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Apostila De Direito Civil Ii Parte Geral 2

parte geral de civil 2

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D I R E I T O C I V I L II 1 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior PARTE GERAL PARTE II CAPÍTULO I DOS FATOS JURÍDICOS 1) CONCEITO E CONSIDERAÇÕES GERAIS: • CONCEITO: Para SAVIGNY, FATOS JURÍDICOS são os acontecimentos em virtude dos quais as relações de direitos nascem e se extinguem. Para TEIXEIRA DE FREITAS, citado por SILVIO RODRIGUES, são todos os acontecimentos suscetíveis de produzir alguma aquisição, modificação ou extinção de direitos. Assim, a expressão fatos jurídicos, em seu sentido amplo, engloba todos aqueles eventos, provindos da atividade humana ou decorrente de fatos naturais, capazes de ter influência na órbita do direito, por criarem, ou transferirem, ou conservarem, ou modificarem, ou extinguirem relações jurídicas (in Silvio Rodrigues, vol. I, pág. 165/166). • FATO JURÍDICO LATO SENSU: são acontecimentos, seja qual for sua natureza, procedem de algum fato positivo ou negativo, normal ou anormal, instantâneo ou de elaboração progressiva, de que decorrem o nascimento, a subsistência e a perda dos direitos, contemplados em lei. Podemos citar como exemplo de eventos dependentes da vontade humana, as declarações de vontade em geral, unilaterais ou bilaterais, e como exemplo de eventos independentes da vontade humana, o nascimento, a maioridade, a loucura, a surdo-mudez, etc. • FATO JURÍDICO STRICTO SENSU: são somente os eventos independentes da vontade humana capaz de produzir efeitos jurídicos, classificados também por parte da doutrina como ações humanas de efeitos involuntários, como os atos ilícitos. D I R E I T O C I V I L II 2 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior • DIFERENÇA ENTRE FATO JURÍDICO E ATO JURÍDICO: Em sentido amplo, o primeiro compreende o segundo, aquele é o gênero de que este é a espécie. Em sentido estrito, fato jurídico é acontecimento natural, independente da vontade interna, enquanto ato jurídico é acontecimento voluntário, fruto da inteligência e da vontade, querido e desejado pelo interessado. • CLASSIFICAÇÃO: Os fatos jurídicos em sentido estrito podem ser classificados em: a) Classificação de Silvio Rodrigues: 1) Quanto à sua estrutura: 1.1) Simples ou unitários: acontecimentos naturais ou ordinários (Ex. nascimento e morte, aluvião, avulsão, álveo abandonado, decurso de tempo); e, acontecimentos extraordinários (Ex. caso fortuito e força maior); 1.2) Compostos ou complexos: prescrição e aquisição de direitos reais. 2) Quanto aos efeitos: 2.1) Constitutivos; 2.2) Modificativos; 2.3) Impeditivos; 2.4) Extintivos. b) Classificação de Washington de Barros Monteiro: 1) Quanto à sua natureza: 1.1) Positivos: morte de uma pessoa; 1.2) Negativos: inexistência de uma dívida que foi paga pelo suposto devedor, dando origem à repetição do indevido. 2) Quanto à maneira pela qual se produzem: 2.1) Instantâneos: caso fortuito ou força maior; 2.2) De elaboração progressiva: usucapião e a prescrição extintiva. 3) Quanto à sua normalidade: 3.1) Naturais ordinários: decurso do tempo; 3.2) Naturais extraordinários: desabamento de um prédio. • CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR: No caso fortuito e na força maior há sempre um acidente que produz prejuízo. O efeito do caso fortuito e da força maior é a extinção da obrigação (artº 393 do CCB), salvo nas hipóteses dos artºs 246 e 399 do CCB. • DIFERENÇA ENTRE CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR: Na força maior conhece-se a causa que dá origem ao evento, pois se trata de um fato da natureza, como, por exemplo, raio que provoca incêndio, inundação que danifica produtos, etc. No caso fortuito o acidente que gera o dano advém de causa desconhecida, como, por exemplo, a explosão de caldeira de usina, provocando morte, podendo ser ocasionado por fato de terceiro, como greve, motim, mudança de governo, etc., causando graves prejuízos. D I R E I T O C I V I L II 3 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior • CLASSIFICAÇÃO DOS FATOS JURÍDICOS EM SENTIDO ESTRITO QUANTO AOS SEUS EFEITOS: 1) FATO CONSTITUTIVO: no âmbito patrimonial, a aquisição de direitos pode se dar: 1.1) de modo originário: o direito nasce no momento em que o titular se apropria do bem de maneira direta, sem interposição ou transferência de outra pessoa. Ex. a ocupação de uma coisa abandonada, caça e pesca, etc. 1.2) de modo derivado: quando há transmissão do direito de propriedade de uma pessoa a outra, existindo uma relação jurídica entre o anterior e o atual titular. Ex. compra e venda de uma casa. A distinção supra se faz importante porque ninguém pode transferir mais direitos do que tem (ULPIANO), pois sendo a aquisição derivada, o adquirente terá seu direito limitado pela extensão do de seu antecessor, como no caso de alguém adquirir um imóvel gravado por hipoteca, sendo esse ônus de natureza real também é transmitido. 1.3) de modo gratuito: se não houve contraprestação. Ex. sucessão hereditária. 1.4) oneroso: quando o patrimônio do adquirente enriquece em razão de uma contraprestação. Ex. a compra e venda, a troca, a dação em pagamento, etc. 1.5) quanto à maneira, pode ser a título universal: se o adquirente substitui o seu antecessor na totalidade de seus direitos ou numa quota ideal deles, tanto nos direitos como nas obrigações. Ex. aquisição dos herdeiros. 1.6) a título singular: quando se adquire uma ou várias coisas determinadas, apenas no que concerne aos direitos, como sucede o legatário, que herda coisa individual, podendo ser “inter vivos”, como no caso da compra e venda, bem como “causa mortis”, como no caso do legado, através de testamento. 1.7) quanto ao processo formativo, pode ser simples: se o fato gerador da relação jurídica consistir num só ato. Ex. assinatura de um título de crédito. 1.8) pode ser complexo: se for necessário a intercorrência simultânea ou sucessiva de mais de um fato. Ex. usucapião que requer posse prolongada, lapso de tempo, inércia do titular da propriedade e, em certos casos, justo título e boa fé. 2) DIREITO ATUAL E DIREITO FUTURO: • O Código Civil de 1916 estabelecia regras a serem aplicadas na aquisição dos direitos. Embora a legislação de 2002, acatando críticas que se faziam a sua previsão, não tenha repetido o artigo, o assunto é relevante, estando o referido em diversos dispositivos esparsos. • DIREITO ATUAL E DIREITO FUTURO: Dizia o inc. III do artº 74 do CCB de 1916 que “dizem-se atuais os direitos completamente adquiridos e D I R E I T O C I V I L II 4 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior futuros os cuja aquisição não acabou de operar”. Assim, o Direito Atual é aquele adquirido, que já está em condição de ser exercido, por se incorporar imediatamente ao patrimônio do adquirente e o Direito Futuro é aquele cuja aquisição, por ocasião da realização do negócio, não se operou, dado que sua efetivação depende de uma condição ou de um prazo, tratando-se de um direito não formado, que requer a complementação dos fatos determinantes de sua aquisição. • DIREITOS FUTUROS DEFERIDOS E NÃO DEFERIDOS: Dentro do campo dos Direitos Futuros, encontramos os Deferidos quando sua aquisição depende somente do arbítrio do sujeito, por exemplo, o herdeiro, desde a abertura da sucessão até a aceitação da herança, tem direito futuro deferido, porque depende apenas de sua vontade torná-lo atual; são os que só não se incorporam ao patrimônio do adquirente porque ainda não quis, mas que poderão a qualquer tempo incorporar-se, pois tal fato não depende de outra coisa senão de seu arbítrio; e encontramos também os Não Deferidos, que são direitos futuros que se subordinam a fatos ou condições falíveis, ou seja, são aqueles que não se incorporam, e talvez não se incorporem ao patrimônio do titular por razões alheias à sua vontade (CCB 1916 - artº 74, par. único). Ex. se alguém faz uma doação de uma casa sob a condição deste se casar, o seu direito sobre o imóvel dependerá da realização do casamento, que poderá ocorrer ou não. • DIREITOS FUTUROS NÃO DEFERIDOS - DIVISÃO: Dentro dos direitos futuros não deferidos, faz-se necessário uma distinção entre Expectativa de Direito, Direito Eventual e Direito Condicional: a) Na Expectativa de Direito há uma mera possibilidade ou esperança de adquirir um direito e, embora a pessoa reuna os requisitos de capacidade e legitimidade, o direito só surge e se adquire ao se verificar o fato ou ato capaz de produzi-lo ou de lhe conferir aperfeiçoamento e vida. Ex. a situação do herdeiro testamentário que aguarda a abertura da sucessão (com a morte do autor da herança) não gozando de qualquer proteção jurídica. b) O Direito Eventual é um direito concebido, mas não nascido, por lhe faltar um elemento básico, sendo mais que uma expectativa de fato, porque algumas das circunstâncias de que depende o seu aperfeiçoamento já se produziram. Para Vicente Ráo, tratando do direito eventual, diz: “os direitos eventuais, pois que tendem a transformar-se em direitos verdadeiros e próprios, são protegidos pela ordem jurídica por preceitos de direito material e por meio de processos preventivos, ou conservatórios, porque, como dizem os autores, ‘seu titular pode pretender que outrem não obste, a seu arbítrio, a superveniência do elemento que falta’ (Messineo, Manuale) e a violação desse dever, pode mesmo constituir justa causa de reparação do dano sofrido pelo sujeito do direito eventual”. Ex. Herdeiro Legítimo. D I R E I T O C I V I L II 5 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior c) Finalmente, Direito Condicional é o que só se perfaz pelo advento de um acontecimento futuro e incerto, de modo que seu titular só o adquire se sobrevier a condição. É a cláusula que subordina o efeito do ato a acontecimento futuro e incerto, de forma que o titular de um direito condicional só o adquire em definitivo se sobrevier a condição suspensiva. Ex. um advogado oferece sociedade ao seu estagiário se ele se formar em direito, ficando este com a possibilidade de adquirir aquele direito, se conseguir colar grau. 3) MODIFICAÇÃO DOS DIREITOS: • MODIFICAÇÕES DOS DIREITOS: Sem que haja alteração em sua substância, os direitos podem sofrer modificações em seu conteúdo, objeto e em seus titulares, a saber: a) MODIFICAÇÃO OBJETIVA: tem-se a modificação objetiva quando atingir a qualidade ou quantidade do objeto ou conteúdo da relação jurídica. Será qualitativa a modificação quando o conteúdo do direito se converte em outra espécie; e será quantitativa a modificação se o seu objeto aumentar ou diminuir no volume, sem alterar a qualidade do direito, em virtude de “fato jurídico stricto sensu”, ou em virtude de ato jurídico do titular ou de outrem. b) MODIFICAÇÃO SUBJETIVA: é a pertinente ao titular, subsistindo a relação jurídica, hipótese em que se pode ter a substituição do sujeito de direito “inter vivos” ou “causa mortis”. Outrossim, tem-se, ainda, a modificação subjetiva quando houver multiplicação dos sujeitos. 4) DEFESA DOS DIREITOS: DEFESA DOS DIREITOS: A defesa dos direitos vinha insculpida no artº 75 do CCB de 1916, pois não há direito sem ação. Numa interpretação do termo ação, podemos afirmar que há no direito pátrio dois tipos de defesa dos direitos: a autodefesa e a ação judicial. A autodefesa está garantida pelos artºs 188, nº I, 1210 pár. 1º e 1283 do CCB de 2002, além do direito de retenção e do penhor legal. Essa autodefesa, entretanto, é excepcional, porque pode conduzir a excessos. O meio normal para tutelar e fazer respeitar o direito violado, ou simplesmente ameaçado, é a ação judicial, por via da qual se recorre à autoridade judiciária competente para restabelecer o direito violado, ou proteger o direito ameaçado. Assim, para resguardar seus direitos, o proprietário deve praticar atos conservatórios, como o protesto, retenção, arresto, interpelação judicial, notificação, etc. Mas, quando sofrer ameaça ou violação, o direito subjetivo é protegido por ação judicial (artº 5º, XXXV, CF). Outrossim, além da defesa direta de seus direitos, o titular do direito lesado pode recorrer à defesa preventiva, que poderá ser judicial (interdito D I R E I T O C I V I L II 6 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior proibitório - artº 1210 pár. 1º do CCB de 2002) ou extrajudicial (cláusula penal, arras, fiança, etc.), que visam impedir a violação do direito. De outra forma, para se propor uma ação judicial, necessário se faz ter interesse, qualidade e capacidade, nos termos dos artºs 76 do CCB de 1916 e 2º e 3º do Código de Processo Civil. Outrossim, o CCB de 2002 absteve-se de repetir noções indispensáveis, mas próprias de direito processual. Desta forma, são condições essenciais para o exercício da ação o direito, o interesse, a qualidade e a capacidade. Não basta ter direito para propor ou contestar ação. Indispensável é também o interesse de agir, que é a medida das ações. Aparece esse interesse quando ameaçado o direito, ou já lesado. Ordinariamente, o interesse é econômico, apreciável em dinheiro, compreendida tanto a defesa do direito pessoal como do direito real. Mas o interesse também pode ser moral, por dizer respeito à honra, à liberdade, ao estado da pessoa, ao decoro e à profissão, quando tocar diretamente ao autor ou à sua família. O interesse deve ser legítimo, direto e imediato. Se ilícito ou imoral, extinguir-se-á o processo sem julgamento do mérito (artº 267 do CPC). Responde por perdas e danos aquele que pleitear de má fé como autor, réu ou interveniente, considerando-se como litigante de má fé aquele que deduzir pretensão ou defesa cuja falta de fundamento não possa razoavelmente desconhecer, bem como quem alterar intencionalmente a verdade dos fatos ou usar do processo com o intuito de conseguir objetivo ilegal (artºs 16 e 17 do CPC). 5) EXTINÇÃO DOS DIREITOS: • Nos termos do que previa os artigos 77 e 78 do CCB de 1916, os direitos extinguem-se quando ocorrer: 1) Perecimento do objeto sobre o qual recaem (artºs 77 e 78, I, II e III) se ele perder suas qualidades essenciais (campo invadido pelas águas) ou valor econômico (cédulas recolhidas) (artº 78, inc. I); se confundir com outro de modo que se não possa distinguir (confusão, mistura de líquidos, comistão de sólidos, e adjunção, justaposição de uma coisa à outra) (artº 78, inc. II); e ainda se cair em lugar onde não pode mais ser retirado (anel que cai no mar) (artº 78, inc. III); 2) Alienação, que é ato de transferir o objeto de um patrimônio a outro, havendo perda do direito para o antigo titular; 3) Renúncia, que é ato jurídico pelo qual o titular de um direito dele se despoja, sem transferi-lo a quem quer que seja, renunciáveis os direitos atinentes ao interesse privado de seu titular, salvo proibição legal. Insuscetíveis de renúncia são os direito públicos e os que envolvem interesses de ordem pública, como os de direito de família (pátrio poder, poder marital, etc.) e os de personalidade (vida, honra, liberdade, etc.); D I R E I T O C I V I L II 7 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 4) Abandono, que é a intenção do titular de se desfazer da coisa, porque não quer mais continuar sendo seu dono; 5) Falecimento do titular, sendo o direito personalíssimo e por isso intransmissível (artºs 114 e 115 da Lei 9.610/98, 520 e 560 do CCB de 2002); 6) Prescrição, que extingue o direito de ação; 7) Decadência, que extingue o próprio direito; 8) Abolição de uma instituição jurídica, como aconteceu com a escravidão; 9) Confusão, se numa só pessoa se reúnem as qualidades de credor e de devedor (CCB 2002, artºs 381, 1410, VI e 1436, IV); 10) Implemento de condição resolutiva; 11) Escoamento do prazo, se a relação jurídica for constituída a termo; 12) Perempção de instância ou do processo, ficando ileso o direito de ação (CCB 2002, artº 1606; CPC artºs 301, IV, 220, 267, V, pár. 3º, 268 e 329); 13) Aparecimento de direito incompatível com o direito atualmente existente e que o suplanta. CAPÍTULO II DOS ATOS JURÍDICOS 1) DEFINIÇÃO: • O artº 185 do CCB conceitua o ato jurídico como sendo todo ato lícito que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. A característica primordial do ato jurídico é ser um ato de vontade, fundado em direito, portanto, lícito, abrangendo a vida civil, na plenitude de suas manifestações. • ELEMENTOS CONSTITUTIVOS: são três os elementos constitutivos do ato jurídico: 1) Elementos essenciais: são aqueles sem os quais o ato não existe. Ex. compra e venda sem o preço. Faltando um dos elementos que compõe o ato jurídico, este não tem consistência jurídica, não existe. Subdividem-se em gerais e particulares. Os primeiros são comuns a todos os atos, enquanto os segundos peculiares a determinadas espécies. Dizem respeito às pessoas que intervêm no ato, ao objeto deste e ao consentimento dos interessados. Quanto às pessoas, a validade do ato jurídico requer agente capaz (artº 104), pessoa dotada de consciência e vontade e reconhecida pela lei como apta a exercer todos os atos da vida civil, excluídas, portanto, as pessoas absolutamente incapaz e os relativamente incapazes, bem como as pessoas D I R E I T O C I V I L II 8 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior jurídicas não representadas. No tocante ao objeto, impõe a lei seja ele lícito (artº 104), deles excluídos os atos contrários à moral, à ordem pública e aos bons costumes, as prestações fisicamente impossíveis e atos que colimem prestações juridicamente impossíveis. O terceiro elemento é o consentimento, pois ato jurídico é ato voluntário, podendo ele ser expresso ou tácito. Sem o concurso da vontade, elemento psicológico tão discutido na atualidade, o ato não se configura. Vale ressaltar ainda que a causa, que é parte integrante do ato de vontade, confundindo-se com o próprio escopo do ato. Os elementos acima estudados concernem aos gerais, comuns a todos, havendo também os particulares, restritos a determinadas espécies. Estes referem-se à forma do ato, que é o meio de revelação da vontade. Em muitos atos, a forma é essencial, como nos casos do casamento, testamento, etc. Se o ato for efetuado sem observância da forma prescrita em lei, tal é nulo (artº 166, nº III); 2) Elementos naturais: são as conseqüências que decorrem da própria natureza do ato, sem necessidade de expressa menção. É a lei que determina quais essas qualidades naturais, suas conseqüências e seus efeitos. Admitida é a sua existência, até prova em contrário. Em princípio, é possível modificar por contrato a natureza de um ato jurídico, se a lei não dispuser de modo diferente. A própria denominação jurídica, dada pelas partes, não tem e nem pode ter valor decisivo; 3) Elementos acidentais: são cláusulas acessórias, que se juntam ao ato para modificar-lhe algum dos elementos naturais. Tais estipulações devem ser precisas e determinadas e não inferidas ou presumidas. Dentre as principais, destacam-se as modalidades dos atos jurídicos: condição, termo e modo ou encargo. 2) CLASSIFICAÇÃO: a) ATO JURÍDICO “LATO SENSU”: Ato jurídico em sentido amplo é toda ação humana voluntária, lícita, contratual ou extracontratual, que gera efeitos jurídicos. Contrapõe-se ao fato jurídico, que é fato da natureza ou ato ilícito com a participação do ser humano; b) ATO JURÍDICO ILÍCITO: Em sentido amplo, ato jurídico ilícito é toda violação culposa de um dever legal ou de uma obrigação preexistente e que cause dano a outrem e que, em conseqüência, acarreta o dever de indenizar; c) ATO JURÍDICO LÍCITO “LATO SENSU”: Contrapõe-se ao ato jurídico ilícito e subdivide-se em ato jurídico lícito “stricto sensu” e negócio jurídico; c.1) ATO JURÍDICO LÍCITO “STRICTO SENSU”: Também chamado de ato jurídico em sentido estrito. São manifestações de vontade que geram efeitos jurídicos, mas não os efeitos jurídicos previstos pelos interessados. Há D I R E I T O C I V I L II 9 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior conseqüência jurídica ex lege. O efeito deriva da lei, mediatamente, portanto. O ato jurídico não tem, aqui, conteúdo normativo, não se prestando como instrumento de regulamentação da autonomia privada, função esta que se defere ao negócio jurídico. É a lei que preceitua: as pessoas que estão enquadradas em tal situação sofrerão esta conseqüência jurídica, ou com outras palavras, se dada situação fática corresponder à hipótese da norma, haverá conseqüência jurídica prevista, independentemente de este efeito corresponder ou não à vontade concreta do sujeito atingido pela incidência da norma. As normas reguladoras dos negócios jurídicos têm em conta a vontade negocial, visto que valorizam, isto é, consideram o intento. Como este elemento é irrelevante no ato jurídico “stricto sensu”, segue-se que lhe são aplicáveis unicamente as regras que a ele não se acham condicionadas, as quais se aplicam, então, diretamente (e não simplesmente por analogia, como quer uma parte da doutrina). Ex. Tomada de posse, tradição da posse, abandono da posse, ocupação e especificação, elaboração de obra artística, quadro, estátua, descoberta científica, habitação, residência e pagamento. • Segundo ORLANDO GOMES, classificam-se os atos jurídicos em sentido estrito em: c.1.1) atos materiais ou reais: consistem numa atuação da vontade que lhes dá existência imediata, porque não se destinam ao conhecimento de determinada pessoa, não tendo, portanto, destinatário. Trata-se de atos a que a ordem jurídica confere efeitos invariáveis, de maneira que tais conseqüências jurídicas estão adstritas tão somente ao resultado da atuação, produzindo-se independentemente da consciência que o agente tenha de que seu comportamento o suscita; c.1.2) participações: consistem em declarações para ciência ou comunicação de intenções ou de fatos, tendo, portanto, por escopo produzir in mente alterius um evento psíquico. Têm, necessariamente, destinatário, pois o sujeito pratica o ato para dar conhecimento a outrem de que tem certo propósito ou que ocorreu determinado fato. Não se confundem, entretanto, com as declarações de vontade dos negócios jurídicos. Nas participações, a declaração de vontade consiste em simples comunicação. Formas de participações: a) intimação: é o ato pelo qual alguém participa a outrem a intenção de exigir-lhe o cumprimento de certo ato. Também se chama interpelação e quando esta é judicial é de direito público e quando extrajudicial, de direito privado; b) notificação: é o ato através do qual alguém dá ciência a outrem da ocorrência que a este interessa conhecer; c) oposição: é o ato mediante o qual alguém impugna a realização de certo ato ou nega anuência a ato que a reclama; d) aviso: é o ato pelo qual se comunica a outrem que determinada ocorrência se verificou ou se verificará, em certo prazo. Ex. aviso prévio. D I R E I T O C I V I L II 10 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior e) confissão: é a declaração de vontade que consiste em admitir alguém a veracidade de fatos desfavoráveis aos seus próprios interesses. Ex. confissão de dívida. 3) NEGÓCIO JURÍDICO: Na definição de negócio jurídico, surgiram duas teorias, a saber: a) a OBJETIVA: o negócio jurídico é a expressão da autonomia privada. A intenção é irrelevante. Não há necessidade de que a intenção seja adequada ao resultado jurídico provocado. A aceitação desta teoria conduziria a resultados diversos no tratamento do problema dos vícios do consentimento e interpretação do negócio jurídico, vale dizer, não admitiria vícios do consentimento e interpretaria o negócio jurídico fundado apenas nos caracteres externos. b) a VOLUNTARISTA: negócio jurídico é a declaração de vontade destinada a provocar determinados efeitos jurídicos ou dirigida à realização de um fim prático tutelado pela ordem jurídica. Entre a vontade real (intenção interior) e a vontade declarada, deve prevalecer a primeira. Requer, portanto, interpretação de vontade. Esta é a teoria que prevalece em nossos dias. Logo, para esta concepção basta a mera manifestação de vontade para a aquisição de um direito, como por exemplo, a compra e venda de uma casa; para conservação, como o protesto; para a modificação, como a novação; para a extinção, como a rescisão contratual, etc., sendo necessário que tal efeito visado pelo interessado esteja conforme a norma jurídica. Mera atividade volitiva interna não basta para configurar o negócio jurídico. A vontade deve ser declarada e dirigir-se à produção de efeito jurídico (nascimento, modificação, conservação ou extinção de um direito) tutelado pela ordem jurídica e objetivamente possível. Puro gracejo não gera obrigação. Embora gere efeitos jurídicos, a sentença judicial não se classifica como negócio jurídico, porque emana de agente no exercício de autoridade pública. O negócio jurídico é figura de direito privado. • OS NEGÓCIOS JURÍDICOS CLASSIFICAM-SE EM: tal classificação é dada por Washington de Barros Monteiro, sob a denominação de classificação dos atos jurídicos e Silvio Rodrigues como negócios jurídicos: 1) Quanto às vantagens que produzem: 1.1) gratuitos: quando há enriquecimento patrimonial sem contraprestação; 1.2) onerosos: onde os agentes visam, reciprocamente, obter vantagens para si ou para outrem, podendo ser comutativos ou aleatórios; 2) Quanto às formalidades: 2.1) solenes: que requerem forma prescrita em lei; 2.2) não-solenes, que não exigem forma legal para sua efetivação; D I R E I T O C I V I L II 11 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 3) Quanto ao conteúdo: 3.1) patrimoniais: se versarem sobre questões suscetíveis de aferição econômica, podendo apresentar-se ora como negócios reais ora como negócios obrigacionais; 3.2) extrapatrimoniais: se atinentes aos direitos personalíssimos e ao direito de família. 4) Quanto à manifestação de vontade: 4.1) unilaterais: se o ato de vontade provier de um ou mais sujeitos, desde que estejam na mesma direção com um mesmo objetivo (testamento, promessa de recompensa), subdividindo-se em receptícios, cujos efeitos só se produzem quando a declaração é recebida pelo destinatário (despedida de empregado, oferta de contrato) e não-receptícios, se sua efetivação independer do endereço a certo destinatário, valendo a manifestação desde que esta é exteriorizada, isto é, a vontade (renúncia à herança); 4.2) bilaterais: se a declaração volitiva emanar de duas ou mais pessoas, porém dirigidas em sentido contrário, podendo ser simples, quando concederem benefício a uma das partes e encargo à outra (doação, depósito gratuito), e sinalagmáticos, quando conferirem vantagens e ônus a ambos os sujeitos (compra e venda, locação, etc.). 5) Quanto ao tempo em que produzem efeitos: podem ser “inter vivos” ou “causa mortis”. 6) Quanto aos seus efeitos: 6.1) constitutivos: quando sua eficácia opera-se a partir do momento da conclusão; 6.2) declarativos: cuja eficácia só se efetiva a partir do momento em que se operou o fato a que se vincula a declaração de vontade. 7) Quanto à sua existência: podem ser principais ou acessórios. 8) Quanto ao exercício dos direitos: 8.1) negócios de disposição: se implicarem o exercício de amplos direitos sobre o objeto: 8.2) de simples administração: se concernentes ao exercício de direitos restritos sobre o objeto sem que haja alteração em sua substância (mútuo, locação de uma casa). 9) Quanto à forma: 9.1) verbais: que pode se dar entre presentes, consumando-se com a emissão, e entre ausentes; 9.2) escritas, 9.3) expressa 9.4) tácita. • Não basta a manifestação da vontade individual para a aquisição, transferência, modificação, conservação ou extinção de um direito. É preciso que a lei reconheça esses efeitos, emprestando-lhes, portanto, teor D I R E I T O C I V I L II 12 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior jurídico. Denomina-se princípio da autonomia da vontade a medida na qual o direito positivo reconhece aos indivíduos a possibilidade de praticar atos jurídicos, produzindo seus efeitos. No campo dos atos bilaterais, a autonomia da vontade manifesta-se sob a forma de liberdade de contratar. O titular decide: se, sobre o que, com quem, como e quando, contrata. Fruto do próprio curso econômico desigual tomado pela sociedade, há necessidade de se limitar cada vez mais a autonomia privada no interesse da proteção dos mais fracos. A isso se chama intervencionismo estatal na economia contratual. Ex. Lei do Inquilinato, relações de trabalho (in dubio pro misero!). 4) REPRESENTAÇÃO DOS INCAPAZES: • Representação é relação jurídica pela qual determinada pessoa se obriga diretamente perante terceiro, mediante ato praticado em seu nome por um representante ou intermediário; os direitos podem ser adquiridos, efetivamente, pelo próprio agente, ou por terceiro que o represente. • Com relação à capacidade do agente no negócio jurídico, esta deve sempre existir, tal como a declaração de vontade, havendo em nosso direito pátrio, em seus artºs 3º e 4º do CCB, o rol dos absoluta e relativamente incapazes, que não podem, por si só, praticar nenhum negócio jurídico. Vemos assim que pais, tutores curadores são representantes legais, e o ato praticado pelo absolutamente incapaz sem a devida representação é nulo (CCB 1916, artºs 84 e CCB 202, artº 166, I) e o realizado pelo relativamente incapaz sem assistência é anulável (CCB 2002, artºs 171, nº I e 1690). No tocante aos tutelados, o artº 1747 determina que cabe ao tutor representar o menor, até os 16 anos, nos atos da vida civil, e assisti-lo, após essa idade, nos atos em que for parte, suprindo-lhe o consentimento. Quanto aos curatelados, o artº 1774 e 1781 determina a representação legal dos interditos, assim também ao do ausente, declarado tal por ato do juiz. Contudo, a incapacidade de uma das partes não pode ser invocada pela outra em proveito próprio, salvo se for indivisível o objeto do direito ou da obrigação. Por ser a incapacidade uma exceção pessoal, ela só pode ser formulada pelo próprio incapaz ou pelo seu representante legal. • Tão importante matéria mereceu do legislador de 2002 um capítulo especial no Livro dos fatos jurídicos, que dela se ocupa no arts. 115 a 120. • Três são os representantes admitidos em nosso direito: 1) Legais: são aqueles a quem a própria lei confere poderes para administrar bens de outrem, como pais, tutores e curadores, em relação aos filhos menores, pupilos e curatelados; D I R E I T O C I V I L II 13 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 2) Judiciais: são os nomeados pelo juiz para o exercício de certo cargo no foro ou no processo, como o síndico, o inventariante e o curador da herança jacente; 3) Convencionais: são os representantes munidos de mandato, expresso ou tácito, verbal ou escrito, do representado, como os procuradores (no contrato de mandato) e o comissário (no contrato de comissão mercantil). • Para Clóvis Beviláqua, existe a capacidade geral e uma especial para certos negócios em dadas circunstâncias. A capacidade especial ou legitimação distingue-se da capacidade geral das partes, para validez do negócio jurídico, pois para que ele seja perfeito não basta que seja plenamente capaz; é imprescindível que seja parte legítima, isto é, tenha competência para praticá-lo, dada a sua posição em relação a certos interesses jurídicos. A falta de legitimação pode tornar o negócio nulo ou anulável, dependendo ela da particular relação do sujeito com o objeto do ato negocial. • Para que o negócio jurídico se repute perfeito e válido deverá versar sobre objeto lícito, ou seja, conforme a lei, não sendo contrário aos bons costumes, à ordem pública e à moral. Além disso, deve ser possível, física e juridicamente, o objeto do ato negocial. • Finalmente, a manifestação de vontade exerce papel preponderante no negócio jurídico, sendo um de seus elementos básicos. Limongi França preceitua: “Consentimento é a anuência válida do sujeito a respeito do entabulamento de uma relação jurídica sobre determinado objeto”. Tal consentimento pode ser expresso ou tácito, receptícias e não receptícias. 5) INTERPRETAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS OU ATOS JURÍDICOS: • Quanto à interpretação do negócio jurídico, esta pode ser: declaratória, se esta tiver por escopo expressar a intenção dos interessados; integrativa, se pretender preencher lacunas contidas no negócio, por meio de normas supletivas, costumes, etc., e, construtivas, se objetivar reconstruir o ato negocial com o intuito de salvá-lo. • A interpretação do negócio situa-se na seara do conteúdo da declaração volitiva, fixando-se em normas empíricas, mais de lógica prática do que de normação legal, pois o Código Civil contém tão somente cinco normas interpretativas, a saber: 1) nas declarações de vontade atender-se-á mais à sua intenção do que ao sentido literal da linguagem (CCB artº 112); D I R E I T O C I V I L II 14 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 2) os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração (artº 113-CCB); 3) os contratos benéficos e a renúncia interpretar-se-ão estritamente (CCB, artº 114); 4) nos contratos de adesão, havendo cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente (CCB, artº 423); 5) nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio (CCB, artº 424); 6) a fiança dar-se-á por escrito e não admite interpretação extensiva (CCB, artº 819 e RT 476/157); 7) a transação interpreta-se restritivamente (artº 843-CCB); 8) é nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas (artº 1.008-CCB); 9) quando a cláusula testamentária for suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador (CCB, artº 1899); 10) Dentre estes, podemos acrescentar o preceito do artº 47 do Código de Defesa do Consumidor, em que as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. • Assim, a observância do negócio jurídico constitui um dos meios demonstrativos da interpretação da vontade das partes. A melhor interpretação de um contrato é a maneira pela qual os interessados, de comum acordo, o executaram. Os eventos posteriores são a melhor explicação dos fatos. De qualquer forma, se os termos são claros e apropriados, não há como fugir ao sentido literal e gramatical; as várias cláusulas da estipulação interpretam-se pondo-as em harmonia, não isoladamente. • O silêncio importa anuência quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa (art. 111 do CCB). • Para arremate, a Lei de Introdução ao Código Civil, em seu art. 5º., preceitua que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”. D I R E I T O C I V I L II 15 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior CAPÍTULO III DEFEITOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS 1) GENERALIDADES: • Segundo vimos anteriormente, o ato jurídico é manifestação da vontade tendente a criar, modificar ou extinguir um direito. Para que este validamente exista, indispensável é a presença do elemento volitivo, que este tenha existido e haja funcionado normalmente. • Efetivamente, pode acontecer que a vontade não tenha existido na celebração do negócio jurídico, fruto das mais diversas circunstâncias, sejam elas transitórias ou duradouras. • Pode acontecer ainda que a vontade tenha existido, pois o interessado desejou realmente praticar o ato questionado, mas a sua vontade estava contaminada por alguns dos vícios do consentimento, eivando o ato de nulidade. • Por fim, há casos em que a vontade existe e funciona normalmente, mas esta se desvia da lei ou da boa fé, e orienta-se no sentido de prejudicar a terceiros, ou se infringir o direito. • Ocorrendo tais fatos, surgem as figuras do erro ou ignorância, dolo, coação ou violência, estado de perigo, lesão, simulação e a fraude contra credores. • CLASSIFICAÇÃO: Os cinco primeiros (erro ou ignorância, dolo, coação ou violência, estado de perigo e lesão) são os chamados vícios de consentimento, pois incidem sobre a vontade impedindo de se externar conforme o último desejo do agente. Nos dois últimos (simulação e fraude contra credores) trata-se de vícios sociais, pois nesses o consentimento se revela desembaraçado de peias. Vejamos com mais vagar cada defeito acima relacionado. 2) DO ERRO OU IGNORÂNCIA: 2.1) CONCEITO: • Ocorre o erro quando o autor da declaração a emitiu inspirado num engano ou na ignorância da realidade. É a noção falsa a respeito de um objeto ou de determinada pessoa. Tal é equiparado à ignorância, que é o completo desconhecimento acerca de um objeto. Num e noutro caso, o agente é levado a praticar o ato jurídico que não praticaria por certo, ou que praticaria em circunstâncias diversas, se estivesse devidamente esclarecido. D I R E I T O C I V I L II 16 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 2.2) ESPÉCIES DE ERRO: a) ERRO SUBSTANCIAL: o erro, para viciar a vontade e tornar anulável, é de tal força, de tal relevo, de tal consistência, que, sem ele, o ato não se realizaria. Declara o artº 138 do CCB: “São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio”. Declara ainda o artº 139, I do CCB que o erro é substancial quando: “I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais”. a.1) Erro essencial sobre a natureza do ato: (error in ipso negotio) quando se tenciona praticar certo ato e no entanto se realiza outro. Inexistindo acordo de vontades sobre a própria essência do ato, em virtude de erro substancial, é ele ineficaz. Ex. A entrega determinado objeto a título de empréstimo e B recebe-o a título de doação. a.2) Erro sobre o objeto principal da declaração: (error in ipso corpore rei) quando a coisa concretizada no ato em verdade não era pretendida pelo agente. A vontade desvia-se devido ao desentendimento sobre o objeto do ato, sendo este anulável e o adquirente está autorizado a pedir sua decretação. Ex. O comprador acredita estar adquirindo terreno urbano e na verdade está adquirindo terreno rural. a.3) Erro sobre qualidades essenciais do objeto: (error in substantia) quando se supunha existente determinada qualidade que, porém, não existia, tendo a falsa crença determinado a vontade. Ex. Adquiro carro de mil cilindradas pensando ser de duas mil. Em todas essas hipóteses acima mencionadas o ato é ANULÁVEL. b) ERRO SOBRE A PESSOA: Estabelece o artº 139, II do CCB: “Concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante”. O erro, incidindo sobre a pessoa com que se teve intenção de tratar, só é causa de anulabilidade do ato quando a consideração da mesma pessoa foi a causa determinante, a mola propulsora do negócio jurídico. Ex. no casamento (artºs 1556 e 1557), na sucessão testamentária (artº 1903), no contrato de sociedade, no contrato a título oneroso, tendo por objeto coisa infungível (artº 247), e, finalmente, todos os atos benéficos realizados intuitu personae (doação, dote, etc.). Outrossim, casos há em que o contrato não visa pessoa contratada, por versar este sobre coisas fungíveis, cuja prestação poderá ser efetuada por qualquer pessoa. Daí, o ato é válido. c) ERRO ACIDENTAL: Esse erro não induz anulação do ato. Está, nesse caso, exemplificativamente, o equívoco relacionado com o valor do objeto contratado, bem assim, a entrega do automóvel diferente em série ou no ano de produção. Qual a diferença entre erro sobre as qualidades essenciais do objeto e vício redibitório? R. Embora íntima a relação existente entre eles, em verdade são diversos os respectivos fundamentos. No vício redibitório (artºs D I R E I T O C I V I L II 17 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 441 a 446) o fundamento é a garantia que o vendedor tem de assegurar ao comprador contra os defeitos ocultos da coisa e que a tornam imprestável ao fim a que se destina; no erro, a anulação tem por base o consentimento imperfeitamente fornecido no momento da constituição do ato. d) ERRO ESCUSÁVEL: Há de ter por fundamento uma razão plausível, ou de ser de tal monta, que qualquer pessoa inteligente e de atenção ordinária seja capaz de cometê-lo. Deve ser ainda real, isto é, tangível, palpável, importando efetivo prejuízo para o interessado. e) ERRO DE FATO: É aquele que recai sobre circunstâncias de fato, por exemplo, sobre qualidades essenciais da pessoa ou da coisa. f) ERRO DE DIREITO: É aquele que diz respeito a existência de norma jurídica, supondo-se, por exemplo, que está em vigor quando, em verdade, está revogado. É possível equiparar o erro de direito ao erro de fato para a caracterização do vício de vontade, causa de anulação do ato jurídico? R. O nosso CCB não se refere ao erro de direito, pois CLÓVIS BEVILAQUA equipara as noções de erro de direito e ignorância da lei, opinando pela inexistência do error juris ante o artº 3º da LICC. Portanto, o erro de direito não é considerado como causa de anulação do contrato. Só o erro de fato é que pode influir de modo a anulá-lo, sobre a eficácia do elemento volitivo. Entretanto, tal entendimento foi duramente combatido pela doutrina e pela jurisprudência, cujo entendimento predominante é de que o erro de direito, como o de fato, desde que afete a manifestação da vontade, na sua essência, vicia o consentimento. Outrossim, preciso é atentar para o exato alcance dos preceitos de escusa de cumprir a lei por não a conhecer, por exemplo, não posso alienar bens recebidos em fideicomisso, cuja propriedade é restrita e resolúvel, e depois subtrair-se às conseqüências, alegando ignorar a limitação constante do art. 1.953 do CCB. De outra forma, posso alegar a ignorância em tela se presumo ser estrangeiro pessoa que tem garantia de legislação que dispõe sobre nacionalidade e cidadania, pois houve erro no processo formativo da minha vontade. Assim, o error juris não consiste apenas na ignorância da norma, mas também no seu falso conhecimento e na sua interpretação errônea. g) FALSA CAUSA: Causa é o escopo, o fim visado pela parte ao realizar o negócio jurídico. Erro quanto ao fim colimado não vicia, em regra, o negócio jurídico, a não ser quando nele figurar expressamente, integrando-o, como sua razão essencial ou determinante, caso em que o torna anulável. É o que preceitua o artº 140 do CCB. Ex. Se alguém beneficiar outro com uma doação, declarando que assim procede porque o donatário lhe salvou a vida, se isso não corresponder à realidade, provando-se que o donatário nem mesmo participara do salvamento, viciado estará o negócio, sendo anulável. Finalmente, pelo artº 141 do CCB se alguém transmitir uma declaração de vontade de incorreta, acarretando desavença entre a vontade declarada e a D I R E I T O C I V I L II 18 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior interna, poder-se-á declarar erro nas mesmas condições que a manifestação de vontade é realizada entre presentes. • Estabelece mais o artº 142 do CCB que o “erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada”. Já vimos que no direito hereditário se encontra disposição especial da mesma natureza, a constante do art. 1903 do CCB. • Assim, quem alega o erro deve prová-lo. Erro só pode ser alegado por aquele a quem aproveite o reconhecimento do vício, não pela outra parte. Embora anulável o ato eivado de erro, prevalece enquanto não anulado por sentença. Por fim, o CPC faculta à parte inocente provar com testemunhas, nos contratos em geral, os vícios do consentimento (artº 404, II). • De acordo com o art. 144 do CCB, o erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa a quem a manifestação de vontade se dirige se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante. Nada impede, efetivamente, que, inobstante o erro ocorrido na manifestação de vontade, a parte a quem esta se dirige esteja de acordo em realizar o negócio tal como deveria ser sem a ocorrência do erro. 3) DO DOLO: 3.1) DEFINIÇÃO: • O dolo é o emprego de um artifício ou expediente astucioso para induzir alguém à prática de um ato que o prejudica e aproveita o autor do dolo ou terceiro (Clóvis Beviláqua). É o sentido da doutrina dominante. Diferenciando o dolo do erro, este deriva de um equívoco da própria vítima, é puramente fortuito, sem que a outra parte tenha concorrido para isso, ao passo que naquele é intencionalmente provocado na vítima pelo autor do dolo ou terceiro, sendo, portanto, passível de anulação (artºs 145 a 150 e 171, II, do CCB). Cabe salientar que há diferença entre o dolo civil, da qual tratamos, e o dolo criminal, pois neste diz-se doloso o crime quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo (artº 18, nº I, do CP). Diferencia-se, também, o dolo civil do dolo processual, sendo este decorrente da maneira pela qual o litigante se conduz na causa, agindo de forma temerária, com provocação de incidentes manifestamente infundados, com o único objetivo de protelar o julgamento do feito. D I R E I T O C I V I L II 19 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 3.2) ESPÉCIES DE DOLO: a) “DOLUS BONUS ou MALUS”: O “Dolus Bonus” é um comportamento lícito e tolerado consistente em reticências, exageros nas boas qualidades, dissimulações de defeitos. É o artifício que não tem finalidade de prejudicar. Esse dolo não induz a anulação do ato. Ex. Vendedor que exalta as qualidades da coisa vendida, com certo exagero e o comprado, que a diminui e encontra defeitos não existentes. O “Dolus Malus” consiste no emprego de manobras astuciosas destinadas a prejudicar alguém. É o dolo grave, que vicia o consentimento. É o que se refere o nosso Código Civil. b) “DOLUS CAUSAM” e “DOLUS INCIDENS”: O Dolo Principal, também chamado dolo essencial, dolo determinante ou dolo causal, é aquele que dá causa ao negócio jurídico sem o qual ele não se teria concluído (CCB, artº 145), acarretando, então, a anulabilidade daquele negócio. O Dolo Incidente é aquele que leva a vítima a realizar o ato, porém em condições mais onerosas ou menos vantajosas. Requisitos: b.1) haja intenção de induzir o declarante a praticar o negócio jurídico, desde que ocorra prejuízo para a vítima; b.2) que os artifícios fraudulentos sejam graves, aproveitando a quem os alega; b.3) sejam causa determinante da declaração de vontade; b.4) procedam do outro contratante, ou sejam deste conhecidos, se procedentes de terceiro. • O Dolo Acidental é o que leva a vítima a realizar o negócio, porém em condições mais onerosas ou menos vantajosas (artº 146, CCB), não afetando sua declaração de vontade, embora provoque desvios, não se constituindo vício de consentimento, por não influir diretamente na realização do ato, que se teria realizado independentemente do emprego de artifícios astuciosos. Não acarreta a anulação do negócio jurídico, obrigando apenas à satisfação de perdas e danos ou a uma redução da prestação acordada. c) DOLO POSITIVO OU NEGATIVO: Dolo positivo é o artifício astucioso que consta de ação dolosa, ou seja, é o dolo por comissão em que a outra parte é levada a contratar, por força de artifícios positivos, ou seja, afirmações falsas sobre a qualidade da coisa. Dolo negativo é a manobra astuciosa que constitui uma omissão dolosa ou reticente; dá-se quando uma das partes oculta alguma coisa que o co-contratante deveria ser sabedor e se sabedor não teria realizado o negocio (artº 147 do CCB). Requisitos: c.1) intenção de induzir o outro contratante a praticar o negócio jurídico; c.2) silêncio sobre uma circunstância ignorada pela outra parte; c.3) relação de causalidade entre a omissão intencional e a declaração de vontade; c.4) ser a omissão do outro contratante e não de terceiro. D I R E I T O C I V I L II 20 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior d) DOLO DE TERCEIRO: É o praticado por pessoa fora da relação negocial, cuja ação é de conhecimento de uma das partes. Mas se não é conhecido por uma das partes, tal ação dará lugar à uma indenização por parte da vítima contra o terceiro autor do dano intencional. e) DOLO DO REPRESENTANTE LEGAL OU CONVENCIONAL: É o praticado pelo representante legal ou convencional de uma das partes, não sendo considerado de terceiro, pois age como se fosse o representado, sujeitando-o à responsabilidade civil até a importância do proveito que obteve do negócio (CCB artº 149), tendo esse ação regressiva contra o representante pela quantia que tiver desembolsado para ressarcir o dano causado, salvo de agiram em conluio. f) DOLO DE AMBAS AS PARTES: O dolo de ambas as partes que agem dolosamente, configurando-se torpeza bilateral, ocorre neutralização do delito porque há compensação entre os dois ilícitos, a ninguém cabendo se aproveitar do próprio dolo. Assim, não poderá haver anulação do negócio. Válido será o ato negocial, ficando o dolo de um compensado pelo dolo do outro, seja qual for a espécie de dolo. • CASOS ESPECIAIS DE ATUAÇÃO DOLOSA: a) Disposições testamentárias: captação e sugestão; b) É retratável a renúncia da herança, quando proveniente do dolo (artº 1.812); c) A partilha pode ser invalidada em razão do mesmo vício (artº 2.027) 4) DA COAÇÃO: 4.1) DEFINIÇÃO E GENERALIDADES: • Coação é qualquer pressão física ou moral exercida sobre a pessoa e a honra de um contratante para obrigá-lo ou induzi-lo a efetivar um negócio jurídico (Maria Helena Diniz). É o vício mais profundo que possa afetar o ato jurídico, uma vez que seu impacto o atinge na própria base, a vontade livre do agente. • Clóvis Beviláqua afirma que a coação pode ser encarada sob dois aspectos distintos, ab intrinseco e ab extrinseco. No primeiro caso, é o estado de espírito em que o agente, perdendo a energia moral e a espontaneidade do querer, realiza o ato que lhe é exigido. No segundo caso, é a violência, física ou moral, exercida sobre a pessoa para constrangê-la à prática do ato. D I R E I T O C I V I L II 21 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 4.2) ESPÉCIES: a) Coação Física ou “Vis Absoluta”: é o constrangimento corporal que retira toda capacidade de querer, implicando ausência total de consentimento, o que acarreta inexistência ou nulidade do ato, não se tratando de vício de vontade. Ex. A mão da vítima é conduzida a assinar ou subscrever um documento. Ela é privada de manifestação de vontade, pois sua vontade está aniquilada. É a completa ausência de consentimento, sendo o ato nulo de pleno direito, e não anulável. b) Coação Moral ou “Vis Compulsiva”: atua sobre a vontade da vítima, sem aniquilar-lhe o consentimento, pois conserva ela uma relativa liberdade, podendo optar entre a realização do negócio que lhe é exigido e o dano com que é ameaçada. É modalidade de vício de consentimento, pois permite que o coacto emita uma vontade, embora maculada, acarretando a anulabilidade do negócio por ele realizado (artº 171, II, CCB). 4.3) REQUISITOS DA COAÇÃO: Para que se configure a coação moral é mister a ocorrência dos seguintes requisitos: 1) a coação deve ser a causa determinante do negócio jurídico; 2) a coação deve incutir à vítima um temor justificado (artº 152 do CCB); 3) o temor deve dizer respeito a um dano iminente, suscetível de atingir a pessoa da vítima, sua família ou seus bens; 4) o dano deve ser considerável ou grave, podendo ser moral ou patrimonial; 5) o dano deve ser igual, pelo menos, ao receável do ato extorquido. 4.4) CASOS DE EXCLUSÃO: Outrossim, seguindo-se o ditame do artº 153 do CCB, excluem a coação: 1) a ameaça do exercício normal de um direito: se a ameaça é justa não existe coação, e sim exercício normal de um direito, embora com alteração do consentimento. Ex. Devedor de dívida vencida e não paga que é ameaçado pelo credor de que irá protestar o título, ou requerer sua falência; 2) simples temor reverencial, que é o receio de desgostar pai, mãe ou pessoas a quem deve obediência e respeito. • OUTRAS DISPOSIÇÕES: Finalmente, pelo artº 154 do CCB, a coação exercida por terceiro, ainda que dela não tenha ciência o contratante, vicia o negócio, causando sua anulabilidade. Porém, se a coação exercida por terceiro for previamente conhecida pela parte a quem aproveitar, esta responderá solidariamente com aquele por todas as perdas e danos. E se a parte prejudicada com a anulação do ato não soube da coação exercida pelo terceiro, só este responderá pelas perdas e danos (artº 155, par. 2º). D I R E I T O C I V I L II 22 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 5) DA SIMULAÇÃO: 5.1) CONCEITO E GENERALIDADES: • Diz Clóvis Beviláqua que simulação é a declaração enganosa de vontade, visando produzir efeito diverso do ostensivamente indicado. Procura-se iludir alguém por meio de uma falsa aparência que encobre a verdadeira feição do negócio jurídico. Nela a vontade se conforma com a intenção das partes que combinam entre si no sentido de manifestá-la de determinado modo, a fim de prejudicar terceiro que ignora o fato. Ex. Ocultação do verdadeiro preço da coisa no contrato de compra e venda, antedata de documento, realização de ato jurídico mediante interpretação de pessoa, sonegação. A simulação tem diversas procedências, tais como burlar a lei, fraudar o fisco, prejudicar credores, guardar em reserva determinado negócio, etc. 5.2) CARACTERÍSTICAS: São características da simulação: 1) é uma falsa declaração bilateral da vontade; 2) a vontade exteriorizada diverge da interna ou real, não correspondendo à intenção das partes; 3) é sempre concertada com a outra parte, sendo, portanto, intencional o desacordo entre a vontade interna e a declarada; 4) é feita no sentido de iludir terceiro. • Qual a diferença entre simulação e dissimulação? R. A simulação provoca a falsa crença num estado não real, que engana sobre a existência de uma situação não verdadeira. A dissimulação oculta ao conhecimento de outrem uma situação existente, pretendendo, portanto, incutir no espírito de alguém a inexistência de uma situação real. 5.3) ESPÉCIES: a) RESERVA MENTAL: é a emissão de uma declaração não querida em seu conteúdo, tampouco em seu resultado, pois o declarante tem por único objetivo enganar o declaratário. Nela o agente quer algo e declara, conscientemente, coisa diferente para, eventualmente, poder alegar o erro em D I R E I T O C I V I L II 23 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior seu proveito, enganando o outro contratante, sendo ineficaz, por não atingir a validade do negócio jurídico. O atual CCB não cuidou da reserva mental. b) SIMULAÇÃO ABSOLUTA: quando a declaração enganosa da vontade das partes exprime um negócio jurídico bilateral ou unilateral simulado, que não gerará efeito algum entre as partes, não havendo intenção de realizar negócio algum. O ato é ilusório, inexistente, fictício. Ex. Devedor que simula venda de seus bens a parente ou amigo, para que aqueles se subtraiam à execução dos credores. c) SIMULAÇÃO RELATIVA: quando resulta no intencional desacordo entre a vontade interna e a declarada. Dá-se quando uma pessoa, sob a aparência de um negócio fictício, pretende realizar outro que é o verdadeiro, diverso no todo ou em parte do primeiro. Tem a intenção de prejudicar terceiros. Há, neste caso, dois contratos, um aparente e um real, sendo este o que é querido pelas partes e que se lhe oculta de terceiros. A simulação relativa pode ser: c.1) Subjetiva: quando o negócio não é efetuado pela próprias partes mas por uma pessoa interposta ficticiamente, quando o negócio aparente conferir ou transmitir direitos a pessoa diversa a quem se confere ou se transmite (CCB, artº 167, par. 1º). c.2) Objetiva: se for relativa à natureza do negócio pretendido, ao objeto ou a um dos elementos contratuais. Será objetiva se o negócio contiver declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira. Ex. Doação do homem casado à concubina, efetivada mediante compra e venda. d) SIMULAÇÃO INOCENTE: quando não existir intenção de violar a lei ou de lesar outrem, devendo ser, por isso, tolerada (CCB, artº 103). Apresenta os seguintes elementos: intencional declaração contrastante com a vontade real das partes; ocultação do negócio real a terceiros e ausência de prejuízo a terceiros ou de violação a lei. Os contraentes poderão usar da ação declaratória de simulação ou opô-la sob a forma de exceção, em litígio de um contra o outro, ou contra terceiro. e) SIMULAÇÃO MALICIOSA: é a que envolve o propósito de prejudicar terceiros ou de burlar o comando legal, viciando o ato que perderá toda a validade. Os contratantes nada poderão alegar ou requerer em juízo quanto à simulação do negócio, em litígio de um contra o outro ou contra terceiro (artº 167 do CCB). 6) DA FRAUDE CONTRA CREDORES: 6.1) DEFINIÇÃO E ELEMENTOS CONSTITUTIVOS: D I R E I T O C I V I L II 24 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior É a prática maliciosa, pelo devedor, de atos que desfalcam o seu patrimônio, com o escopo de colocá-lo a salvo de uma execução por dívidas em detrimento dos direitos creditórios alheios. Desta feita, deverá o devedor responder, com seu patrimônio, por dívidas por ele contraídas, não podendo ser preso em decorrência do não pagamento dela, com exceção dos casos elencados pelo artº 5º, LXVII, da Constituição Federal. Algumas vezes, o devedor oferece ao credor uma garantia específica, que recai sobre determinado bem, móvel ou imóvel, como acontece no penhor e na hipoteca. A coisa dada em garantia fica sujeita por vínculo real, ao cumprimento da obrigação (artº 1.419 do CCB). Outras vezes, o credor não dispõe de garantia específica , contando apenas com a garantia comum a todos os credores, que é o patrimônio do devedor (artº 591 do CCB). 6.2) REQUISITOS: Dois são os seus requisitos: a) objetivo: o “EVENTUS DAMNI”, que é todo ato prejudicial ao credor, por tornar o devedor insolvente ou por ter sido realizado em estado de insolvência, devendo haver nexo causal entre o ato do devedor e a sua insolvência; b) subjetivo: a “CONSILIUM FRAUDIS”, que é a má-fé, a intenção de prejudicar do devedor (renúncia da herança) ou do devedor aliado a terceiro (venda fraudulenta), ilidindo efeitos da cobrança. Na conceituação de consilium fraudis não tem relevância o animus nocendi, o propósito deliberado de prejudicar credores. Basta que o devedor tenha consciência de que de seu ato advirão prejuízos. A fraude pode existir sem ser premeditada. Igualmente, em relação ao cúmplice do fraudador não se cuida da intenção de prejudicar, bastando o conhecimento que ele tenha, ou deva ter, do estado de insolvência do devedor e das conseqüências que, do ato lesivo, resultarão para os credores. 6.3) ATOS SUSCETÍVEIS DE FRAUDE: São suscetíveis de fraude os seguintes negócios jurídicos: a) a título gratuito (doação, dote) ou remissão de dívidas (CCB artº 386), quando os pratique independentemente de má-fé, o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, caso em que poderão ser anulados pelos credores quirografários (sem garantia) como lesivos dos seus direitos, se já o eram (credores) ao tempo desses atos (CCB artº 158, par. 2º); b) a título oneroso, se praticado por devedor insolvente ou quando a insolvência for notória ou se houver motivo para ser conhecida do outro contraente (CCB artº 159), podendo ser anulado pelo credor; c) outorga de garantias reais (CCB artº 1.419), pelo devedor a um dos credores quirografários estando em estado de insolvência, prejudicando os direitos dos demais credores (artº 163), acarretando a anulabilidade do ato; D I R E I T O C I V I L II 25 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior d) pagamento antecipado do débito, que frustra a igualdade que deve haver entre os credores quirografários, podendo estes propor ação para tornar sem efeito esse pagamento, determinando que o beneficiado reponha aquilo que recebeu em proveito do acervo (artº 162). 6.4) AÇÃO REVOCATÓRIA: A fraude contra credores, que vicia o negócio de simples anulabilidade, somente é atacável por AÇÃO PAULIANA ou AÇÃO REVOCATÓRIA. Só pode ser proposta por credor que já o fosse quando se praticou o ato acoimado de fraudulento. O credor posterior encontra comprometido o patrimônio do devedor, não tendo, pois, direito de reclamar contra a suposta fraude. Mas só o quirografário pode intentá-la. Ao credor com garantia real não assiste esse direito, por falta de interesse econômico ou moral. Os bens que acompanham os créditos os seguem por toda parte, ainda no caso de venda. Enquanto existirem tais bens os créditos estão garantidos e o pagamento assegurado. Requer os seguintes pressupostos: a) ser o crédito do autor anterior ao ato fraudulento; b) que o ato que se pretende revogar tenha causado prejuízo; c) que haja intenção de fraudar, presumida pela coincidência do estado de insolvência; d) pode ser intentada contra o devedor insolvente, contra pessoa que com ele celebrou a estipulação fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé (artº 161); e) prova da insolvência; f) perdem os credores a legitimação ativa para movê-la, se o adquirente dos bens do insolvente que ainda não pagou o preço, que é o corrente, depositá-lo em juízo, com citação edital de todos os interessados (artº 160 - CCB). 6.5) DISPOSIÇÕES ESPECIAIS: O principal efeito da ação pauliana é revogar o negócio lesivo aos interesses dos credores, repondo o bem no patrimônio do devedor, cancelando a garantia real concedida (artº 165, par. único) em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, possibilitando a efetivação do rateio, aproveitando a todos os credores e não apenas ao que intentou. • Diferença entre fraude contra credores e fraude de execução. R. Este é incidente de processo regulado pelo direito público e aquele é defeito dos atos jurídicos disciplinado pelo direito privado. Na fraude a execução pressupõe demanda em andamento que a usa para frustrar a execução, torna nulo o ato, os bens do devedor continuam a responder pelas dívidas deste como se não tivesse saído do seu patrimônio, sendo que seu reconhecimento aproveita somente ao exeqüente. Na fraude contra credores, esta não está condicionada à preexistência de demanda em relação ao ato D I R E I T O C I V I L II 26 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior considerado fraudulento, torna o ato anulável, o seu reconhecimento depende do ajuizamento da ação revocatória ou pauliana e aproveita, o seu reconhecimento, a todos os credores, indistintamente. CAPÍTULO IV DAS MODALIDADES DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS 1) DA CONDIÇÃO: 1.1) DEFINIÇÃO E ELEMENTOS CONCEITUAIS DA CONDIÇÃO: O CCB, em seu artº 121 define condição como sendo: “Considera-se condição a cláusula, que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto”. Portanto, é condicional um negócio quando sua eficácia depende de um acontecimento futuro e incerto. Fato passado ou presente não é condição. Reportando-se a fato passado ou presente, ou o fato se verificou ou não se verificou. No primeiro caso a estipulação deixou de ser condicional, convertendo-se em pura e simples, sem afetar a disposição. No segundo, a estipulação tornou-se ineficaz por ter falhado o implemento da condição. Nosso direito não admite como verdadeira a condição que nada deixam em suspenso, sendo estas consideradas impróprias. Afeta apenas a eficácia e não a existência do negócio. Tal condição pode ser suspensiva e pode ser resolutiva. A condição é uma declaração acessória da vontade, oposta à outra, que é principal (Clóvis Beviláqua). Daí decorre que ela segue a sina do contrato, sendo nula se ele o for. Há em nosso direito pátrio alguns negócios que não admitem condição, senão vejamos: a) o casamento sob condição ou a termo; b) emancipação de filho sob condição; c) reconhecer filho ilegítimo sob condição (artº 1.613 CCB); d) adotar sob condição (artº 375 CCB); e) aceitar ou renunciar herança sob condição ou termo (artº 1.808 CCB); etc. Outros há que, por sua natureza, são eminentemente condicionais, como os pactos antenupciais, que se reputa celebrado sob condição suspensiva: se o casamento se realizar. 1.2) CLASSIFICAÇÃO: D I R E I T O C I V I L II 27 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior • Espécies de condição: são lícitas todas as condições que a lei não vedar expressamente (artº 122 CCB). Ela expressamente proíbe as condições: a) que privarem de todo o efeito o ato; b) que o sujeitarem ao arbítrio de uma das partes; c) impossíveis (CCB artº 123 e 124), quer sejam fisicamente impossíveis, que juridicamente, sendo que a primeira considera-se não escrita e a última invalida os atos a ela subordinados, incluindo-se entre estas as condições contrárias à moral e aos bons costumes. • Vejamos: a) Condição casual: é aquela que depende de um acontecimento alheio à vontade das partes, estando submetida ao caso fortuito ou ao acaso. Dá-se igualmente o nome de casual à condição que subordina a obrigação a um acontecimento que depende da vontade exclusiva de um terceiro; b) Condição potestativa: quando a realização do fato, de que depende a relação jurídica, se subordina à vontade de uma das partes, que pode provocar ou impedir sua ocorrência. Nem todas as condições potestativas são ilícitas. Só o são puramente potestativa, isto é, aquelas em que a eficácia do negócio fica ao inteiro arbítrio de uma das partes sem a interferência de qualquer fator externo; é a cláusula si voluero, ou seja, se me aprouver. As condições simplesmente potestativas diferem das acima mencionadas porque, embora sujeitas a uma manifestação de vontade de uma das partes, dependem, por igual, de algum acontecimento que escapa à sua alçada. A condição potestativa pode perder esse caráter por dificuldades de toda sorte, que venham a agravar a debilidade humana, chamada pelos romanos de condição promíscua, onde, de um instante para outro, ela pode deixar de sê-lo, passando a reger-se pelo acaso (Ex. darte-ei tal soma se escalares o pico Jaraguá, sendo esta escalada tolhida por uma paralisia no contratante); c) Condição mista: é aquela que depende da vontade de uma das partes e, igualmente, da vontade de um terceiro determinado; d) Condições lícitas e ilícitas: diz o artº 122 do CCB que são lícitas todas as condições que a lei não vedar expressamente, pois, existindo proibição legal, a condição é ilícita, acrescentando o mesmo dispositivo que entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes. São igualmente ilícitas as condições imorais ou contrárias aos bons costumes, tais as que dispensam os cônjuges dos deveres de fidelidade e coabitação mútua, ou que imponham a obrigação de viver na ociosidade. D I R E I T O C I V I L II 28 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior e) Condição impossível: é aquela que subordina a eficácia do negócio a um acontecimento cuja realização é física ou juridicamente inalcançável. A condição juridicamente impossível é aquela que colide com um obstáculo legal e permanente, ou que fere a moral e os bons costumes. A condição de não fazer coisa fisicamente impossível tem-se por inexistente. A juridicamente impossível invalida o ato a ela subordinado (artº 123 e 124 do CCB). Por conseguinte, se impossibilidade é física, o ato prevalece, considerando-se a condição como não escrita; se jurídica a impossibilidade da condição, tanto esta como o contrato em seu todo é nulo; f) Condição suspensiva: o artº 125 do CCB dá a noção de condição suspensiva, a saber: “Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa”. De modo que, nos contratos subordinados a esta espécie de cláusula, a aquisição do direito fica submetida à ocorrência de um fato futuro e incerto. Se este advier, adquire-se o direito; caso contrário, não. O titular do direito eventual possui apenas uma expectativa de direito, uma spes debitum iri, ou seja, a possibilidade de vir a adquirir um direito, caso a condição ocorra. No artº 130 do CCB, a lei permite ao titular do direito eventual o exercício de atos conservatórios. E no artº 126 do CCB, se alguém dispuser de uma coisa sob condição suspensiva e, dependente esta, fizer quanto àquelas novas disposições, estas não terão valor, realizada a condição, se com ela forem incompatíveis. A condição suspensiva, para os romanos, pode ser considerada sob três estados diferentes: o estado de pendência, que perdura enquanto não se verifica o evento futuro e incerto, ficando suspenso a eficácia do ato (artº 125 do CCB - conditio pendet), o de implemento da condição, onde, verificada a condição, o direito passa de eventual a adquirido e o ato adquire eficácia, como se desde o início fora puro e simples, não condicional (conditio existit) e o de sua frustração, onde estima-se como nunca tendo existido a estipulação (artº 129 do CCB - conditio deficit); g) Condição resolutiva: o negócio se aperfeiçoa desde logo, todavia fica sujeito a se desfazer se ocorrer aquele evento futuro e incerto referido na avença Enquanto na condição suspensiva o ato só ganha eficácia com o advento daquela, na resolutiva o negócio se resolve com o referido advento. O artº 127 e 128 do CCB precisa os efeitos da condição resolutiva. Como a suspensiva, a resolutiva pode ser igualmente considerada sob três estados: pendente a condição, verificada esta, ou comprovado o seu malogro. No primeiro, é como se o ato fora puro e simples; verificada, porém, a condição, o ato se desfaz, como se nunca tivesse existido; malograda, o ato é também considerado como puro e simples desde a origem. A condição resolutiva da obrigação pode ser expressa ou tácita, operando, no primeiro caso, de pleno direito e, por interpelação judicial, no segundo. Se expressa, não há margem para qualquer dúvida; uma vez verificada, opera de pleno direito, D I R E I T O C I V I L II 29 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior independentemente de invocação à justiça; se tácita, porém, torna-se imperiosa a intervenção da autoridade judiciária para que esta pronuncie a rescisão do ato. Se houver dúvida sobre a natureza da condição, suspensiva ou resolutiva, será ela resolvida pelo exame dos termos do ato, intenção das partes e circunstâncias do caso. • Portanto, a lei considera verificada a condição quando é maliciosamente obstada pela parte a quem prejudica, e a presume não ocorrida quando for maliciosamente provocada por aquele a quem o seu implemento aproveita (artº 129120, do CCB). Ela condena por igual o dolo daquele que impede a realização da condição e o daquele que lhe força o advento. A regra é informada pelo princípio da responsabilidade, pois, convocando ou frustrando a condição, um dos contratantes causa prejuízo ao outro, e a melhor maneira de repará-lo é considerar a condição como não ocorrida ou realizada. • Finalmente, a condição não tem, em regra, efeito retroativo, exceto quando a lei expressamente o determina; por conseguinte, os atos de administração praticados pendente conditione sobrevivem intocados, não se devendo, tampouco, devolver os frutos colhidos. Outrossim, a lei expressamente determina que o advento da condição terá efeito retroativo quanto aos atos de disposição, os quais se invalidam com a sua ocorrência. 2) DO TERMO: • O TERMO: O termo é, na definição de Clóvis Beviláqua o dia em que começa ou se extingue a eficácia de um ato jurídico. Trata-se de modalidade do negócio cujo fim é suspender a execução ou o efeito de uma obrigação, até um momento determinado, ou até o advento de um acontecimento futuro e certo. Não se confunde com o prazo, que é o espaço de tempo intercorrente entre a declaração de vontade e o advento do termo. Também se diferencia da condição, pois nesta tem-se em vista um evento futuro e incerto e no termo, considera-se um momento futuro e certo. É considerado um direito deferido, porque não impede a aquisição do direito, cuja eficácia ele apenas suspende. • Desmembrando a definição acima formulada, temos: 1) Termo inicial: (dies a quo) é o que suspende o exercício de um direito, ou ainda, é o momento em que a eficácia de um ato jurídico deve começar. Também se chama termo suspensivo porque protrai a exigibilidade de um direito; 2) Termo final: (dies ad quem) é o que dá término a um direito criado pelo contrato e até então vigente. É o momento em que a eficácia do ato D I R E I T O C I V I L II 30 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior jurídico deve terminar, também denominado termo resolutivo ou extintivo. (ler artº 135 do CCB). 3) Termo certo: é certo quando se reporta a uma data do calendário: 04 de setembro de 1999; ou então, quando fixado tendo por base o decurso de certo lapso de tempo: de hoje a um ano, quando tal pessoa atingir a maioridade; 4) Termo incerto: quando se refere a acontecimento futuro, mas que se verificará em data indeterminada, por exemplo, o óbito de certa pessoa. 3) O PRAZO: • O PRAZO: É o lapso de tempo transcorrido entre a declaração de vontade e o advento do termo. O artº 132 do CCB determina que se computem os prazos excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento. Todavia, se este cair em feriado, considera-se prorrogado o prazo até o seguinte dia útil. Os prazos fixados por hora contam-se de minuto a minuto. Quando tais prazos não foram mencionados, pela regra geral do artº 331 do CCB são exeqüíveis desde logo. Entretanto, embora sem prazo, as obrigações não serão exigíveis desde logo: a) se a execução tiver de ser feita em lugar diverso; b) se depender de tempo. 4) O MODO OU ENCARGO: • O MODO OU ENCARGO: Encargo ou modo é uma limitação trazida a uma liberalidade, quer por dar destino ao seu objeto, como, por exemplo, dôo uma casa, contanto que ele aí vá morar; quer por impor ao beneficiário uma contraprestação, como, por exemplo, deixo a B cinco milhões, mas ele terá de educar meus filhos até a maioridade. É um ônus que diminui a extensão da liberalidade. Beviláqua define o encargo como “a determinação acessória, em virtude da qual se restringe a vantagem criada pelo ato jurídico, estabelecendo o fim a que deve ser aplicada a coisa adquirida, ou impondo uma certa prestação”. • O encargo se distingue da condição, pois, enquanto esta atua sobre a eficácia do negócio, impedindo a aquisição do direito (se suspensiva), ou aniquilando-o (se resolutiva), o encargo não suspende tal aquisição, que se torna perfeita e acabada desde logo, a menos que o disponente imponha o D I R E I T O C I V I L II 31 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior contrário, caso em que o modo funcionará como condição suspensiva (CCB artº 136). CAPÍTULO V DA FORMA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS E DA SUA PROVA 1) DA FORMA: 1.1) CONCEITO DE FORMA: • Clóvis Beviláqua define a FORMA como o conjunto das solenidades que se devem observar, para que a declaração da vontade tenha eficácia jurídica. A regra geral é a da liberdade de forma a qual só não vige quando a lei expressamente demandar forma especial, nos termos do artº 107 do CCB. • A forma especial, quando exigida pelo legislador, tem por fim: a) garantir a autenticidade do ato; b) assegurar a livre manifestação da vontade das partes; c) chamar a atenção das partes para a seriedade do ato que estão praticando; d) facilitar a prova do negócio jurídico. • Outrossim, a desobediência à forma, quando prescrita em lei, acarreta a nulidade do ato jurídico nos termos do artº 145, nºs IV e V, do CCB. • No direito anterior e em alguns sistemas, encontramos ainda duas formas diferentes: a ad solemnitatem, quando elementar para a existência do ato jurídico, isto é, quando sem elas o ato não se configura; e a ad probationem tantum, quando o ato, embora ganhe vida sem utilizá-las, não pode ser provado, visto que sua evidência fica condicionada à forma imposta pela lei. 2) DA PROVA: 2.1) CLASSIFICAÇÃO: • Prova é o conjunto dos meios empregados para demonstrar legalmente a existência de um ato jurídico. Ademais, se o ato é solene somente pode ser aceito pela forma prescrita em lei, não podendo o juiz admiti-lo por outra forma, conforme regra ditada pelo artº 125 do CCB, a saber: “Mas, quando a lei considerar determinada forma como de substância do negócio jurídico, o juiz não lhe D I R E I T O C I V I L II 32 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior admitirá a prova por outro meio”. Outrossim, tal regra encontra exceção quando ocorre o inverso, quando o ato para ser ultimado necessita apenas de instrumento particular pode ser suprido por outro de caráter legal (artº 221, par. único do CCB). 2.2) MEIOS PROBATÓRIOS ADMITIDOS EM DIREITO: • Dispõe o Código Civil, em seu artº 212 que os atos a que não se impõe forma especial poderão provar-se mediante: 1) Confissão: é o ato pela qual uma das partes afirma o que a outra alega, versando sempre questão de fato, e dentro desse limite é a rainha das provas, sendo seu valor probante incontestável. Distingue-se a confissão em judicial e extrajudicial, pode ser expressa, quando provém da deliberação do confitente, traduzida por palavras ou por escrito, e também presumida ou ficta, quando a lei a supõe, em virtude de um comportamento determinado do litigante. A confissão pode ser feita por mandatário com poderes especiais, só operando contra quem a fez. A confissão, ainda, pode ser divisível ou indivisível; 2) Atos processados em juízo: são aqueles atos que já foram objeto de processo e pronunciamento judicial, como o caso julgado. Em questão de provas, tais atos podem ser emprestados de outro processo que eventualmente tenha corrido entre as mesmas partes, que servirão de subsídios na formação do convencimento do juiz, devendo tal prova ser recebida com cautela pelo juiz face o princípio da identidade física do juiz; 3) Documentos públicos ou particulares: os documentos públicos são aqueles emanados de autoridade pública, tais como as mensagens, as proclamações, os tratados, as portarias e os avisos de ministros. Documentos particulares são os emanados da atividade privada, tais como as cartas, os telegramas particulares, os bilhetes, os memorandos, etc; 4) Testemunhas: são as pessoas que asseguram a verdade de um ato ou fato alegado. São instrumentárias quando se pronunciam sobre o conteúdo do instrumento que subscrevem e judiciárias quando depõem em juízo. Outrossim, há restrições quanto à admissibilidade incondicionada da prova testemunhal, pois esta não poderá exclusivamente ser aceita em contratos de valor até o décuplo do salário mínimo à época de sua feitura, nos termos do artº 401 do CPC e do artº 227 do CCB; ordinariamente, não se admitirá o testemunho de uma só pessoa, face o princípio do testis unus, testis mullus, mas pode o juiz livremente formar sua convicção, até com o testemunho dessa única testemunha; os incapazes, nos termos do artº 228 do CCB, abrindo-se exceção ao dispositivo supra aos ascendentes quando o litígio versar sobre o nascimento ou óbito de seus filhos e aos parentes e amigos íntimos em caso de separação ou divórcio. Finalizando, não poderá qualquer testemunha ser compelida a depor sobre fatos a cujo respeito por estado ou profissão deva guardar segredo, nos termos do artº 229 do CCB; D I R E I T O C I V I L II 33 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior 5) Presunção: são casos em que o juiz não pode verificar diretamente, de modo que a prova se estabelece pelo raciocínio, criando-se uma relação entre fatos conhecidos e fatos contestados. Podem decorrer da lei e chamam-se legais, ou advêm de circunstâncias da vida, daquilo que habitualmente acontece, e então são chamadas presunções hominis ou presunções comuns. As presunções decorrentes da lei subdividem em duas espécies, a saber: as irrefragáveis, chamadas juris et de jure, não se admitem prova em contrário; e as juris tantum, permitidas pela lei a apresentação de prova em contrário, tendo por efeito reverter o ônus da prova, que caberia ao autor da ação; 6) Exames e vistorias: exame é a apreciação de alguma coisa por meio de peritos para esclarecimentos do juiz. Vistoria é o exame que depende de inspeção ocular para apurar o estado de uma coisa. Dentre as medidas preventivas, a lei inclui a vistoria ad perpetuam rei memoriam, que é a verificação, através de perícia, de um estado transitório da coisa, a fim de fixá-lo como provado; 7) Arbitramento: é o exame que peritos fazem de alguma coisa, para determinar-lhe o valor ou estimar em dinheiro a obrigação a ela ligada. CAPÍTULO VI DAS NULIDADES 1) CONCEITO: • Consiste no reconhecimento da existência de um vício que impede um ato de ter existência legal ou de produzir efeito. • COMO SE DISTINGUE A NULIDADE ABSOLUTA DA RELATIVA: Num primeiro momento, cabe salientar que as nulidades absolutas são muito mais graves que as nulidades relativas, posto que naquelas o atentado à ordem jurídica é muito mais profundo e o legislador reprime-as com muito mais energia, aplicando-lhes sanção mais severa. Nesta última, a falta cometida é mais leve, sendo menos profundo o contraste com a ordem jurídica. Passemos à distinção entre nulidade relativa e absoluta: a) Quanto aos efeitos: o ato nulo não produz qualquer efeito, pois quod nullum est, nullum producit effectum. Contrariamente, o ato anulável produz todos D I R E I T O C I V I L II 34 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior os efeitos até ser julgado tal por sentença. Assim, a nulidade é automática, pois emana da vontade do legislador, enquanto a anulabilidade depende de sentença e emana da vontade do juiz, a pedido do prejudicado, sendo certo que a sentença que proclama a nulidade absoluta é declaratória, enquanto que o julgado que afirma a nulidade relativa é constitutivo. Enquanto a nulidade relativa pode convalescer, se as partes assim o quiserem, a nulidade absoluta jamais se cura, vedado que fica o juiz supri-la, ainda a requerimento das partes (artº 168, par. único). Finalmente, enquanto os efeitos da sentença decretadora de nulidade absoluta operam erga omnes, os efeitos do julgado em que se reconhece uma nulidade relativa aproveitam exclusivamente aos que alegarem, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade (artº 177, 2ª parte, do CCB); b) Quanto à pessoa que as pode alegar: o ato anulável só pode ser alegado pelos interessados, enquanto que a nulidade absoluta pode ser argüida não só por qualquer interessado, como também pelo Ministério Público, devendo, ademais, ser pronunciada pelo juiz, quando a encontrar provada (artº 168, par. único); c) Quanto à ratificação: o ato anulável é suscetível de ser ratificado, enquanto que o ato nulo não admite ratificação. Ratificação é a renúncia ao direito de promover a anulação do ato, advindo da vontade do prejudicado e, portanto, só se admite nos casos de anulabilidade. Os atos absolutamente nulos representam ameaça à ordem social, e as normas de ordem pública não podem ser ilididas por ajuste entre os particulares. A ratificação retroage à data do negócio, pois, uma vez aperfeiçoada aquela, este se considera expungido, desde sua feitura, de qualquer defeito; d) Quanto à prescritibilidade: enquanto o ato nulo é imprescritível, a ação anulatória está sujeita à prescrição. Assim, os atos anuláveis equivalem a uma ratificação presumida, enquanto os atos nulos são irretificáveis, portanto, imprescritíveis. 2) ATO INEXISTENTE: • É o negócio que não reúne os elementos de fato que sua natureza ou seu objeto supõem, e sem os quais é impossível conceber sua própria existência. Falta um elemento substancial para a perfeição do ato, e nas quais a lei é silente sobre a questão da nulidade, dizendo-se que o ato é inexistente. Ex. Casamento de pessoas do mesmo sexo, o casamento celebrado por pessoa absolutamente incompetente, etc. Ao contrário do D I R E I T O C I V I L II 35 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior ato nulo, onde mister se faz a declaração judicial de sua ineficácia, o ato inexistente independe de ação judicial para perder qualquer efeito, pois, se ele nem sequer existe, não se faz necessário, naturalmente, destruí-lo. Quanto à prescrição, o ato inexistente não convalesce nunca, por maior que seja o transcurso do tempo. 3) NULIDADE ABSOLUTA: • O ato jurídico, para ter validade, requer agente capaz, objeto lícito e forma prescrita e não defesa em lei, nos termos preceituados pelo artº 104 do CCB. Faltando um desses requisitos, podemos dizer que o ato é nulo, nos termos do artº 166 do CCB. Assim, o ato praticado pelo absolutamente incapaz, o ato cujo objeto é ilícito, quer por colidir com a lei, quer por atentar contra a moral e os bons costumes, o ato em que se desprezou a forma prescrita em lei ou em que se utilizou forma que a lei vedava, ou o ato a qual foi preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade, como é o caso do testamento público, que exige-se a presença de cinco testemunhas instrumentárias, e quando o ato jurídico é taxativamente declarado por lei como nulo ou lhe negar efeito, como no caso do artº 1.428 do CCB. 4) DA ANULABILIDADE: • Duas são as hipóteses em que surgem o ato anulável: quando é praticado por pessoa relativamente incapaz, e quando, a viciar o negócio jurídico, encontra-se um defeito tal como o erro, o dolo, a coação, a simulação ou a fraude. O artº 154 do CCB proclama serem anuláveis as obrigações contraídas pelos menores entre 16 e 18 anos, quando atuarem sem autorização de seus legítimos representantes, ou sem assistência de curador que houvesse de intervir no ato. Outrossim, a proteção legal supra referida ao menor púbere cessa quando ele, para se eximir de uma obrigação, mente sobre sua idade, no ato de contratar (artº 180 do CCB), agindo dolosamente e sendo o erro da outra parte escusável; quando pratica ato ilícito que o sujeita ao dever de reparar o dano (artº 156 do CCB), equiparando-o, a lei, ao maior. A nulidade parcial de um ato não prejudica na parte válida, se esta for da outra separável (artº 184 do CCB). É o princípio tradicional segundo o qual utile per inutile non vitiatur. Assim, se um ato jurídico pode ser desdobrado, e apenas uma de suas partes vem afetada pela nulidade, a outra continua válida, porque não a contamina aquele vício destruidor. Ex. Se a dívida contraída é nula por ser o contratante devedor incapaz, nula é a hipoteca que a garante. Se o contrário ocorrer, nula D I R E I T O C I V I L II 36 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior somente será o acessório, ou seja, a hipoteca. Finalizando, anulado o ato, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam. Não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente, no termos do artº 182 do CCB. CAPÍTULO VII DOS ATOS ILÍCITOS 1) CONCEITO: • Ato ilícito é aquele praticado com infração a um dever e do qual resulta dano para outrem, dever esse legal ou contratual. Se alguém descumpre uma obrigação contratual, pratica um ilícito contratual, devendo este reparar o prejuízo causado, nos termos do artº 389 do CCB. Outrossim, por vezes o ilícito se apresenta fora do contrato, infringindo o causador uma norma legal por agir com dolo ou culpa, chamando este ilícito de responsabilidade extracontratual ou aquiliana, nos termos do preceituado no artº 159 do CCB, a saber: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”. 2) PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE AQUILIANA: 2.1) Ação ou omissão do agente: advém de uma atitude, quer ativa, no caso consiste num ato doloso ou imprudente, quer passiva, via de regra, se retrata através da negligência, no caso da ação. A omissão só ocorre quando o agente, tendo o dever de agir de determinada maneira, deixa de fazê-lo; 2.2) Relação de causalidade: entre o comportamento do agente e o dano causado, é necessário se demonstre relação de causalidade. Outrossim, pode haver ato ilícito com dano, sem que um seja a causa do outro, ou que a relação de causalidade não fique demonstrada, tendo em vista a culpa exclusiva da vítima; 2.3) Existência de dano: é a causa de um prejuízo a outrem. Tal prejuízo ou dano tanto pode ser patrimonial quanto moral. Ambos são indenizáveis, D I R E I T O C I V I L II 37 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior sendo certo que no dano moral há entendimentos doutrinários e jurisprudências que entendem contrariamente; 2.4) Dolo ou culpa do agente: age com dolo aquele que , intencionalmente, procura causar dano a outrem, consciente das conseqüências funestas de seu ato, assumindo o risco de provocar o evento danoso. Outrossim, atua culposamente aquele que causa prejuízo a terceiro em virtude de sua imprudência, imperícia ou negligência. Assim, em matéria de responsabilidade extracontratual, a necessidade de reparar o dano advém de culpa do agente (de qualquer grau), onde o elemento predominante é o alcance do prejuízo experimentado pela vítima. Lex Achilia et levissima culpa venit. Façamos a distinção entre culpa in concreto e culpa in abstrato: na primeira se examina a imprudência ou a negligência do agente, verificando as condições que cercam uma espécie determinada e na segunda se compara o procedimento do agente ao do homem normal, isto é, ao de um tipo fictício que se tem em vista, tal como o diligens pater familias dos romanos. O adotado pela nossa legislação é o da culpa in concreto. Ademais, a culpa pode ser da vítima, podendo esta ser exclusiva, que exclui nesse caso a responsabilidade civil do agente, e a concorrente com a culpa do agente, onde esta se atenua porque a vítima também contribuiu para o evento danoso com sua própria negligência ou imprudência. Mas se fato foi provocado por força maior ou caso fortuito, cessa igualmente a responsabilidade, pois a presença de uma dessas circunstâncias elimina a idéia de culpa, nos termos do artº 1058, par. único do CCB. • Casos há em que os atos causadores de dano não são considerados ilícitos, como preceitua o artº 188 do CCB, a saber, a legítima defesa (ver tb. artº 1.210 CCB), o exercício regular de um direito reconhecido e os atos praticados em estado de necessidade. CAPÍTULO VIII DA PRESCRIÇÃO 1) DEFINIÇÃO: • Prescrição é a perda da ação atribuída a um direito e de toda sua capacidade defensiva, em consequência do não-uso delas, durante um determinado D I R E I T O C I V I L II 38 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior espaço de tempo. A inércia do credor, ante a violação de um seu direito, por um período de tempo fixado na lei, conduz à perda da ação de que todo direito vem munido, de modo a privá-lo de qualquer capacidade defensiva. 2) ESPÉCIES: • Temos, portanto, dois tipos de prescrição, a aquisitiva e a extintiva. A prescrição aquisitiva é o deferimento pela lei à pessoa que desfruta de um direito por extenso período de tempo, a prerrogativa de incorporá-lo ao seu patrimônio. Já a prescrição extintiva determina que o indivíduo que longamente deixou de exercer uma ação que resguardava um seu direito subjetivo, perca a prerrogativa de utilizá-la. É a que engloba nosso estudo, pois a aquisição aquisitiva será vista em época do usucapião. • Conforme Beviláqua, na prescrição extintiva, o que perece não é o direito, e sim a ação de que seu titular estava munido e com a qual podia defender-se, mas, desprovido da ação, o direito perde sua eficácia, pois não se faz acompanhar da força coercitiva que o Estado lhe empresta. • As normas sobre a prescrição são de ordem pública, insuscetíveis de serem derrogadas por convenção entre os particulares, mas, em virtude do caráter cogente das normas sobre a matéria: a) os particulares não podem ajustar sobre a imprescritibilidade de qualquer direito; b) não podem prorrogar os prazos de prescrição; c) não podem a ela renunciar, antes que se consume. • Dois são os requisitos elementares para que se processe a prescrição, a saber, a inação do titular do direito e o transcurso do tempo. • Diferença entre prescrição e decadência: Quanto aos efeitos, a prescrição é suscetível de ser interrompida e não corre contra determinadas pessoas; já os prazos de decadência fluem inexoravelmente contra quem quer que seja, não se suspendendo, nem admitindo interrupção. Quanto à natureza, na prescrição o que perece é a ação que guarnece o direito, enquanto que na decadência é o próprio direito que fenece. Quanto à origem da ação, quando a ação e o direito têm origem comum, trata-se de prazo de caducidade; outrossim, se o direito preexiste à ação, que só aparece com a violação daquele, o prazo é de prescrição. • Renúncia à prescrição é o ato pelo qual o prescribente se despoja do direito de invocá-la. Ela pode ser expressa ou tácita, mas depende de dois pressupostos: a) que dela não decorra prejuízo para terceiro; b) que já se haja consumado. Por conseguinte, a lei veda a renúncia quando ainda em curso, ou quando não iniciada a prescrição. Na renúncia expressa, esta se revela através de uma declaração autêntica, não sujeita à forma especial, enquanto na tácita esta se caracteriza quando o devedor, ciente de que D I R E I T O C I V I L II 39 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior contra si já se consumou a prescrição, pratica algum ato ostensivo, que envolve o reconhecimento do direito prescrito. Ex. pagamento de dívida já vencida. • Quanto ao prazo em que a prescrição deve ser alegada, essa o pode ser em qualquer instância (artº 193 do CCB), o que vale dizer que o interessado pode aduzi-la, em forma de exceção, na primeira ou em superior instância, na ação ou na execução. Contra os incapazes não corre os prazos prescricionais, sendo certo que se iniciado, se suspende. Se relativamente incapaz e aqueles que não se encontram na administração de seus bens, a lei permite que a prescrição contra eles se consume, conferindo-lhes ação regressiva contra seus representantes. • Quanto à suspensão e interrupção da prescrição, esta se suspende por força de disposição da lei em casos determinados e, ao reiniciar seu curso, o prazo anteriormente transcorrido aproveita ao devedor, enquanto que a interrupção da prescrição é o ato deliberado do credor pelo qual, lançando mão de forma adequada, torna sem efeito o prazo já transcorrido. Quanto aos casos que impedem ou suspendem a prescrição, lemos os artºs 197 a 199 e as causas que interrompem a prescrição os artºs 202 a 204, todos do CCB. • Finalmente, quanto aos prazos prescricionais, este é regulado pelos artº 205 e 206 do CCB, onde, regra geral, as ações pessoais prescrevem em vinte (20) anos, as reais entre presentes em dez (10) anos e entre ausentes em quinze (15) anos, aplicando-se a todos os casos nas quais o CCB não previu outro prazo (artº 179) a regra acima exposta. BIBLIOGRAFIA BÁSICA CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo, Editora Saraiva, 1º ed., 1991. ______. Código Civil Anotado. São Paulo, Saraiva, 1995. GONÇALVES, Carlos Roberto. Sinopses Jurídicas. Direito Civil Parte Geral 1. São Paulo, Saraiva, 1997. D I R E I T O C I V I L II 40 Prof. Orlando Pereira Machado Júnior MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Campinas, Bookseller, 1ª ed., 1999. MONTEIRO, Washington de Barros. 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