetos, o foco no cliente, o
estabelecimento de relações duradouras entre os agentes, a especificidade
dos contratos segundo a necessidade do empreendimento e a mudança nas
responsabilidades dos agentes.
3. Objetivos
Partindo do pressuposto de que a qualidade na construção de edifícios por
empreitada depende da adoção de mecanismos que assegurem a qualidade no
processo de projeto por parte de todos os agentes envolvidos, assim como o
estabelecimento de um ambiente favorável à cooperação, ao fluxo de
informações e à convergência de objetivos, o principal objetivo deste
trabalho consiste na proposição de diretrizes para a gestão da qualidade no
processo de projeto.
Embora não constitua o objetivo principal, o trabalho contribuirá para a
definição de:
mecanismos a serem observados no processo de seleção de projetistas,
segundo as características específicas do empreendimento, do cliente e do
sistema contratual, de modo a assegurar um ambiente cooperativo para o
desenvolvimento dos projetos, que favoreça o relacionamento harmonioso e
coordenado entre os profissionais envolvidos;
procedimentos para a identificação das prioridades do empreendimento a
partir das necessidades implícitas e explícitas do cliente, contribuindo
para a programação das necessidades em termos de produtos e processos e
para a seleção de um sistema contratual favorável à integração entre os
agentes.
Constituem objetivos específicos do trabalho, dentro da área de atuação
delimitada e da abordagem proposta:
identificar os sistemas contratuais mais difundidos no setor, avaliando
suas repercussões no processo de projeto e na integração entre os
participantes;
identificar e caracterizar as principais modalidades de parcerias adotadas
no setor;
discutir e propor uma terminologia para os sistemas de contratação
identificados, devido ao uso indiscriminado e inadequado de designações;
caracterização da estrutura técnica, gerencial e organizacional dos
intervenientes;
compreensão das atribuições, objetivos e capacidade de influência de cada
agente quanto ao empreendimento;
identificar, por meio de pesquisas de campo, a opinião dos diferentes
agentes sobre a qualidade no processo construtivo, a possibilidade de
melhoria da qualidade dos projetos e as responsabilidade de cada
interveniente;
caracterização do subsetor de construção de edificações e dos fornecedores
de engenharia e projetos;
levantamento da metodologia de seleção empregada na contratação dos
projetistas e dos construtores;
estabelecer diretrizes para otimizar o processo de projeto e a integração
entre o projeto e o processo construtivo, visando o atendimento das
prioridades do empreendimento.
A resposta aos objetivos formulados considerará a natureza da atividade de
construção, as características das empresas do setor, as características do
processo de produção do projeto, as mudanças recentes e as principais
dificuldades do setor de projeto quanto à qualidade (PSQ, 2000).
4. Método de pesquisa
Trata-se de uma pesquisa qualitativa descritiva, que emprega principalmente
estudos de caso, cujos principais objetivos consistem em "expandir e
generalizar teorias e análises, sem todavia enumerar freqüências" (YIN,
1994). Os estudos de caso serão realizados por meio de entrevistas semi-
estruturadas aplicadas a clientes, construtores e projetistas pertencentes
a um determinado empreendimento.
As pesquisas de campo têm como objetivo levantar informações relevantes
sobre as vantagens e desvantagens de cada sistema contratual para o
processo de desenvolvimento dos projetos, a integração entre os
intervenientes e o sucesso do empreendimento, segundo a percepção de
clientes, projetistas e construtores. A principal desvantagem deste método
diz respeito à baixa taxa de retorno dos questionários, em torno de 10%. Os
questionários elaborados passarão por um "wording", sendo posteriormente
analisados por professores e alunos da Pós-Graduação. As informações
obtidas têm como finalidade subsidiar os estudos de caso descritivos.
A figura 3 ilustra a comprovação em estudos de caso múltiplos. A
fundamentação teórica constitui uma importante etapa do planejamento e
coleta de dados. Os estudos de caso buscam evidências convergentes segundo
os fatos e conclusões de cada caso. Considera-se a conclusão de cada caso
como uma comprovação necessária aos demais casos individuais. Para cada
caso individual, o relatório indicará como as proposições foram
demonstradas. A coleta de dados obedecerá as etapas recomendadas por YIN
(1994):
treinamento;
elaboração de um protocolo (questionários e procedimentos a serem
observados);
estudo de caso piloto.
YIN (1994) define o escopo técnico do estudo de caso como "uma investigação
empírica que observa um fenômeno contemporâneo em um contexto realístico,
especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não são
claramente evidentes". O autor enfatiza que as questões relativas ao estudo
das interfaces entre organizações devem ser respondidas por representantes
de cada uma das organizações, de modo a assegurar conclusões mais
consistentes. Desta forma, buscar-se-á:
o emprego de múltiplas fontes de evidência, que contribuam para aumentar a
validade do estudo de caso;
adoção do "projeto de estudo de caso", com o intuito de prevenir
incompatibilidades entre as evidências encontradas e as questões formuladas
pela pesquisa;
a realização de estudos exploratórios, a fim de subsidiar as pesquisas de
campo e os estudos de caso.
4.1. Variáveis operacionais
Apresentamos a seguir as variáveis empregadas neste estudo:
4.1.1. Desempenho do empreendimento
Esta variável emprega os elementos preconizados por BARROS NETO (1999), que
incorporam os desejos do cliente e os critérios competitivos da produção,
assim como PUDDICOMBE (1998): cumprimento do cronograma e das
especificações de qualidade, respeito da margem de lucro do construtor,
redução de custo para o cliente, ausência de reivindicações do construtor e
do cliente, segurança e imprevistos mínimos.
4.1.2. Gestão da qualidade em projetos
Esta variável compreende itens componentes das recomendações para clientes,
construtores e projetistas para a qualidade no empreendimento (ASCE, 1990)
e elementos de sistemas de gestão da qualidade em projetos (CORNICK, 1991;
NGI, 1998).
4.1.3. Sistemas de contratação
Esta variável será composta a partir do subsistemas constantes no modelo de
análise proposto por KUMARASHAMY & DISSANAYAKA (1998): pacotes de trabalho,
o arranjo funcional, a modalidade de pagamento, a forma de contratação e as
metodologias para seleção dos profissionais.
4.1.4. Integração
A integração entre os participantes do empreendimento será mensurada com o
auxílio do "degree of interaction" (DOI), que avalia a quantidade e a
qualidade da interação no decorrer do empreendimento, baseado nos seguintes
parâmetros: fase de interação, número de pessoas, funções, número de horas,
duração e tipo de interação (POCOCK et al., 1996).
4.2. Seleção das empresas para o estudo de caso
A seleção dos empreendimentos para os três estudos de caso decorre da
consideração dos seguintes critérios:
modalidade de contratação: seleção de empreendimentos contratados segundo
modalidades tradicionais ("design-bid-build") e não-tradicionais ("design
and build", "management contracting", "project management", "turnkey").
características das empresas participantes:
atuação no subsetor de edificações;
atuação no segmento de empreitada;
adoção de mecanismos de garantia e gestão da qualidade;
representatividade no cenário nacional, em termos de organização da
produção, gestão empresarial e inovações em produtos e serviços.
Após a seleção preliminar das empresas, será iniciada uma fase de contatos,
na qual serão apresentados a natureza e os objetivos do trabalho proposto,
com a finalidade de definir um grupo conforme os critérios adotados.
5. Atividades a serem desenvolvidas
Tendo em vista a obtenção dos objetivos formulados, prevê-se uma seqüência
de pesquisa subdividida em seis macro-etapas, a saber:
5.1. Aquisição de conhecimento
1.1. Levantamento bibliográfico
1.2. Revisão bibliográfica
5.2..Estudos exploratórios
5.2.1. Contatos com clientes, projetistas e construtores
5.2.2. Elaboração de entrevistas semi-estruturadas
5.2.3. Realização das entrevistas
5.2.4. Análise dos dados coletados
5.3. Pesquisas de campo
5.3.1. Contato com as entidades de classe
5.3.2. Elaboração e envio dos questionários para a pesquisa de campo
5.3.3. Envio de carta de reforço
5.3.4. Análise dos dados coletados
5.4. Estudos de caso
5.4.1. Seleção dos empreendimentos para o estudo de caso
5.4.2. Contatos e negociação para adesão das empresas
5.4.3. Elaboração das entrevistas semi-estruturadas
5.4.4. Aplicação das entrevistas
5.4.5. Análise dos dados coletados
5.5. Proposição das diretrizes
5.5.1. Proposição de diretrizes para a gestão dos processos técnicos,
gerenciais e organizacionais de projeto
5.5.2. Validação das diretrizes junto a profissionais atuantes na
construção de edifícios por empreitada, consultores e especialistas do
Departamento de Construção Civil e Urbana.
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Grilo